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Orações para Bobby: para além de um happy end
Orações para Bobby: para além de um happy end
Orações para Bobby: para além de um happy end
E-book317 páginas3 horas

Orações para Bobby: para além de um happy end

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Sobre este e-book

Orações para Bobby (2009), dirigido por Russell Mulcahy e produzido pelo canal de TV norte-americano Lifetime, cumpre um dos seus propósitos que é o de transmitir a mensagem de renascimento, redenção e ressignificação do pensamento conservador de Mary Griffith. Essa mãe torna-se uma ativista e defensora do Movimento LGBTQIA+ após o suicídio de seu filho, Bobby Griffith. O recorte temporal abrange não só a era Reagan, sob o manto do conservadorismo religioso, como também apresenta a possibilidade de correlacionar à época atual. Este livro lança mão de um corpo teórico que abrange, sobretudo, os Estudos Culturais da Mídia e Educação, como também os Estudos de Gênero e Sexualidade. A obra atenta-se para o movimento do texto para seu contexto, apresentando elementos essenciais para o entendimento da composição fílmica. Nesse sentido, é possível aduzir que o cinema se articula à educação, sob o viés da Pedagogia Cultural, compreendido igualmente como prática social. Portanto, a obra proposta se faz urgente e imperiosa, à medida que ajuda a promover o debate sobre atitudes e práticas homofóbicas e o discurso de ódio que vem se intensificando cada vez mais nesse conturbado momento histórico brasileiro.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento10 de jan. de 2023
ISBN9786525033983
Orações para Bobby: para além de um happy end

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    Orações para Bobby - Bibiana Anjos Rezende

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    Orações para Bobby

    Para além de um Happy End

    Editora Appris Ltda.

    1.ª Edição - Copyright© 2022 da autora

    Direitos de Edição Reservados à Editora Appris Ltda.

    Nenhuma parte desta obra poderá ser utilizada indevidamente, sem estar de acordo com a Lei nº 9.610/98. Se incorreções forem encontradas, serão de exclusiva responsabilidade de seus organizadores. Foi realizado o Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional, de acordo com as Leis nos 10.994, de 14/12/2004, e 12.192, de 14/01/2010.Catalogação na Fonte

    Elaborado por: Josefina A. S. Guedes

    Bibliotecária CRB 9/870

    Livro de acordo com a normalização técnica da ABNT

    Editora e Livraria Appris Ltda.

    Av. Manoel Ribas, 2265 – Mercês

    Curitiba/PR – CEP: 80810-002

    Tel. (41) 3156 - 4731

    www.editoraappris.com.br

    Printed in Brazil

    Impresso no Brasil

    Bibiana Anjos Rezende

    Orações para Bobby

    Para além de um Happy End

    Ao meu amado e querido filho, Carlos César, dono do sorriso mais lindo que já vi... que nunca desistas da vida, nem de você mesmo! Por fim, que todas as formas de amar e de existência prevaleçam!

    O amor cura. Nossa recuperação está no ato e na arte de amar.

    (Bell Hooks)

    PREFÁCIO

    Prefaciar o livro da professora e mestra em Educação, Bibiana Anjos Rezende, é, para mim, uma enorme alegria e uma responsabilidade. A alegria vem do fato de eu ter tido o privilégio de trabalhar com Bibiana entre os anos de 2016 e 2018 na construção do seu texto de dissertação, ora publicado, junto ao Programa de Pós-Graduação em Educação da (então) Universidade Federal de Mato Grosso, campus de Rondonópolis¹, na linha de estudos Infância, Juventude e Cultura Contemporânea: direitos, políticas e diversidade. A responsabilidade advém do fato de tentar traduzir ao leitor a potência e importância do livro que agora tem em mãos.

    Bibiana Anjos Rezende é professora da rede pública estadual de educação, ministrando a disciplina de Inglês para adolescentes e jovens, desde sua trajetória inicial na pequena cidade de Alto Garças, no interior do estado, até o momento, onde exerce a docência em Rondonópolis. Sempre muito dedicada ao trabalho, Bibiana tinha entre uma de suas práticas educativas o desenvolvimento de um projeto de ensino no qual os estudantes assistiam a um filme em inglês e reencenavam as cenas mais marcantes e importantes, agora no papel de atores, tendo de dominar minimamente o idioma estrangeiro, sua pronúncia e compreensão. Foram esses os materiais com os quais tive contato, alguns pequenos vídeos que seus estudantes realizaram sobre o filme Orações para Bobby, fonte principal da pesquisa que aqui se publica, que despertaram meu interesse em trabalhar com Bibiana.

    O filme, baseado em fatos reais, é uma denúncia poderosa sobre os sofrimentos vividos por jovens homossexuais que encontram em suas próprias famílias seus maiores inimigos e opressores. Ao invés do acolhimento necessário e o reconhecimento de suas dignidades, muitos pais e familiares se voltam contra esses e essas jovens, motivados por grupos e organizações religiosas e moralistas que compreendem a homossexualidade como um erro, um pecado ou uma deficiência. Várias e vários são obrigados a frequentar cultos de libertação ou programas de reversão de homossexualidade, que são denunciados pelo Conselho Regional de Psicologia no Brasil, e em muitas outras nações, entre elas, os próprios Estados Unidos, palco onde se desenvolve a trama de Orações para Bobby.

    O filme nos apresenta os conflitos vividos entre Bobby, um jovem que assume a homossexualidade, e sua família tradicionalista e cristã, representada, sobretudo, na figura da mãe, interpretada divinamente por Sigourney Weaver. A falta de apoio familiar e o crescimento dos conflitos morais e pessoais levaram o jovem a cometer suicídio. Aqui, outro aspecto importante da película é enfrentado pelo texto de Bibiana, ao questionar as condições de vida e as situações extremas pelos quais muitos e muitas passam e poucos escapam.

    Como se pode ver, o filme escolhido por Bibiana para trabalhar com seus estudantes e em sua pesquisa de mestrado vai muito além dos aspectos de uma educação formal, que procure ensinar características e organização de uma determinada língua estrangeira. Incorporando de maneira louvável as teorias e estudos desenvolvidos no campo das Pedagogias Culturais, Estudos Culturais e Estudos de Gênero, o livro Orações para Bobby: para além de um Happy End toma o objeto fílmico como fonte de análise e nos mostra como esses artefatos da indústria cultural nos auxiliam (ou prejudicam, em determinados casos) na construção de valores, ideias, identidades e modos de ver e compreender a realidade.

    O contexto de produção do livro foi, igualmente ao da obra cinematográfica que ela analisa, conturbado do ponto de vista histórico, político e social. Lembremos que, em 2016, deu-se o golpe contra a presidenta Dilma Rousseff, que abriu os portões para que uma direita extremista, que se julgava marginal ao establishment político, ganhasse força e protagonismo no país. Estudiosos das questões de gênero, como a filósofa norte-americana Judith Butler sofreram, naquele momento, ataques pessoais em aeroportos brasileiros, justamente por pessoas que se intitulavam de bem, cristãs, defensoras dos valores tradicionais da família e da pátria.

    Ora, encontramos o levante desses grupos políticos na história norte-americana² justamente no momento histórico da chegada de Ronald Reagan à presidência dos Estados Unidos, em 1981. Apoiando-se em uma tríade composta por conservadores políticos, economistas neoliberais e religiosos de direita, o gabinete Reagan acabou por se tornar uma referência

    aos movimentos ultradireitistas contemporâneos, que viam na fusão desses campos a base para um governo voltado, cada vez mais, para os ricos e que punia os pobres e os subjugava, por meio dos cortes nos programas públicos sociais.

    Esse contexto da história norte-americana dos anos 1980 é reconstituído no trabalho de Bibiana dos Anjos Rezende e, ao mesmo tempo, permitiu à autora compreender a ascensão do conservadorismo e de uma extrema-direita no Brasil quando escrevia seu trabalho. Dessa forma, ao reconstruir a tragédia ocorrida com Bobby e contextualizá-la no momento de ascensão neoconservadora nos Estados Unidos, o texto dela nos alertava para o presente brasileiro, em que forças conservadoras, moralistas, religiosas e econômicas de mesma matriz se articulavam em torno de uma possível ascensão ao comando nacional, o que, infelizmente, verificou-se verdadeiro.

    E é diante de mais um momento conturbado mundialmente, a pandemia do Coronavírus (que só no Brasil, enquanto traço essas linhas, ceifou mais de 570 mil vidas), e em pleno enfrentamento às ameaças à democracia empreendidas pelo atual governo brasileiro, que a professora e mestra em Educação, Bibiana Anjos Rezende, presenteia-se com seu texto forte, potente e intelectualmente brilhante, inspirando-nos a continuar na resistência e na defesa de todas as formas de amor e existência.

    Concluo com os versos de Mario Quintana que, tenho certeza, traduzem bem a mensagem do livro que o leitor ou leitora terá o prazer de conhecer nas páginas a seguir:

    Todos esses que aí estão

    Atravancando meu caminho,

    Eles passarão...

    Eu passarinho!

    (QUINTANA, 1978).

    Rondonópolis, 19 de agosto de 2021.

    Dia do Historiador

    Flávio Vilas-Bôas Trovão


    ¹ O campus Universitário de Rondonópolis foi emancipado, em 2016, e hoje é uma universidade autônoma, a Universidade Federal de Rondonópolis (UFR), em Mato Grosso. Quando a autora do texto era mestranda, vivia-se o momento de transição institucional e o PPGEdu estava vinculado, ainda, à UFMT.

    ² Apesar do debate antropológico e geográfico no que se refere ao emprego dos termos: americano, norte-americano e estadunidense, no presente trabalho optamos pela terminologia norte-americano ao fazer alusão às produções e à sociedade dos Estados Unidos da América.

    Sumário

    INTRODUÇÃO

    CAPÍTULO 1

    APRESENTAÇÃO DO FILME PRAYERS FOR BOBBY (ORAÇÕES PARA BOBBY)

    1.1 O LIVRO PRAYERS FOR BOBBY: A MOTHER’S COMING TO TERMS WITH THE SUICIDE OF HER GAY SON (1995)

    1.2 O FILME PRAYERS FOR BOBBY (2009)

    1.3 O ELENCO DO FILME PRAYERS FOR BOBBY (2009)

    1.4 A RECEPÇÃO CRÍTICA DE PRAYERS FOR BOBBY (2009)

    1.4.1 O cartaz: retrato representativo

    1.5 A CONSTRUÇÃO DA NARRATIVA FÍLMICA

    1.5.1 Roteiro adaptado

    CAPÍTULO 2

    OS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA: CONTEXTO HISTÓRICO E SOCIOPOLÍTICO

    2.1 SOB O MANTO DO CONSERVADORISMO RELIGIOSO

    2.2 NO LIMIAR DE UM NOVO SÉCULO: O CONSERVADORISMO PERSISTE

    CAPÍTULO 3

    CULTURA, CINEMA E EDUCAÇÃO

    3.1 SOBRE OS ESTUDOS CULTURAIS E OS ESTUDOS CULTURAIS DA MÍDIA

    3.2 OS ESTUDOS CULTURAIS EM EDUCAÇÃO E AS PEDAGOGIAS CULTURAIS

    3.3 O CARÁTER ATIVO DO PÚBLICO

    CAPÍTULO 4

    ANÁLISE DAS REPRESENTAÇÕES DE GÊNEROE SEXUALIDADE

    4.1 CRÉDITOS PRELIMINARES – SEQUÊNCIA INICIAL

    4.2 TRILHA FÍLMICA: UMA LEITURA POSSÍVEL

    4.3 REPRESENTAÇÃO DA FAMÍLIA NUCLEAR AMERICANA

    4.4 REPRESENTAÇÕES ESTEREOTIPADAS DO UNIVERSO GAY EM ORAÇÕES PARA BOBBY?

    4.5 PSICOTERAPIA: A BUSCA PELA CURA GAY

    4.6 MACHO TAMBÉM CHORA: REPRESENTAÇÃO DE UMA MASCULINIDADE

    4.7 ROUPAS E GESTOS: DESVELANDO UMA SEXUALIDADE DISSIDENTE?

    CAPÍTULO 5

    A HOMOSSEXUALIDADE COMO REPRESENTAÇÃO DA MORTE EM ORAÇÕES PARA BOBBY

    5.1 Entre a realidade e a representação: suicídios de homossexuais são passíveis de luto?

    5.2 PRAYERS FOR BOBBY (1995): THE PLUNGE

    5.3 CORPOS QUE PESAM: SEXUALIDADES DESVIADAS

    5.3.1 Aids: a ira de Deus sobre os homossexuais

    CRÉDITOS FINAIS: À GUISA DE UMA CONCLUSÃO

    REFERÊNCIAS

    Figura 1 – Lifetime: Original Movie – produtora do filme Orações para Bobby

    Fonte: Filme Orações para Bobby, 2009

    INTRODUÇÃO

    Ao refletir sobre a homossexualidade, eu aprendi que minha tradição religiosa ensinou-me a acreditar que meu filho era um pecador; meu sistema de apoio médico ensinou-me a acreditar que meu filho era doente; meu sistema educacional ensinou-me que meu filho era anormal; as visões do meu sistema legal sobre meu filho e seu parceiro... sem direitos legais; minha família... não deu apoio por ter um parente gay em seu meio; minha principal fonte de comunicação tratava a homossexualidade como um desvio.³

    (James Genasci)

    A epígrafe que abre a presente obra, não se trata, em absoluto, de meras palavras aleatórias jogadas ao vento, mas fazem parte do universo real-fictício de Prayers for Bobby (traduzido para o português e doravante referenciado como Orações para Bobby, 1995), tencionando disparar provocações e inquietações sobre a temática da homossexualidade. O mote denuncia a prevalência das dicotomias tradicionais de sexo e de gênero que continuam sendo perpetradas e se fazem tão presentes ainda hoje, nas mais diferentes esferas da sociedade. No cerne dessa ficção vejo brotar a representação de realidades opressivas, excludentes e reclusivas que acabam por cercear o sujeito na expressão de sua subjetividade. Nesse sistema tão bem definido, a experiência sexual livre jamais se efetiva em sua completude, com vistas a estar subsumida a normas rígidas de controle, de regulação, conforme afirma Foucault (2009, p. 20).

    Iniciar uma narrativa, seja acadêmica ou ficcional, pela voz embargada de um sujeito talvez não seja coisa vã, tampouco uma escolha isenta de determinado teor de intencionalidade, mas tal depoimento-denúncia me leva a perceber os silêncios e as invisibilidades tão presentes nas ausências. Vozes ecoantes, palavras que irrompem em meio a estes interstícios. As palavras aqui operam como um fio de Ariadne, pois desvelam a introspecção-confissão. Elas trazem à luz, mesmo que por meio da ficção e de suas representações, a voz da própria vida (BAKHTIN, 1992, p. 406–407). As palavras aqui podem significar muitas coisas, elas são fugidias, instáveis, tem múltiplos apelos (LOURO, 2008, p. 14). Os filmes, a ficção, são ressonantes como porta de acesso para disparar a problematização mais ampla, como as múltiplas e complicadas combinações de gênero, sexualidade, classe, raça e etnia que a pesquisa busca evidenciar (LOURO, 2008, p. 65).

    Debater as representações de juventude, de sexualidade, de gênero, a partir deste filme, é uma forma de questionar esse patriarcado heteronormativo, haja vista a necessidade da construção de redes de solidariedade e de diálogo entre jovens que se encontram silenciados e invisibilizados na sociedade. A película permite-me enxergar que as vidas dos jovens homossexuais importam e são passíveis de luto.

    Sobre a concepção da juventude, Rosa Maria Bueno Fischer (2016) afirma não ser possível fixar tempos nem modos de ser jovem, pois essa abarca a noção de pluralidade, isso remete a ampliar o conceito para juventudes. Segundo a autora, é mais rico pensar sobre trajetórias juvenis diversas, marcadas por um certo tempo histórico, político e social, mas também por muita imprevisibilidade (FISCHER, 2016, p. 4). Para ela, seria mais interessante escutar e observar os jovens nas suas angústias, desejos e sonhos, debatendo sobre os modos pelos quais eles, nessa condição precária de ausência de certezas, buscam a autoafirmação e a inscrição no mundo.

    Nesse viés, é de grande importância atentar para a concepção de Pais (1990), que considera a juventude como um eixo semântico de significância ambivalente. Por um lado, são indivíduos pertencentes a uma mesma fase da vida, porém, por outro, se apresentam como conjuntos sociais distintos entre si. Em Buscas de si: expressividades e identidades juvenis, Pais (2006) apresenta duas maneiras distintas de olhar para as culturas juvenis. A primeira delas diz respeito às socializações que as prescrevem e a segunda se refere às expressividades ou performances cotidianas. Enfim, configura-se em um espaço de novas sensibilidades e realidades (PAIS, 2006, p. 1)

    As culturas juvenis, na concepção de Pais (2006) são nitidamente performativas, isto quer dizer que os jovens nem sempre se enquadram nas culturas prescritivas que a sociedade lhes impõe (PAIS, 2006, p. 1). Em suma, o autor afirma considerar importante o desvelamento das sensibilidades performativas das culturas juvenis, pois os jovens não mais se identificam com os modelos prescritivos de aprisionamentos. Isso posto, leva-me a pensar sobre Bobby, um jovem homossexual americano que tentou se ajustar a um padrão social hegemônico que o aprisionou por décadas. Essa constante, entretanto, constitui cenas reais recorrentes na vida de inúmeros jovens que se encontram em uma sociedade em crise e sem futuro (ABRAMO, 1994, p. 85). Este modelo cultural hegemônico de aprisionamento que vem sendo perpetrado persiste no distanciamento destes jovens para as margens, destinadas àqueles sujeitos cujas práticas culturais são invisibilizadas, silenciadas e distantes do centro, ou seja, da universalidade, da unidade e da estabilidade (LOURO, 2003, p. 44).

    No entendimento de Giroux (1996b), a sociedade americana tem expressado uma hostilidade e indiferença para com os jovens, reforçando as condições sombrias em que vive esse grupo. Segundo o autor, os jovens vivem sob o ataque da esfera da direita contra o Estado de Bem-Estar Social e contra o legado das políticas sociais progressistas (GIROUX, 1996b, p. 126).

    Na nova política representacional da juventude, a luta em torno do disciplinamento e contenção do corpo e da sexualidade se torna constante, haja vista a necessidade de se manter a ordem social. A sexualidade transgressora é vista como uma ameaça à política conservadora da sociedade, conforme assinala:

    Louvados como um símbolo de esperança no futuro e, ao mesmo tempo, execrados como uma ameaça à ordem social existente, os jovens têm se tornado objetos de ambivalência, presos em discursos contraditórios e espaços de transição. Mesmo afastados para as margens do poder político na sociedade,os/as jovens se tornaram, não obstante, um foco central da fascinação, do desejo e da autoridade dos adultos. Vivendo, cada vez mais, numa situação em que lhes são negadas oportunidades de auto-definição e de interação política, os/as jovens são transfigurados/as por discursos e práticas que subordinam e contêm a linguagem da liberdade individual, do poder social e da agência crítica. Símbolos de uma democracia em declínio, são identificados/as com uma gama de significantes que negam completamente seu papel de cidadãos e cidadãs ativos/as. (GIROUX, 1996b, p. 124).

    Nesses termos, Miriam Abramovay (2004) focaliza sobre a questão da homofobia, os diversos preconceitos e discriminações que, em nome da sexualidade, acabam por desrespeitar e ferir a dignidade do outro. Nesse sentido, para aqueles que são objetos desses sofrimentos e revoltas, por conta dos padrões culturais que cultivam, simbólica e explicitamente, hierarquias e moralismos em nome da virilidade, da masculinidade e da rigidez de se viver a sexualidade de outros modos, resta, muitas vezes, ocultar suas queixas e denúncias. Assim, impera, em muitos casos, a lei do silêncio, na qual os jovens e adultos, por medo, ameaças ou mesmo indiferença, se calam (ABRAMOVAY, 2004, p. 289).

    Retomando a ideia de juventudes, Juarez Dayrell (2003) argumenta que a juventude é parte de um processo mais amplo de constituição de sujeitos, apesar das especificidades peculiares a cada um. Esse processo é influenciado pelo meio social concreto no qual se desenvolve e pela qualidade de trocas que este proporciona. Não há um único modo de ser jovem, e é justamente neste sentido que Dayrell enfatiza que a noção de juventudes, no plural, assinala a diversidade de modos de ser jovem existentes.

    Dayrell (2003) propõe um modo de olhar e compreender os jovens enquanto sujeitos sociais. Segundo o autor, uma das imagens mais recorrentes acerca da juventude é a condição da transitoriedade, ou seja, o jovem é um vir a ser. Isso quer dizer que, só no futuro ou na passagem para a vida adulta suas ações do presente farão sentido. Nesse viés, há uma enorme tendência de a juventude ser encarada de forma negativa. A visão romântica da juventude veio se cristalizando, a partir dos anos de 1960. E a partir de então, percebe-se que a juventude está se configurando em um tempo de liberdade, de prazer e de comportamentos exóticos. Por outro lado, há a juventude vista em momento de crise, uma fase difícil, repleta de conflitos relacionados à autoestima e personalidade. Essa noção abarca também a juventude que se distanciou da família, ocasionando, assim, crise com a instituição socializadora. Nesse sentido, cabe então refletir acerca de como o jovem é visto e representado na sociedade.

    Acrescento a essas linhas introdutórias o surgimento do cinema e a sua importância na nossa sociedade marcadamente visual. Pois bem, o cinema se apresenta como o fruto por excelência da técnica de reprodução, e emerge na modernidade ensejando novos olhares, novas perspectivas em meio a um processo de ruptura, no qual o culto devotado à obra de arte cede espaço à reprodutibilidade, como nos ensina Walter Benjamin (1987). Por meio dessa técnica o processo de democratização da arte, assim como o de aproximação das massas, se intensifica. Se, por um lado, a ideia de coletividade se desabrocha, por outro a concepção de aura e de unicidade da obra de arte declinam. O cinema, por sua vez, atua na formação não só de mentalidades em sociedades e opera como artefato cultural, isto é, mediante uma miríade de imagens em movimento, os olhares são educados culturalmente, socialmente e politicamente. Assim, o cinema pode, também, atender a fins políticos, progressistas (ou não), favorecendo uma crítica revolucionária das relações sociais (BENJAMIN, 2000, p. 239).

    Uma das primeiras exibições públicas do cinematógrafo em Paris ocorreu em uma pequena cafeteria, no dia 28 de dezembro do ano de 1895. A imagem de um trem em movimento surgido no centro da tela branca, avançando rumo à câmera, cuja tomada com

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