O Futuro da Floresta em Portugal
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Sobre este e-book
João Santos Pereira
João Santos Pereira, nascido em Santarém em 1948, graduou-se no Instituto Superior de Agronomia (onde é professor catedrático desde 1985) e obteve o grau de doutor (PhD) na Universidade de Wisconsin-Madison (EUA). Ensina Ecologia e Biologia Vegetal em cursos do 1.º, 2.º (Mestrado) e 3.º ciclo (Doutoramento). Os interesses de investigação científica incidem sobre a ecologia das florestas, nomeadamente o efeito das alterações climáticas no ciclo do carbono. Foi coautor (ou coeditor) de 6 livros de múltiplos ensaístas e de mais de 100 artigos em revistas internacionais. É membro do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável (CNADS) e da Academia Europaea, Londres.
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O Futuro da Floresta em Portugal - João Santos Pereira
Prólogo
Ao aceitar o convite da Fundação Francisco Manuel dos Santos para escrever um ensaio sobre as florestas portuguesas, pareceu-me oportuno transmitir aos leitores uma visão que integrasse a natureza dos ecossistemas e o uso que a humanidade faz deles. A maior parte das florestas do mundo são ecossistemas altamente intervencionados pelo Homem. O facto de produzirem bens com valor de mercado e de prestarem serviços ambientais (sem que se identifique necessariamente um valor económico) não lhes muda o carácter. Atualmente não vale a pena discutir com base em utopias piedosas do tipo «se o Homem não existisse…».
Em Portugal, é importante falar das florestas pela área de território que ocupam, pelo valor económico dos produtos, pelos riscos que comportam e pelos serviços ambientais que proporcionam. Infelizmente, falamos mais pelas más do que pelas boas razões. Todos os verões, a atenção da comunicação social é monopolizada pela floresta que arde. Tem sido assim nas últimas décadas. Os incêndios rurais não são estritamente florestais. Cerca de ¹/3 do que arde são matos e os incêndios põem em risco territórios, pessoas e bens muito para além da floresta. A primeira década deste século foi fértil em perdas catastróficas de património florestal e vidas humanas (2003), mas 2013 voltou a ser um ano dramático, com a morte de oito bombeiros na segunda quinzena de agosto.
Há consenso de que melhor seria evitar os fogos do que tentar apagá-los, mas ainda que todos concordem na importância das ações de prevenção e haja conhecimento e instrumentos legais para o fazer, não se faz o suficiente. A prevenção não é mágica e poucos políticos estão preparados para enfrentar a falta de visibilidade das ações de prevenção. É um trabalho que nunca está terminado. No verão, com as matas a arder, a urgência está na defesa imediata de bens e pessoas.
O outro tema recorrente nos meios de comunicação é em torno dos potenciais efeitos dos eucaliptais no ambiente. Os eucaliptais, historicamente diabolizados, desencadeiam atitudes maniqueístas, em que uma floresta boa (mítica) de espécies autóctones defronta o eucalipto, estrangeiro e capaz de, como dizem, «secar tudo à sua volta» ou de outras proezas igualmente inverosímeis.
Embora ainda se ignorem muitas coisas sobre as florestas, onde há umas décadas havia penúria de bons trabalhos escritos, há hoje uma bibliografia razoável. Por exemplo, sobre a história e a sociologia das florestas portuguesas: Devy-Vareta (1986), Radich e Alves (2000), Rego (2001), Baptista e Santos (2005), Radich e Baptista (2005), Baptista (2010). Outras publicações debruçam-se sobre aspetos específicos como os incêndios, por exemplo, Alves et al. (2012 e 2007), Pereira et al. (2006), Viegas et al. (2011). Alguma bibliografia específica foi particularmente útil para o ensaio. Por exemplo, o relatório do «Plano Nacional de Defesa da Floresta Contra Incêndios» (PNDFCI), coordenado por José Miguel Cardoso Pereira e por Tiago Oliveira, e o relatório de caracterização da fileira florestal portuguesa da Associação para a Competitividade da Indústria da Fileira Florestal (AIFF), coordenado por João Ferreira do Amaral (2010).
Este texto apresenta uma visão pessoal. Todavia, a análise não seria possível sem a sabedoria e o conselho de colegas e amigos. Quero aqui agradecer-lhes. Desde as estimulantes conversas com António Monteiro Alves, José Miguel Cardoso Pereira, João Soares, João Soveral e Nuno A. Ribeiro, até aos valiosos comentários sobre uma versão inicial deste trabalho de Francisco Avillez, Victor Louro, Tiago Oliveira e Manuela Chaves. Agradecimento é devido também aos que ajudaram no trabalho editorial: a Márcia Santos pelo rigor e disciplina, a Alexandre Vaz Correia pela informação transmitida e a Ana Paula Ferreira e Elsa Breia pelos oportunos comentários. Todavia, é minha a responsabilidade por quaisquer erros ou interpretações incorretas.
Parte 1 – Conhecer as florestas
As florestas têm uma enorme importância para a vida da Terra. Cobrem aproximadamente ¹/3 das terras emersas, contêm cerca de 70% da biomassa, albergam uma parcela substancial da biodiversidade terrestre, influenciam o balanço hidrológico e o clima e contribuem para o equilíbrio da biosfera pelo papel que desempenham no ciclo global do carbono. Reconhecemo-las como ecossistemas que podem prestar serviços ambientais à sociedade, que vão da conservação da biodiversidade até à mitigação das emissões de gases com efeito de estufa (GEE), entre os quais dióxido de carbono (CO2) no âmbito das alterações climáticas (Santos, 2012).
Além da importância para a ecologia do planeta, as florestas sempre tiveram grande significado para a humanidade. A madeira (tecido vegetal essencial das árvores) é o material de construção por excelência, a humanidade tem dependido dela como matéria-prima industrial e artesanal e como combustível. Além do valor incontornável da madeira na construção de utensílios e estruturas, o fabrico de papel permitiu uma revolução na comunicação, que esteve na origem das grandes modificações sociopolíticas e económicas dos últimos duzentos anos. Com o papel abundante e barato, a informação e a cultura tornaram-se assim acessíveis à maioria dos cidadãos. A imprensa (introduzida na Europa no século XV) só foi útil quando o papel permitiu a comunicação a todos os níveis. No século XXI, começou esta função a ser partilhada com os meios eletrónicos, mas o consumo de papel no mundo continua a aumentar. A cortiça com as suas propriedades físicas e químicas únicas – baixa densidade e isolante térmico e acústico – parece talhada para usos especiais (Pereira, 2007), desde as rolhas das garrafas do vinho até às pás dos aerogeradores. Ao mesmo tempo, as florestas contêm uma variedade de outros bens não lenhosos (por exemplo, cogumelos, frutos, pastagens) e são fontes inesgotáveis de encantamento e espaço de fruição lúdica, o que numa sociedade fortemente urbanizada não é negligenciável.
Mas a imagem não é exclusivamente idílica. A floresta arde, cria entraves ao transporte de pessoas e bens. Como escreveu um conhecido geógrafo, «antes mesmo de o clima, de a vegetação e de as paisagens terem alcançado o seu caráter moderno, os seres humanos estavam empenhados na secular luta pelo domínio da Natureza, vastas áreas de floresta e pastagem foram queimadas, a vegetação foi alterada irremediavelmente, tal como os solos e a fauna silvestre foi eliminada» (Williams, 2003). Em grande parte do planeta a floresta era a vegetação primordial. A história da humanidade é uma narrativa da