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Dano Moral Coletivo
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E-book385 páginas5 horas

Dano Moral Coletivo

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Sobre este e-book

Obra de fôlego destinada a todos os operadores do direito e que traz uma abordagem inovadora sobre o dano moral coletivo, um tema recente que não é muito debatido na doutrina, mas que é objeto de diversas ações judiciais. É analisada a evolução da responsabilidade até chegar na possibilidade de indenização por dano moral. Em seguida, é abordada a natureza jurídica do dano moral, concluindo pela impossibilidade de se aplicar o viés punitivo no dano moral individual. Em continuidade é abordado o dano moral coletivo, trazendo os principais aspectos da tutela coletiva, para então, aprofundar a discussão em torno do dano moral coletivo. Em suma, é uma obra de caráter multidisciplinar que aborda tema extremamente atual, pouco explorado e ainda traz estudo de direito comparado. Não é conhecida outra obra no mercado editorial que aborde o tema da forma como é tratado nessa obra.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento13 de mai. de 2019
ISBN9788584932436
Dano Moral Coletivo

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    Dano Moral Coletivo - Paulo Sergio Ferraz de Camargo

    Dano Moral Coletivo

    UMA POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DOS DANOS PUNITIVOS

    2016

    Paulo Sergio Uchôa Fagundes Ferraz de Camargo

    logoAlmedina

    DANO MORAL COLETIVO

    Uma Possibilidade de Aplicação dos Danos Punitivos

    © Almedina, 2016

    AUTOR: Paulo Sergio Uchôa Fagundes Ferraz de Camargo

    DIAGRAMAÇÃO: Almedina

    DESIGN DE CAPA: FBA

    ISBN: 978-858-49-3243-6

    Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

    (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)


    Camargo, Paulo Sergio Uchôa Fagundes Ferraz de

    Dano moral coletivo : uma possibilidade de aplicação

    dos danos punitivos / Paulo Sergio

    Uchôa Fagundes Ferraz de Camargo. -- São Paulo : Almedina, 2016.

    Bibliografia

    ISBN 978-858-49-3243-6

    1. Danos (Direito civil) 2. Dano moral

    3. Dano moral - Reparação

    4. Interesses coletivos (Direito)

    5. Reparação (Direito) I. Título.

    16-07715 CDU-347.426.4


    Índices para catálogo sistemático:

    1. Dano moral coletivo : Reparação : Direito civil 347.426.4

    Este livro segue as regras do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (1990).

    Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro, protegido por copyright, pode ser reproduzida, armazenada ou transmitida de alguma forma ou por algum meio, seja eletrônico ou mecânico, inclusive fotocópia, gravação ou qualquer sistema de armazenagem de informações, sem a permissão expressa e por escrito da editora.

    Outubro, 2016

    EDITORA: Almedina Brasil

    Rua José Maria Lisboa, 860, Conj.131 e 132, Jardim Paulista | 01423-001 São Paulo | Brasil

    editora@almedina.com.br

    www.almedina.com.br

    Para Lara pelos ensinamentos, companhia, compreensão e, sobretudo, pelo exemplo de dedicação. Dedico este trabalho com todo meu amor.

    AGRADECIMENTOS

    No longo caminho da educação para chegar até o mestrado agradeço em primeiro lugar o inabalável incentivo de meus pais. Minha mãe que em qualquer problema enfrentado, trazia suas palavras de sabedoria. E meu pai que sempre demonstrou a necessidade de empenho e dedicação.

    À Lara. Sendo certo que não sou capaz de traduzir em palavras a imensa importância que ela representa.

    Agradeço minha orientadora, Professora Patrícia Pizzol, que sempre estimulou a pesquisa e transmitiu seu sólido conhecimento com afabilidade, desempenhando na plenitude sua função de orientadora.

    Aos meus irmãos, ao Beto, à Lena e à Dalva, pelos 15 e 39 anos de paciência, incentivo e companheirismo.

    Aos colegas de escritório nessa longa jornada. Sem eles não seria possível. Auxílio incondicional e irrestrito.

    Aos componentes da banca examinadora Drs. Rogério Ferraz Donnini e Alexandre David Malfatti pelo apoio e orientações recebidas.

    À Almedina por acreditar na obra e proporcionar sua publicação.

    Para finalizar agradeço os queridos colegas da PUC que ajudam a trilhar esse caminho, desde 1995.

    SUMÁRIO

    INTRODUÇÃO

    1. RESPONSABILIDADE CIVIL – BREVES CONSIDERAÇÕES

    1.1. Evolução Histórica

    1.2. Pressupostos da Responsabilidade Civil

    1.2.1. Da Ação Omissiva ou Comissiva

    1.2.1.1. Da Responsabilidade Subjetiva

    1.2.1.2. Da Responsabilidade Objetiva

    1.2.2. Do Dano

    1.2.2.1. Do Dano Material e do Dano Moral

    1.2.3. Do Nexo de Causalidade

    1.3. Responsabilidade Contratual e Extracontratual

    1.4. Das Excludentes de Responsabilidade

    2. DANO MORAL

    2.1. Conceituação

    2.2. Previsão Legal

    2.3. Aplicação do Dano Moral

    2.4. Parâmetros de Fixação

    3. DOS DANOS PUNITIVOS

    3.1. Surgimento

    3.2. Aplicação em Outros Países

    3.2.1. Aplicação na Argentina

    3.2.2. Aplicação na Espanha

    3.2.3. Aplicação na França

    3.2.4. Aplicação na Província de Quebec no Canadá

    3.2.5. Aplicação na Alemanha

    3.2.6. Aplicação na Itália

    3.2.7. Aplicação na Inglaterra

    3.2.8. Aplicação nos Estados Unidos

    3.3. Aplicação no Brasil

    3.3.1. Conflito com o artigo 944 do Código Civil

    3.3.2. Da Vedação do Enriquecimento sem Causa

    3.3.3. Da Ausência de Pedido Específico

    3.4. Dano Moral e Danos Punitivos

    4. DANO MORAL COLETIVO

    4.1. Dos Direitos Coletivos

    4.1.1. Dos Interesses e Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos

    4.2. Conceituação do Dano Moral Coletivo

    4.3. Aplicação no Processo Coletivo

    4.3.1. Esfera Administrativa

    4.3.2. Esfera Judicial

    5. PROCESSO COLETIVO

    5.1. Legitimidade

    5.2. Competência

    5.3. Coisa Julgada

    5.4. Liquidação

    5.5. Execução

    5.5.1. Do caráter fluído da execução

    5.5.2. Competência e demais aspcetos

    CONCLUSÃO

    REFERÊNCIAS

    Introdução

    O presente trabalho tem por objetivo defender que a aplicação do caráter punitivo nas condenações por dano moral fique restrita ao dano moral coletivo, considerando, ainda, somente os danos coletivos e difusos e excluindo os de natureza individual homogênea.

    No decorrer do trabalho, serão trazidos temas que dizem respeito a: (i) responsabilidade civil; (ii) dano moral individual; (iii) danos punitivos; (iv) dano moral coletivo e, ainda, (v) processo coletivo.

    Inicia-se, com uma abordagem sobre a evolução histórica da responsabilidade civil, passando para os aspectos gerais desta, com seu caráter atual de reparação integral do dano. Em seguida, será tratado o tema específico do dano moral, principalmente em sua esfera individual, e a evolução nos parâmetros de fixação da indenização que, atualmente, conferem um caráter punitivo a sua fixação, afastando assim a indenização por dano moral de sua natureza compensatória. Tal situação gera um inegável conflito com o artigo 944 do Código Civil que considera que a indenização é medida pela extensão do dano. Conflito este que se alastra ao parágrafo único do referido artigo, que permite a redução da indenização, mas não sua majoração, situação que amplia o debate acerca da aceitação de um caráter punitivo na aplicação do dano moral individual.

    Em ato contínuo, tratar-se-á especificamente a aplicação dos danos punitivos, abordando sua evolução histórica e forma de aplicação, inclusive considerando a utilização do instituto em outros países.

    Neste debate, devemos considerar ainda o conflito com o enriquecimento sem causa e a completa ausência de previsão legal para aplicação dos danos punitivos.

    Após a exposição acerca da aplicação dos danos punitivos, o dano moral coletivo será abordado, trazendo os conceitos de direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos e a aplicação do dano moral na esfera coletiva de reparação de danos. Neste capítulo, ainda, abordar-se-á a possibilidade de nosso sistema jurídico recepcionar os danos punitivos, apenas e tão somente, quando se tratar de dano moral coletivo, tocando os temas discutidos na obra, tais como: (i) responsabilidade civil, (ii) dano moral, (iii) danos punitivos e (iv) dano moral coletivo.

    Ao final, considerando, sobretudo, a aplicação prática do dano moral coletivo, serão apresentados os temas pertinentes que envolvem o processo coletivo e responsabilidade civil, quando se trata de dano difuso e coletivo, ponderando as peculiaridades do processo que visa tutelar direito coletivo. Tais considerações são de suma importância em razão das diferenças que o processo coletivo apresenta em relação ao processo individual, que, como é sabido, é a forma de processo mais utilizada pelos operadores do direito.

    Responsabilidade Civil – Breves Considerações

    Para tratarmos dos temas de dano moral coletivo e de danos punitivos, faz-se necessário abordar os principais aspectos da responsabilidade civil. Sendo assim, será apresentada a evolução histórica da responsabilidade civil, demonstrando-se as alterações ocorridas ao longo do tempo, sobretudo, no que diz respeito à responsabilidade subjetiva e objetiva, bem como a evolução do instituto ao recepcionar o dano moral de caráter individual e, mais recentemente, o dano moral coletivo.

    A responsabilidade civil atualmente é objeto de diversas ações nos tribunais pátrios, tendo uma grande importância, tanto na aplicação prática do direito, como em seu estudo acadêmico. A tendência hodierna é não deixar que um dano existente fique sem reparação, devendo, para isso, buscar satisfazer in totum o prejuízo da vítima, repondo seu patrimônio ao estado em que estava antes do ataque sofrido¹.

    Essa tendência visa atingir um equilíbrio em uma sociedade que passou por uma forte sofisticação nas relações contratuais, passando a usufruir novos serviços e dispor de novos produtos. O incremento das relações contratuais e a oferta de novos produtos e serviços no atual contexto de globalização, aliado ao processo de massificação das relações, acaba por gerar a necessidade de proteção não somente do bem-estar individual, preservando a dignidade da pessoa humana, mas, também, do bem-estar coletivo.

    Com este contorno, a responsabilidade civil tenta dar efetividade à reparação integral dos danos sofridos e, ainda, passa a considerar a importância da prevenção dos danos, sendo possível inibir a prática de atos que sejam seus potenciais causadores de lesões. No entanto, deve-se notar que no processo evolutivo da responsabilidade civil nem sempre foi assim, não se pode deixar de considerar que, ao longo da história, a reparação de danos ganhou sensível aumento de importância até tornar-se figura central no mundo do direito como é nos dias de hoje.

    1.1. Evolução Histórica

    Nos primeiros registros em que se pode admitir uma forma de reparação de danos, mesmo em sociedades primitivas, esta estava sempre ligada a algum tipo de vingança. A ideia era retribuir ao ofensor o mal causado, fazendo com que sofresse o mesmo dano que causou. Inicialmente, cuidava-se de vingança coletiva, para, em seguida, admitir-se a vingança individual.

    O regime da vingança individual está presente no Código de Hamurabi (1780 a.c), gerando as disposições olho e por olho, dente por dente e, posteriormente, no Código de Manu (entre 1300 a.c. e 800 a.c.). Convém frisar que eram vinganças de caráter privado sem processo específico, com pequena interferência do Estado.² Urge destacar que, no Código de Manu, já existe a possibilidade de a indenização ser paga por pecúnia, ou seja, já se afasta um pouco da ideia de vingança.³

    Em continuidade, chega-se a Roma e, no período da República⁴, é possível destacar a Lei das XII Tábuas (450 a.c.), na qual ainda se conserva a vingança privada, mas que contém um importante avanço, uma vez que permite que o lesado possa transigir com seu ofensor e receber certa soma em dinheiro em reparação ao dano sofrido. A própria lei definia a soma em dinheiro a ser recebida, ou seja, tinha um caráter fixo. Até o momento, contudo, não se fazia qualquer menção à culpa do agente.

    Após a Lei das XII Tábuas, um sensível avanço no sistema da responsabilidade civil em Roma foi sentido, em especial, com a Lex Aquilia (século III a.c.), sendo possível considerar que com a edição dessa lei já se faz menção à culpa na conduta do agente causador do dano. Por razão de tal lei que, até hoje, definimos a responsabilidade extracontratual como responsabilidade aquiliana. Nesta lei, a indenização deixou de ter o caráter fixo da Lei das XII Tábuas e passou a utilizar a jurisprudência como norte para fixação das indenizações, sendo a indenização fixada sempre em pecúnia, saindo de cena, portanto, o caráter de vingança, permanecendo apenas o caráter reparatório.

    Após a importante Lex Aquilia, ainda em Roma, já no período da Monarquia Absoluta⁶ e próximo à Idade Média, uma grande contribuição para a responsabilidade civil veio no ano de 533 com a compilação sistemática das leis feita pelo Imperador Justiniano, criando o Código Justiniano.

    No Código Justiniano, na parte do Digesto ou Pandectas estava presente o princípio largamente aplicável à responsabilidade civil, conhecido como neminem laedere (alterum non laedere), que pode ser entendido como não lesar a outrem⁷.

    Com esta codificação temos o registro de uma grande evolução no desenvolvimento da responsabilidade civil, caracterizando a ilicitude do ato que lesar terceiro. Oportuno salientar o ensinamento de Rogério Ferraz Donnini⁸ que nos mostra a aplicação do princípio neminem laedere na Constituição Federal, seja pela preservação da dignidade da pessoa humana, seja pela garantia ao indivíduo de apreciação por parte do Poder Judiciário de qualquer lesão ou ameaça a direito, previsto no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal⁹.

    Em seguida, inicia-se o período da Idade Média e, simultaneamente, um momento em que o dever de indenizar permanece atrelado à averiguação da culpa. Apesar disso, já se desenvolve a noção de dolo e, também, a distinção entre responsabilidade civil e a penal.¹⁰ Na Idade Média, a Igreja Católica exercia grande influência junto aos Reis na aplicação do direito, resultando, assim, em disposições consagradas do direito romano com disposições do direito canônico.¹¹

    O fim de da Idade Média deu-se com o Renascimento. Neste momento histórico, temos a Idade Moderna com o sistema de governo chamado Absolutismo. Neste período, registra-se o surgimento de novas ideias trazidas por Thomas Hobbes, Nicolau Maquiavel e Thomas More e, ainda, o Estado atuando com mão forte e controlando a aplicação do direito. Inicia-se, nesta época, a consolidação de um pensamento que leva em consideração a prevenção dos danos¹², ou seja, passa-se a se preocupar não só com a reparação, mas, também, com a prevenção.

    Ainda nesse contexto histórico, marca-se a passagem do feudalismo para o mercantilismo, com um forte incremento das relações comerciais e sociais, alterando as estruturas da sociedade europeias e iniciando-se a formação dos Estados nacionais, com grande poder concentrado na mão do monarca.

    O Absolutismo e a Idade Moderna são sucedidos pelo Capitalismo e pela Idade Contemporânea, momento em que o Iluminismo teve grande influencia no desenvolvimento do pensamento humano. Foi, portanto, um momento marcado pela contestação da concentração de poder nas mãos dos Reis, buscando-se um equilíbrio nas relações entre o Estado e os cidadãos, bem como a valorização do ser humano. Essas novas ideias resultaram na Revolução Francesa e na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.¹³

    Com a queda do absolutismo na França, os diretos individuais foram fortemente amparados com a edição do Código Civil francês, dando tratamento a assuntos de grande importância, incluindo a responsabilidade civil. Neste momento, a norma, positivada através de códigos, ganhou muito destaque passando o Código Civil francês (Código Napoleônico) a influenciar a elaboração de códigos civis em diversos países da Europa e no resto do mundo.¹⁴

    Em 1900, entrou em vigor o Código Civil alemão ( Bürgerliches Gesetzbuch – BGB) e trouxe novo sopro na evolução do direito. Tanto o Código Civil francês, como o alemão foram influenciados pelo direito romano, sendo muito feliz Rui Stoco ao sintetizar a influencia do direito romano na evolução da aplicação do direito.

    Lembre-se, apenas para efeito histórico, que a redescoberta do Direito romano foi empreendida por três escolas: a) na idade média, pelos glosadores do Corpus Juris Civilis; b) na idade moderna, pelos iluministas franceses; c) na idade contemporânea, pelos pandecistas alemães. As elaborações de tais escolas refletiram-se na produção jurídica: a primeira escola devem-se as diversas ordenações do reino; o legado da segunda é o Código Civil francês ou Código Napoleão de 1804; e o resultado dos estudos da terceira é o Código Civil alemão de 1896, no original Bürgerliches Gesetzbuch ou simplesmente BGB.¹⁵

    No século XIX, o Brasil, apesar de ter se tornado independente, ainda aplicava as Ordenações do Reino de Portugal, mais precisamente as Ordenações Filipinas. Vale notar que, no ano de 1867, Portugal editou seu primeiro Código Civil, inspirado no Código Civil Francês.

    Foi somente no século XX, mais precisamente em 1916, que entrou em vigor no Brasil seu primeiro Código Civil, com anteprojeto do jurista Clóvis Bevilaqua. O Código Civil de 1916 tinha forte influência tanto do Código Civil francês, como do Código Civil alemão (BGB)¹⁶.

    A estruturação do Código Civil de 1916 foi toda inspirada no BGB, utilizando-se de uma Parte Geral e uma Parte Especial, sendo a Parte Especial dividida em títulos de Família, Coisas, Obrigações, Contratos e Sucessões. No entanto, no tema da responsabilidade civil, a influência foi toda do Código Civil francês, adotando-se a regra da responsabilidade subjetiva, atribuindo, assim, extrema importância para a ocorrência da culpa.¹⁷

    O Código Civil de 1916 carregava todo o pensamento francês de fortalecimento do indivíduo e proteção do seu patrimônio, de garantias para os bens de sua propriedade¹⁸. Nestes termos, consagrava o princípio da autonomia da vontade e, ainda, a força vinculativa dos contratos.

    Como já falado anteriormente, no âmbito da responsabilidade civil, o Código Civil de 1916 adotou, como regra, o regime da responsabilidade subjetiva e cuidou apenas, e tão somente, do caráter material da reparação, sem trazer qualquer previsão em relação ao dano moral. Nos dias de hoje, tais limitações tornam-se fora de contexto, considerando a preocupação com a proteção ao indivíduo e a reparação integral dos danos sofridos.

    Quanto à responsabilidade civil, o Código Civil de 1916 tratava da obrigação de indenizar, com base na prática de um ato ilícito que causasse prejuízo a outrem, desde que fosse possível identificar o nexo de causalidade entre o ato culposo praticado e o dano causado¹⁹.

    No decorrer do século XX, a responsabilidade civil evoluiu passando a incorporar os elementos que garantem, nos dias de hoje, a aplicação do dano moral e garantindo, assim, a possibilidade de reparação integral dos danos sofridos, bem como a possibilidade de inibir a prática do ilícito, precavendo a ocorrência de um dano em potencial.

    Dentre esses elementos, destaca-se aplicação da responsabilidade objetiva, positivada na Constituição Federal de 1988 para os atos praticados pela Administração Pública (artigo 37, § 6º)²⁰ e a adoção da responsabilidade objetiva como regra no Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90)²¹.

    A Constituição de 1988 e o Código de Defesa do Consumidor distanciaram-se do modelo adotado pelo Código Civil de 1916 e valorizavam, sobretudo, a dignidade da pessoa humana e a ampla reparação dos danos, deixando de lado o viés patrimonialista do Código de 1916.²²

    O Código Civil de 2002, que deu lugar ao Código Civil de 1916, filiou-se ao pensamento de valorização do ser humano e busca da reparação integral do dano, coadunando-se com a Constituição Federal de 1988²³. Sendo assim, trouxe previsões acerca da proteção tanto do dano material, como do dano moral e, ainda, em situações específicas, adotou o sistema da responsabilidade objetiva, diminuindo, desse modo, a importância da culpa. Carlos Roberto Gonçalves entende que a previsão da responsabilidade objetiva em certas situações é a maior novidade introduzida pelo Código Civil de 2002, no âmbito da responsabilidade civil²⁴.

    Vale notar, ainda, que o Código Civil de 2002, principalmente em sua parte geral, adota o sistema das cláusulas abertas e traz importantes positivações como a função social dos contratos, boa-fé e probidade, afastando-se, assim, da autonomia da vontade e força vinculante dos contratos, ambas consagradas no sistema de 1916²⁵.

    Com isso, percebe-se uma mudança de eixo do Código Civil 2002, em relação ao Código Civil de 1916, ao passo que aquele girava em torno de uma proteção patrimonial, este gira em torno da proteção ao indivíduo.

    O Código Civil de 2002 ampliou o tratamento da responsabilidade civil, em relação ao Código Civil de 1916. A responsabilidade civil, por sua vez, ganhou um título específico, dentro do Livro I, da Parte Especial – Do Direito das Obrigações, que é o Título IX – Da Responsabilidade Civil (artigos 927 a 954). Além do título próprio, o Código Civil ainda traz disposições acerca da responsabilidade civil em seus artigos 186 e 187, quando trata de ato ilícito (responsabilidade extracontratual) e no artigo 389 e seguintes quando trata do inadimplemento das obrigações (responsabilidade contratual).

    Feitos os registros necessários sobre a evolução histórica da responsabilidade civil, passaremos a abordar os principais aspectos da responsabilidade civil, para, posteriormente, ingressarmos no estudo do dano moral.

    1.2. Pressupostos da Responsabilidade Civil

    A responsabilidade civil é um dos grandes temas de direito civil e, acima, colocamos de forma sucinta sua evolução desde a vingança coletiva, até a fase atual que busca aplicar a reparação integral do lesado, com o objetivo de que um dano não fique sem reparação e que essa reparação, por sua vez, indenize todo o dano sofrido.

    Vale notar que a responsabilidade civil alterou-se no curso do tempo e nos dias de hoje deve, obrigatoriamente, considerar a abrangência e complexidade das relações sociais, com todo avanço tecnológico e incremento das relações comerciais e de trabalho, não sendo raro estarmos submetidos a relações massificadas, devendo-se atentar para preservação da dignidade da pessoa humana, do meio-ambiente e do patrimônio histórico-cultural.

    Na visão de Rogério Ferraz Donnini:

    A responsabilidade, como dissemos, é corolário do inadimplemento de uma obrigação pelo devedor, em desfavor do credor. Portanto, aquele que fere o direito de outrem deve reparar o prejuízo causado. O devedor que descumpre suas obrigações submete-se à apreensão de seus bens passíveis de penhora, respondendo, assim, com seu patrimônio pelo pagamento de suas dívidas, o que se denomina imputação civil dos danos (…) A idéia de responsabilidade é a do neminem laedere (a ninguém ofender), ou alterum non laedere (a outrem não ofender). Aquele, portanto, que viola, fere o direito e causa dano a uma pessoa comete ato ilícito e tem o dever de reparar esse prejuízo. É o que dispunham os artigos 159 e 169 do Código Civil de 1916 e agora dispõe os arts. 186 e 187, combinados com o art. 927 de nossa atual lei civil substantiva.²⁶

    Já Maria Helena Diniz define a responsabilidade civil como sendo:

    A aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato ou animal sob sua guarda ou, ainda, de simples imposição legal. Definição esta que guarda em sua estrutura, a idéia de culpa quando se cogita da existência de ilícito (responsabilidade subjetiva), e a do risco, ou seja, da responsabilidade sem culpa (responsabilidade objetiva).²⁷

    Pelas definições supracitadas, podemos perceber que a culpa não é mais um elemento central na responsabilidade civil, admitindo-se a responsabilidade sem culpa. Além disso, não se atém somente ao dano material, contemplando, também, a possibilidade de reparação do dano moral.

    E para que subsista o dever de indenizar, podemos destacar como pressupostos da responsabilidade civil, os seguintes elementos: (i) ação comissiva ou omissiva; (ii) dano e, por fim, (iii) nexo de causalidade entre a ação ou omissão e o dano. Os pressupostos da responsabilidade civil retro-mencionados serão abordados individualmente a seguir.

    1.2.1. Da Ação Omissiva ou Comissiva

    A ação praticada, seja ela omissiva ou comissiva, deve ser juridicamente relevante. Além disso, quando para a fixação do dever de indenizar estamos diante de uma regra de responsabilidade subjetiva a ação ou omissão juridicamente relevante do agente ofensor, deve necessariamente ser um ato ilícito e, ainda, ter sido praticado com dolo ou culpa, causando prejuízo à vítima nos termos dos artigos 186, 187 e 927 caput do Código Civil²⁸. Ou seja, o ato praticado deve ter violado uma norma jurídica, ou obrigação assumida, para ser considerado ato ilícito e ter causado um dano²⁹. Visto que se estamos diante de um regramento de responsabilidade objetiva, como o do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil não necessariamente o ato precisa ser ilícito³⁰.

    Como leciona Maria Helena Diniz a indenização deriva de uma ação ou omissão do lesante que infringe um dever legal (RT, 417:167), contratual ou social, isto é, se praticado com abuso de direito (RT, 167:269, 171:141)³¹.

    Vale notar que a responsabilidade regula os atos próprios praticados pelo ofensor, assim como os atos de terceiro que gerem danos e a obrigação de reparar recaia sobre quem tinha o dever de guarda, de vigilância, de cuidado ou de incolumidade. Ademais, a responsabilidade por ato próprio também é chamada de responsabilidade direta e está prevista, nos já mencionados, artigos 186 e 927 do Código Civil. Já a responsabilidade por ato de terceiro é a chamada responsabilidade indireta e está prevista no artigo 932³² e seguintes do Código Civil.

    Nestes termos, a ação ou omissão causadora do dano pode ser praticada diretamente pelo agente, ou até mesmo por um terceiro nos casos expressos em lei de responsabilidade indireta. Além disso, como regra, adota-se a necessidade de o ato praticado ser ilícito, com base na regra da responsabilidade subjetiva e, excepcionalmente, admite-se nas hipóteses previstas em lei, que um ato lícito seja passível de causar dano e ser reparado, quando estamos diante das hipóteses de responsabilidade objetiva.

    Em suma, nosso sistema de responsabilidade civil adotou como regra a responsabilidade subjetiva, na qual é necessária a constatação da culpa do agente e de forma excepcional contemplou a responsabilidade objetiva, na qual não se discute a culpa, sendo o causador do dano obrigado da indenizar, independente desta. Diante da importância desses elementos, cabe expor sobre a responsabilidade subjetiva e objetiva, trazendo a aplicação dos elementos dolo e culpa.

    1.2.1.1. Da Responsabilidade Subjetiva

    O Código Civil de 1916³³ já trazia, em seu artigo 159, como regra a responsabilidade subjetiva, ou seja, para que um dano fosse indenizado o ato praticado deveria ser necessariamente ilícito, tendo que ficar caracterizada a culpa stricto sensu ou o dolo.

    Consoante ao de 1916, o Código Civil de 2002 manteve a mesma regra, pautando-se pela responsabilidade civil clássica³⁴, nos termos dos já mencionados artigos 186, 187 e 927 caput.

    O artigo 186 do Código Civil, quando trata de ação ou omissão voluntária, refere-se ao dolo do agente e ao falar de negligência ou imprudência refere-se à culpa. Sendo assim, consagra-se a característica da responsabilidade subjetiva de avaliar a culpa ou dolo do agente, configurando-se, neste formato, o ato ilícito³⁵ como pressuposto do dever de indenizar.

    Sergio Cavalieri Filho aponta de forma precisa as distinções entre dolo e culpa³⁶:

    Tanto no dolo como na culpa há conduta voluntária do agente, só que no primeiro caso a conduta já nasce ilícita, porquanto a vontade se dirige à concretização de um resultado antijurídico – o dolo abrange a conduta e o efeito lesivo dele resultante -, enquanto que no segundo a conduta nasce lícita, tornando-se ilícita na medida em que se desvia dos padrões socialmente adequados. O juízo de desvalor no dolo incide sobre a conduta, ilícita desde a sua origem; na culpa, incide apenas sobre o resultado. Em suma, no dolo o agente quer a ação e o resultado, ao passo que na culpa ele só quer a ação vindo a atingir o resultado por desvio acidental de falta de cuidado.³⁷

    A culpa pode ser classificada como: grave, leve ou levíssima³⁸. A culpa grave é que mais se aproxima do dolo e para sua ocorrência o ofensor deixa de se pautar pelas cautelas necessárias que seriam comuns parar qualquer dos homens. A leve se caracteriza por deixar de observar as cautelas de rotina, as cautelas ordinárias. Já a levíssima é a não adoção de cautelas extraordinárias.

    A gradação da culpa é importante no sistema da responsabilidade subjetiva, pois o parágrafo único do artigo 944 do Código Civil³⁹ possibilita a redução da indenização de acordo com a gravidade da culpa⁴⁰.

    Mazeaud e Mazeaud alertam sobre a dificuldade em se definir culpa⁴¹, mas apesar da dificuldade nos valemos da sempre oportuna lição de Maria Helena Diniz, no seguinte sentido:

    a culpa em sentido estrito, caracterizada pela imperícia, imprudência ou negligência, sem qualquer deliberação de violar um dever. Portanto, não se reclama que o ato danoso tenha sido, realmente, querido pelo agente, pois ele não deixará de ser responsável pelo fato de não se ter apercebido do seu ato nem medido as suas conseqüências.⁴²

    O dolo em nosso Código Civil é tratado como um defeito do negócio jurídico e está previsto do artigo 145 ao 150, e é a prática consciente de um ato lesivo, no qual o agente tem plena consciência de agir em violação a alguma regra jurídica, com intuito de se beneficiar. Ou melhor ainda na palavras de Caio Mario da Silva Pereira:

    Modernamente, o conceito de dolo alargou-se, convergindo a doutrina no sentido de caracterizá-lo na conduta antijurídica, sem que o agente tenha o propósito de prejudicar. Abandonando a noção tradicional do animus nocendi (ânimo de prejudicar), aceitou que a sua tipificação delimita-se no procedimento danoso, com a consciência do resultado. Para a caracterização do dolo não há mister perquirir se o agente teve o propósito de causar o mal. Basta verificar se ele procedeu consciente de que o seu comportamento poderia ser lesivo. ⁴³

    A responsabilidade civil subjetiva é uma influência direta do Código Civil francês, em especial, de seu artigo 1382⁴⁴, que serviu de clara inspiração para o artigo 159 do Código Civil de 1916, e para o artigo 186 do Código Civil de 2002, consagrando a culpa em sentido amplo (dolo e culpa)⁴⁵ como ponto fundamental para o dever de indenizar.

    1.2.1.2. Da Responsabilidade Objetiva

    Da metade para o final do século XIX, com o incremento das relações humanas e a introdução cada vez maior das máquinas na atividade industrial, iniciou-se o desenvolvimento de uma corrente na qual se vislumbrava que a culpa não era mais suficiente para ser um requisito obrigatório na reparação de danos, sendo certo que alguns danos ficavam sem reparação, pelo fato da ausência de comprovação da culpa⁴⁶.

    Nesse sentido, a obrigação de indenizar consistiria na combinação entre uma ação, um dano/prejuízo e a relação de causalidade entre a ação e o dano, independentemente, de a ação ser voluntária ou involuntária, lícita ou ilícita⁴⁷.

    Nesta situação, de afastar a discussão da culpa e da antijuridicidade do fato, estamos diante da responsabilidade objetiva, esta que consagra a teoria do risco, na qual é possível

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