Estudos do lazer: uma introdução
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Estudos do lazer - Nelson Carvalho Marcellino
prefácio à 2ª edição
Àprimeira vista pode soar pretensioso abordar, em poucas páginas, temas tão diferentes e complexos como conteúdo do lazer, patrimônio urbano e qualidade de vida, lazer da criança e da terceira idade, férias, carnaval, turismo, biblioteca, televisão e outros tantos que compõem este livro, já em sua segunda edição, de autoria do professor Nelson Carvalho Marcellino, docente e pesquisador do Departamento de Estudos do Lazer, da Faculdade de Educação Física da Universidade Estadual de Campinas (FEF/UNICAMP).
No entanto, é justamente nessa amplitude temática que reside o interesse de Estudos do lazer: uma introdução: trata-se de uma compilação de alguns dos artigos escritos pelo autor entre abril de 1987 e abril de 1988 no jornal Correio Popular, de Campinas (SP), sobre a questão do lazer na sociedade contemporânea.
São 39 textos curtos (entre duas páginas e duas páginas e meia cada um), cujo maior mérito está em mostrar as múltiplas facetas e consequências de um assunto que, a despeito de estar presente, de uma forma ou outra, na vida de todos, ainda é pouco valorizado como objeto de reflexão. O lazer, justamente pelo fato de ser um tema tão familiar, termina sendo alvo de considerações que raramente ultrapassam o senso comum, numa perspectiva na maioria das vezes meramente consumista.
O livro do professor Marcellino certamente contribuirá para enriquecer esse debate, pois situa a discussão no quadro de processos sociais mais amplos, característica que o torna de interesse como texto introdutório para cursos e disciplinas em que o lazer faz parte do currículo.
O público que pode beneficiar-se com a leitura de Estudos do lazer: uma introdução, porém, não se limita à academia: profissionais comprometidos com a prática do lazer, em órgãos públicos e privados, assim como educadores, planejadores e outros poderão encontrar nos diferentes capítulos do livro sugestões que permitirão ampliar o alcance de suas atuações nos respectivos campos de trabalho.
Essa particularidade de poder atingir leitores de áreas diversificadas é resultado de uma rara combinação: estilo leve, jornalístico, sem ceder à simplificação ou vulgarização dos temas tratados. Dessa forma, aquilo que inicialmente aparecia como um propósito pretensioso – abordar uma variada gama de aspectos em pouco espaço – terminou sendo o ponto forte do livro do professor Marcellino: o que se propõe é mostrar um quadro, apontar uma direção e assim incentivar os aprofundamentos que certamente se fazem necessários.
José Guilherme Cantor Magnani
Departamento de Antropologia, FFLCH/USP
introdução
De abril de 1987 a abril de 1988, tive ocasião de publicar, no suplemento Lazer & Turismo, do jornal Correio Popular (Campinas-SP), uma série de 55 artigos, abordando assuntos variados, relativos à teoria do lazer. O objetivo era divulgar, por meio de uma linguagem acessível ao grande público, os resultados de pesquisas e reflexões sobre o lazer das populações contemporâneas, das sociedades urbano-industriais.
Os textos, de forma seletiva, passaram a ser utilizados, em apostilas ou separadamente, como material de apoio das discussões efetuadas em sala de aula de cursos de segundo grau, e mesmo nas disciplinas introdutórias dos estudos do lazer nos cursos de graduação nos quais vêm sendo ministradas, caso de educação física, turismo, terapia ocupacional etc.
O objetivo deste livro é procurar atender à demanda citada, além do leitor não matriculado em cursos, mas que tenha interesse nos conhecimentos específicos dessa área. Não se busca fornecer elementos originais ao debate acadêmico; procura-se atender à necessidade de textos que possam servir como ponto de partida de discussões e aprofundamentos, em sala de aula.
Para tanto, foram selecionados e atualizados 39 textos, de linguagem bastante simples, curtos, procurando cobrir os diferentes aspectos da teoria do lazer: os elementos necessários à sua conceituação, os conteúdos culturais que envolve, as relações com as demais esferas de ação humana, as barreiras para o seu desenvolvimento na nossa sociedade etc.
São pequenas amostras da riqueza que a discussão da temática do lazer envolve. Cabe aos professores, em contato com os colegas de outras disciplinas, e em conjunto com os alunos, definir os pontos a serem estudados, não só a partir dos textos, mas da realização de atividades de lazer, envolvendo a escola e a comunidade próxima, por exemplo.
Nos textos não são colocadas as referências bibliográficas, nem mesmo das pesquisas, que são genericamente abordadas. Preferi adotar essa postura em virtude das características introdutórias, e para facilitar a leitura.
Ao final, coloco indicações bibliográficas, restritas a livros que abordam o assunto em termos gerais e são de fácil aquisição ou consulta nas bibliotecas.
Aqueles que se interessarem pelo aprofundamento terão nas bibliografias dos livros indicados excelente material para continuidade dos estudos.
Fico à disposição para a rica troca de críticas e sugestões.
Nelson Carvalho Marcellino
Inverno de 1996
estudos sobre lazer
Como todas as questões que envolvem a vida social do homem, a do lazer também tem antecedentes bastante longínquos, em termos de reflexão. O ócio, o não trabalho, foi motivo de preocupação para uma série de nomes da filosofia social. Mas é sobretudo a partir do advento da chamada sociedade industrial
que a importância do lazer foi ganhando terreno na produção dos pensadores sociais do século XIX.
É na Europa, motivado pelas condições do trabalho industrial, as quais desrespeitavam o mínimo da dignidade do ser humano, que surge o primeiro manifesto
a favor do lazer dos operários, o clássico O direito à preguiça, do militante socialista Lafargue, publicado em 1880. Mas foi preciso esperar até as primeiras décadas do século XX para que se desenvolvesse o estudo sistemático da questão do lazer, tanto nos Estados Unidos, quanto na Europa. No pós-guerra, as investigações sobre o lazer ganharam uma nova dimensão, em virtude do próprio contexto histórico. Anteriormente, no entanto, a questão já havia sido analisada por filósofos como Bertrand Russel, que em 1932 publicava o seu Elogio ao lazer, Huizinga, com o Homo ludens, de 1938, ou Veblen, do clássico Teoria da classe ociosa, que data do início do século.
A partir dos anos de 1950, o lazer passa a ser objeto de estudo sistemático nas modernas sociedades urbano-industriais, quer capitalistas, quer socialistas. Dentre vários trabalhos publicados, destacaram-se pela sua repercussão os de David Riesman (A multidão solitária), Friedmann (O trabalho em migalhas) e Mills (A nova classe média white collar).
Mais recentemente, com ênfase nas três últimas décadas, alguns autores vêm se dedicando, quase que exclusivamente, ao assunto, estudado de uma perspectiva geral. Dentre eles, destacam-se Parker, Kaplan, Grazzia, Fourastié, e o sociólogo francês Joffre Dumazedier, este último de grande influência sobre pesquisas e trabalhos realizados no Brasil, com várias obras traduzidas, entre as quais: Lazer e cultura popular e Valores e conteúdos culturais do lazer.
Os estudos brasileiros
Pelo menos cinquenta anos separam o desenvolvimento dos estudos sobre o lazer na Europa e no Brasil. Lá, o contexto histórico que propiciou o interesse maior por essa questão está diretamente relacionado ao processo industrial. Aqui, muito embora também possa ser verificada a mesma relação, o assunto encontra-se mais vinculado à urbanização da vida nas grandes cidades.
A questão do lazer é motivo de preocupação recente entre os pensadores e pesquisadores brasileiros, bem mais nova, por exemplo, do que a fama de