Hegemonia neoliberal no Brasil e direito do trabalho: o caso dos entregadores de aplicativo
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Sobre este e-book
Ian Santos Araujo
Bacharel em Direito.
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Hegemonia neoliberal no Brasil e direito do trabalho - Ian Santos Araujo
1
INTRODUÇÃO
Ao confrontar reflexivamente as condições políticas e culturais do século XXI, percebemos uma desafiante, por vezes atormentadora multiplicação de paradoxos. Quebra-cabeças aparentemente insolúveis. Perguntas que demandam uma tramitação simbólica (singular e coletiva) que ultrapassam nossos esforços de linguagem. Sentimo-nos impotentes para enfrentá-las.
Ao conceber assim, nos estranhamos. Na efervescente sociabilidade informacional-digital, com amplas e imensuráveis vias de acessibilidade aos saberes, supostamente deveríamos estar mais seguros, cônscios, munidos do bem-estar
de uma projeção de futuro desejante.
Com o avanço implacável dos aparelhos microeletrônicos, o remodelamento dos ecossistemas de informações, os novos meios de comunicação na internet, atualiza-se incessantemente a cobertura dos eventos políticos e econômicos. Com apenas um clique
, e à distância dos nossos dedos, uma variedade de formatos de divulgação de conhecimentos nos encara.
Nesse contexto multiplataforma, uma simples pesquisa, por exemplo, por Revolução Haitiana
, nos direciona para um avulso cenário. Livros, teses de doutorado, dissertações de mestrado, TCCs, artigos científicos, ensaios, podcasts, documentários, vídeo-aulas no YouTube, resumos e resenhas em sites, publicações em redes sociais e entrevistas com historiadores e demais especialistas.
Por que, então, experimentamos um alastramento do obscurantismo, uma regressão vulgar às formas de falar
desprovidas de densidade, uma expansão de estratégias criminosas de fake news, incultura, pobreza teórica? Por que se normalizou uma relação inconsequente com as palavras, um ódio à figura dos professores, uma imensa despolitização?
Implicando-se em entender o complexo universo do neoliberalismo, não nos surpreenderemos. A reestruturação da linguagem está no núcleo da lógica do capital. Através das formações de linguagem, somos capazes de simbolizar o mundo em que vivemos. De elaborar ritos e opor resistência. De se reposicionar como sujeito do desejo. Pela via da palavra, tecida na temporalidade singular, e com os outros, nos tornamos agentes de transformação social e capazes de transgredir as estruturas fixas de subjetivação.
Evidentemente, isso não significa isolar a linguagem das vanguardas partidárias organizadas e da atuação confrontacional dos movimentos sociais. Como se ela representasse puramente operações mentais autofechadas
, falatórios, algo desenraizado da reprodução material da vida nas condições históricas.
Pelo contrário, a emergência das lutas nos espaços não surge nem se mantém espontaneamente, assim como os aspectos de reconhecimento da exploração e de formação de um desejo de superação coletiva da miséria. A ideologia liberal-burguesa atravessa agudamente a todos desde a infância, constitui os aparelhos de interpelação cotidiana em grande quantidade, organiza a identidade
das pessoas exatamente por limitar e determinar suas experiências.
Assim, no campo dos afetos e da linguagem, a forma-social burguesa impõe padrões de interação que moldam a subjetividade, tendo como efeito, ao longo do tempo, amores, ódios, identificações, medos, esperanças, objetos de repulsa e admiração. Os esquemas valorativos consolidados pela regularidade da vida sob o capitalismo resistem ao vivido
como autotransparência racional empírica do que se costuma chamar a realidade
. (NUNES, 2022, p. 12).
Reposicionemos, então, a linguagem. Não é um ente abstrato, está em relação circular com sistemas sociais (fixados pelo modo de produção econômica) e expressa sutilmente, também, o que tais sistemas reprimem ou sufocam. É um lugar de conflito, confusão, possibilidade de elaboração e diversos destinos. (NUNES, 2022, p.