Comunicação politica e emoções coletivas: Lula e os procuradores
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Comunicação politica e emoções coletivas - Jacques Alkalai Wainberg
SUMÁRIO
CAPA
CONSELHO
FOLHA DE ROSTO
CRÉDITOS
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO
Jacques A. Wainberg e Manuel Luís Petrik Pereira
1 SENTIMENTOS: O DISCURSO DIVISIVO E AS EMOÇÕES COLETIVAS
Jacques A. Wainberg
2 O PODER DAS PALAVRAS: LULA E OS PROCURADORES
Jacques A. Wainberg, Fernando Simões Antunes Junior, Angelo Arlindo Carnieletto Muller, Manuel Luís Petrik Pereira, Mariana Oselame, Leticia Pimenta, Fernanda Locatelli, Luciana Bukstejn Gomes, Lorena Garibaldi, Matheus Passos Beck, Ricardo Cesar Correa Pires Dornelles e Melanie Caffarate
3 ESPERANÇA E LUTO: A DISSIDÊNCIA LIBERAL E O OCASO DO PT
Jacques A. Wainberg
4 MENTIRA E VERDADE: LULA, DILMA E FHC
Jacques A. Wainberg
5 EMPATIA E IDEOLOGIA: OS ASPECTOS EMOCIONAIS DA LINGUAGEM PARA GERAR ADERÊNCIA AOS DISCURSOS
Fernando Simões Antunes Junior
6 ESTIGMA: A DISSIDÊNCIA, OS RÓTULOS E A IMAGINAÇÃO
Jacques A. Wainberg
7 A RAIVA E O ÓDIO: OS EFEITOS DO DISCURSO COLÉRICO
Angelo Müller
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Martina Jung
SOBRE OS AUTORES
SÉRIE
APRESENTAÇÃO
Jacques A. Wainberg
Manuel Luís Petrik Pereira
Como definir uma emoção? A pergunta é reveladora da complexidade do tema. A mesma indagação é feita, no mínimo, desde os filósofos pré-socráticos e foi reafirmada há mais de 130 anos por William James, nos primórdios dos estudos sobre a psique. Agora, discernir o que é emoção torna-se outra vez um desafio.
As primeiras respostas emergem do campo da Psicologia, e mesmo aí são controversas, a ponto de o Dicionário Dorsch¹, em seu verbete sobre o tema, recordar a proposta repetida tantas vezes de se riscarem as emoções da linguagem científica
. Iris Mauss e Michael Robinson (2009) afirmam que as emoções são respostas experienciais, psicológicas e comportamentais a estímulos pessoais significativos
. Elas seriam uma mistura de ativação fisiológica, expressão de comportamento e experiência consciente (pensamento e sentimento). É possível até numerá-las, ainda que também aí haja divergências. Alguns autores sugerem cinco (medo, raiva, tristeza, alegria e amor); outros sete (além dessas, nojo e surpresa). Poder-se-ia também mapeá-las dentro do cérebro. Hoje se menciona que a excitação das emoções ocorre simultaneamente em várias regiões cerebrais, além da amígdala.
Walter Benjamin dá sua resposta à pergunta: O que comunica a linguagem? Ela comunica um estado mental que lhe corresponde
. Ou seja, a compreensão da confluência entre a comunicação e a emoção só é possível pela observação de uma pragmática interacional e discursiva, seja a face a face, seja a que ocorre dentro da esfera espetacular-midiática.
Cabe salientar também que a escolha de vocábulos pelos falantes obedece a um complexo processo cognitivo que está embebido de conteúdo emocional. Esse fato é facilmente discernível quando o discurso serve de instrumento à disputa dos atores pelo poder político. Dito de outra maneira, as palavras são escolhidas devido a sua capacidade de gerar emoção nas pessoas. Segundo Aristóteles, elas podem redirecionar os desígnios de uma audiência. A propósito, o filósofo Michel Maffesoli² diz que a transfiguração do político se completa quando a ambiência emocional toma o lugar da argumentação ou quando o sentimento substitui a convicção
. O embate atual entre os procuradores e Lula é, entre outros episódios similares, a consumação desse vaticínio.³
A emoção como expediente de convencimento é apresentada logo no primeiro capítulo por Jacques A. Wainberg, ao abordar os efeitos do discurso divisivo, que está acompanhado da raiva, a emoção gerada pela polarização política. Em seguida, o capítulo de autoria conjunta dos membros do Grupo de Pesquisa Comunicação, Emoção e Conflito (GPCEC) disseca a emoção discursiva presente nos discursos dos procuradores e de Lula. A análise é feita com o auxílio do software Linguistic Inquiry and Word Count (LIWC), método utilizado em estudos empíricos apresentados também em outros textos deste livro.
A cena política atual é objeto de reflexão do capítulo Esperança e luto: a dissidência liberal e o ocaso do PT. Nele o autor analisa a estruturação e a débâcle do Partido dos Trabalhadores, considerando para tal uma amostra significativa de discursos de seus militantes ao longo do tempo. Fica claro que a nova oposição, chamada pelo autor de dissidência liberal
, curiosamente adota, em seu ativismo político, táticas semelhantes às adotadas pelos grupos de esquerda das décadas de 1960 e 1970, ainda que desprovidas do seu componente utópico. Através do LIWC é apontado, no capítulo Mentira e verdade: Lula, Dilma e FHC, o grau provável de veracidade e de mentira das falas dessas personalidades.
Empatia: colocando-se no lugar do outro, de Fernando Simões Antunes Junior, mostra que ética e psicologia andam juntas. Em Estigma: a dissidência, os rótulos e a imaginação, Jacques A. Wainberg aprofunda a análise dos ardis dos conflitos atuais, conflagrados que estão pelos rótulos, como os expressos nos epítetos coxinhas
e petralhas
utilizados nos embates retóricos recentes no país.
Ao baixar a guarda de suas defesas psíquicas, o público se dispõe a se expor e a acolher as mensagens persuasivas que lhes chegam aos sentidos desde fontes que lhes são simpáticas. É o que ocorre também nos espetáculos do showbiz, nas cerimônias religiosas e cívicas, nas sessões de cinema e nas manifestações políticas. Hoje em dia as emoções coletivas também surgem por estimulação a distância. É o que acontece com a audiência dos veículos de comunicação massiva. Essa mídia atinge milhares de pessoas que, apesar de dispersas no espaço geográfico, reagem aproximadamente da mesma maneira ao incentivo que lhes dispara e provoca reações, ora de afeto, ora de medo, espanto, orgulho, empatia e repúdio, por exemplo.
Tipicamente, é esse tipo de efeito mobilizador que tornou o rádio e a televisão ao mesmo tempo celebrados, temidos, vigiados e criticados. As emoções coletivas se distinguem das emoções sociais – já que estas não dependem de uma excitação eventual e circunstancial dos sentidos para existir. As emoções sociais se consolidam vagarosamente nas mentes humanas por meio da educação formal e informal (a que é oferecida ao indivíduo por seus grupos de referência) e da sociabilidade. As emoções sociais perduram no tempo, modificando-se com dificuldade. Elas dependem do contexto cultural no qual a pessoa está inserida, do que constitui o senso comum (algo consagrado pelos usos e costumes e pelo aparato legal de uma sociedade), do que divulga e consolida os padrões estéticos (exacerbados pela publicidade, pela produção massiva e padronizada de bens de consumo e da moda, por exemplo) e do que constitui a moralidade social.
Portanto, as emoções sociais (também referidas na literatura como sentimentos sociais) fazem parte da subjetividade humana. Usualmente, as emoções coletivas e as emoções sociais se confundem. Isso ocorre porque os gatilhos que disparam as emoções coletivas se valem dos sentimentos sociais que estão depositados em posição standby no imaginário coletivo. Tal gatilho pode ser, por exemplo, um acontecimento aleatório capaz de disparar uma reação coletiva imprevista, como a ocorrida na Tunísia e que deu origem à primavera árabe em dezembro de 2010 (esse tipo de fenômeno é usualmente referido na prosa cotidiana como fator gota d’água).
A excitação tem graus e níveis, podendo alcançar o paroxismo, algo facilmente percebido nos espetáculos esportivos, nos rituais místicos, na devoção dos fãs a certas celebridades e no totemismo, por exemplo. No campo da política, a autoridade se esforça para governar os sentimentos coletivos, evitando assim ser ela própria vítima das emoções coletivas – que aparecem, às vezes, sob a forma de uma rebelião, protesto e/ou violência.⁴
O tema foi abordado em obras hoje consideradas clássicas. São os casos de Psicologia das multidões, de Gustave Le Bon⁵, e Psicologia das massas e análise do eu, de Sigmund Freud. Em ambas, os objetos de estudo são as multidões e a influência do grupo sobre o indivíduo, que produz a conformidade e altera profundamente o comportamento da pessoa que se adéqua à atmosfera emocional que o envolve.
Naturalmente, todo ator político tem consciência dessa dinâmica conhecida por efeito contágio.⁶ Ele hoje se difunde também graças às redes sociais. Dominar tais impulsos coletivos implica a capacidade comunicativa do ator político de influenciar a imaginação e a percepção das pessoas e dos grupos humanos, mobilizando e alterando o humor e o estado de espírito da sociedade ou de parte dela, algo que pode ser medido e monitorado por meio de métricas variadas. O resultado desses levantamentos explica as atitudes comunitárias e as tendências políticas da sociedade ou de parte dela em um certo momento.
As emoções coletivas são geradas ora pelo somatório das emoções individuais ora pela manipulação desde uma fonte estimuladora que é externa, como é o caso dos espetáculos musicais.⁷ Estudos empíricos podem medir a variabilidade das emoções entre os membros de um grupo, a proporção de emoções negativas e positivas que circulam nesse ambiente e a média dessas emoções, que caracterizariam o humor social em um dado instante.
Este é o tema de um campo de estudos hoje conhecido como Sociologia das Emoções. O objetivo do mesmo é estudar os impulsos e as motivações que levam os membros de um grupo a agir.⁸ Este tipo de abordagem tem caracterizado também autores que agora contemplam o tema das emoções para explicar decisões políticas no campo das relações internacionais. Entre elas estão, por exemplo, a honra e a humilhação.
Entre as perguntas típicas da área da Sociologia das Emoções, estão: o que é emoção? Como estudá-la? Emoção é um fenômeno sociológico? A emoção é um fenômeno cuja origem é social, cultural ou biológica? As emoções são inatas e universais ou são culturalmente específicas? Qual a influência do social sobre a forma de sentir e de expressar as emoções por uma pessoa?
O conflito entre os procuradores e Lula dividiu emocionalmente o país. Cabe, por isso, marcar essa fase da história nacional com o levantamento que esta obra apresenta. Ele leva em conta a natureza desse conflito político e jurídico, a comunicação persuasiva utilizada pelos atores envolvidos nesse embate com vistas a acionar as emoções coletivas e o efeito provocado na audiência por tais falas.
Referências
BENJAMIN, Walter. On language as such and on the language of man. Selected writings. Cambridge: The Belknap Press of Harvard University Press, 1997, v. 1.
CISCO, Richard. Poetic rift presents: weapons of mass emotion. Disponível em:
DORSCH, Friedrich; HÄCKER, Hartmut; STAPF, Kurt-Hermann. Dicionário de psicologia Dorsch. Petrópolis: Vozes, 2001.
INTERNATIONAL SOCIETY FOR RESEARCH OF EMOTIONS. Disponível em:
LE BON, Gustave. Psicologia das multidões. São Paulo: Martins Fontes, 2008.
MAFFESOLI, Michel. A transfiguração do político: a tribalização do mundo. Porto Alegre: Sulina, 2005.
MAUSS, Iris B.; ROBINSON, Michael D. Measures of emotion: a review. Cognition and Emotion, East Sussex, RU, v. 23, n. 2, 2009.
REVISTA BRASILEIRA DE SOCIOLOGIA DA EMOÇÃO. Disponível em:
SACKS, Oliver. Alucinações musicais: relatos sobre a música e o cérebro. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
¹ DORSCH, Friedrich; HÄCKER, Hartmut; STAPF, Kurt-Hermann. Dicionário de psicologia Dorsch. Petrópolis: Vozes, 2001.
² MAFFESOLI, Michel. A transfiguração do político: a tribalização do mundo. Porto Alegre: Sulina, 2005, p. 104.
³ Na proposta de Maffesoli, sentimento
deve ser entendido como um sentido orgânico social, promotor de decisões práticas, fruto de um desiderato comum e, portanto, uma forma válida de substituição da política como concebida na modernidade.
⁴ Ver Revista Brasileira de Sociologia da Emoção. Disponível em:
⁵ Ver LE BON, 2008.
⁶ Sugere-se, para aprofundar a questão, a consulta da obra Poetic rift presents: weapons of mass emotion de Richard Cisco.
⁷ Ver SACKS, 2007.
⁸ Ver International Society for Research of Emotions. Disponível em:
1
SENTIMENTOS: O DISCURSO DIVISIVO
E AS EMOÇÕES COLETIVAS
Jacques A. Wainberg
Figura 1. Opinião pública dividida.
Fonte: foto de Juca Varela/Agência Brasil.
Em 2016, os brasileiros estavam divididos. Por isso mesmo uma boa distância física entre os grupos políticos antagônicos foi adotada em abril daquele ano durante o julgamento pela Câmara dos Deputados do pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff. A medida visava a evitar a violência física entre as duas facções, a que era contra e a que era a favor do governo.
Esta não é primeira vez que tal cisão ocorre na história nacional. Ela usualmente resulta do conflito político que surge em decorrência de narrativas divergentes e da decepção que uma parcela significativa da população sente em relação aos governantes e ao estado geral do país. Esse ambiente psicossocial fragiliza a fé popular na autoridade e nas instituições e permite a difusão de mensagens dissidentes nas redes on-line e off-line.
O discurso divisivo se anima desse tipo de controvérsia pública. Sua prosa é colérica, incendiária, dicotômica e polarizada. Frequentemente, é também impolida. Em decorrência, cria-se um clima de hostilidade beligerante no qual a radicalidade das posições em confronto as torna irreconciliáveis. O diálogo social é, então, rompido. A separação se transforma, por fim, em litígio infeccioso; e o choque verbal por ele causado se espalha na sociedade como uma epidemia.
Ou seja, o discurso divisivo serve aos fins do sectarismo. Ele é gestado profissionalmente por ativistas que almejam inflamar os espíritos, conquistar a adesão e controlar o comportamento dos seguidores. O oponente é assumido e rotulado por eles como inimigo. A mídia, ao acompanhar esses desencontros, amplifica o embate retórico e ofusca as iniciativas que buscam a moderação.
O antídoto é o discurso apaziguador, e o resultado é a civilidade. Ele é gestado na família, na escola e na comunidade. Começa com as palavras mágicas
que os infantes aprendem dos pais e se consolida em traços de personalidade que abominam os rompantes tóxicos da manifestação rude
. A civilidade deriva, portanto, da polidez, atributo que caracteriza o discurso politicamente correto.
Este tema não é novo e foi referido, por exemplo, em um papiro por Ptahhotep¹, em uma coleção de máximas e conselhos dirigidos ao seu filho. O documento exalta virtudes tais como a veracidade, o autocontrole, a delicadeza e a capacidade de ouvir o interlocutor e assim evitar o conflito sempre que possível.² Conselhos similares têm sido dados ao longo da história por autores interessados em introduzir o público na arte da autodefesa verbal
.³
Recomendação oposta e contrária à prosa divisiva foi defendida também por George Washington (1732-1799). Ele consolidou (aos 16 anos de idade) 110 regras de convivência baseadas em preceitos escritos pelos padres jesuítas franceses em 1595.⁴ Elas incluem orientações de como as pessoas deveriam vestir-se, caminhar, comer e dirigir-se aos superiores. Sua primeira diretiva diz claramente que toda e qualquer ação realizada na companhia de outras pessoas deve estar acompanhada de algum sinal de respeito aos presentes. Forni⁵ sugere, agora, 25 regras para o sucesso da comunicação interpessoal e social. Entre elas, está falar de forma amável, ouvir e respeitar a opinião do outro, fazer crítica construtiva e evitar perguntas pessoais ao interlocutor.
A fala politicamente correta sanitiza a linguagem, algo que irrita o espírito inquieto dos polemistas. Eles geralmente reagem e se rebelam contra sua função policialesca, a que censura e silencia a dissidência. A civilidade produz sempre algum grau de empatia entre os falantes e os ouvintes. Esse efeito é decisivo ao fortalecimento da coesão social e