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Equação sobre o abismo
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Equação sobre o abismo
E-book88 páginas1 hora

Equação sobre o abismo

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Sobre este e-book

Nos contos de "Equação sobre o abismo", do escritor premiado brasileiro Sérgio Tavares, deparamo-nos com tramas contundentes: dominados por desvios, manias, compulsões ou pensamentos intrusivos, seus personagens agem por instinto, mergulhados num estado de espírito tal, que sequer questionam a natureza e a consequência dos seus actos. A escolha do autor em narrar sempre em primeira pessoa, com o uso estético das minúsculas, feito um diário ou caderno de anotações, tem o efeito de trazer o leitor para mais próximo, convidando-nos a observar cada gesto e pormenor essenciais às histórias. A depender de quem as lê, estas ficções podem tanto mostrar uma projecção distorcida de nós mesmos quanto um espelho exacto da condição humana em situações extremas. E, se por um lado estes contos têm uma crueza que nos desconcerta e nos tira do eixo, por outro lado também nos dá a ver uma espécie de delicadeza e ingenuidade nos personagens complexos criados pelo talento literário do escritor brasileiro Sérgio Tavares. Com prefácio de Ronaldo Cagiano, premiado em 2010 pelo SESC, um prémio de grande renome no Brasil, e também finalista do 2º. Prémio Brasília de Literatura, o autor apresenta esta sua obra para os leitores portugueses, publicada com o título original de "Cavala", termo brasileiro que se refere no registo popular a mulheres vistosas e sedutoras, adaptado para o actual "Equação sobre o abismo".
IdiomaPortuguês
Data de lançamento27 de fev. de 2023
ISBN9789899069145
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    Pré-visualização do livro

    Equação sobre o abismo - Sérgio Tavares

    © Sérgio Tavares, 2010 / Editora Gato-Bravo, 2022

    Não é permitida a reprodução total ou parcial deste livro nem o seu registo em sistema informático, transmissão mediante qualquer forma, meio ou suporte, sem autorização prévia e por escrito dos proprietários do registo do copyright.

    editor Marcel Lopes

    coordenação editorial Paula Cajaty

    revisão e adaptação Julia Roveri

    projecto gráfico Bookxpress

    imagem da capa Shutterstock

    Título

    Equação sobre o abismo

    Título da edição original

    Cavala

    Autor

    Sérgio Tavares

    Impressão

    Europress Indústria Gráfica

    ISBN 978-989-9069-13-8

    e-ISBN 978-989-9069-14-5

    1a edição: abril, 2022

    Depósito legal: 497659/22

    GATO BRAVO

    rua Veloso Salgado 15, loja A

    1600-216 Lisboa, Portugal

    tel. [+351] 308 803 682

    editoragatobravo@gmail.com

    editoragatobravo.pt

    Para Laura, minha filha.

    Sumário

    Cartografia de um mundo-cão

    Equação sobre o abismo

    Fome

    Sobre a pélvis

    Papel de cão

    Agradeço à editora Paula Cajaty, pelo zeloso acolhimento na Gato-Bravo e por apresentar a obra ao leitor português.

    Ao escritor Ronaldo Cagiano, grande amigo e mentor, que escreveu a belíssima apresentação.

    Ao Prêmio Sesc de Literatura, por ter me revelado como escritor.

    À minha família, pelo suporte, pela orientação e pelo amor.

    E especialmente à minha filha Laura, a quem amo incondicionalmente e dedico este livro.

    E o mundo se encontra, em sua maior parte,

    dividido entre os loucos que se lembram e

    os loucos que se esquecem. Os heróis são poucos.

    James Baldwin, O quarto de Giovanni

    Cartografia de um mundo-cão

    Quero apenas ser como sou,

    máscara digna de todos os abismos.

    Ricardo Gil Soeiro, Tratado da mão

    Nos quatro contos que enfeixam Equação sobre o abismo, Sérgio Tavares revela um universo esconso extraído das escaramuças afetivas e prisões psicológicas de seus personagens: homens, mulheres e uma criança na corda bamba emocional, migrantes perdidos no deserto de um atávico desconforto ou no perigo da iminente violência quotidiana.

    Encurralados no beco sem saída de sua condição ou vítimas de uma compulsória natureza, são levados de roldão pela torrente dos instintos, terreno em que as (com)pulsões, demônios, transtornos, obsessões e fantasias; ou a torpeza, os desvios de comportamento ou as práticas desvinculadas da impostura ou rigidez dos códigos burgueses, plasmam uma rotina cruel, de intensas e complexas proporções, de onde emergem fragilidades insuperáveis, muitas vezes esboçando a tênue fronteira entre a realidade e o delírio.

    Esses contos que outorgaram ao autor o prestigiado Prémio SESC de Literatura em 2009, revelando uma das vozes mais potentes da literatura contemporânea brasileira, chegam ao leitor português atualizando dramas e dilemas tão ancestrais, no deslindar da experiência dos que são corroídos por fissuras existenciais e deambulam numa atmosfera de banalidade dos sentimentos e num ambiente em que é irrisório o fio que separa a vida da morte.

    As tramas aqui pontuadas em descrições candentes e sem camuflagens estão presentes no quotidiano do mundo, ainda que muitas vezes rivalizem com a ficção em sua dimensão escatológica. Sem dourar a pílula, Tavares extrai de um amplo painel social e do inconsciente coletivo as situações de um sobreviver deslocado e fragmentário, com protagonistas submetidos à diversidade dos embates, acossados por uma realidade íntima e histórica. Vai descortinando vidas talhadas a golpes e constrições físicas ou morais, sucumbidos ao sexo, aos delírios, ao esgarçamento dos sentidos, às suas próprias ambiguidades e contradições. São símbolos ou metáforas pungentes de uma humanidade adoecida, em que cada qual se reconhece envilecido e amiudado pelo flagelo das próprias circunstâncias, muitas vezes movidos por uma subjacente e virulenta opressão.

    A apropriação desses cenários, em simbiótica analogia com o flagrante das mazelas da vida como ela é, de Nelson Rodrigues, um expert no rastreamento da nossa pequenez e miséria, encontra familiaridade narrativa na sofisticada dicção de Sérgio Tavares. O refinamento e as sutilezas da linguagem funcionam como amálgama poético das tragédias desses seres à beira de abismos inescapáveis e que, ao realizar o balanço de seu próprio destino, não lhes sobra, na desesperada solução para um apaziguamento, senão a triste equação que contabiliza perdas e danos, único resultado possível diante da incômoda e degradante brutalidade que nos rodeia.

    Em literatura não basta contar uma história ou transplantar a realidade para um livro, é preciso saber contá-la. Nesse sentido caminha Equação sobre o abismo: espelha a ourivesaria de um autor no pleno domínio de seu ofício. Nesse conjunto homogêneo que harmoniza forma e conteúdo, Sérgio Tavares caminha na direção daquela frontalidade e demanda estética que devem balizar a obra de qualquer artista, sobre o que já nos disse Paul Auster: Um escritor só pode ser bom se tiver a honestidade de ir ao fundo, ao céu, ao inferno, doa o que doer.

    Ronaldo Cagiano

    Lisboa, inverno de 2021.

    equação sobre o abismo

    quero dormir, descansar o meu corpo num sono profundo, mas esse quadro não deixa, esse quadro 22x16cm que forma uma sequência abstrata de matizes que flutuam na tela porosa, um trio composto por elementos surreais, pingos, traços e borrões que se atraem e se fundem numa contagem decrescente, menos 23 pinceladas por quadro.

    acabo de calcular e multiplico pela área do retângulo, 8.096 tons e subtons vermelhos, amarelos e laranja que forçam o cérebro a decifrar figuras subliminares, uma mariposa?, um precipício?, um rosto doente?, mas isso não importa, o que importa é a moldura e a sua falha fatal, essa desproporção a 1,91m dos meus olhos e a 10,5cm da janela em frente à cama.

    a falha, devo dizer, não está na moldura, que fique bem claro, é uma moldura de qualidade, carvalho revestido com verniz que salienta as mínimas fissuras da madeira, três caixilhos com 4cm de espessura e separados 2cm um do outro, proporcionando um perímetro igual a 1.120cm², e aí é que se encontra a falha, na falsa ideia de que existem igualdade e proporção no conjunto das molduras.

    veja bem, deixe-me explicar melhor: cada quadro emparelhado naturalmente constitui um ângulo de 90° entre si e em relação ao quadro adjacente, formando ângulos retos. um único quadro, por exemplo, é formado por quatro ângulos retos, ou seja, os encontros de suas arestas são proporcionais entre si, ocasionando uma simetria de 90° com o quadro adjacente, quando estes se encontram alinhados.

    acontece que, por influência de uma corrente de vento ou pela mão da gravidade, este quadro do meio, menos 23 pinceladas que o primeiro e mais 23 pinceladas que o terceiro, constituído por pingos, traços e borrões vermelhos, amarelos e laranja, encontra-se em desalinho em relação à

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