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Retalhos
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E-book124 páginas1 hora

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Sobre este e-book

Viaje pelo futuro distópico da Terra, volte ao passado longínquo da era de princesas e castelos, adentre a selva de pedra das densas metrópoles, ou simplesmente vá ao parque numa tarde de domingo. Você não imagina o que pode encontrar ao virar a próxima página. Um compilado de contos fantásticos e observações sobre o cotidiano e em como ele afeta de forma permanente nossas vidas e rotina. O livro tráz 16 histórias intrigantes e independentes, mas que de alguma forma se conectam, cada uma com sua lição particular e ponto de vista referente ao tema tratado. Ler Retalhos, é transportar-se para diferentes pontos do mundo e da mente humana, é um mergulho num mar de questionamentos, depois de uma exaustiva escalada na montanha das dúvidas. A verdadeira experiência está nos detalhes, na busca por referências escondidas nas entrelinhas, nas conexões possíveis com a vida real, até chegar ao ponto de questionamento do que é real e o que é mera ficção.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento25 de mai. de 2020
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    Pré-visualização do livro

    Retalhos - Vinicius Ramos

    Prefácio

    Este livro é um grande teste. São vários contos experimentais em que utilizei técnicas que aprendi na arte da escrita.  Como escritor minha função é acionar as engrenagens da sua imaginação. Já sua parte como leitor(a) é verificar se as técnicas funcionaram, e se as imagens apareceram na sua cabeça.
    Eu reuni aqui o resultado de alguns anos de observação do cotidiano, para cada história contada, existe outra não registrada que deu origem a essa. Daqui tirei muitos personagens de outras obras, coloquei sentimentos e lições aprendidas ao longo do período de criação.
    Uma vez ouvi Antônio Abujamra dizer em seu programa: Quem é poeta, é poeta sempre, e se vê continuadamente assaltado pela poesia… O escritor deve pensar que tudo é argila, com que fará da miserável circunstância de nossa vida, alguma coisa que possa aspirar à eternidade.
    Eu me sinto assim, como um observador do mundo. Ando por aí sempre com o radar ligado, tentando captar algo mínimo que possa compor alguma história.
    Eis o resultado dessas observações, retalhos remendados com as linhas de um único livro.
    nova moedanova moeda

    01

    Nova Moeda

    Nova Moeda

    Coautoria: Felipe Ramos Leite.

    Eram quase duas horas da tarde, Igor e seu pai Walter, estavam de pé naquela fila desde as oito da manhã. Mesmo que o sol não pudesse ser forte, o calor da aglomeração compensava sua ausência naquele horário. O cheiro era insuportável, aquele fedor de gente que não toma banho há muito tempo, o odor de pele suja e de aglomeração incomodava.

    — Pai, por que a gente tá nessa fila?

    —Nós viemos pegar água, meu filho. Não vai demorar muito, logo, logo a gente tá em casa.

    Walter pegou a criança no colo e lá de cima ele pôde ver a imensidão da fila. Ela seguia pela rua, passava por uma quadra, pela seguinte, e por mais uma antes de dobrar a esquina, havia homens armados vigiando a fila e percorrendo toda a sua extensão, sem pressa. Olhando para frente viu cinco caminhões-pipa. No topo de cada caminhão, havia um homem fardado segurando uma mangueira distribuindo água aos integrantes da fila.

    O que o pobre Igor não sabia era como a situação da Terra chegou a esse ponto. A criança não viveu nos tempos da bonança, ou melhor, nos tempos da abundância onde a preocupação era com o fim do mês e não com o fim do dia.

    A poluição e o desperdício constantes geraram uma crise hídrica sem precedentes, em uma época que a fumaça e a fuligem nublaram o céu, e o azul nunca mais foi visto. Está na mente de alguns ainda, a imagem dos peixes boiando nos rios contaminados, das pessoas usando máscaras para se proteger dos vapores tóxicos, frutos dos rejeitos despejados nas águas correntes. Os poucos mananciais que ainda mantiveram algum tipo de vida, eram os cursos de água mais afastados dos grandes centros e esporádicas nascentes, esses que ainda assim necessitam de tratamento para se tornarem potáveis eram vigiados pelos militares.

    O exército era o responsável por afastar os cidadãos sedentos que tentassem se aproximar de qualquer veio de água semi-potável, havia relatos até de muros, trincheiras, arame farpado, campos minados, torres de vigília com holofotes e guardas armados vinte e quatro horas por dia.

    A água tornou-se a nova moeda nacional, a economia girava em torno de gotas de água potável, tudo nos dias atuais poderia ser comprado com água, o luxo e a diversão deixaram de ser importantes e deram lugar a sede.

    Depois do início da grande crise, logo após o exército ter sido colocado na rua para tentar garantir a segurança da água que ainda restava, foi estipulado pelo governo o limite de um litro de água por pessoa, mais meio litro para cada criança que a família possuir. Não era muito, e jamais seria o suficiente.

    Os salários dos trabalhadores eram pagos com gotas de água, contudo, trabalho nesses tempos era algo arriscado, pois se uma pessoa resolvesse procurar emprego, poderia não garantir seu lugar na fila de distribuição e talvez, ou melhor, provavelmente um emprego pagasse menos que um litro, por isso a maioria das pessoas preferia garantir um litro na fila a arriscar ter menos que isso. Nem sempre havia garantia.

    Pobre Igor, do colo do pai olhava para cima e via aquelas pesadas nuvens cinzentas. Certa vez à noite, perdeu o sono, e ouviu o pai conversar com a mãe sobre uma coisa chamada chuva, ele não entendeu muito bem como funcionava, e nem poderia, para o jovem a chuva era um conceito muito abstrato e longínquo. Como era possível cair água do céu? Pensava. Seu próprio pai dizia que dinheiro não caía do céu, o garoto se perdia nos termos. Para ele, água e dinheiro sempre foram a mesma coisa, e na sua concepção não existia nada mais valioso.

    O caminhão já estava bem próximo, a espera na fila para Walter e Igor parecia estar chegando ao fim. Walter era o terceiro da fila. Em volta dos caminhões havia uma pesada grade de isolamento apenas com um portão vigiado por um soldado que controlava a passagem das pessoas. Os cidadãos eram chamados de cinco em cinco, passavam pelo isolamento e recebiam a água, um de cada caminhão, seguindo aquela regra de um litro por pessoa. Os próximos cinco foram chamados. Walter adentrou a área isolada:

    — Espera só um minuto, meu filho — disse Walter colocando o filho no chão e segurando a sua mão.

    Walter mexeu no bolso de sua calça cinza, na altura do joelho direito, tirou uma garrafa de plástico meio amassada, dessas que um dia já foi engarrafada com água mineral. Onde outrora houvera um rótulo, hoje só havia sujeira grudada no restante da cola.

    Walter desenroscou a tampa que não pertencia à garrafa,

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