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Pedagogia da animação
Pedagogia da animação
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E-book188 páginas3 horas

Pedagogia da animação

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Sobre este e-book

Destinado a educadores, o autor sugere nesse livro uma reconsideração das bases da Educação, propondo que esta redescubra suas origens na alma – parte imaterial do homem. Alma, anima – Animar: fazer vibrar a alma.
Nessa linha de pensamento, recuperar a alma é sair desse abismo de alienação em que nos encontramos e perceber nosso direito ao prazer.
Daí, tanto a poesia quanto o brinquedo tornam-se manifestações da utopia de um mundo melhor a ser construído, de um mundo em que a competência e o poder estejam a serviço do prazer.
Do prefácio de Rubem Alves. - Papirus Editora
IdiomaPortuguês
Data de lançamento7 de jun. de 2017
ISBN9788544902479
Pedagogia da animação

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    Pedagogia da animação - Nelson Carvalho Marcellino

    PEDAGOGIA DA ANIMAÇÃO

    Nelson Carvalho Marcellino

    >>

    A coleção Fazer/Lazer publica pesquisas, estudos e trabalhos técnicos fundamentados em teorias, ligados ao fazer profissional, no amplo campo abrangido pelas atividades de lazer, entendido como manifestação cultural contemporânea, que ocorre no chamado tempo livre.

    SUMÁRIO

    PREFÁCIO

    Rubem Alves

    INTRODUÇÃO

    1. ALGUNS SINAIS PARA UMA PROPOSTA UTÓPICA DE EDUCAÇÃO: O LAZER COMO ESPAÇO PARA O LÚDICO

    O jogo das palavras

    A busca da possibilidade ausente: O espaço para a manifestação do componente lúdico da cultura

    Denúncia criativa e participativa: Alguns sinais para a proposta utópica

    2. LAZER E INFÂNCIA: O FURTO DO LÚDICO – IMPLICAÇÕES PARA O PROCESSO EDUCATIVO

    O lazer e a cultura da criança

    A igualdade provocada pelo furto do lúdico

    Mercadorias: O furto como álibi

    Evasão do real para um novo real

    O des-respeito à cultura da criança

    A contribuição da escola

    3. PROPONDO UM NOVO JOGO

    Negação da escolarização?

    Buscando novas referências: A pedagogia da animação

    Mais uma inovação educacional?

    Sobre a dimensão utópica da pedagogia da animação, ou para caminhar é preciso tirar os pés do chão

    CONCLUSÃO

    ... É A ÁGUIA UM SOL QUE CAI, OU ENTÃO O SOL É UMA ÁGUIA QUE SOBE

    NOTAS

    BIBLIOGRAFIA

    SOBRE O AUTOR

    OUTROS LIVROS DO AUTOR

    REDES SOCIAIS

    CRÉDITOS

    PREFÁCIO

    Meditação sobre a Alma e a Educação

    Competência.

    Era isto que não faltava ao operário.

    Aprendera, na escola da vida,

    a empilhar tijolos, com pá, cimento e esquadria e assim

    erguia casas, onde antes só havia chão,

    "... uma casa aqui,

    adiante um apartamento,

    além uma igreja, à frente

    um quartel e uma prisão..."

    Competente: operário que sabia exercer a profissão...

    (Vinicius de Moraes, O operário em construção)

    Haverá, por acaso, coisa mais importante a se ensinar? Competência.

    Competência é quando o corpo, esquecido de tudo o mais, vira instrumento, ferramenta. Nos seus músculos e pensamentos mora o conhecimento que é preciso para se construir o que se deve construir. Não é assim que se faz o mundo? O operário aprendera bem. Esquecido de si mesmo, seu corpo se misturara aos tijolos, cimento e paredes. Operário competente, ferramenta boa, como a pá, o prumo, a esquadria. Competente e útil. Utensílio. Precisado. Procurado. Empregado. Contratado. Marx diria: mercadoria...

    Mas uma coisa ele não sabia: que quanto mais sua competência crescia, crescia também a sua alienação.

    Alienação.

    Não ser mais de si mesmo.

    Pertencia a outro.

    Seu corpo competente não era seu.

    Havia se esquecido do seu próprio Desejo.

    Empregado, era competência comprada por um Outro, estranho, por um salário. E assim ele

    tudo desconhecia

    de sua sagrada missão:

    não sabia, por exemplo,

    que a casa de um homem é um templo,

    um templo sem religião,

    como tampouco sabia

    que a casa que ele fazia

    sendo a sua liberdade

    era a sua escravidão.

    Mas como pode ser isto, que da competência nasça a escravidão?

    Foi Marx quem o explicou, num dos seus manuscritos de 1844, sobre trabalho e alienação. Dizia ele que quanto mais trabalha o operário, mais se expande, ao seu redor, um mundo que lhe é estranho, posse do Outro que o empregou. Alienação é isto: construir, com a própria competência, um mundo que não é o seu. E é por isto que o trabalho, podendo ser liberdade, pode ser também escravidão.

    Nada sabia sobre a sua missão.

    Missão? Que é isto? Quem o diz?

    Donde surge? Donde brota?

    Onde estará inscrita?

    Pobre operário: não sabia sequer ler a escritura gravada no tijolo e no pão.

    De fato, como podia

    um operário em construção

    compreender por que um tijolo

    valia mais que um pão?

    Tijolos ele empilhava,

    quanto ao pão, ele comia...

    Cegueira. Alienação...

    Não, não foi nos discursos de competência que o operário descobriu sua grande missão. Mas um dia

    à mesa, ao cortar o pão,

    foi o operário tomado de súbita emoção

    ao constatar assombrado

    que tudo naquela mesa

    – garrafa, prato, facão –

    era ele quem os fazia...

    Olhou em torno: gamela,

    banco, enxerga, caldeirão,

    vidro, parede, janela,

    casa, cidade, nação!

    Era ele quem fazia...

    Ah! homens de pensamento,

    não sabereis nunca o quanto

    aquele humilde operário

    soube naquele momento!

    Naquela casa vazia

    que ele mesmo levantara,

    um mundo novo nascia

    de que sequer suspeitava.

    O operário emocionado

    olhou sua própria mão,

    sua rude mão de operário,

    e olhando bem para ela

    teve num segundo a impressão

    de que não havia no mundo

    coisa que fosse mais bela.

    Por um instante silencia-se a competência e, em seu lugar, aparece a beleza.

    É claro que os homens de pensamento não saberão nunca o que soube o humilde operário, naquele momento. Soube uma outra coisa, saber de uma outra ordem, diferente da competência. Pela fresta da emoção surgida naquele momento solitário viu algo que nunca vira: sua própria alma: beleza: missão...

    Tenho medo de usar esta palavra: alma. Está ausente dos léxicos da competência, é destituída de dignidade epistemológica, foi banida dos livros de ciência... Alma é palavra que marca os limites de um mundo proibido e esquecido, o mundo que se banha sob a luz do Desejo. Não, sua missão não era nem casas e nem igrejas, nem apartamentos e nem prisões. Era ele mesmo, espelhado nas suas mãos, centro do universo.

    Alma é isto, este centro afetivo que pulsa dentro do corpo, que ilumina o mundo inteiro e transfigura músculos, sangue e pensamento. Erótica é a alma, diz Adélia Prado. É nela que se encontram as fontes da ação. Foi o que aconteceu com o operário: redescobriu aquilo que nem sabia que existia.

    Foi dentro da compreensão

    desse instante solitário

    que, tal sua construção,

    cresceu também o operário.

    Cresceu em alto e profundo,

    em largo e no coração,

    e como tudo o que cresce

    ele não cresceu em vão.

    Pois além do que sabia

    – exercer a profissão –

    o operário adquiriu

    uma nova dimensão:

    a dimensão da poesia.

    Virou poeta.

    Ah, dirão os servos da competência.

    Poesia é coisa fraca. E o mundo em que vivemos exige que sejamos fortes. Que pode a poesia contra a dureza da pá e da esquadria, contra a força do cimento e do dinheiro?

    Não sabem eles que é da beleza da poesia que nascem os guerreiros. Lutam melhor aqueles em cujos corpos moram os sonhos. Para se lutar não basta ter corpo e saber competentes: é preciso ter alma.

    Lembro-me da queixa de Guimarães Rosa, denunciando aqueles que deixaram de lado a alma, considerando-a fora de moda (Literatura e vida, em Arte em Revista, ano I, nº 2, p. 15). Pergunto-me se não tem sido isto, precisamente, o que tem acontecido com a educação... Em nome do saber competente, o esquecimento do Desejo. Onde, em nossos currículos, existe um lugar para o sonho? Como podem os sonhos competir com a força do conhecimento rigoroso? Onde as utopias? Como acontecia com o operário, acontece também com os nossos estudantes: com o crescimento da competência cresce também o esquecimento do Desejo. Não é de se espantar que alguém como Lichtenberg tenha dito que esperava o dia em que se construiriam universidades destinadas ao desaprender. Porque o espaço e o tempo do corpo estão de tal maneira entulhados com blocos de saber que não existe nem tempo e nem espaço para pensar a vida e o mundo que seria necessário construir para sermos felizes. Como sonâmbulos vamos fazendo a história sem nenhuma noção daquilo que procuramos. Porque alma é isto: a presença da ausência daquilo que se procura, nos espaços do corpo. E é por isto que a psicanálise achou necessário instaurar um discurso cujo único objetivo é criar espaços vazios, desentulhar. Para que neste vazio possa aflorar o Desejo, sob a forma de Sonho. Tudo isto por causa do Prazer. O operário alienado empresta o seu corpo competente para que o Outro encontre o seu Prazer. Ele mesmo fica na dor. Como dizia Marx, o trabalhador não se realiza a si mesmo no seu trabalho, mas se nega a si mesmo, tem um sentimento de miséria e não de bem-estar... Seu trabalho é autossacrifício, mortificação.

    Recuperar a Alma é sair deste abismo de alienação: perceber o seu direito ao Prazer. Porque é para isto que tudo se faz neste mundo, inclusive as revoluções.

    Na verdade nossas práticas educacionais, em nome dos ideais de progresso e mesmo de revolução, têm significado uma expansão ilimitada de conhecimento acerca do mundo, e uma brutal repressão da alma. Poderíamos então repetir a velha pergunta dos textos sagrados: De que nos vale ganhar o mundo inteiro se perdemos a nossa alma? Na verdade isto é impossível, pois quem perde a alma está destinado a perder o mundo.

    E o próprio poema se encarrega de responder a pergunta: é o operário poeta que se transforma em operário guerreiro. A mansidão da poesia significa o triunfo sobre a alienação, pois é nela que se recupera a missão de transformar o mundo segundo as exigências do Desejo.

    E um fato novo se viu

    que a todos admirava:

    o que o operário dizia

    outro operário escutava.

    E foi assim que o operário

    do edifício em construção,

    que sempre dizia sim

    começou a dizer não.

    A poesia não é coisa fraca, por ser coisa da alma. Ela é forte precisamente por brotar da alma. Como o disse Octavio Paz, a poesia é conhecimento, salvação, poder, abandono. Operação capaz de transformar o mundo, a atividade poética é revolucionária por natureza; exercício espiritual, é um método de libertação interior. A poesia revela este mundo; cria um outro...

    O que estou dizendo é que o caminho para um mundo transformado tem de passar pelo mundo interior. Porque mundos melhores não se fazem; eles crescem (E.E. Cummings).

    A questão é: quais são os caminhos para esta viagem pelo interior? Onde se encontram as moradas da alma?

    A psicanálise e os poetas responderiam que a Alma mora no mesmo lugar que o Desejo porque a Alma é o Desejo. A pedagogia da competência prescinde desta viagem pelos espaços interiores e mesmo se ri dela. Dominada pela pressa, pensa ser possível ir direto ao ponto. Vazia de percepções psicanalíticas e poéticas, se constrói sobre o pressuposto de que já sabemos qual é o objeto do Desejo. Falta-lhe a percepção do Inconsciente, o imenso Vazio em torno do qual o Corpo foi social e politicamente construído, por meio de repressões sucessivas. Se já sabemos qual é o objeto que nos trará a felicidade basta-nos, então, nos concentrarmos no know-how – expressão norte-americana que equivale a nossa competência, equivalência esta que revela a proximidade entre as posições do Senhor e do Servo. E assim fazemos a história, enfeitiçados por um engano, tomando como Desejo aquilo que nada mais é que o Desejo daqueles que têm poder.

    É preciso reaprender o lugar esquecido do Desejo para construir um mundo que seja nosso, e não de Outro. A política tem de ser transfigurada pela Poesia, a competência tem de ser instrumento do Sonho.

    Redescobrir o lugar do Sonho, reencontrar as origens da Alma. Esta seria a tarefa educativa fundamental, preliminar a tudo o mais que se possa fazer. Para que o poder e a competência não sejam possuídos por demônios.

    A psicanálise é uma escuta dos Sonhos, para se reaprender o Desejo. Porque o Desejo, expulso da realidade diurna pelos fatos de poder, só consegue aparecer disfarçado, sob a proteção do sono, quando a realidade se

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