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A Três Léguas Da Desilusão
A Três Léguas Da Desilusão
A Três Léguas Da Desilusão
E-book222 páginas3 horas

A Três Léguas Da Desilusão

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Sobre este e-book

Matias é um homem frustrado com a profissão e com o casamento. Vive a remoer o passado e a se projetar em pessoas que gostaria de ter sido e em situações que gostaria de ter vivido. Seus remorsos aliviam, porém, quando conhece uma jornalista principiante, cuja história pregressa se entrelaça à da sua esposa.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento5 de ago. de 2018
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    Pré-visualização do livro

    A Três Léguas Da Desilusão - Caio Araujo

    A três léguas da desilusão

    Caio Araujo

    Matias acordou com a garganta seca no meio da madrugada.

    Olhou para a esposa que dormia ao seu lado na cama e esboçou

    uma tentativa de retomar o sono. Três minutos depois,

    levantou-se e foi ao banheiro. Trancou a porta. Sentou-se no

    vaso. Folheou a antepenúltima edição da revista de arquitetura

    que Renata mantinha num cesto onde também se encontravam

    tampas quebradas de batons, cotonetes usados e um

    perfumador de ambiente já quase no fim. Bocejou duas vezes,

    acertou a conta com o intestino, limpou-se, lavou as mãos sem

    sabonete, deu descarga, lavou as mãos outra vez e se olhou no

    espelho. Estava cansado, mas sem sono. O terçol no olho

    direito havia diminuído – muito em função do cabo de garfo

    aquecido que aplicara no desconforto por trinta segundos logo

    depois de bater uma galinhada na noite passada. Jogou água no

    rosto. Enxugou-o com a toalha de corpo. Foi à cozinha e abriu

    a porta da geladeira. Tomou um gole de iogurte e finalizou o

    resto de maça largado na prateleira da porta. Pegou o único

    copo do escorredor e despejou nele três dedos de água do filtro.

    Engasgou no primeiro gole. Em seguida, conferiu se a calça

    jeans pendurada no varal havia secado e tentou se lembrar onde

    deixara o celular, embora não tenha cogitado procurá-lo.

    Retornou ao quarto. Ligou o abajur. E abriu o décimo terceiro

    capítulo de Dom Quixote. Leu uma página e meia e desistiu.

    Não conseguia se concentrar. Sua cabeça estava em outro lugar.

    Recuou três anos no casamento e se viu de mãos dadas com a

    esposa sob uma barraca amarela estampada com naus piratas

    fincada na areia da praia central de Marataízes, em frente ao

    restaurante Gaivota, onde costumavam ficar até as duas e meia

    da tarde, antes do almoço mais tarde que o habitual. Era um dia

    comum da segunda quinzena de janeiro. Fazia trinta e quatro

    graus. Pela terceira vez veraneavam naquele litoral onde

    Renata fora pega de surpresa por um testamento que lhe

    transferiu a propriedade de uma casa modesta que havia

    pertencido a avó que só a conheceu criança. Renata tomava

    água de coco e Matias, a quarta cerveja do fardo que trazia no

    isopor. Beliscavam peroá frito, o oitavo melhor da região,

    segundo os pescadores, que atribuíam a queda de qualidade à

    sequência de safras ruins desde o aumento da exploração de

    petróleo no litoral capixaba. Renata nunca se esquecia de avisar

    que queria o peixe com poucos espinhos e, embora soubesse

    que o pedido fugia um pouco do controle daqueles homens,

    acenava com o polegar quando a respondiam: "xá com a gente,

    dona". Matias preferia a aleatoriedade. Também queria que o

    peixe viesse sem espinhos, mas não abria mão da possibilidade

    contrária. Se viesse com, lamentava, mas, ao contrário dela,

    não reclamava, pois entendia que as expectativas não

    consumadas são o que há de mais normal na gastronomia, e

    que se gostamos de ser surpreendidos para o bem, devemos,

    por coerência, aceitar algumas surpresas frustrantes. Além do

    que, a todo cozinheiro, como a qualquer outro profissional,

    deve ser concedido o direito de alterar dias bons, mediados e

    ruins no trabalho, contanto que os dois primeiros se

    sobressaiam. Ele pensava ainda que na maioria das vezes o

    problema não era o prato, mas sim o paladar excessivamente

    exigente – fresco – dos clientes. Se houvesse a garantia de que

    nenhum peroá contivesse espinhas, ele pediria no lugar uma

    porção de fritas ou de frango à passarinho, porque seria

    antinatural a inexistência de espinhas em todo o cardume. A

    não ser, claro, que esta fosse obra do total acaso, determinado

    pela força da natureza ou da intuição do pescador no momento

    de selecionar qual peixe fritar. Não só não tinha problema em

    confiar o apetite à sorte, como exigia que assim o fosse, afinal,

    desta forma respeitava-se à autoridade da natureza e às suas

    imposições. Considerava ridícula a tentativa vã do homem em

    manipular o resultado das suas ações, minimizando riscos e

    potencializando garantias. Certa vez, num simpósio sobre

    inteligência artificial para o qual fora enviado a cobrir contra a

    sua vontade, confrontou um biólogo inglês que tentava provar

    por A mais B que a imortalidade seria viável no futuro. Como

    um cético do ineditismo e um defensor agressivo da ideia de

    que o futuro não será em nada melhor que o passado, Matias

    aguardou pacientemente o palestrante encerrar sua exposição e

    responder as quinze perguntas da plateia, nenhuma

    desconfortável, para caminhar na sua direção, enfiar-lhe o dedo

    na cara e disparar:

    – O senhor é um impostor. Sua tese foi concebida para agradar

    esta massa de alienados, iludindo-os com este conceito difuso

    que é o da geração especial, que é sempre a que virá, nunca a

    que já foi. Eles te aplaudem porque sofrem de baixa

    autoestima. Porque gostam de ouvir que são capazes de fazer a

    diferença na humanidade, de construir um mundo melhor, de

    erradicar a miséria, como se esses ideais fossem

    supermodernos e que só agora – veja só! – finalmente poderão

    ser postos em prática. Em três milhões de anos de vida humana

    na terra ninguém jamais pensou nisso antes – ironizou, para

    então prosseguir com o dedo em riste –

    Não farão diferença alguma e o mundo pode muito bem piorar.

    Em primeiro lugar, pare de mimá-los. Em segundo, enfie o

    discurso motivacional no cu, seu hipócrita. Se os maiores

    gênios foram esquecidos, todos seremos. Não há muito que

    fazer contra isso, mas, ainda bem, não estaremos aqui para

    lamentar. O que dizer? É mesmo da estupidez humana esta sina

    por marcar o tempo. Talvez assim nos sentíssemos menos

    medíocres, não é? Daríamos um sentido à vida, olha que

    incrível! Engraçado, porque não vejo tantas reverências a

    Aristóteles, Copérnico e Darwin. Eles não mereceram?

    Quantos ainda se recordam dos fenícios, dos mongóis, dos

    persas, dos incas? Eram povos tão primitivos… Como somos

    mais avançados! A verdade, professor, é que as pessoas estão

    pouco se fodendo para o que os outros fizeram. Seja lá o que

    for, só importa o que elas farão. Deixe-me te fazer algumas

    perguntas inoportunas: quem venceu o prêmio Nobel de

    economia de oito anos atrás? O senhor chorou a morte de

    Mandela? Lembra-se dele todos os dias? Pois esses jovens não

    se lembrarão do senhor depois de amanhã, de nenhuma das

    suas frases, só dos elogios, porque precisam alimentar a

    futilidade com falsas esperanças – e o senhor cumpre bem este

    papel, como todo velho egocêntrico desesperado em agradar as

    novas gerações. É por isso que velhos descolados fazem tanta

    questão de se distanciarem dos seus pares, alegando terem

    ideias supostamente mais frescas, progressistas, gabam-se por

    ter a mente mais aberta, e que, ao contrário deles, não pararam

    no tempo. Ocorre que para fazer algo de bom amanhã é preciso

    olhar o que de bom foi feito ontem. E esses jovens não sabem.

    Acreditam piamente, graças a sua bajulação, que possuem um

    dom extraordinário, algo nunca antes visto na história – uma

    história que para eles começou há duzentos anos e que será

    totalmente diferente a partir de hoje, afinal de contas, ela agora

    está nas mãos desta geração iluminada a qual pertencem.

    Coitados. O senhor deveria sentir algum remorso, encerrou o

    desabafo, com seguranças tentando contê-lo e senhorinhas que

    vestiam jalecos de veludo rosa e sapatinhos de camurça lhe

    pedindo calma.

    Matias beliscou dois pedaços de uma só vez, cuspiu os

    espinhos num pires e achou que o peixe estava uma delícia.

    Amassou a latinha vazia e pegou outra no cooler. Perguntou a

    Renata se ela queria dar um mergulho. Ela respondeu que sim,

    só que mais tarde. Renata limpou as lentes dos óculos escuro

    com a bainha da canga. Bocejou. Inclinou a cadeira de praia

    para trás e exclamou: ai, ai, para então não falar mais nada,

    enquanto Matias elaborava um novo raciocínio, que ela sabia,

    viria em tom de provocação, para que aquele diálogo – que

    agradava muito mais a ele do que a ela – continuasse. E assim

    ele fez.

    – A sensação de insegurança, disse em voz alta, é coisa de

    maricas que não se expõem à beleza das incertezas porque

    escondem seus medos atrás da precaução e porque não

    encaram o jogo da vida, onde tudo pode dar certo, como pode

    não dar. Digo isso, continuou em tom crítico, a todos os pais

    que zelam em excesso pelo bem-estar dos filhos, como se

    fossem donos da liberdade deles. São tirânicos. Assim como os

    nossos amigos que vivem enjaulados naqueles condomínios

    achando que estão protegidos. A obsessão por segurança é o

    princípio da covardia. Corajosos enxergam uma chance de

    êxito e tomam decisões que, certas ou erradas, foram tomadas,

    coisa que os cagões nunca fazem, porque ficam o tempo todo

    ponderando, procurando desesperadamente os contras e se

    empenhando ao máximo para ofuscar os prós – sentenciou

    empolgado, enquanto Renata ouvia calada, sem esboçar

    reações, como se tivesse parado de prestar atenção na metade

    da fala.

    Esta era a filosofia que embasava seus pensamentos em

    discussões acaloradas, dentre as quais a que mais gostava e na

    qual mais se sentia confortável: o futebol. Defendia com fervor

    o lado espontâneo do esporte contra a corrente da imprensa

    especializada que clama por intervenções tecnológicas a fim de

    coibir os erros de arbitragem. Dizia que a finalidade do jogo é

    permitir que o imprevisto desmonte o planejado, porque no

    futebol, ao contrário do xadrez, o fundamental não é se

    preparar para o que vai acontecer; é estar aberto a todas as

    possibilidades e se adaptar a elas, sempre dando margem às

    aleatoriedades. Por isso, afirmava com euforia, o azarão vence,

    justamente por não saber previamente que decisão tomar diante

    do fato novo, mas que, devido a uma enorme capacidade de

    improviso, surpreende o favorito.

    É mesmo surpreendente a capacidade que Matias tem de

    cambiar o tom da conversa. Abandonar a fúria que alimenta

    suas palavras só para instigar o interlocutor para dar vazão a

    uma fala acadêmica, quase erudita, com a qual ele também

    simpatizava, como ficou nítido no seguinte aprofundamento do

    raciocínio anterior:

    – É claro que isso também pode acontecer em outras

    modalidades, mas não com a mesma frequência que acontece

    no futebol. Por três motivos elementares. O primeiro é óbvio:

    por ser coletivo, o peso da atuação individual – esplêndida ou

    execrável – muitas vezes não interfere no resultado. Tanto pode

    o craque fazer o diabo e sair derrotado, como pode um cone ser

    campeão mundial. Basta que haja compensação desses

    extremos por parte dos demais atuantes ou, claro, basta que a

    bola desvie no joelho do volante na entrada da área, engane o

    goleiro, resvale na trave e entre. Ou saia, por acaso. Basta

    ainda que numa tarde infernal o lateral arranque feito um

    corisco pela direita, drible três marcadores – algo até então

    jamais visto na sua carreira deplorável, nem mesmo nos

    treinamentos – e acerte o cruzamento na medida exata para o

    artilheiro, que, como de hábito, domina de canhota, ergue a

    cabeça, bate cruzado deslocando o arqueiro e corre para o

    abraço. Os companheiros vão ao seu encontro comemorar. A

    torcida se prepara para soltar o grito. Mas, de repente, se dá

    conta de que naquela tarde, excepcionalmente, o chute saiu um

    pouco mascado, e numa sucessão de imagens em câmera lenta,

    vê a bola sair pela linha de fundo. O camisa nove acabara de

    perder o gol mais feito de toda a sua brilhante trajetória de

    matador implacável.

    Eventos imprevisíveis como esses, no futebol, definitivamente

    são comuns. Daí a velha máxima de que o "futebol é uma

    caixinha de surpresas", embora muito pouco original,

    permanece verdadeira. Por mais que os aspectos táticos tenham

    ganhado enorme influência no jogo, vindos da Europa para a

    América do Sul, eles continuam não sendo, no futebol, o

    grande diferencial. Jogadores, fãs e a própria imprensa

    geralmente preferem ressaltar o talento e a técnica como

    fatores determinantes para as conquistas. O próprio êxito dos

    treinadores é atribuído em boa parte à capacidade deles de

    manter o grupo nas mãos e de "extrair o melhor de cada

    atleta", mantras bastante difundidos na imprensa esportiva.

    Partilham desta linha de raciocínio quem acredita que a grande

    virtude do técnico é saber lidar com os jogadores, motivá-los e

    mantê-los concentrados, sabendo dosar cobranças e

    recompensas e ainda parecer justo e coerente aos olhos dos

    preteridos. Sob esta ótica, crê-se que o sucesso do treinador

    deriva mais da relação interpessoal no vestiário do que do

    estudo prévio do adversário. A sua maior virtude, portanto,

    seria de natureza emotiva, persuasiva, e não estratégica. Não à

    toa, muitos atletas desprezam as preleções. Consideram-nas

    chatas e inócuas, sobretudo as mais longas. No imaginário

    popular, o técnico precisa saber falar a língua dos jogadores –

    em geral clara e objetiva –, precisa criar um elo de confiança

    com e entre os comandados e fazer com que eles se dediquem,

    na vitória e na derrota, temporada pós-temporada, num ciclo

    infinito de renovação de metas, porque ninguém no futebol

    pode jamais se dar por satisfeito. Vencer cria expectativas de

    novas vitórias. Perder alimenta a narrativa da volta por cima.

    Esta visão romântica e paternalista sobre a relação técnico-

    jogador, tão conflitante como outra qualquer, ainda mais numa

    condição hierárquica, está, sem dúvida, bastante desgastada,

    mas ainda surte forte efeito no meio. Afinal, o treinador é, antes

    de tudo, um escudo para o fracasso dos atletas. É ele quem

    impreterivelmente assume a responsabilidade pelas derrotas e

    se auto-exime nas vitórias. Do treinador se espera coragem

    para admitir a culpa sem tê-la e humildade para transferir os

    méritos próprios. É realmente cômodo desempenhar mal uma

    função e ver o chefe assumir a bronca. Este é um dos muitos

    mimos a que os jogadores foram mal-acostumados. Talvez a

    frase mais pronta para justificar derrotas - "quando se ganha,

    ganham todos; quando se perde, perdem todos" – resume a

    dificuldade crônica no futebol de se admitir falhas individuais,

    presentes em qualquer esporte coletivo. O treinador deve

    protegê-lo. Em público, ele não diz que o seu time perdeu,

    hipoteticamente, porque o seu volante desperdiçou três pênaltis

    e foi expulso no primeiro tempo. Seria um ato execrável da sua

    parte, afinal, o jogador nunca deve ser exposto, coitadinho. É

    um diamante. Tem que ser preservado a sete chaves, defendido

    com unhas e dentes. Nesta situação, o treinador diria que todos

    têm responsabilidade e que a dele é ainda maior porque foi

    quem escolheu o time. Da mesma maneira em que é obrigado a

    equiparar a importância do atacante que marca os cinco gols na

    goleada por cinco a zero ao terceiro reserva do goleiro, que

    sequer pôde estar no banco por problemas na documentação.

    Fazem parte da mesma equipe, então são iguais. Na importa o

    que aconteça, são iguais. O treinador não pode verbalizar suas

    preferências – elas só podem constar da sua escalação, que

    ainda precisa ser justificada. A depender do ego do jogador, ele

    ainda precisa se desculpar por que não o escalou. O treinador

    não tem o direito de preferir em público um comandado mais

    competente ou dedicado que outro. Precisa tratar todos sem

    distinção, sob o risco de perder o controle sobre o grupo. Para

    ser bem-visto por todos, precisa passar a mão na cabecinha dos

    subordinados, dirigir-lhes palavras dóceis na imprensa e

    blindá-los a todo custo das críticas. Por isso, trabalham também

    como assessores de imprensa. Inocentam-nos do que fazem nos

    gramados e assumem sua defesa quando eles se envolvem em

    problemas de ordem tributária e até mesmo penal.

    O treinador é também o porta-voz do clube. Quando o time vai

    mal, é ele quem dá a cara à tapa, às vezes tendo que

    administrar situações que fogem a sua alçada, como, por

    exemplo, atrasos salariais. Em nome das agremiações, ele

    assume todo início do ano que o time disputará todos os

    campeonatos para ser campeão. É, contudo, um compromisso

    impossível de se cumprir porque nunca um clube vence tudo o

    que disputa. Jamais aconteceu em lugar algum e jamais

    acontecerá, mas que mesmo assim ele precisa reiterar para

    cativar sua torcida. Como todos jogam para vencer, mas só um

    no final fica com a taça, logo os demais descumprem o

    combinado. Cabe ao treinador, então, renovar a esperança de

    que no futuro o clube honrará sua palavra, o que, embora sem

    data precisa e já livre da cobrança por não estar mais a frente

    da instituição, é provável mesmo que ocorra, pois como

    grandes que são, devido ao passado vitorioso – nunca

    hegemônico – cedo ou tarde o time reunirá os diversos fatores

    para lograr tal objetivo. Pode levar muito tempo, como pode

    não ser tão fatídico, mas é isso pelo menos o que se percebe no

    futebol brasileiro – um revezamento contínuo de nove a doze

    times que nas últimas sete décadas conquistaram algumas

    vezes os títulos mais cobiçados do país e do continente, e que

    por isso, porém não só, reforçaram sua grandeza.

    É certo que alguns times foram muito bem-sucedidos durante

    um determinado período, às vezes até longos, mas sempre com

    alternância de predomínio. Santos e Palmeiras dominaram a

    década de 60; Internacional e Cruzeiro venceram muito nos

    anos 70; o Flamengo em 80; São Paulo, Palmeiras e Grêmio na

    primeira metade dos anos 90; Vasco e Corinthians na segunda,

    e todos eles, desde 2000, voltaram a conquistar títulos

    importantes – nacionais e internacionais – alguns mais, outros

    menos. Entretanto, só o Santos conseguiu ser soberano por

    mais de quatro anos consecutivos. Conquistou cinco

    campeonatos paulistas de 1960-65 (a exceção de 1963), foi

    pentacampeão brasileiro (1961-65) – feito até hoje jamais

    alcançado – e bicampeão da Libertadores e do Mundial de

    Clubes (1962-63), então torneios de menor prestígio.

    Predomínios extensos são comuns na Argentina, no Uruguai,

    na Espanha, na Itália e na Inglaterra, onde não mais que quatro

    equipes oligopolizam o futebol. A Alemanha é um caso ainda

    mais extremo. O Bayern de Munique reina há décadas, salvo

    exceções pontuais, na Bundesliga, o campeonato nacional. No

    Brasil, nunca um time venceu tanto num período de cinco anos

    como o Santos, e dificilmente o fará, não só porque aquele

    elenco santista foi possivelmente o melhor que já existiu, mas

    porque a concorrência no país é de fato maior, o que faz do

    Brasileirão o torneio nacional mais competitivo e imprevisível

    do planeta, ainda que num nível técnico inferior

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