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Andiamo In Brasile
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E-book264 páginas2 horas

Andiamo In Brasile

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Sobre este e-book

As memórias que você, leitor, está prestes a ler são fantásticas! Parecem mesmo saídas de um filme, mas podemos garantir que são todas reais. [...] Esta aventura começa com o nascimento de Franco, na Itália, em 1939, estendendo-se ao longo de seus mais de 80 anos de caminhada, narrado com detalhes inesquecíveis o desenrolar de vidas de personagens típicos de uma cultura que tem na força do trabalho, da família e do bom humor a sua base para ir adiante. Andiamo in Brasile relata quase um século de história vivida em meio à Segunda Guerra Mundial, à imigração para um país estranho, à sobrevivência, às novas amizades, amores e a constituição de uma família que faz da sua cultura, a sua motivação de ir em frente, sem nunca ter como opção a desistência. Roberta e Paula Bolla
IdiomaPortuguês
Data de lançamento8 de jul. de 2022
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    Andiamo In Brasile - Franco Bolla

    Primeiras memórias de infância

    até o fim da Guerra

    1. Primeiras memórias de infância

    Bem, hoje é dia 15 de janeiro de 2009. Vou iniciar procurando, ao pensar na minha infância, as lembranças mais antigas que ainda tenho guardadas.

    Em torno do ano de 1942-43, morávamos em Verona¹, Itália, na Corso Milano (que naquela época chamava-se Via General Graziani), número 44, Borgo Milano, no terceiro piso, de fundos.

    Foi ali que escutei as primeiras bombas caírem por perto. Tínhamos, no telhado da casa, um alarme que avisava da chegada dos bombardeios. Alarme esse que ouvíamos primeiro em função de que o contator elétrico, que fazia o alarme soar, se ouvia do nosso apartamento.

    Então, ouvíamos primeiro o track do contator e já sabíamos que a sirene começaria a avisar de mais um bombardeio aéreo chegando. Com o tempo, eles ficaram cada vez mais frequentes. Não havia noite, não havia dia. À noite, os aviões largavam uma iluminação artificial que clareava o suficiente para eles enxergarem os seus alvos favoritos, como a Estação Férrea de Verona. Esta estação se situava entre um 1 km e 1,5 km da nossa casa, então, realmente, as bombas caíam perto da nossa região.

    Os bombardeios se tornaram tão frequentes e tão apavorantes que meu pai decidiu se mudar com a família dali e procurar um abrigo fora da cidade, mas isso é um outro capítulo, pois ainda tenho outras lembranças deste local e vou retornar ao assunto. Estes fatos ocorreram quando eu tinha entre três e quatro anos de idade.

    2. Desmonte do carro

    Por falar de onde morávamos em 1942, conforme comentei da sirene no telhado, me vem mais uma lembrança. Meu pai, naquela época, tinha um carro muito pequeno chamado Topolino. Na verdade, era um Fiat 500 e, corria a voz que os carros que estivessem em bom estado – e o dele estava – seriam requisitados pelo governo para serviços e, que Mussolini precisaria para deslocar seu pessoal. Então, em função desses boatos, meu pai desmontou o Topolino², e esse era tão grande que ele carregou peça por peça para o apartamento que tínhamos no terceiro andar, como já disse.

    Lá, tínhamos um corredor nos fundos, ou melhor, uma área externa bastante comprida, onde ele depositou todo o carro. Ele daria a desculpa que o carro estaria quebrado e que estava consertando-o. Nessa ocasião, vendo meu pai desmontando e mexendo no carro, eu – coisa de guri – peguei uma almotolia³ de chapa de ferro e corria para cima e para baixo – como todo guri dessa idade, que precisa correr com alguma coisa na mão para ver se ele se arrebenta – e de fato, correndo com a almotolia na mão, fui ao chão, e ela me entrou no queixo, rasgando-o. Levei alguns pontos e essa cicatriz está comigo até hoje.

    3. Meu pai na África

    Volto atrás nas datas. Eu ainda não tinha nascido quando esta história aconteceu, mas a ouvi várias vezes em casa. Em 1936, um ano após se casar, meu pai, Antonio Bolla, foi para a África. Com a história do Mussolini⁴, que também queria ter uma colônia italiana, como tantos outros países, por exemplo a França, a Inglaterra e a Bélgica, os italianos foram atraídos para essa colônia na África chamada Eritreia⁵, na cidade de Asmara, Addis Ababa, entre outras.

    Meu pai e seu sócio compraram um caminhão e foram para a África nessa época, para transportar combustíveis. Era um serviço arriscado, mas rendia um bom dinheiro. Porém, depois de alguns meses, meu pai contraiu malária e ficou tão mal, mas tão mal, que não sei como não faleceu naquela ocasião. Ele acabou voltando para a Itália e seu sócio ficou lá trabalhando, sozinho, com o caminhão da sociedade.

    Nos primeiros tempos, o sócio ainda mandou algum dinheiro, porém mais adiante começou a se queixar, dizendo que a coisa ia mal, e, no final, não mandava mais dinheiro. Acontece que o irmão desse sócio do meu pai tinha, na ocasião, um açougue na parte térrea de onde morávamos. A minha mãe ia costumeiramente comprar carne neste açougue e alguma outra coisa mais.

    Um belo dia, o açougueiro estava atendendo outras pessoas e disse para minha mãe:

    – Olha, Bruna, recebi uma carta do meu irmão – ele sabia que o irmão era sócio do meu pai –, enquanto eu atendo aqui, tu podes abrir a carta e dar uma lida? Talvez tenha alguma notícia para teu marido.

    Minha mãe abriu a carta, e qual não foi sua surpresa quando viu que ele contava ao irmão, o açougueiro, que agora, depois que o Nino (apelido do meu pai) tinha voltado para a Itália em função da malária, ele estava como o diabo gosta: faturando por sua conta com o caminhão que era dos dois. E que, em pouco tempo, ele teria dinheiro para comprar outro caminhão, e mais outro, porque a coisa estava indo muito bem e, apesar de ser um trabalho arriscado, ele estava ganhando muito dinheiro. Ela ficou paralisada, mas acabou contando ao meu pai, que ficou decepcionado e arrasado com esse assunto.

    Passaram-se alguns meses, não veio mais nenhuma notícia. Um belo dia, chegou uma carta para o açougueiro, dizendo que o irmão dele tinha passado em cima de uma mina com o caminhão, que explodiu, e não conseguiu se safar: morreu queimado. Então, é um lance de família que já ouvi falar tantas e tantas vezes que não podia deixar de contar.

    4. África Oriental, 1936

    Nessa época, a África Oriental, uma parte dela era colônia Italiana: a Eritreia, a Etiópia (antiga Addis Ababa) e a Somália, e meu pai foi para essa parte da África para fazer transporte de combustíveis para o governo através do Gruppo Adige Valpantena, que tinha a concessão para este transporte (já me referi a isso, como também já falei sobre o sócio do meu pai, que acabou explodindo junto com o caminhão).

    Então, meu pai foi para lá cheio de entusiasmo, porque, naquela época, se fazia muito dinheiro com esse transporte de combustíveis. Ele transportava combustível de Asmara até Addis Ababa, ia à Somália, voltava, enfim, naquela região toda, onde existem montanhas de até 2.400 metros de altura. Ele sempre falava da dificuldade em fazer pegar o caminhão na manhã seguinte, em função do frio e da altitude, já com o ar um pouco rarefeito. Outro problema era cozinhar, porque a água ferve abaixo de 100 ºC, em função da altitude. E, por isso, o cozimento fica prejudicado, com a menor temperatura de ebulição.

    Então lembrei que ele contava que conseguia ovos no caminho e que, durante o dia, com o sol a pino, entre o calor do motor e do sol, ele cozinhava os ovos em cima do capô do motor. Comprava ovos no caminho, mas nunca via as galinhas, e um dia ficou curioso e perguntou:

    – Encontro ovos com facilidade, mas não vejo galinhas em lugar nenhum. Onde estão as galinhas que botam esses ovos coloridos tão bonitos? De onde vêm esses ovos?

    – Esses ovos não são de galinhas. São de abutre ou de urubu – respondeu o homem.

    Essa região da África foi capturada pelos italianos em 1936 e foi libertada pelos ingleses em 1941. Foi capturada em termos, porque o Haile Selassie (que era o rei desta região naquela época e, pelo que diziam, simpatizava com Mussolini, e vice-versa) fez vista grossa e deixou os italianos entrarem. Acontece que também existia a facção contrária, que não queria os italianos, que obviamente eram vistos como invasores, então, as escaramuças se davam todas as noites.

    O exército italiano tinha muita dificuldade de manter as posições, porque assaltavam os acampamentos, degolavam os soldados e, por um ato de selvageria ou vingança, não sei explicar o porquê, os italianos mutilados e degolados apareciam no dia seguinte com o órgão genital na boca.

    Meu pai se casou em 1935 e, em 1936, foi para a África. Em 1937, pegou malária e foi para um hospital de campanha do Exército Italiano. Estava sendo cuidado e medicado, não contra a malária, mas contra o tifo, pois o médico dizia que era disso que se tratava. Meu pai foi definhando, definhando e sempre falava para o médico:

    – Olha, isso aqui para mim é malária.

    – Não, o médico sou eu, e isso é tifo.

    E foi definhando até o ponto em que pediu, como último recurso, para falar com o capelão, porque via que iria deixar a casca lá.

    O capelão foi ao leito dele, e meu pai disse:

    – Olha, é assim, me casei em 1935, minha mulher está na Itália, e eu estou aqui agonizante, e quero fazer um último pedido. Peço que o senhor consiga convencer meu médico a mandar o meu sangue para exame em Addis Ababa ou Asmara – pois estavam longe desses locais, era um hospital fora, de campanha –, para ver se realmente não estão me dando o medicamento errado, porque para mim isso aqui é malária e não tifo.

    O capelão se compadeceu de meu pai, pois viu que estava nas últimas, então foi procurar o médico e o convenceu a mandar a amostra para exame. O médico acabou aceitando e, depois de uma semana, veio o resultado acusando que era malária, com forma tifosa, ou seja, havia também sintomas de tifo, não sei bem explicar. O médico também não estava errado, mas era muito teimoso, não quis administrar quinino, por exemplo, aí, quando veio o resultado dizendo que era malária, começaram a dar os remédios que se dava para essa doença; então, pouco a pouco, meu pai foi melhorando, até que saiu do sufoco.

    Meu pai encontrou um garotinho negro, que agora não me vem o nome, de catorze a dezesseis anos (tenho a fotografia dele) e fez dele o seu ajudante. Ele o auxiliava com o caminhão e, se tivesse que trocar um pneu, fazer comida, lavar os pratos e vigiar à noite, também fazia. O guri não dormia à noite, cuidando de avisar ao meu pai se algo acontecesse.

    Esse guri se afeiçoou tanto ao meu pai, e meu pai tanto a ele, que foi uma dificuldade para ele voltar à Itália. Quando ele melhorou da malária, o médico disse para não ficar lá, pois a doença poderia reincidir:

    – Você tem que sair daqui, tem que voltar para a Itália.

    Foi aí que meu pai deixou o caminhão com o sócio, como me referi. Porém, o guri não queria saber de meu pai ir embora, mas, naquela época, seria impossível, impraticável conseguir uma licença para levar o negrinho para casa. Meu pai contava que ele se desesperou no momento do embarque, que corria para cima e para baixo do cais, enquanto o navio se afastava.

    Contava ele que tinha recordações maravilhosas deste guri, que cuidou muito bem dele, tanto quando estava com saúde quanto doente. Ele ficou ao lado do leito dele desde que foi para o hospital até sair. Falando, agora, com minha irmã Marina, ela se lembrou do nome deste guri: Meleht. E ele chamava o nosso pai de Gêtaye, que, na língua amárica⁶, significa meu amo, meu senhor.

    Meu pai e seu ajudante Meleht.

    Meu pai com o chapéu na mão. Creio que um deles (não os nativos) seria o sócio que explodiu com o caminhão.

    O caminhão que levou para a África e que acabou explodindo numa mina com o sócio dentro.

    Hospital na África, onde meu pai se recuperou da malária, 1936.

    5. Retomando o trabalho na Itália

    Em 1937, meu pai se refez da campanha da África e recomeçou a vida na Itália. Ficou bom da malária e voltou a trabalhar. Ele comprou um caminhão com reboque para o transporte de carga seca. Em 1939, o ano em que nasci, ele comprou um segundo caminhão para transporte de combustíveis, com reboque e tudo mais.

    Em 1939, ele estava indo muito bem, quando estourou a Guerra, e a Itália achou por bem requisitar todos os caminhões e reboques que podiam transportar combustíveis, e requisitaram o do meu pai também. Ele ficou alucinado. Já tinha perdido um caminhão na África, estava recomeçando e agora a Guerra lhe tirava o outro caminhão. Foi aí que ele falou que, no momento que terminasse a guerra, ele não ficaria mais na Itália.

    Passado um tempo, meu pai foi, não sei por qual motivo, a uma feira em Milão – e qual foi a surpresa dele? Em um leilão de carros, encontrou o seu reboque sendo leiloado, com número de matrícula, tudo conferia. Sempre houve malandragem, em todo e qualquer governo. Certamente requisitavam de uns e vendiam em outras localidades.

    No início de 1943, em Verona, não se podia mais morar. Os bombardeios eram constantes, diurnos, noturnos. Os gêneros alimentícios ficaram difíceis de se encontrar e havia o fator psicológico, não se podia mais dormir à noite porque sobrevoava um pequeno avião, apelidado de Pipo, que voava em cima da cidade em círculos e, de tanto em tanto, largava uma pequena bomba. Era mais um fator psicológico para que a cidade não dormisse. Enfim, a coisa ficou tão complicada, difícil e perigosa, que as pessoas que podiam sair da cidade não pensavam duas vezes, indo para a casa de parentes ou de amigos.

    Verona era muito visada em função da sua posição geográfica. Foi aí que meu pai, decidiu sair da cidade, e fomos todos para Oppeano, a 20 ou 22 km de Verona. Inicialmente, nos hospedamos no Palazzo Bertoni, como era chamada a casa da minha avó materna. Ficamos ali pouco tempo, pois a casa já estava cheia de outros, digamos, fugitivos da cidade. Foi aí que se conseguiu, por conhecimentos do meu pai, e talvez também da minha avó Bertoni, um lugar para morar um pouco fora de Oppeano, já nas fazendolas nos arredores da cidade. A fazenda se chama até hoje LeSore.

    Caminhão que comprou após retornar à Itália, em 1937.

    6. Meu avô paterno

    Arturo Gaetano Bolla, casado com Ginevra dal Fior, teve três filhos, sendo o meu pai o mais velho. Família modesta. Ele, professor de Educação Física, não conseguia sustentar a família com a profissão, então fez um curso de linotipia e começou a trabalhar em uma tipografia. Entre professor de Educação Física e linotipista, tocava o barco adiante. Era uma pessoa de semblante bastante sério, eu diria até que era severo com os filhos, pelo que ouvi falar, mas muito bom esposo e dedicado à família.

    A esposa dele, a Ginevra, era tão econômica que, quando fazia sopa, colocava uma panela d’água na janela para fazer o primeiro aquecimento com o sol, para depois colocá-la no fogão – só para se ter uma ideia de como era essa mulher. Lutavam com dificuldade,

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