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Esqueletos no sótão: Um Mistério de Marketville, #1
Esqueletos no sótão: Um Mistério de Marketville, #1
Esqueletos no sótão: Um Mistério de Marketville, #1
E-book363 páginas4 horas

Esqueletos no sótão: Um Mistério de Marketville, #1

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Sobre este e-book

Calamity (Callie) Barnstable não fica surpresa ao saber que é a única beneficiária da propriedade de seu falecido pai, muito embora fique chocada ao descobrir que tenha herdado uma casa na cidade de Marketville -um imóvel do qual ela nem sabia da existência. No entanto, existem condições vinculadas à herança de Callie: ela deve se mudar para Marketville, morar na casa e solucionar o assassinato de sua mãe.

Callie não está interessada em desenterrar um mistério de trinta anos, mas se não o fizer, ficará à mercê de uma intrigante vidente chamada Misty Rivers que espera expor, ela mesma, os segredos da família Barnstable. Determinada a frustrar a tal Misty e cumprir os desejos de seu pai, Callie aceita o desafio. Mas será que ela está preparada para enfrentar os esqueletos escondidos no sótão?

IdiomaPortuguês
EditoraBadPress
Data de lançamento28 de out. de 2022
ISBN9781667417288
Esqueletos no sótão: Um Mistério de Marketville, #1
Autor

Judy Penz Sheluk

A former journalist and magazine editor, Judy Penz Sheluk is the bestselling author of Finding Your Path to Publication and Self-publishing: The Ins & Outs of Going Indie, as well as two mystery series: the Glass Dolphin Mysteries and Marketville Mysteries, both of which have been published in multiple languages. Her short crime fiction appears in several collections, including the Superior Shores Anthologies, which she also edited. Judy has a passion for understanding the ins and outs of all aspects of publishing, and is the founder and owner of Superior Shores Press, which she established in February 2018. Judy is a member of the Independent Book Publishers Association, Sisters in Crime, International Thriller Writers, the Short Mystery Fiction Society, and Crime Writers of Canada, where she served on the Board of Directors for five years, the final two as Chair. She lives in Northern Ontario. Find her at www.judypenzsheluk.com.

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    Esqueletos no sótão - Judy Penz Sheluk

    1

    Estive sentada na área de recepção de Hampton & Associados por quase uma hora, quando Leith Hampton finalmente entrou pela porta principal, seu rosto ruborizado, um suave aroma de colônia de sândalo flutuando na sala. Segurava uma maleta preta abarrotada em cada mão e murmurou um pedido de desculpas por uma manhã difícil no tribunal, antes de dar uma enxurrada de instruções a um associado de aparência atormentada. Um goldendoodle abanando o rabo apareceu do nada, e me dei conta de imediato de que o cachorro estivera dormindo embaixo da mesa da recepcionista.

    Leith acenou com a cabeça em direção ao seu escritório, um sinal para que eu entrasse e me sentasse, então me seguiu, jogando as duas maletas em sua mesa. Ele se abaixou para acariciar o cachorro e tirou um biscoito do bolso da calça. Atticus, disse ele, sem olhar para cima. Meu cão de terapia pessoal. Em determinados dias, ele é o único que me mantém são.

    Eu assenti, deslizando-me para uma cadeira mais próxima da janela. Não era um escritório particularmente grande, e definitivamente se podia ouvir algum barulho da rua, buzinas, sirenes, a rotação ocasional do motor de uma motocicleta, mas oferecia uma vista decente da Rua Bay. Observei incontáveis indivíduos de todos os tamanhos, formas e cores possíveis se apressando pela rua, enquanto os ciclistas, completamente insanos na minha opinião, abriam seu caminho para dentro e para fora do fluxo interminável de tráfego congestionado. No coração do distrito financeiro de Toronto, todos estavam sempre com pressa, mesmo que chegar a algum lugar com pressa não fosse possível.

    Atticus fixou residência em uma cadeira junto ao canto, acomodando-se no cobertor que cobria o tecido original da fábrica. Achei graça em pensar que Leith Hampton, um advogado de defesa criminal conhecido por suas pungentes acareações e brutais traquinagens, tanto dentro como fora do tribunal, fosse dono de um goldendoodle, e ainda mais que ao animal lhe fosse permitido ocupar a mobília.

    Depois de uns bons quinze minutos, meia dúzia de consultas com associados de aparência ainda mais atormentada e três telefonemas, todos breves, Leith estava aparentemente satisfeito por ter resolvido o que precisava ser feito e quem o faria. Ele olhou para mim e percebi o que fazia as pessoas gravitarem em sua direção. Não era seu corpo de metro e meio, esguio em sua maior parte, com exceção de uma discreta pança, mas seus olhos; olhos tão azuis, tão intensos em seus olhares, que pareciam elétricos.

    Ele abriu uma gaveta e retirou uma pasta de arquivo de papel manilha junto com um documento fino encadernado em papelão azul claro, as palavras ÚLTIMO TESTAMENTO DE JAMES DAVID BARNSTABLE gravadas em preto na capa. Vamos para a sala da diretoria. Lá não seremos perturbados.

    Aparentemente, Atticus não era permitido na sala de reuniões, visto que ele pulou da cadeira e rolou de volta para seu lugar sob a mesa da recepção, suspirando alto enquanto lançava seu corpo de pelo encaracolado no chão. Segui Leith até uma grande sala sem janelas, na qual havia uma mesa de mogno cercada por várias cadeiras giratórias de couro preto. Selecionei um assento em frente a ele e esperei.

    Leith colocou o testamento à sua frente, alisando uma dobra invisível com uma mão bem cuidada, as unhas mostrando evidências de um polimento vigoroso. Fiquei me perguntando que tipo de homem frequentaria salão de manicure e pedicure, eu estava supondo que também cuidasse dos pés, e cheguei à conclusão de que aquele era o tipo de homem que cobrava seus serviços por quinhentos dólares a hora.

    Diferente de seu escritório, onde havia uma mesa atulhada de papéis, um aquário de água salgada e paredes cobertas com tapeçarias ricamente bordadas, a sala de reuniões era desprovida de desordem ou ornamentação. A única exceção era uma fotografia emoldurada de uma atraente loira de olhos azuis, com seus vinte e poucos anos. Tinha seus braços possessivamente envoltos em torno de duas crianças loiras, com cerca de três e cinco anos de idade.

    Senhora Leith Hampton, a quarta, logo presumi, ou possivelmente a quinta. Eu havia perdido a conta, não que isso importasse. Meu negócio ali não tinha nada a ver com a última esposa troféu do Hampton ou sua prole de dentinhos separados. Eu estava ali para ler o Último Testamento de meu pai, um evento ao qual eu teria ficado muito mais feliz se não tivesse que comparecer tão cedo. Infelizmente, um equipamento de segurança com defeito não impediu sua queda do trigésimo andar de um condomínio em construção. O fato de um advogado de defesa criminal, com a reputação específica de Leith, ter redigido o testamento era uma indicação óbvia do quão longa seria a amizade entre os dois homens.

    Leith limpou sua garganta e olhou para mim com aqueles intensos olhos azuis. Tem certeza de que está pronta, Calamity? Eu sei o quão próxima você era de seu pai.

    Eu vacilei um pouco quando disse Calamity. As pessoas me chamavam de Callie ou nem mesmo me chamavam. Só o meu pai se permitia de me chamar de Calamity, e mesmo assim apenas quando ficava seriamente irritado comigo, e nunca em público. Era um acordo que havíamos feito nos tempos do ensino básico. As crianças já podem ser cruéis o suficiente sem o incentivo adicional de um nome como Calamity (Calamidade).

    Quanto a estar pronta, eu estive pronta pelos últimos noventa e poucos minutos. Estive pronta desde o recebimento da ligação dizendo que o meu pai havia se envolvido em um infeliz acidente de trabalho. Foi assim que havia se expressado a voz indiferente do outro lado do telefone. Um infeliz acidente de trabalho.

    Eu sabia que em algum momento teria que enfrentar o fato de que o meu pai não voltaria para casa, e que nunca mais discutiríamos sobre política ou riríamos juntos, enquanto assistíssemos a um episódio da série The Big Bang Theory. Sabia que um dia me sentaria e choraria muito, mas aquele agora não seria o momento, e certamente não seria o lugar. Há muito tempo aprendi a armazenar o meus sentimentos em compartimentos cuidadosamente construídos. Então, nivelei Leith com um olhar seco e assenti.

    Estou pronta.

    Leith abriu o arquivo e começou a ler. Eu, James David Barnstable, declaro que este é o meu último testamento e também que revogo, cancelo e anulo todos os testamentos e codicilos feitos anteriormente por mim, seja de forma conjunta ou individual. Declaro que tenho idade legal para fazer este testamento e que estou em pleno juízo, bem como que este último testamento expressa os meus desejos sem influência indevida ou coação. Lego a totalidade de meu patrimônio, propriedades e efeitos, para a minha filha, Calamity Doris Barnstable.

    Assenti e tentei ignorar a monotonia do juridiquês do testamento. Não esperava nem mais nem menos. Eu era filha única de dois filhos únicos, e a minha mãe havia muito tempo tinha nos abandonado à própria sorte, meu pai e eu, para que cuidássemos de nós mesmos. Não que a totalidade de sua propriedade valesse muita coisa; alguns móveis desgastados, alguns pratos mal combinados e uma pequena pilha de livros cheios de orelhas, em sua maioria de Clive Cussler e Michael Connelly, com o ocasional John Sandford incluído para qualquer eventualidade.

    A herança significaria limpar a casa de dois quartos do meu pai, um exemplo sombrio da arquitetura dos anos 70, atolada nas entranhas dos subúrbios mais afastados. Pensei em meu já abarrotado apartamento-estúdio, no centro de Toronto, e sabia que a maioria de seus pertences acabaria em algum bazar local. Aquele pensamento me deixou triste.

    Há uma cláusula, Leith disse, arrastando-me para fora do meu devaneio. Seu pai quer que você se mude para a casa em Marketville.

    Eu me endireitei na cadeira e olhei Leith nos olhos. Claramente eu havia perdido algo importante quando estive fora do ar. Que casa em Marketville?

    Leith soltou um suspiro teatral de tribunal, bem ensaiado, mas exagerado para sua audiência de apenas uma. Você não esteve realmente me dando ouvidos, não é mesmo Calamity?

    Fui forçada a admitir que não, embora ele então tivesse toda a minha atenção. Marketville era uma comunidade de viajantes, a cerca de uma hora ao norte de Toronto, o tipo de cidade para onde famílias com dois filhos, um cão e um gato se mudavam em busca de uma casa maior, uma escola melhor e campos de futebol. Não tinha muito a ver comigo ou mesmo com o meu pai.

    Você está dizendo que o meu pai era dono de uma casa em Marketville?! Não entendo. Por que será que ele não morava lá?

    Leith deu de ombros. Parece que ele não suportava se separar do imóvel, e também não suportava a ideia de viver ali. Ele o tem alugado desde 1986.

    O ano em que a minha mãe partiu. Eu tinha apenas seis. Tentei me lembrar de uma casa em Marketville. Nada veio à minha mente. Até mesmo as minhas lembranças sobre a minha mãe eram vagas.

    A casa passou por alguns momentos difíceis, com inquilinos entrando e saindo ao longo dos anos, Leith continuou. Fiz o meu melhor para administrar a propriedade por uma modesta taxa de manutenção mensal, mas não morando nas proximidades... Ele corou discretamente o rosto e me perguntei o quão modesta essa taxa teria sido. Eu olhei de volta para a foto de sua jovem e vibrante família e suspeitei que tais tesouros não seriam baratos. Provavelmente havia também a pensão alimentícia para as demais esposas troféus. Decidi deixar para lá. Meu pai confiava nele. Isso já deveria ser o suficiente.

    Então, você está dizendo que eu herdei uma casa a ser reformada.

    Suponho que você poderia colocar dessa forma, embora o seu pai tenha recentemente contratado uma empresa para fazer algumas melhorias básicas, logo após o último inquilino ter se mudado. Ele folheou suas anotações na pasta. "Royce Empreiteira e Administradora de Propriedades. Presumo que o proprietário da empresa, Royce Ashford, mora bem ao lado. Mas não tenho certeza se muita coisa, ou alguma coisa, foi feita na casa ainda. Naturalmente, todo o trabalho teria parado após a morte do seu pai."

    Você disse que ele queria que eu me mudasse para a casa? Quando ele iria me contar isso?

    Acho que o plano inicial era que o seu pai se mudaria para lá. Mas, claro, agora...

    Agora que ele está morto, você acha mesmo que ele queria que eu me mudasse para lá?

    Na verdade, é mais que um desejo, Calamity. É uma cláusula do testamento que exige que você se mude para a casa Dezesseis do Círculo Boca-de-Dragão, por um período de um ano. Após esse tempo, você está livre para fazer o que quiser com o imóvel. Voltar a alugá-lo, continuar morando lá ou vendê-lo.

    E se eu decidir vendê-lo?

    Casas naquela área de Marketville normalmente são vendidas rapidamente e por um preço decente, certamente várias vezes o investimento original de seus pais, nos idos de 1979. Você teria que colocar mãos à obra em um trabalho árduo, isso sem mencionar algumas reformas básicas, mas o seu pai lhe deixou algum dinheiro para isso também.

    "Tinha dinheiro guardado?! O suficiente para reformas?!" Pensei na velha casa geminada, nos carpetes puídos, no lençol de flanela cobrindo os buracos no tecido do antigo sofá de brocado verde oliva. Sempre pensei que o meu pai era frugal porque assim preferia ser. Nunca me ocorreu que estivesse gastando dinheiro para consertar uma casa que eu nem mesmo sabia que existia.

    Cerca de cem mil dólares, embora apenas metade seja destinada à reforma. O saldo de cinquenta mil seria pago a você em prestações semanais, enquanto morasse lá... sem pagar o aluguel, claro. Certamente seria o suficiente para você tirar um ano de folga do trabalho e cumprir a outra exigência.

    Cinquenta mil dólares. Quase o dobro do que ganhei em um ano inteiro em meu trabalho de telefonista no banco. Sair do emprego definitivamente não seria uma dificuldade. E meu aluguel mensal seria fácil de romper com trinta dias de antecedência. Qual é a outra exigência?

    Leith se recostou na cadeira e deixou escapar outro de seus suspiros teatrais. Tive a sensação de que ele realmente não aprovava tal condição.

    Seu pai queria que você descobrisse quem assassinou a sua mãe. E ele acreditava que as pistas pudessem estar escondidas na casa de Marketville.

    2

    Fiquei boquiaberta, encarando o Leith Hampton. De que diabos você está falando? A minha mãe não foi assassinada. Ela nos deixou quando eu tinha cerca de seis anos. Eu podia não me lembrar claramente da minha mãe, mas ainda tinha claro na mente a maneira como as crianças falavam sobre o ocorrido na escola; seus pais sendo obviamente a fonte de informação. Uma cidadezinha de nada acolhe um novo homem e lhe abre caminhos para uma vida melhor. Até aquele instante eu não tinha ideia de que a fofoca houvesse surgido em qualquer outro lugar que não fosse Toronto.

    Aparentemente, o seu pai passou a acreditar de outra forma, Leith disse, cruzando os braços na frente do peito.

    Isso me surpreendeu. O nome da minha mãe raramente era mencionado durante a minha fase de crescimento. Na maior parte do tempo, parecia até mesmo que ela nunca tinha existido. Minha curiosidade natural sobre quem ela era, e para onde teria ido, sempre esteve longe de ser saciada. As poucas coisas que o meu pai me disse sobre ela, geralmente depois de algumas cervejas, quase não faziam diferença. Que o nome dela era Abigail; que ela gostava de cozinhar; que amava filmes antigos, especialmente musicais dos anos 50.

    Então, você está dizendo que a casa de Marketville nunca fez parte do testamento dele?

    A casa sempre fez parte do testamento e você sempre foi a beneficiária. O codicilo é a parte em que você tem que ir morar na casa por um ano e tentar resolver o suposto assassinato de sua mãe, ou, caso não haja êxito, descobrir a verdadeira razão por trás de seu desaparecimento. Leith balançou a cabeça. Admito que não apoiei a ideia, mas ele insistiu. Eu fiz o meu melhor para dissuadi-lo, mas você sabe como o seu pai pode ser obstinado.

    Sim, eu sabia. Procure teimoso no dicionário e talvez você encontre uma foto de James David Barnstable. Era uma característica que eu havia herdado, junto com seu cabelo castanho desgrenhado e olhos castanhos com contornos pretos. O cabelo que eu poderia alisar até subjugá-lo, bastando produtos suficientes e paciência suficiente com um secador de cabelo e uma chapinha, e os olhos provavelmente seriam a minha melhor característica. Mas o rastro da teimosia quase provou ser a minha ruína em mais de uma ocasião. E do meu pai também. Você sabe o que o levou a essa fixação?

    Eu sei que ele contratou um investigador particular, assim que a sua mãe foi embora, mas não deu em nada. Foi como se ela tivesse desaparecido no ar. Pode ter havido algumas outras tentativas, das quais não estou ciente. Mas foi sua última inquilina na casa de Marketville que reacendeu o fogo.

    Como assim?

    Leith deu uma risadinha seca, mas não havia humor no som. Aparentemente, a inquilina era uma psíquica, ou pelo menos ela afirmava ser. Uma mulher chamada Misty Rivers.

    Como alguém com o nome de Calamity Jane, uma fronteiriça do Velho Oeste, de reputação duvidosa, eu não estava a ponto de criticar nome, sobrenome ou apelido de qualquer outra pessoa. Estava apenas grata que os meus pais tiveram o bom senso de me dar um nome meio diferente. O que essa Misty Rivers fez ou disse para chamar a atenção do meu pai?

    Ela disse a ele que a casa era assombrada por alguém que havia morado lá, alguém que amava lilases.

    E daí, ele chegou à conclusão de que a minha mãe havia sido assassinada?!

    É uma percepção, eu sei. Mas, em um passado ainda mais distante, outra inquilina já havia se queixado de ruídos estranhos. Rangidos no porão, passos no sótão, esse tipo de coisa. Ambos rejeitamos a reclamação, imaginando ser uma tentativa da inquilina de rescindir o contrato de aluguel. Se esse era o objetivo, funcionou muito bem. Ela se mudou antes do prazo, e sem pagar multa alguma.

    Mas, então, depois da psíquica...

    Exatamente. Depois da Misty Rivers, o seu pai não tinha tanta certeza. Quando você saiu da casa de Marketville, ele havia trancado todas as coisas da sua mãe no sótão. Disse que não suportaria dar de cara com as mesmas depois que ela partiu; então, os anos simplesmente passaram. Misty o fez acreditar que poderia haver pistas escondidas entre os pertences de sua mãe.

    Era como se o Leith estivesse falando sobre um estranho. Ele nunca me contou nada disso.

    Ele queria ter certeza, para evitar que você se machucasse. Ele não queria que você acreditasse no que poderia ter sido apenas um conto de fadas.

    Um conto de fadas. Exceto que aquele não parecia ter um final feliz. Fucei em minha bolsa, em busca do meu protetor labial de manteiga de cacau, enquanto pensava a respeito de tudo.

    E o que tem a ver esse papo dos lilases?

    Ao longo dos anos, as pessoas tentaram plantar uma variedade de coisas, flores, uma horta, tudo sem nenhuma medida de sucesso. A única coisa que crescia na propriedade era um arbusto de lilases, no quintal, de forma descontrolada. Não importava quantas vezes fosse cortado, na primavera seguinte voltaria vigoroso e frondoso. Aparentemente, sua mãe o havia plantado.

    Eu revirei meus olhos. Os lilases são conhecidos por sua indestrutibilidade. E seria fácil o bastante para alguém ver um velho arbusto de lilases e chegar à conclusão de que o proprietário original o havia plantado. Outro pensamento me ocorreu. Essa Misty Rivers, ela queria algum dinheiro?

    Leith assentiu, sua expressão era séria. Acredito que o seu pai iria pagá-la para que investigasse. Contra o meu conselho, falando oficialmente. Infelizmente para a senhora Rivers, a morte prematura dele interveio.

    Inacreditável. Meu bom senso não me ajudava muito; um pai trabalhador diligente, cumpridor de suas obrigações sindicais, contratando uma psíquica?! O que ele estaria pensando?

    Foi como se o Leith Hampton tivesse lido a minha mente. Eu sei que é muita coisa de uma só vez, Callie. Tudo que sei é que, nos últimos meses, o seu pai ficou cada vez mais obcecado com o... desaparecimento da sua mãe. Tenho que admitir que não esperava por isso. Todos esses anos, ele se recusou a falar sobre ela, e por um bom motivo.

    Que bom motivo?

    Leith apertou os lábios como se quisesse prender novamente as palavras que havia soltado, ou estivesse a ponto de soltar.

    Que bom motivo, Leith? Eu perguntei, novamente. Se estou partindo para essa caçada ao ganso selvagem, pelo menos preciso saber tudo o que tenho que saber.

    Leith suspirou, mas não houve teatro dessa vez. Suponho que você esteja certa e, além disso, uma vez que você comece a cavar no passado, certamente o descobrirá.

    Eu sei que os advogados são pagos por hora, mas não havia necessidade de arrastar aquele assunto. Inclinei-me para a frente, ficando semiereta, enquanto as minhas unhas batucavam na superfície de mogno polido. Certamente descobrirei o quê?

    Embora o corpo de sua mãe nunca tenha sido encontrado, ninguém nunca a viu ou ouviu falar dela novamente. A polícia suspeitou de crime. Apesar de que o seu pai tenha relatado o desaparecimento dela, ele logo se tornou o principal suspeito. Havia muita fofoca em meio à vizinhança.

    Porque o cônjuge é sempre o primeiro suspeito da polícia, eu disse, pensando nos incontáveis episódios de Lei e Ordem que havia visto ao longo dos anos.

    Exatamente. Eventualmente, a polícia o deixou em paz, mas o caso nunca foi encerrado. O dano que isso causou à reputação do seu pai em Marketville foi... quero dizer, ele simplesmente não mais conseguia permancer ali. Ele também não suportava a ideia de vender a casa. Consequentemente, ficou alugada ao longo dos anos.

    E voltar a tudo isso, agora? Revisitando uma história antiga, abrindo velhas feridas. O que será que ele estava esperando provar?

    Leith deu de ombros. Talvez ele só quisesse limpar seu nome, Calamity. Talvez adicionar o codicilo fosse sua maneira de pedir que você fizesse o mesmo. Eu gostaria que ele tivesse confiado em mim um pouco mais do que confiou. Quando se tratava de questões jurídicas, ele não me tratava como um amigo, ele me tratava como seu advogado. Eu encorajei essa visão de nosso relacionamento.

    Eu trabalho na central de atendimento de um banco. As únicas coisas que sei como investigar são justamente as reclamações dos clientes. Tentei processar tudo o que Leith me havia dito. Você disse que eu precisava me mudar para a casa. E se eu não descobrir nada? E se, como seria totalmente provável, não houvesse nada por descobrir? E se eu encontrasse evidências que envolvessem o meu pai?

    Sua única obrigação é tentar e, claro, morar lá.

    E se eu não quiser?

    Cinquenta mil dólares seriam mantidos em custódia para reformas. Misty Rivers teria permissão para morar na casa de Marketville, sem pagar aluguel pelo período de um ano, com a condição de que investigasse o desaparecimento da sua mãe. Eu receberia relatórios semanais de progresso, pelos quais ela receberia mil dólares... para cada um. O mesmo tipo de relatório de progresso que você deve fornecer, caso concorde em fazê-lo. Todos os cinquenta mil dólares seriam pagos de imediato, caso o mistério do desaparecimento de sua mãe fosse resolvido antes de que termine o ano.

    Relatórios semanais de progresso dizendo o quê? O lilás voltou a florescer?! Eu queria gritar. Em vez disso, perguntei: O que acontece depois de um ano?

    Misty Rivers se muda da casa. Você ficará com a posse total do imóvel, para fazer o que quiser. Sem cláusula alguma.

    Nesse ínterim, alguma psíquica charlatã estaria remexendo nos pertences da minha mãe e morando sem pagar aluguel, provavelmente sem qualquer interesse em limpar o nome do meu pai. Nem a pau, Juvenal!

    Como mencionei antes, sua obrigação cessa um ano a partir da data de sua mudança. Depois disso, você está livre para fazer o que quiser. Vender a casa, continuar morando lá, colocar de volta no mercado de aluguel. Os cinquenta mil dólares para reformas estarão disponíveis a partir do momento em que você se mudar. Quaisquer dólares não usados para reformas estarão, ao término, disponíveis para o seu uso pessoal, sem problemas.

    "E o que será de Misty Rivers?

    Ela já recebeu um adiantamento de cinco mil dólares; você decide se quer fazer uso dos serviços dela. Eu não poderia me imaginar fazendo tal coisa.

    Mas parecia que eu estaria definitivamente me mudando para Marketville.

    3

    O Círculo Boca-de-Dragão era um beco sem saída, dentro de um enclave de casas geminadas dos anos 70. O ocasional imóvel de dois andares pontilhava uma paisagem suburbana não mais que previsível, embora uma inspeção mais próxima revelasse acréscimos de nível superior às estruturas originais.

    Cada estrada dentro da subdivisão tinha o nome de uma flor silvestre provinciana, começando com a artéria central da Avenida lírio-do-campo e se ramificando em ruas laterais simétricas com nomes como Estrada Lírio-de-um-dia, Travessa Sapatinho-de-dama e Semicírculo Margarida.

    Em sua maioria, as casas pareciam ser bem cuidadas, os gramados exuberantes e verdes, as janelas brilhando. Dezesseis do Círculo Boca-de-Dragão, um bangalô de tijolos amarelos, com sua garagem bastante rebaixada, era a única exceção notável. O telhado tinha sido remendado em meia dúzia de lugares, com pouca atenção voltada para uma combinação na cor das telhas. As janelas estavam cobertas de anos de sujeira e areia e, muito possivelmente, alguns ovos de passados Halloweens.

    Dizer que a casa precisava apenas de um grau seria um eufemismo gigante. O que ela precisava era de uma boa camada de fogo.

    Levei um minuto para me dar conta de que um homem havia se aproximado pelo gramado da frente para se juntar a mim. Chutei que ele teria cerca de quarenta, e seria uma espécie de faz-tudo, meio rude mas com uma boa aparência; o tipo de cara que você poderia ver em um daqueles programas de televisão sobre reformas de casas. Bíceps bem definidos, cabelo castanho arenoso e cortado rente ao couro cabeludo, olhos castanhos cálidos. Ele usava jeans, botas de trabalho e uma camisa de golfe preta com um logotipo dourado que anunciava a Royce Empreiteira e Administradora de Propriedades. Imaginei um tanquinho sob aquela camisa e tentei bravamente não ficar vermelha.

    Royce Ashford, disse ele, estendendo sua mão direita. Eu moro na casa ao lado. Ele gesticulou para uma imaculada residência, tijolos cinzas com revestimento de vinil branco. O revestimento parecia novo, a propósito.

    Então, aquele era o empreiteiro que Leith Hampton havia mencionado; o empreiteiro que o meu pai havia contratado.

    Callie Barnstable.

    Você é a nova inquilina? Havia algo na maneira como ele disse isso, uma pitada de lá vamos nós, de novo e coitada implícita nas palavras.

    Pior ainda. Sou a dona deste lugar. Deixei o meu emprego para me mudar para cá.

    Por um breve momento, Royce ergueu suas sobrancelhas em surpresa, mas se recuperou rapidamente. Eu ouvi sobre o acidente dele. Sinto muito. Parecia ser um bom homem.

    Obrigada. Fiquei sabendo através do Leith Hampton, seu advogado, que você conhecia o meu pai.

    "Eu não diria que o conhecia exatamente. Faz apenas algumas semanas que nos encontramos pela primeira

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