Luiz Gonzaga: Um Contador do Nordeste do Brasil
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Luiz Gonzaga - Nildecy de Miranda Nascimento
Editora Appris Ltda.
1ª Edição - Copyright© 2018 dos autores
Direitos de Edição Reservados à Editora Appris Ltda.
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COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO LINGUAGEM E LITERATURA
A meu pai, que há algum tempo virou silêncio e em cujo
colo ouvi as primeiras canções de Luiz Gonzaga.
A Maurício, Marcelo e Bela, presentes especiais de Deus.
A Nélio, andarilho do sertão cujas narrativas
motivaram parte desta escrita.
À professora Maria Lenilda Carneiro David (in memoriam).
PREFÁCIO
A música de Luiz Gonzaga está presente em minha vida desde a infância, reforçando a minha nordestinidade
, dando-me uma identidade e criando a noção de pertencimento a essa terra de gente forte e autêntica. Por isso, apresentar esta obra, para mim, é motivo de lisonja, alegria e orgulho. Trata-se do livro originado da pesquisa de mestrado da professora e amiga Nildecy de Miranda Nascimento, com quem tive o prazer de trabalhar e conhecer a competência e a qualidade literária.
A autora faz uma viagem pelo universo gonzaguiano e nos apresenta um texto rico de imagens, representando a alma poética presente na música desse cantor e compositor pernambucano.
O livro é um convite a conhecer uma escritora madura, sensível, cujas emoções são apresentadas de forma plástica e lúdica a partir de uma pesquisa profunda da obra de Luiz Gonzaga e da cultura popular nordestina que ele representa em suas formas e temas.
A qualidade da literatura de Nildecy é perceptível na riqueza de conteúdo, no texto inventivo e fluido, na simplicidade linguística com que mergulha na pluralidade cultural e social do Brasil e do povo nordestino, de quem Luiz Gonzaga foi uma fonte inesgotável de produção de arte
(NASCIMENTO, 2018, p. 29). O conteúdo apresentado neste livro traz importante contribuição para o estudo da cultura nordestina, por apresentar um assunto complexo e delicado que vem sendo discutido há anos: a questão da brasilidade. E a cultura nordestina é vista como a que mais se aproxima dessa brasilidade, pelo seu caráter popular que melhor representa e preserva nossa identidade nacional.
Para Nildecy (2018), as músicas de Luiz Gonzaga são recursos comunicativos, que instituem um lugar, acionando um imaginário já gravado na memória coletiva
(p. 30) , e sua performance pode ser considerada como inaugurativa de um discurso que representa criativamente o sertão do Nordeste
(p. 33).
Entre xotes, forrós e xaxados do Rei do Baião
, Nildecy presenteia-nos com ricas relações imagéticas nordestinas e nos leva a um mundo onde o cantar triste do Assum Preto mistura-se às lágrimas das famílias retirantes, numa Triste Partida, à espera da chuva para, como a Asa Branca, retornar ao seu sertão.
Por fim, cumprimento a amiga Nildecy pela excelente qualidade do trabalho e não apenas recomendo sua leitura, mas convido todos os leitores a conhecerem esta obra que será, sem dúvida, uma referência para todos nós que estudamos, gostamos e vivemos a música e a cultura sertaneja do Nordeste.
Marly Caldas
Professora, jornalista e mestra em Literatura e Diversidade Cultural
Sumário
Introdução
Luiz Gonzaga no traçado de outras linhas
1
Nacionalismo e discurso identitário
2
Luiz Gonzaga cantando e contando
3
Quem conta um conto inventa um ponto
Considerações finais
inserção é invenção?
Referências
ANEXOS
Letras de algumas canções trabalhadas
Introdução
Esta obra tem por objetivo deixar para pesquisadores, professores e artistas em geral uma fonte de pesquisa sobre o legado do forrozeiro Luiz Gonzaga, evidenciando seus temas, os recursos da linguagem poética que ele utiliza, as influências culturais que perpassam o seu cancioneiro, entre outros aspectos, demonstrando de que forma ele contribuiu para divulgar e valorizar a cultura do sertão nordestino.
O cancioneiro de Luiz Gonzaga se constitui numa rica fonte de textos para trabalhar com literatura e outras disciplinas e pode servir para todas as idades, da alfabetização ao ensino superior. Como nosso foco é a literatura, destacamos em seus textos uma grande quantidade de versos líricos, de narrativas, de elementos épicos. Sua linguagem nos apresenta a língua errada do povo, língua certa do povo que fala gostoso o português do Brasil
¹.
Ao sabor de textos que utilizam com maestria a ironia e o humor, o artista divulgou a cultura sertaneja, demonstrando que o homem do sertão sabe transformar as dificuldades em alegrias.
Estudar Luiz Gonzaga é projeto que se desenhou ainda na minha infância sob a influência do meu pai, que adorava os forrós juninos. Mais tarde, já professora de literatura, a ideia desta pesquisa se tornou mais concreta diante estudantes do ensino médio, quando utilizei Samarica Parteira para motivar uma discussão sobre o romance regionalista. Os alunos, naquela oportunidade, ficaram eufóricos com a canção. Quando voltei a explicar os tópicos teóricos, observei que a turma estava participando com interesse, brincando com o assunto em foco. Como sempre fui apaixonada pela sala de aula, eu me pus a refletir sobre como o cancioneiro gonzaguiano pode ser utilizado em todos os segmentos, tornando as aulas mais prazerosas.
Fui então para o Mestrado em Literatura e Diversidade Cultural da Universidade Estadual de Feira de Santana e me propus ao estudo do tema. Inicialmente não sabia como proceder ao recorte do objeto de estudo, devido ao pluralismo de vozes autorais que participam do cancioneiro gonzaguiano. Já em discussão com os meus orientadores, sucessivas reflexões, nos levaram a entender Luiz Gonzaga como o artista que, com a sua interpretação, tornou nacionalmente conhecido o cancioneiro que ora apresentamos.
Ainda que não tenha escrito a maioria das composições que gravou, é a escolha e a interpretação singular de Luiz Gonzaga que dá existência pública a esses textos. Podemos pensar na possibilidade de que alguns letristas teriam permanecido no anonimato, se não fosse a divulgação de Luiz Gonzaga. O caráter de permanência que ele adquiriu, como forma de imaginar o espaço nordestino, revela a importância desse poeta popular.
No primeiro capítulo, localizamos a obra de Luiz Gonzaga entre os discursos nacionalistas, destacando que na década de 40, período em que Luiz Gonzaga começou a fazer um grande sucesso no Rio de Janeiro, o rádio vivia a sua fase de ouro. impulsionando a música popular a radiodifusão e a indústria fonográfica.
No segundo capítulo, trataremos mais especificamente sobre Luiz Gonzaga. Apresentaremos o homem-espetáculo que ele foi, a temática de sua obra, a linguagem utilizada, alguns dos recursos poéticos que utilizou, investigando traços da herança cultural do colonizador ou do elemento indígena.
Faremos considerações sobre a performance do artista, inventivo ao veicular mensagens muitas vezes inscritas no próprio corpo enquanto cantava.
No terceiro capítulo, articularemos um paralelo entre as canções de Gonzaga e a literatura regionalista, partindo da comparação de trechos de romances de escritores consagrados a letras de músicas de Luiz Gonzaga, para demonstrar como cada um deles aborda os temas que tornaram viva uma tradição discursiva sobre o Nordeste.
Em seguida, realizando uma análise dos textos Samarica parteira, de Zé Dantas, e Karolina com K, de autoria do próprio Luiz Gonzaga, demonstraremos como Luiz Gonzaga, enquanto contava os seus casos, tornava conhecida a cultura do sertão pela via do lúdico, da alegria e do prazer.
Ainda no terceiro capítulo, analisaremos canções de um universo ligado, pelo viés da fantasia, à literatura infantil, pois acreditamos na possibilidade dos textos de Luiz Gonzaga serem utilizados nas salas de aula desde a alfabetização.
Ao final transcreveremos letras de algumas canções. Muitas delas fomos buscar em discos antigos, nem sempre em bom estado de conservação, e nesse aspecto contamos com a ajuda de Guilherme Machado e de José Sobrinho, a quem também fazemos referência nas páginas finais.
Luiz Gonzaga no traçado de outras linhas
Luiz Gonzaga tem sido objeto de estudo nas áreas de Jornalismo, Ciências Sociais e Literatura, Comunicação, Música, entre outras. Foi estudado por diversos profissionais: professores universitários, musicólogos, estudantes de Filosofia e de Letras, jornalistas e sociólogos. Entre os seus pesquisadores, encontramos o odontólogo Uéliton Mendes da Silva, o sociólogo Délio Mendes, o padre Francisco de Assis Magalhães Rocha, com doutorado em religiosidade popular pela Universidade de Santo Tomás de Aquino, em Roma, entre outros.
O sanfoneiro do Riacho de Brígida, do escritor Sinval Sá, foi o mais antigo trabalho sobre o artista de que tivemos conhecimento. O livro, cuja terceira edição é de 1966, traz a biografia de Luiz Gonzaga, reproduzindo muitas de suas estórias e anexando um cancioneiro do Rei do Baião.
A coleção História da música popular brasileira, da Abril S/A, dedicou o volume 13 a Luiz Gonzaga, em 1970. Em 1988, Mundicarmo Maria da Rocha Ferreti publicou, em Recife, o Baião de dois: A música de Zedantas e Luiz Gonzaga no seu contexto de produção e sua atualização na década de 70.
Em 1996, a RCA ofereceu ao público a coletânea Luiz Gonzaga: 50 anos de chão que inclui um livreto com variada iconografia e perfil biográfico de Luiz Gonzaga pelo jornalista João Máximo, do Jornal do Brasil. Estudo minucioso foi realizado por Uéliton Mendes da Silva, que catalogou a discografia de Gonzaga de acordo com diversos critérios: ano de gravação das músicas, ordem alfabética, parcerias, gravadoras, entre outros. Luiz Gonzaga: discografia do rei do baião, publicado em Salvador em 1997.
A professora Elba Ramalho, PhD em Musicologia pela Universidade de Liverpool e professora de música na Universidade Federal do Ceará, defendeu, na Inglaterra, a tese de doutorado Luiz Gonzaga: his career and his music (Luiz Gonzaga: sua carreira e sua música), em julho de 1997,