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Petit Haïti: Haitianos em Itapema (SC)
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Petit Haïti: Haitianos em Itapema (SC)
E-book240 páginas3 horas

Petit Haïti: Haitianos em Itapema (SC)

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Sobre este e-book

O livro Petit Haïti: haitianos em Itapema (SC) aborda a imigração haitiana para o Brasil a partir do município catarinense de Itapema, localizado no litoral norte, como sendo parte integrante das migrações transnacionais. A obra se propõe a analisar as razões e as motivações que levam haitianos, tanto homens quanto mulheres, a optarem por migrar e, também, quais as estratégias utilizadas para deixarem o Haiti até se integrarem à sociedade local. Para tanto, pensar em redes migratórias tornou-se fundamental para compreender a migração como estratégia histórica de sobrevivência para o povo haitiano. A migração é considerada pelos haitianos como um aspecto de sua cultura. Além disso, apresenta a experiência etnográfica pela qual se evidencia a importância de tecer redes, desde o início, quando haitianos se organizaram junto a brasileiros para formar a Associação dos Haitianos de Itapema e Amigos (Ahia). Na Ahia, trocavam informações para acolher os familiares e amigos, com a finalidade de conseguir emprego e assegurar seus direitos para viverem a cidadania plena. Desse modo, as redes são indispensáveis para compreender como os haitianos migram com relativa segurança e se estabelecem na sociedade local com um mínimo de apoio.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento19 de jul. de 2022
ISBN9786525027562
Petit Haïti: Haitianos em Itapema (SC)

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    Petit Haïti - Günter Bayerl Padilha

    INTRODUÇÃO

    Os impulsos que levam as pessoas a migrarem são diversos e complexos. Normalmente, entre as razões que levam os haitianos, tanto homens quanto mulheres, a empreenderem um projeto migratório está relacionado aos fatores econômicos e desastres ambientais. No caso da imigração haitiana para Itapema (SC), é possível identificar o terremoto de 12 de janeiro de 2010 como razão para migrar, mas não a única. Por esse motivo, a presente obra aborda as redes migratórias e de solidariedade como preponderantes nas mobilidades ao motivar e viabilizar o empreendimento de migrar. Além disso, são elas que asseguram a chegada e o processo de inserção ao país-destino.

    No primeiro capítulo, apresento como cheguei ao tema da imigração haitiana e de que maneira me envolvi na construção de uma rede de solidariedade e acolhimento aos recém-chegados do Haiti. O principal envolvimento com os haitianos deu-se durante as reuniões da Associação dos Haitianos de Itapema e Amigos (Ahia), da qual eu fazia parte, como amigo. Participar das reuniões mensais da Ahia permitiu-me as primeiras experiências de olhar, ouvir e escrever o que minha intuição e meus sentidos possibilitaram captar (OLIVEIRA, 1996). Também ali pude confrontar com a primeira dificuldade, a de não dominar o Kreyòl, idioma no qual eram estabelecidas as conversas entre os participantes e conduzidas as reuniões. Sendo assim, dependia das traduções realizadas dos principais assuntos debatidos durante as reuniões e no contato com quem não falava português. Entre eles, estava Joam Florisma, que se tornou o meu melhor interlocutor durante minha vivência com os haitianos em Itapema e região, durante os anos de 2012 até 2020.

    No segundo capítulo, apresento um quadro geral sobre a mobilidade haitiana, assinalando que a migração para o Brasil não é algo isolado, mas está intimamente ligada à história do Haiti, ou seja, a migração é parte integrante da cultura haitiana. Migrar faz parte da estratégia de sobrevivência haitiana em diferentes momentos de sua história, que remete desde as suas lutas por independência, que se efetivou em 1804, e que persiste até os dias atuais. A recente migração haitiana para o Brasil e, especificamente, para a Região Sul do país está diretamente conectada ao processo histórico do Haiti. Isso significa que as experiências de mobilidade dos haitianos têm permitido as formações de redes e a configuração de uma diáspora, em Itapema (SC).

    Este livro, no terceiro capítulo, apresenta a dinâmica das redes de solidariedade e como elas têm permitido a mobilidade dos haitianos até o município de Itapema e como asseguram as condições para que se mantenham na cidade. Sendo assim, apresento extratos de entrevistas realizadas com haitianos que narraram suas experiências de migração e de se estabelecer em Itapema (SC). No total, foram realizadas 10 entrevistas com imigrantes que possuem algum vínculo com a Ahia. Dessa maneira, procuro assinalar que, apesar de muitas agências, de agentes da sociedade civil, ou dos órgãos governamentais atravessarem as redes de mobilidade haitiana, para favorecer as condições que a viabilizam, são, fundamentalmente, os amigos quem de fato têm importância basilar na sustentação das estratégias de sobrevivência e permanência dos haitianos em Itapema (SC).

    Concluo que a Ahia contribuiu significativamente para a inserção dos haitianos na sociedade e que a permanência deles em Itapema (SC) se deve, em grande parte, às redes que entrelaçam os haitianos com as pessoas que estão ao longo do percurso e no destino. São as redes que possibilitam efetivamente a mobilidade haitiana para Itapema (SC).

    1

    APROXIMAÇÃO AO TEMA DA IMIGRAÇÃO HAITIANA

    Este livro aborda a imigração haitiana para o município de Itapema, litoral norte do estado de Santa Catarina. O meu interesse pela imigração haitiana decorreu dos primeiros contatos com os haitianos em Itapema, que se iniciaram em 2012. Minha esposa, meu filho e eu havíamos mudado da cidade de Três Passos, no Rio Grande do Sul, para a cidade de Itapema (SC). Três Passos (RS) é uma cidade de pequeno porte, contava com 23.965 habitantes que vivem de uma economia predominantemente agrícola, baseada no cultivo de soja, trigo, milho, criação de suínos e gado leiteiro, de pequenas indústrias ligadas ao setor do vestuário e moveleiro, além do comércio. Diferentemente de Três Passos, a cidade de Itapema, onde passamos a residir, é uma cidade de porte médio, que comporta uma população estimada em 45.797 habitantes e uma economia baseada nas atividades de construção civil, mercado imobiliário, prestação de serviços e, principalmente, turismo (IBGE, 2010). Essa mudança de residência foi resultado da opção missionária da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB), que me designou para atuar como pastor, na Paróquia de Itapema. Sou pastor da IECLB desde 2002. Estava atuando na Paróquia de Três Passos desde 2007.

    1.1 APROXIMAÇÃO À IMIGRAÇÃO HAITIANA

    A nossa chegada ao município de Itapema (SC) ocorreu em meados do mês de abril de 2012. Estabelecemos residência no Bairro Meia Praia, num apartamento localizado na Rua 240, de onde não demoramos a perceber o movimento de ciclistas e pessoas pela Avenida Nereu Ramos, a principal via da cidade. Muitas dessas pessoas trabalhavam na limpeza das vias públicas e da orla do município e, entre si, falavam um idioma que não conseguimos identificar de imediato qual era. Inicialmente, minha esposa observou que poderiam ser pessoas oriundas de algum país africano¹. Na ocasião, eu complementei que poderiam estar falando algum dialeto, pois, quando as ouvíamos, nossos ouvidos identificavam, por um lado, algo familiar e, por outro, algo que causava certo estranhamento. É que alguns vocábulos se assemelhavam ao francês, mas percebemos que não era esse propriamente o idioma falado. Passados alguns dias, soubemos, por meio de jornais regionais, que aquelas pessoas que tínhamos ouvido pelas vias públicas de Itapema eram originárias do Haiti e que o seu idioma era o kreyòl².

    Adiante, em agosto de 2012, quando acompanhava um grupo de mulheres da Ordem de Senhoras Evangélicas (Oase) da Paróquia, em visita ao grupo da Paróquia de Jaraguá do Sul (SC), conversava com o motorista do ônibus que nos conduzia, e ele comentou que sua próxima viagem seria para o estado do Acre. O motivo, esclareceu ele, era para buscar um grupo de haitianos para uma empresa de limpeza urbana localizada em Itajaí (SC). Ele comentou, ainda, que já fizera essa viagem outras duas vezes e que a maioria dos haitianos vinha para trabalhar na empresa Ambiental³, a qual é responsável pela limpeza pública nos municípios de Itajaí, Balneário Camboriú, Camboriú, Indaial, Jaraguá do Sul, São Francisco do Sul e Itapema, todas de Santa Catarina. Essa foi a primeira vez que ouvira que haitianos eram recrutados no Acre para virem trabalhar em Santa Catarina.

    No entanto, minha aproximação com os haitianos ocorreu de forma efetiva dois anos depois, em 2014, quando, após o almoço num restaurante, localizado no bairro Meia Praia, em Itapema, eu fui apresentado à Dalila Maria Pedrini,

    formada em serviço social⁴ e professora aposentada da Universidade Regional de Blumenau (FURB), que manifestou sua preocupação com a situação dos haitianos que se encontram em Itapema, principalmente em relação ao aprendizado da língua portuguesa e sobre as condições de trabalho. Ela disse que começou a ouvir sobre a chegada dos haitianos em Santa Catarina, em 2012, e que, por ter experiência em cooperativismo e atuar como assessora em políticas sociais públicas e assistência social, ficou sensibilizada com a necessidade de acolhê-los, pois constatou que eles eram em grande número na região e não havia nenhuma instituição ou serviço público que lhes oferecesse alguma acolhida. Relatou, ainda, que, no início de 2013, ela manteve os primeiros contatos com haitianos em Camboriú (SC), por meio de um trabalho voluntário, ajudando-os a conhecerem seus direitos trabalhistas, informando-lhes sobre o funcionamento do Centro de Referência de Assistência Social (Cras) e como deveriam proceder para acessar as políticas públicas na área da educação e saúde. Depois, em contato com os haitianos em Itapema (SC), a professora Dalila vislumbrou a possibilidade de organizar uma associação para eles, também nesse município. Assim, com auxílio dos haitianos da Associação de Balneário Camboriú (SC), ela começou a visitar os haitianos e lhes fez o convite, em kreyòl, para organizar uma associação em Itapema (SC). Durante esse almoço, Dalila Maria Pedrini nos informou, ainda, que, desde dezembro de 2013, a associação de haitianos que residiam em Itapema (SC) já estava em processo de organização e advogava que as instituições religiosas e sindicais deveriam formar uma rede de apoio. Informou, ainda, que estava dialogando com o padre da Paróquia Sagrado Coração de Jesus e estendeu o convite para que a Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil também viesse somar-se à ação solidária em prol dos imigrantes haitianos e, assim, auxiliar no processo pedagógico popular para que a sociedade se sensibilizasse com eles. Na ocasião, ela explanou seu esforço em realizar uma reunião com os haitianos e as entidades civis e governamentais para articular ações que os auxiliassem a garantirem seus direitos nos municípios do litoral norte de Santa Catarina. Ela, então, me fez o convite para participar de uma reunião que ocorreria com haitianos e outras pessoas na sede da Federação dos Trabalhadores das Indústrias de Santa Catarina (Fetiesc), no dia 11 de fevereiro de 2014, e ressaltou que seria importante que mais pessoas da Paróquia também participassem. Ao final do encontro, ao nos despedirmos, confirmei a ela o meu compromisso em estar na reunião e para a qual me comprometi que buscaria mobilizar os membros de minha própria

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