Motricidade Humana: Novos Olhares e Outras Práticas - À Luz da Transdisciplinaridade e das Ciências Emergentes
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Sobre este e-book
Os autores propõem um novo olhar sobre a Educação Física (o que os motiva a defender a sua superação pela Ciência da Motricidade Humana), com base nos conhecimentos mencionados, bem como a partir de uma concepção de corporeidade à luz do pensamento complexo de Edgar Morin e também das Teorias de Fluxo e Composição (respectivamente oriundas dos escritos do psicólogo húngaro radicado nos Estados Unidos Mihaly Csikszentmihalyi e da historiadora brasileira Denise Sant'Anna). Busca, nessa direção, apresentar aos leitores, especializados ou leigos, novas possibilidades de compreensão do corpo e das práticas corporais, o que remete, de acordo com o início desta sinopse, com a necessidade de ultrapassar a visão ainda hoje hegemônica da dicotomia corpo/mente e, mais além, abrir o diálogo com outras dimensões do real. Esse é o convite que fazemos a você, leitor!
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Motricidade Humana - Alfredo Feres Neto
Editora Appris Ltda.
1ª Edição - Copyright© 2018 dos autores
Direitos de Edição Reservados à Editora Appris Ltda.
Nenhuma parte desta obra poderá ser utilizada indevidamente, sem estar de acordo com a Lei nº 9.610/98.
Se incorreções forem encontradas, serão de exclusiva responsabilidade de seus organizadores.
Foi feito o Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional, de acordo com as Leis nºs 10.994, de 14/12/2004 e 12.192, de 14/01/2010.
COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO EDUCAÇÃO, TECNOLOGIAS E TRANSDISCIPLINARIDADE
Dedico este livro à memória de minha irmã, Leila Feres Bicudo, que nos deixou tão cedo, e com quem aprendi a olhar para dentro de mim,
em nossas conversas ainda na adolescência.
AGRADECIMENTOS
Ao professor Manuel Sérgio, meu supervisor no estágio de pós-doutoramento realizado em Portugal, e cujas ideias me inspiraram a organizar este livro.
Ao professor Pedro Guedes, que me acolheu tão generosamente na Universidade da Beira Interior, pelo qual serei eternamente grato.
Ao filósofo José Antunes de Sousa, Professor Visitante na Faculdade de Educação Física da Universidade de Brasília entre 2015 e 2018, pelas trocas de mensagens e conversas inspiradoras ao redor do tema da Motricidade e das Ciências Emergentes.
À psiquiatra Maria Henriqueta Camarotti, pelas ideias também inspiradoras para a organização deste livro, em especial, a partir da leitura de seu livro Consciência Autocurativa.
À minha querida esposa Márcia Barreto, bem como aos meus amados filhos, Sophia e Marcos Vinícius, pelo apoio irrestrito em todas as horas, e também pela compreensão e resiliência que tiveram nos momentos em que estive distante fisicamente, particularmente durante o estágio de pós-doutoramento, início deste projeto, entre 2015 e 2016.
Ao CNPQ (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – Brasil) pelo apoio financeiro para a realização da pesquisa de pós-doutoramento.
Apresentação I
Organizador
Este livro reflete, de forma relativamente interdisciplinar e convergente, inquietações várias diante do apelo irresistível que a complexidade humana coloca aos vários saberes. O friso de autores é significativamente plural e alargado e integra, desde logo, o grande arauto de uma nova ciência a que chamou Ciência da Motricidade Humana (CMH) Manuel Sérgio, um filósofo português que, ousada e zelosamente, tem proclamado a sua inovadora tese de forma muito particular em terras do Brasil.
O primeiro capítulo, denominado "Contribuições à Ciência da Motricidade Humana: por uma concepção de corporeidade à luz do pensamento complexo", do professor Renato Bastos João, dialoga muito bem com as principais proposições formuladas por Manuel Sérgio, na medida em que, assim como ele, constrói seu texto com base no pensamento de Edgar Morin. Nessa direção, busca amplificar o conceito de corporeidade com base no paradigma da complexidade proposto pelo filósofo francês, estabelecendo relações originais com a obra sergiana. Pode-se perceber, portanto, que o pensamento do filósofo português continua estimulando o debate e o desdobramento de suas ideias originais, tanto no Brasil como em diversos outros países, como a Espanha, a Colômbia, o Chile, a Argentina, apenas para mencionar alguns.
Essa tese, porém, reclama, dado o contexto em que foi forjada, apontando inequivocamente para a transcendência (sendo sem dúvida auspiciosa na sua proposição), ela, dizíamos, reclama, contudo, o arrojo da superação definitiva da amarra paradigmática típica do materialismo. É nesse sentido que apontam os contributos dos professores Alfredo Feres Neto e José Antunes de Sousa. Feres Neto, no capítulo denominado "Transdisciplinaridade, motricidade humana e o paradigma do primado da consciência: um diálogo necessário (e urgente!)", desenvolve seu texto à luz da denominada abordagem transdisciplinar (AT), proposta pelo físico romeno Basarab Nicolescu. Nessa perspectiva, é crucial ter em conta que há diferentes níveis de realidade (sendo que a dimensão material, na qual a ciência moderna se fia, é apenas uma delas), assim como há também diferentes níveis de percepção. Feres Neto busca estabelecer alguns nexos entre a AT e a CMH (o que já havia sido esboçado por Manuel Sérgio, por exemplo, em seu livro Um corte epistemológico: da Educação Física à motricidade humana), dessa vez com base no paradigma do primado da consciência, tal qual proposto por Amit Goswami.
De fato, impõe-se que afoitamente ultrapassemos o preconceito granítico e dogmático de exclusividade do mundo exterior como última expressão da realidade e apontemos decididamente para o estatuto epistemológico da primordialidade da consciência enquanto fonte universal de toda a realidade existente, e obviamente de toda a realidade humana.
É com esse mesmo espírito que Sousa, em seu capítulo intitulado "Motricidade humana: um nome ou um programa de vida?", apresenta uma robusta abordagem da CMH, realizando inicialmente um interessante e bastante completo roteiro da obra de Manuel Sérgio. Na sequência, avança na direção de incluir reflexões na perspectiva da superação da ciência materialista, dialogando com autores como Amit Goswami, Deepak Chopra, Ken Wilber, entre outros, ampliando as proposições inicialmente realizadas pelo professor aposentado da Faculdade de Motricidade da Universidade de Lisboa, na direção de alçá-las junto ao pensamento de vanguarda representado pelos autores supracitados, o que entendo ser uma porta importantíssima para se vislumbrar novas ideias e se colocar na direção de outras e melhores práticas corporais, tanto na esfera da Educação como na da Saúde.
É nessa mesma perspectiva de busca de diálogo com o pensamento complexo e transdisciplinar que se integra o precioso contributo de Maria Henriqueta Camarotti, ilustre psiquiatra e mulher inquieta na sua resposta ao enigma humano e que, desde há muito, por meio de seus estudos, vem se colocando em uma postura de franca superação do paradigma materialista e positivista, apontando, como de resto os demais autores, para aquilo que consideramos ser a tonalidade característica deste livro: a transdimensionalidade do ser humano. A autora em foco desenvolve essa compreensão em seu texto "As ciências emergentes: uma nova base paradigmática na compreensão da motricidade humana". Desse modo, colabora sobremaneira para subsidiar, com conhecimentos de vanguarda produzidos com base em pesquisas em campos tão diversos como a Física Quântica, Campos Morfogenéticos (Rupert Sheldrake), Teoria da Mente Holotrópica (Karl Pribham e David Bohm), Teoria do Campo Unificado (John Hagelin), os fundamentos da ciência da motricidade humana, na medida em que contribui para ampliar a percepção reducionista e dicotômica de mundo e de ser humano, ainda hegemônicas na ciência moderna e no campo acadêmico ainda chamado Educação Física.
Neste livro, optamos, na Parte II, por uma dimensão mais aplicada da CMH. Nessa direção, Manuel Sérgio presenteia-nos com seu texto "Motricidade humana e futebol, uma síntese bastante bem escrita de sua obra, ele que, como foi dito, é o propositor da Ciência da Motricidade Humana. Desse modo, o leitor terá a oportunidade de acompanhar, com base em uma perspectiva histórico-comparativa, o contexto no qual surge a Educação Física, que, assim como a Medicina, incorre, segundo o autor, ao se apoiar em Michel Foucault, no
erro de Descartes", isto é, no dualismo antropológico cartesiano. Isso no século XVIII. Teríamos avançado algo desde então? Entendo que o filósofo português, ao realizar a crítica de que não se educa o físico, e sim as pessoas, abre um campo de possibilidades ainda a ser percorrido, na direção das várias facetas da complexidade humana, na esteira de filósofos como Edgar Morin, Basarab Nicolescu, entre outros. E ainda realiza incursões bastante interessantes na esfera do esporte, mais precisamente do futebol, ampliando olhares ainda muito conservadores sobre esse que é o mais popular e grandioso fenômeno contemporâneo. Não é à toa que seu aluno mais famoso, o renomado técnico de futebol José Mourinho, não se cansa de render homenagens ao seu antigo mestre!
José Antunes de Sousa retorna nesta parte do livro com duas reflexões importantíssimas, na medida em que aborda dois temas da maior relevância. No primeiro, intitulado "Gerontologia: educação e desporto, busca, com base em algumas de suas ideias desenvolvidas anteriormente, elementos com vistas à construção de um novo olhar sobre o envelhecimento, que não mais se baseia na primicialidade do corpo orgânico, mas sim na da consciência, a partir da qual tudo decorre, inclusive a dimensão corpórea do ser humano. No segundo, de nome
Desporto e espiritualidade", recupera conhecimentos advindos da Física Quântica (um outro nível de realidade, conforme argumenta Nicolescu), buscando tecer um imenso potencial que está presente no vazio quântico proporcionado pela meditação, em suas diversas manifestações. E tudo isso a partir de sua experiência pessoal como estudante de Educação Física em Mafra, Portugal, bem como em sua atuação profissional no Sport Lisboa e no Benfica, renomado clube de futebol português.
Gostaríamos de realçar o caráter transatlântico desta cooperação. De fato, como se estende entre Portugal e Brasil, por meio desta modesta obra, uma verdadeira ponte dos afetos: do lado de lá, Manuel Sérgio e José Antunes de Sousa, e do lado de cá, Maria Henriqueta Camarotti, Alfredo Feres Neto e Renato Bastos João.
Esperamos que este livro se junte a outros esforços, nas áreas da Educação e da Saúde, que vêm buscando elementos nas denominadas Ciências Emergentes
, bem como em uma nova Ciência da Motricidade Humana, na direção de superação do paradigma materialista, que ainda limita nossa percepção da realidade e, portanto, nossas intervenções sobre ela.
Brasília, Maio de 2018
Alfredo Feres Neto
Apresentação II
Prof. Dr. João Francisco Régis de Morais
Após ler o Prefácio competente e bem redigido do Prof. Dr. Carol Kolyniak Filho, não me permiti sucumbir à tentação de escrever novo (segundo) Prefácio. Apenas atendendo à solicitação do muito estimado Prof. Dr. Alfredo Feres Neto, quis – isto sim! – registrar umas breves impressões acerca de tão valiosa obra coletiva. Meu caro irmão lusitano Manuel Sérgio Vieira e Cunha é o bíblico homem que saiu a semear
e, como se vê, prossegue semeando, não a semente apenas repetitiva, mas a que convida a novos desdobramentos.
Permita-me lembrar de que, em 1921, o Dr. Albert Einstein recebia o Prêmio Nobel de Física Matemática. O meio científico se vira abalado com a descoberta de sua fórmula central: Energia é igual à massa multiplicada pelo quadrado da velocidade da luz (E = m x c²)
. Logo, o Dr. Einstein visitou os Estados Unidos da América (EUA), sendo convidado a integrar o corpo de docência e pesquisa da Universidade de Princeton, para o qual veio e ali esteve até o fim de sua vida física, em 1955.
Tendo muita afinidade com o físico-matemático da Universidade de Stanford, Dr. William Tiller, trabalhou com ele seguidas vezes. Ora, Tiller comentou com Einstein que este chegara à fórmula estupenda que afirmava ser o Universo uma miríade imensa de campos energéticos; Tiller estimulou o colega a que explicitassem melhor a fórmula genial. Com o acordo do Dr. Einstein, desenvolveram juntos o que foi chamado Esquema espaço-tempo positivo-negativo Tiller/Einstein
. Apesar da ampla denominação, o Esquema não era de difícil compreensão. Em resumo: se todo o Universo é energia, toda aceleração de energia que vá até ao limite do quadrado da velocidade da luz define o espaço-tempo positivo: mundo visível e palpável. E, ainda em termos naturais, toda aceleração de energia que vá além do limite do quadrado da velocidade da luz, define o espaço-tempo negativo: mundo etéreo, normalmente não visível e não palpável. Não é necessário muito esforço para percebermos que os meios científicos, de certo realismo positivista, agastaram-se com tal Esquema.
Mas, tudo isso se ia emparelhando com a notável obra do cientista e teólogo Dr. Pe. Pierre Teilhard de Chardin, apesar do disciplinado jesuitismo deste. Tão disciplinado que só foi editada sua vasta obra escrita post-mortem. Teilhard propôs um evolucionismo cristão, o qual lhe custou bem caro no meio jesuítico. Sendo legítimo resumirmos tão ampla e notável obra, diríamos que sua explanação inicia-se na cosmogênese cuja dimensão permanece assustadoramente desconhecida, ainda que se fale em explosão atômica de Big-bang ou em coisas como Limite de Plank. Obviamente, a ciência segue ignorando quando tudo começou no Universo; todavia, após muitos milhões de anos, havia já a galáxia Via Láctea, e nela, a nossa estrela solar.
A partir de uma explosão no Sol que liberou considerável massa ígnea, teve início a litogênese (de litos, no grego: pedra; para saber-nos habitantes de um simpático pedregulho dito planeta Terra). Todas essas fases foram de milhões e milhões de anos, e com a hidroxigenação deste planeta, ele passou a ter água: princípio de vida. Há fortes indicações de que a vida veio do fundo das águas, porém antes se dera a fitogênese. Segundo Teilhard de Chardin, a zoogênese teve quantíssimas fases, até que, graças à lei de complexidade neurofisiológica, pôde ocorrer a antropogênese: também por Chardin chamada de o passo da reflexão
, que gerou os mais elevados experimentos cósmicos: os humanos.
Os anais sabiam, mas não sabiam que sabiam, pois sua consciência elementar não era reflexa. Assim é que Teilhard (especialmente em sua obra máxima O Fenômeno Humano) não considera a antropogênese apenas um importante passo evolutivo, mas define-a como extraordinário salto qualitativo
até hoje, dizemos, não superado.
Ora, em tal visão, o fenômeno humano é transdimensional; de pronto podemos, para começo mesmo, constatar nos humanos: dimensão somática (soma, corpo), dimensão psíquica (cognição e emoções), dimensão noética (do grego noos: o espírito de cada um) e dimensão pneumática (a que aponta relações de transcendência), essa última filha do livre arbítrio para que seja aceita ou não. Tal transdimensionalidade é que empobrece aspectos da Medicina, da Educação Física – e de vários outros setores de dinâmica profissional, preocupados apenas com a matéria e a dinâmica corporal.
Quisera, nas presentes breves impressões, ter espaço para, não sendo impróprio, comentar os ricos textos que iluminam este livro com suas propostas plenas de aberturas responsáveis. Os leitores verão que textos de inequívoca nobreza fazem parte desta obra coletiva. Desde meus primeiros contatos com a Ciência da Motricidade Humana, os quais se deram nos últimos anos da década de 1980, de certo modo senti
que o motus da motricidade sergiana não se reduzia aos sentidos unicamente materiais de movimento
. Ao ler textos do meu estimado Manuel Sérgio, naquele então pensei em realidades embriogenéticas, fetológicas; pensei no atomismo humano, em seu molecularismo, e em aperfeiçoamentos de tecidos para órgãos com dinâmicas específicas e, sem qualquer dúvida, elevei meu pensamento a neurônios e a capacidades cérebro-corticais. Pensava tudo isso entranhado em realidades socioculturais.
Pois agora testemunho intelectuais sensíveis e capazes advogando aberturas tais, cada autor dos textos que aqui são reunidos trazendo para sua companhia nomes marcantes como Ken Wilber, Edgar Morin, Rupert Sheldrake, Amit Goswami, Basarab Nicolescu e alguns outros, dentre os quais o homem que um dia saiu a semear
(Manuel Sérgio). Para o autor destas impressões
, não pareceu minimamente necessário distinguir tais ou quais textos de outros nesta excelente obra coletiva. Preferi fruir a virtude específica de cada ensaio, para ao fim constatar o quanto esta reunião textual – sem poses desnecessárias – se mostra universal; universal, sim, no sentido ricamente etimológico que dá origem à palavra: UNO VERSUS ALIA – a unidade através da diversidade
, coisa absolutamente fiel à transdimensionalidade humana.
Sem estender-me mais, resta-me