Encontre milhões de e-books, audiobooks e muito mais com um período de teste gratuito

Apenas $11.99/mês após o término do seu período de teste gratuito. Cancele a qualquer momento.

Os mortos inocentes
Os mortos inocentes
Os mortos inocentes
E-book317 páginas4 horas

Os mortos inocentes

Nota: 0 de 5 estrelas

()

Ler a amostra

Sobre este e-book

Mark e Bobbie Ware tem a vida perfeita: uma mansão enorme, dinheiro suficiente para satisfazer qualquer necessidade imaginável, e um lindo filho de dez anos.

Mas tudo isso muda quando um homem perturba o mundo perfeito dos Wares ao tirar deles a única coisa mais importante que possuem: a felicidade.

Sem esperanças, ligam para o Detetive Particular Sam Dyke e pedem por ajuda para recuperarem a paz. Para fazer isto, Sam terá que confrontar e derrotar um inimigo que com inteligência incomparável e força de vontade está dedicado a promover a causa da ameaça mais fatal enfrentada pelo mundo nos dias de hoje, o terrorismo.

Caso Sam falhe nesta missão, não apenas os Wares perderão tudo pelo que trabalharam, mas a batalha contra o terrorismo no Oriente Médio se tornará quase impossível de ser vencida.

IdiomaPortuguês
Data de lançamento14 de ago. de 2020
ISBN9781071562635
Os mortos inocentes
Autor

Keith Dixon

Keith was born in Durham, North Carolina in 1971 but was raised in Bellefonte, Pennsylvania. He attended Hobart College in Geneva, New York. He is an editor for The New York Times, and lives in Westchester with his wife, Jessica, and his daughters, Grace and Margot. He is the author of Ghostfires, The Art of Losing, and Cooking for Gracie, a memoir based on food writing first published in The New York Times.

Leia mais títulos de Keith Dixon

Autores relacionados

Relacionado a Os mortos inocentes

Ebooks relacionados

Thriller criminal para você

Visualizar mais

Artigos relacionados

Categorias relacionadas

Avaliações de Os mortos inocentes

Nota: 0 de 5 estrelas
0 notas

0 avaliação0 avaliação

O que você achou?

Toque para dar uma nota

A avaliação deve ter pelo menos 10 palavras

    Pré-visualização do livro

    Os mortos inocentes - Keith Dixon

    Translated by Milena Gimenes

    PRÓLOGO

    QUANDO O CARRO parou abruptamente, levantou os olhos do iPad e observou o que estava acontecendo pela janela da frente.

    Sabia que estavam perto de casa porque ele reconheceu as sebes e a curva da rua que seguia adiante. Mas o carro não costumava parar aqui. Não havia trânsito para segurá-los. E não era hora ainda das vacas se reunirem em rebanho ao longo da estrada atravessando de um pasto para o outro, o fazendeiro com a cara avermelhada balançando um longo cajado espantando-as atrás. Aquilo não aconteceria até daqui a uma hora.

    Não havia nenhuma vaca, mas sim um carro preto parado atravessado na estreita faixa. Ele viu que as portas estavam abertas como se o motorista tivesse descido para ir até algum lugar e estaria de volta daqui alguns minutos.

    Desligou o iPad e fechou a capa.

    Harris, o chofer, apertou um botão e ouviu-se um forte clique, todas as portas do veículo travaram.

    Os olhos de ambos se encontraram no retrovisor e os de Harris moveram-se rápido em direção à janela traseira.

    — Merda — exclamou.

    Então, notou que um homem havia aparecido ao lado da sua porta. Não conseguia ver muito bem, mas viu que o homem estava usando luvas pretas. Outro homem estava parado em frente ao carro. Usava alguma coisa no rosto, uma máscara de lã. O homem na frente estava apontando uma arma para Harris, pelo vidro. Então, abaixou e atirou em um dos pneus. O carro balançou.

    O homem levantou a arma de novo e balançou duas vezes, apontando para a lateral do carro.

    As portas destravaram e Harris desceu. Andou em direção ao homem com a arma.

    Então, de repente, a porta abriu com força e uma mão apareceu segurando seu ombro, puxando-o do banco de trás.

    O homem cheirava como um cesto de roupas sujas e era alto.

    Mas todos pareciam altos do seu ponto de vista.

    Havia apenas dez anos de idade.

    CAPÍTULO UM

    CINCO MINUTOS depois de ter passado pelos portões de entrada, finalmente era possível ver a casa.

    Apesar de que chamar isso de casa era como chamar o Palácio de Buckingham de cabana. A entrada pela qual estava passando fazia uma curva em um grande arco entre arbustos largos e podados à mão, levando em direção ao jardim em círculos, com o chão coberto por pequenas pedrinhas decorativas. A fonte de pedra padrão, dois cupidos entrelaçados, ficava no meio do círculo, esquecida como a Grécia Antiga. A mansão propriamente dita era uma imitação vitoriana, mas uma imitação de alta classe. Um conjunto de janelas de três andares refletiam o céu e as nuvens rastejando, enquanto de um lado, uma grande estufa de laranjas, o teto branco em forma de domo, parecia ser conectada ao prédio principal por meio de uma complexa rede de trepadeiras e heras. O lugar parecia bem cuidado, mas não particularmente bem amado.

    Ao me aproximar, comecei a ver mais do outro lado da casa, que seguia em direção à uma edificação diferente com mais um conjunto de janelas quadradas do mesmo tamanho, algumas delas abertas para ajudar a refrescar o calor de matar que estava fazendo. Em outras janelas, consegui ver refletido os topos das construções agrupadas em volta do jardim atrás da casa. Talvez fossem as acomodações para os funcionários ou garagens, ou estábulos ou, pelo que sei, campos de trabalhadores temporários que moem sem um objetivo definido, esperando para ser libertos, cuidando dos jardins ou realizando outras tarefas entediantes.

    Já havia visto o local de cima, pelo Google Earth, e a mansão aparecia como um tijolo maciço, um lugar cercado por gramados abertos em frente e florestas desconexas na parte de trás. Também encontrei a propriedade listada em uma imobiliária local, onde o preço pedido era de 5,5 milhões de libras. Até mesmo para Prestbury, a joia valiosa do Noroeste, isso era caro demais. Me pergunto o porquê do dono, Mark Ware, estar vendendo. Será que ficou sem dinheiro? Ou ficou entediado com todo o verde? Era uma pergunta que preferia não fazer, ninguém me pagava para ser mal educado com os clientes.

    Parei o carro e desci, então fiquei em pé por um momento, alongando, virando para olhar pelo teto do veículo além dos muros baixos, deixando meu olhar ir longe por meia milha de canteiros de flores e relva pela longa estrada. Não havia tráfego por ali: menos de duas milhas de distância de Prestbury, era isolado, grama cortada, um paraíso particular. Prefiro a ideia de estar separado das pessoas. Ultimamente tenho ficado muito próximo a elas. Não tem me feito muito bem.

    Atravessei as pedrinhas até a imensa porta da frente e por dois minutos procurei por uma corda que quando se puxava, parecia tocar a campainha em algum lugar lá dentro. O sol bateu na parte de trás do meu pescoço e me senti esquentando como uma lagosta em água fervente: não havia para onde ir, mas esperava pelo melhor.

    A porta foi aberta silenciosamente por uma mulher asiática vestindo um blazer azul e saia, o cabelo preso em um coque no topo da cabeça dela. Parecia ter 40 anos, mas sou bem ruim em adivinhar a idade das mulheres. Acho que os lábios fizeram uma expressão amarrada antes mesmo de ter aberto a porta, e minha aparência atual não ajudou a melhorar a situação.

    Levantou o queixo olhando em minha direção.

    — Pois não?

    — Meu nome é Sam Dyke. Estou aqui para ver Mark Ware.

    — Tem hora marcada?

    — É um caminho bem longo para se dirigir sem marcar uma hora.

    A carranca era incansável.

    — Espere aqui.

    A porta se fechou e continuei fervendo no sol. Minha paciência era pouca para pessoas ricas com empregados, apesar de naturalmente, não ser culpa dela. Algumas vezes, no entanto, os empregados parecem pensar que má educação era necessária para manter o ego das pessoas ricas.

    A porta abriu novamente e a mulher deu um passo para trás.

    — Entre, por favor.

    Entrei e depois de um momento, parei abruptamente. Minha boca havia provavelmente aberto quando vi o tamanho da casa e a imensidão do corredor em frente. Azulejos preto e branco estendiam-se em direção à uma parede de painéis na qual estavam quatro portas, duas delas fechadas. Um armário de carvalho enorme com meia dúzia de portas, e o que parecia ser algumas centenas de prateleiras, ficava à direita. À esquerda, uma escada em curvas detalhada seguia primeiro até um mezanino ou sacada, não sei o termo técnico, antes de fazer uma parada e continuar para cima até outro andar escondido da minha vista. Diversas pinturas à óleo em telas enormes pendiam das paredes do mezanino. Não eram representações de ancestrais esquecidos no passado, mas aparentemente paisagens modernas repletas de redemoinhos e traços. Havia mais cômodos lá em cima e consegui ver tetos altos e lustres imensos de vidro.

    A mulher asiática ficou me olhando, observando minha reação, talvez aproveitando um pouco a magnificência.

    — Siga-me, por favor — finalmente disse, e andou em direção à escada.

    Nossos passos ressoaram nitidamente nos azulejos até que alcançamos a escada, onde o ruído foi abafado pelo denso carpete. No topo do primeiro lance de escadas, ela me guiou pelas pinturas modernas e ao longo do mezanino, virando à esquerda, abriu uma porta de painéis que era pelo menos duas vezes maior do que ela.

    Entramos em uma sala ampla, pintada principalmente em branco, e mobiliada com cadeiras de couro cor creme de aparência cara e sofás. Um piano de cauda ficava no canto mais distante, a tampa aberta com o tradicional conjunto de fotografias organizadas em cima da superfície brilhante, e uma televisão de cinquenta polegadas na parede.  De onde eu estava, parecia tão grande quanto um selo.

    Mais fotos estavam dispostas na parede entre duas portas francesas abertas que davam para uma extensa sacada. Mas essas fotografias eram diferentes, do tipo que se paga um profissional para tirar de você e seus filhos na frente de um fundo branco, divertidas, engraçadas, capturando um momento em suas vidas que talvez nunca mais acontecerá.

    Eu não havia nenhuma fotografia desse tipo. Quando estava crescendo, essas ostentações divertidas eram consideradas um capricho e exclusivas à classe média. Olhando as fotos do casal jovem, o homem era bonito, mas já com cabelos grisalhos dos lados. A mulher, uma belezinha loira com grandes olhos azuis. A criança, com sete ou oito anos, encarando a câmera. Senti uma ânsia de inveja e uma crescente sensação de desgosto que era perfeitamente injusta. Esses eram meus clientes, e esse era o filho deles. Não havia o porquê sentir esses sentimentos de forma alguma sobre eles.

    Devia ter continuado dizendo isso para mim mesmo.

    CAPÍTULO DOIS

    A MULHER ASIÁTICA estava me acompanhando ainda. Deu um passo para trás e fez um gesto de por favor, sente-se com a mão.  Esperou até que me acomodasse como um sultão em um dos dois sofás brancos antes de se virar e sair da sala, fechando a porta.

    Estava lá por causa da rápida ligação na noite passada, exatamente ao sair do meu escritório. O homem no telefone se apresentou como Mark Ware e então perguntou se eu sabia quem era ele.  Depois, tive a impressão que apenas concordou em me encontrar porque eu não sabia a reposta para aquela questão. 

    Cercado, agora, por essa extravagante exibição de prosperidade, disse a mim mesmo que deveria de fato conhecer ele. Empresário local ambicioso, CEO da Denning Electronics, fornecedores de sistemas complexos de contramedidas ao Ministério da Defesa e agências paralelas em todo o mundo. Alguns anos atrás, aos quarenta anos, foi chefe da companhia, tendo crescido rapidamente pelos ranks em uma pequena, mas dinâmica companhia farmacêutica localizada em Londres. Provavelmente tem dado um bom extra, o qual provavelmente pagou por essa almofada, e um salário que poderia ter mantido um pequeno país da África bem estabilizado por vários anos. 

    Dizer que estava surpreso pela ligação dele seria um eufemismo. Achei que existissem pessoas para fazer isso por ele. Até mesmo essas pessoas teriam subempregados para falar com subalternos como eu.

    Então, quando descobriu que não reconheci o nome, me convidou para falar com ele. Não disse o porquê, mas sabia que era urgente. Consigo resistir a qualquer situação, exceto quando é algo de urgência com um cliente rico.

    Embora agora estivesse perplexo com os frutos do seu trabalho, estava sentindo um pouco de refluxo ácido no estômago. Quando trabalhei como fiscal na Customs & Excise, como era conhecida então, visitei casas de traficantes de droga o suficiente. Não diria que eles têm tanto dinheiro quanto o Ware, mas seja quanto for, estão nadando nele. Exibicionismo parece ser uma droga mais viciante que heroína quando o dinheiro entra no seu organismo. Não me fez muito bem, então ainda hoje isso não me traz nada de bom.

    Fui despertado dessa crise filosófica quando a porta abriu de novo e fiquei em pé, como resposta automática.

    O homem da fotografia em família feliz entrou. Era mais velho, mais grisalho e não parecia feliz.  Esboçou um sorriso amarelo e estendeu a mão, que apertei.

    — Mark Ware — se apresentou — Desculpe fazê-lo esperar.

    — Sam Dyke. Sem problemas.

    Corpo de atleta e musculoso, parecia com um ator de televisão, alguém que começou apenas como um rosto bonito, mas resistiu e adquiriu caráter ao longo do tempo.  Usava jeans de alta costura e um pulôver da Dolce & Gabbana. Seja o que for que estava incomodando-o, não interferiria em seu senso de estilo.

    — Sr. Dyke, obrigada por vir. Por favor, sente-se.

    Sentados em lados opostos do sofá cor creme, nos virando meio sem jeito frente a frente. O ar de total controle insinuado pela linguagem corporal dele era quase palpável. Me senti como se o jardineiro estivesse sendo questionado sobre como estavam as rosas.

    — Se você não soubesse quem sou ontem à noite, eu diria que você fez sua pesquisa agora. Não é mesmo? — Começou dizendo.

    — O google é o melhor amigo do detetive.

    — Então você sabe a minha posição e o que eu faço. Não que isso faça alguma diferença para essa conversa, percebi isso.

    — Sobre o que é essa conversa, Sr. Ware?

    — Só queria ser objetivo. Sem mal entendidos. O meu ponto forte como líder sempre foi a clareza, pelo menos é o que as pessoas dizem. Embora, claro, elas possam estar só puxando meu saco mesmo.

    — É um costume bem recorrente em grandes empresas.

    — Claro, você sabe do que estou falando, depois de ter trabalhado para a Excise.

    Acho que ele percebeu o olhar de surpresa que apareceu em meu rosto e explicou de forma paternal:

    — Também sei usar o Google. Na maior parte do tempo estou rodeado de pessoas que fazem o que eu quero sem fazer perguntas. É ótimo, mas neste momento, isso é irrelevante. Preciso de alguém competente... e discreto.

    — Sou tão competente quanto me permitem ser e discreto com qualquer pessoa. Sr. Ware, poderia me dar uma pista sobre o que está acontecendo?

    — É só que...

    — O quê?

    — Não conheço você. É difícil falar sobre isso.

    Levantei.

    — Me avise quando tiver coragem suficiente de contar.

    — Não, por favor.... — Olhou para mim, o rosto agora em agonia. — Vou te contar, claro que vou contar. Por favor, sente-se.

    Não havia intenção nenhuma minha de realmente ir embora, mas, às vezes, você precisa forçar um pouco. Os clientes normalmente estão com vergonha ou se sentem culpados ou acham difícil de se abrir com um estranho. Algumas vezes você tem que provar para eles que o seu tempo é valioso.

    Sentei-me novamente e houve uma pausa, não interrompi dessa vez. Por fim, ele se afastou e ficou encarando uma das janelas francesas que estava aberta. O dia estava quente e o céu, azul, mas pude perceber que isso não significava nada para ele. Os enormes jardins e a casa superficiais podiam ter sido feitos de palitos pela força que eles pareciam ter.

    — Tenho um filho, Sr. Dyke. Lucas. Dez anos de idade. Adora fazer uma bagunça. Você tem filhos?

    — Um garoto.

    Balançou a cabeça, e então pegou um pedaço de papel do bolso.

    — Provavelmente devia ter guardado isto num lugar mais seguro, mas não consegui parar de carregá-lo comigo. Pensei que talvez alguma coisa poderia ter mudado na próxima vez que olhasse.

    Me entregou o papel. Era uma folha de papel quadriculado arrancada de um livro comum que as crianças usam na escola. De um lado, estava escrito:

    Entraremos em contato. Sem polícia, se você quiser ele de volta. Vá para o trabalho. Não fale nada.

    Ware me observou terminar de ler o bilhete e virar.  Não havia nada escrito no verso.

    — Dois dias atrás Lucas estava voltando para casa da escola — comentou. — Nosso motorista o havia buscado e estavam só a oitocentos metros daqui quando encontraram um carro estacionado no meio da rua. Harris, o motorista, parou e outro carro apareceu atrás dele. Parecia ser um homem em cada carro. Um deles atirou no pneu dianteiro e tirou Harris do carro. O outro, agarrou Lucas no banco de trás. Eles entregaram ao Harris esse bilhete e o fizeram andar de volta.

    — E você não contou a ninguém?

    Arquejou e gesticulou em direção ao bilhete.

    — Você contaria? Se fosse o seu filho?

    — Harris pode descrever os homens? Alguma coisa estranha sobre o carro, os sequestradores?

    — Harris é um ótimo profissional, ex-policial, trabalhou na polícia metropolitana de Londres. Mas não havia nada. As placas dos carros estavam cobertas. Os homens haviam estatura média e eram fortes, usavam máscaras, luvas e óculos escuros. Não disseram nada, fizeram tudo apenas gesticulando.

    — Que horas eram? Onde você estava?

    — Eu te falei, foi depois do fim das aulas. Recebi a ligação de Harris lá pelas quatro e quinze da tarde e ele veio direto para casa. Minha esposa estava voltando também.

    — Você tem um motorista, mas ele não estava levando nem você, nem sua esposa? Ele só leva e busca Lucas na escola?

    Ware ficou exasperado e sua cara mudou de cor.

    — Eu estava em uma reunião em Manchester que estava marcada para terminar depois das seis da tarde. Minha esposa estava no cabelereiro. Ela normalmente busca o Lucas na escola, mas ela não queria perder o horário do salão, e Harris estava disponível porque estava esperando até a hora da reunião acabar para me buscar. Ele teria trazido Lucas para casa e depois dirigido até Manchester mais tarde.

    — E deixaria Lucas com a mulher que me recebeu.

    — Sra. Chau, isso mesmo. O Lucas não precisa muito de supervisão contando que ele tenha seu iPad e uma TV.

    Encostei no sofá e olhei para as fotografias de família na parede me encarando. Pareciam tirar sarro da situação em que os Wares estavam passando.

    — O que você quer que eu faça? — Perguntei, enfim. —  Você sabe qual é o meu conselho.

    Abaixou os olhos.

    — Vá até a polícia. Conte tudo a eles.

    — Algumas razão para não fazer isso?

    — Que tal o fato de estarmos assustados para caramba que alguma coisa possa ter acontecido com Lucas? É o suficiente?

    — Talvez já tenha acontecido. Senão, a polícia é ainda a sua melhor opção. Recursos, agentes, contatos. Eu estou sem nada.

    — Minha pesquisa diz que você lidou com alguns casos de alto nível nos últimos meses.

    — Estou lisonjeado. Sucesso não vem de graça. O bilhete diz sem polícia, isso pode me incluir, se você generalizar a definição.

    — Minha esposa quer fazer alguma coisa, qualquer coisa. Foram dois dias de inferno para ela, para mim também, é claro. Nós não dormimos, mal comemos. Só estamos esperando.

    Suspirei.

    — O que eles querem?

    — Quem?

    — Os sequestradores. É dinheiro? Você tem sobrando aqui.

    — O que mais poderia ser?

    — Influência. Uma decisão feita em nome de alguém. Em favor de alguma pessoa.

    Olhou para mim, observando meu rosto. Quando falou, parecia em dúvida, como se a ideia não tivesse lhe passado pela cabeça.

    — É possível que seja isso?

    — Estão fazendo você esperar porque não estão atrás de dinheiro. Talvez tenha outra coisa na lista de desejos deles. Alguma grande decisão que você tenha que fazer? Pelo que investiguei, sua empresa fornece equipamentos para a maioria das empresas de segurança do oeste. Subcontratam trabalho, novos contratos a serem elaborados, oferta de trabalho a empresas menores para competirem... coisas desse tipo?

    Ele balançou a cabeça com confiança, excluindo a possibilidade.

    — Nada. O plano de preparação para os próximos dezoito meses já está finalizado. Não havia nada pelos outros seis meses.

    Levantei-me e fui olhar por uma das janelas francesas abertas. Como esperava, a vista era surpreendente, o jardim encobria o chão em pequenas lombadas e desníveis de cor, a forma era definida por árvores ou caminhos em arco ou por muros de tijolo rústico baixo. Além disso, do outro lado da estrada onde Lucas havia sido raptado, o campo de Cheshire continuava na sua progressão majestosa, verde e profuso e sem problemas, um rebanho ocasional de vacas pontuando o verde como salpicos de tinta. 

    Era um mundo de natureza, e mesmo embora bem escondida, uma violência incorruptível espreitava logo abaixo da superfície. Evidentemente, Mark Ware e a sua mulher não esperavam que ela aparecesse na porta da frente e abraçasse seu filho com as mãos ásperas e descuidadas.

    Enquanto pensava nisso, a porta atrás de mim se abriu de novo e me virei para encontrar a mulher mais bonita que já havia visto na vida andando em minha direção.

    CAPÍTULO TRÊS

    AS FOTOS NA parede não lhe faziam justiça. Capturaram os ângulos planos de seu rosto e o brilho intenso de seus olhos, azul como o mar da Grécia, mas as lentes da câmera não conseguiam capturar a elegância com a qual as diferentes partes haviam sido encaixadas. Os ligamentos, as delicadas articulações, a precisão com que o pescoço conectava a clavícula com a mandíbula, a pele tensionada como se estivesse movendo pela sobrancelha descendo pelas bochechas até o queixo delicado.

    Ela era uma obra-prima da genética. 

    Hoje, seu cabelo loiro estava preso no topo da cabeça e usava um batom rosa claro.  Sem brincos, somente uma aliança em seu dedo.  Uma blusa branca simples e calças de cor creme claro.  Nenhuma ostentação.  Não precisava chamar atenção, era impossível desviar o olhar.

    E este era um dia ruim. 

    Apertei a mão pálida que me estendeu. 

    Então, me perguntou.

    — Sr. Dyke, muito prazer, Roberta Ware.  Todo mundo me chama de Bobbie. Então, pode nos ajudar? 

    Mark Ware ficou estático. Ele parecia se sentir diminuído pela presença da mulher, como se a própria energia de vida dela reconhecesse uma força mais forte. 

    — O Sr. Dyke acha que seria melhor contar à polícia — disse. 

    Ela me encarou de cima a baixo. 

    — Isso é impossível. Você leu o bilhete. 

    — Mesmo assim, você me chamou. 

    — Eu estou fora de mim. Tive que fazer isso. Se chamar a polícia é a única opção em que você consegue pensar, não precisamos da sua ajuda.  Sinto muito que teve que vir até aqui.

    — Eu disse que a polícia era a melhor solução para o problema.  Não disse que eles eram

    Está gostando da amostra?
    Página 1 de 1