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Memórias ancoradas em corpos negros
Memórias ancoradas em corpos negros
Memórias ancoradas em corpos negros
E-book515 páginas6 horas

Memórias ancoradas em corpos negros

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Sobre este e-book

A natureza da preservação de africanismos na memória coletiva dos descendentes de heranças africanas tem desafiado os estudiosos brasileiros nas várias disciplinas humanas. Das perspectivas históricas e sociológicas às manifestações culturais e religiosas, enquanto tentam interpretar o impacto de africanismos retidos em várias práticas culturais.
Memórias ancoradas em corpos negros é uma coleção de estudos independentes, planejados para apreender evidências afrodiaspóricas, na originalidade de suas abordagens.
É importante, para melhor entendimento e interpretação do tecido cultural brasileiro, não só da perspectiva da preservação de elementos culturais africanos no Brasil, mas também do reconhecimento de seus significados em várias manifestações culturais, desde o contar histórias a designs iconográficos.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento17 de out. de 2022
ISBN9788528305227
Memórias ancoradas em corpos negros

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    Memórias ancoradas em corpos negros - Maria Antonieta Antonacci

    CapaLogo PUC-SP

    PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

    Reitora: Anna Maria Marques Cintra

    EDITORA DA PUC-SP

    Direção: Miguel Wady Chaia

    Conselho Editorial

    Anna Maria Marques Cintra (Presidente)

    José Rodolpho Perazzolo

    Ladislau Dowbor

    Karen Ambra

    Lucia Maria Machado Bógus

    Mary Jane Paris Spink

    Miguel Wady Chaia

    Norval Baitello Junior

    Oswaldo Henrique Duek Marques

    Rosa Maria B. B. de Andrade Nery

    © Maria Antonieta Antonacci. Foi feito o depósito legal.

    Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Reitora Nadir Gouvêa Kfouri / PUC-SP

    Antonacci, Maria Antonieta

        Memórias ancoradas em corpos negros / Maria Antonieta Antonacci. – 2 ed. São Paulo: Educ, 2014.

        Bibliografia.

        1. Recurso on-line: ePub

        ISBN 978-85-283-0522-7

    Disponível para ler em: todas as mídias eletrônicas.

    Acesso restrito: http://pucsp.br/educ

    Disponível no formato impresso: Memórias ancoradas em corpos negros / Maria Antonieta Antonacci. – 2 ed. São Paulo: Educ, 2014. ISBN 978-85-283-0476-3.

       1. Africanos – Diáspora. 2. Cultura – Brasil – Influências africanas. 3. Dança – África. 4. Música – África. 5. Negros – Brasil – Canções e música – Influências africanas. 6. Literatura folclórica brasileira – Brasil, Nordeste – Influências africanas. I. Título.

    CDD 306.40981

    398.109813

    780.96

    783.3196

    784.50981

    EDUC – Editora da PUC-SP

    Direção

    Miguel Wady Chaia

    Produção Editorial

    Sonia Montone

    Revisão

    Siméia Mello

    Bebel Nepomuceno

    Editoração Eletrônica

    Gabriel Moraes

    Waldir Alves

    Capa

    Waldir Alves

    Administração e Vendas

    Ronaldo Decicino

    Produção do e-book

    Waldir Alves

    Gabriel Moraes

    Rua Monte Alegre, 984 – sala S16

    CEP 05014-901 – São Paulo – SP

    Tel./Fax: (11) 3670-8085 e 3670-8558

    E-mail: educ@pucsp.br – Site: www.pucsp.br/educ

    Maria Antonieta Antonacci

    MEMÓRIAS ANCORADAS EM CORPOS NEGROS

    2ª edição revista e ampliada

    São Paulo

    Aos que aqui nos jogaram

    Walter Calixto Ferreira, o Mestre Borel

    À memória de meus pais, Antonio e Suzana, que aqui se encontraram e me cultivaram.

    A existência de uma rede de comunicações entre os escravos, sobre a qual somente temos indícios, não se tornou um objeto sério de pesquisa histórica.

    O impensável é aquilo que não se pode conceber dentro do leque de alternativas possíveis, aquilo que perverte todas as respostas porque ele subverte todos os termos sob os quais as questões foram expressas.

    Michel-Rolph Trouillot

    (...) a história pós-positivista Ocidental, particularmente pela valorização do impresso e da instrução criptográfica, em detrimento de outras formas de comunicação, parece ter afetado drasticamente a forma como os estudiosos ocidentais compreendem e valorizam o poder do corpo como local de múltiplos discursos para esculpir história, memória, identidade e cultura.

    Esiaba Irobi

    Uma cultura é uma herança da qual os indivíduos ou grupos não podem ser despojados do mesmo modo em que podem sê-lo da propriedade ou do poder político. Mas precisamente por causa da habilidade da cultura para afetar o equilíbrio do poder, é necessário que as elites governantes contenham esse poder distintivo. Uma via tem sido através da racialização ou etnização.

    Paget Henry

    Agradecimentos

    Em minha formação acadêmica, encontrei mulheres marcantes, como Déa Fenelon, Theresa Petroni, Nicole Belmont. De seus grupos de trabalho, de leitura em leitura e intensos debates, carrego muitas bagagens.

    Como da sala de aula e de espaços de orientação saíram o mote e o desafio para as pelejas aqui travadas, um imenso reconhecimento a todos que comigo trocaram ideias e suas pesquisas. Na impossibilidade de todos nomear, agradeço, ao Paulino, leituras na imprensa negra de São Paulo; ao Carlinhos, a perspectiva de nem tudo ser italiano; ao Gerson, Airton, Hideraldo, Montyzuma e Agenor; Daniel, Charles, Ednélia, Jhony, Sergio Guerra, Ione e Vilma; Telmo e Rose, expressões de viveres orais ao Norte, Nordeste e Sul do Brasil, destacando o acesso a parábolas do beato José Camilo, via depoimento a Gilmário, que ainda despertou para o potencial de vozes em folhetos de cordel.

    Nesse período, graças a Gilmar Carvalho e um périplo na região de Juazeiro, entrevistei o penitente Joaquim Mulato, o poeta maior Patativa do Assaré, interagindo com artesãos da palavra, da madeira e do couro.Para a leitura de Joaquim Mulato, foi fundamental sua parceria e a do professor Candido Costa e Silva.

    Mais recentemente, agradeço, ao Salloma, caminhos por memórias sonoras negras; a Viviane, Josberto, Zilmar, Simone, Edson, Luis Cláudio, questões relacionadas à cultura material e sensível de grupos populares do Ceará. Ao Marcelo, debates relacionados ao visível e invisível em museus afro; ao Elias, Mônica, Victor, Cristina e Júlio, lutas, vozes, imagens e teatros em perspectivas africanas; e, a Bebel, o encontro com o teatro negro popular no Rio de Janeiro de 1920, como as festas e celebrações negras entre Caribe e Brasil, a par de anseios em aprofundar e reler heranças da diáspora.

    Na redação, usufrui de leituras de Eveline, Amailton, minha irmã Célia e de orientandos como Salloma, Cleber, José Francisco, acentuan­do as contribuições de Bebel.

    Nesse percurso, foi de grande importância compartilhar ideias, em bancas de qualificação e defesa, com Josi e Jerusa, Kabengele e Enio, a quem também agradeço pelas generosas e estimulantes leituras. Nessa trajetória ainda contei com muitas conversas com Kazadi, uma vez que não teria superado impasses relacionados à música em Áfricas sem sua preciosa companhia, indicando autores e detendo-se na escrita com sugestões que, nem sempre, consegui incorporar.

    Muito significativo foi conviver com a equipe do Museu Afro Brasil, sob curadoria de Emanoel Araujo e coordenação de pesquisa de Maria Lucia Montes.

    Agradeço, ao CNPq, via bolsa PD e taxa de bancada, o custeio de viagens de estudo, o acesso e pesquisas em arquivos, museus, exposições, como a compra de livros, CDs e DVDs nesses anos. À Fapesp, o start destes estudos com bolsa pós-doc na EHESS. A redação final valeu-se de intercâmbio, via Convênio Capes/UT, nos últimos dois biênios.

    Não fosse o incentivo da Educ, não teria me animado a esta empreitada de reunir e rever ensaios com mais de dez anos, agradecendo muito por terem editado um canteiro em obras.

    Aos de casa, Thiago e Julia, a doce companhia e a contínua ajuda diante de meu precário desempenho em relação às técnicas de digitação.

    De diferentes formas, muitos contribuíram para despertar, em Vozes Anoitecidas (1987), Estórias abensonhadas (1994), na poética de Mia Couto; mas difíceis de serem escritas, pois, combinando formas, ritmos e cores, configuram vidas e histórias inadmissíveis na lógica do Ocidente.

    Prefácio

    Kazadi wa Mukuna¹

    Na África, a música tem papel e função em todos os aspectos da vida, do nascimento à morte. Para os vivos, é uma ferramenta didática usada para instruir os membros de uma geração mais jovem a seus papéis como membros efetivos de suas comunidades. Além disso, a linguagem também providencia informação pertinente sobre a natureza da música, indo da estrutura melódica de uma música e sua organização rítmica, a suas implicações harmônicas e ao papel que ela desempenha no dia a dia das pessoas.

    Música e dança funcionam como um meio de comunicação e do­cumentação e servem como ferramentas essenciais para a tradição oral. A linguagem de um grupo étnico também exerce um papel vital nessa mídia, que está contida no conceito da filosofia da existência, com significado e representação na expressão "I belong, therefore I am" (Pertenço, logo sou). Ou, como expresso no termo Zulu do Ubuntu, baseado no relacionamento simbiótico entre todos os elementos dentro do universo. Esse conceito fundamental a respeito da música e dança na África também sobreviveu no Brasil, através do impacto da tradição oral na mente dos africanos e seus descendentes. Citando Hampâté Bâ (1981, p. 168), A tradição oral é a grande escola da vida, e todos os seus aspectos são cobertos e afetados por ela. É ao mesmo tempo religião, conhecimento, ciência natural, aprendizado em um ofício, história, entretenimento e recreação.

    Maria Antonieta Antonacci, professora de história e de culturas africanas na PUC-SP e coordenadora do Cecafro, convidou-me para ministrar um curso intitulado Música Africana, Teoria, Artes e Cultura. Mais de cem estudantes, graduados e ainda não graduados, compareceram a esse curso cujo cerne era constituído pelo papel e função da música, dança e linguagem africana.

    A natureza da preservação de africanismos na memória coletiva dos descendentes de heranças africanas tem desafiado os estudiosos brasileiros nas várias disciplinas humanas. Das perspectivas históricas e sociológicas, às manifestações culturais e religiosas, enquanto tentam interpretar o impacto de africanismos retidos em várias práticas culturais. Neste livro escrito por Antonieta, cada texto, embora com diferentes títulos, Tradições de oralidade, escritura e iconografia na literatura de folhetos: Nordeste do Brasil, 1890/1940, Artimanhas da história, Corpos sem fronteiras, Corpos negros desafiando verdades, fala do mesmo tema e atesta a larga amplitude do conhecimento que a autora carrega a respeito da África, sua história e sua cultura, e seu impacto no tecido cultural do Brasil. Pontos que são claramente descritos conforme são aplicados pela autora, no decorrer de cada um, em sua introdução.

    Trata-se de uma coleção de estudos independentes, planejados para apreender evidências afrodiaspóricas, na originalidade de suas abordagens. É importante para um melhor entendimento e interpretação do tecido cultural brasileiro, não só da perspectiva da preservação de elementos culturais africanos no Brasil, mas também do reconhecimento de seus significados em várias manifestações culturais, desde o contar histórias a designs iconográficos. A presente coletânea de documentos de pesquisa escritos por Antonieta reflete o entendimento daquele curso. A autora incorporou os conhecimentos então discutidos para decifrar significados da tradição oral africana contida em africanismos – oral, literário, danças, manifestações culturais, movimentos do corpo –, no imaginário coletivo de descendentes africanos na Diáspora em geral e no Brasil em particular.

    Tradução: José Mauro Trevisan

    Referência bibliográfica

    HAMPÂTÉ BÂ, Amadou (1981). The Living Tradition. In: Ki-Zerbo, Joseph (ed.). General History of Africa Methodology and African Prehistory. Los Angeles, University of California Press.

    1 Etnomusicólogo, Kent University.

    Sumário

    Agradecimentos

    Prefácio

    Apresentação da primeira edição

    Apresentação da segunda edição

    Tradições de oralidade, escrita e iconografia em literatura de folhetos: Nordeste do Brasil, 1890/1940

    Artimanhas da história

    Corpos sem fronteiras

    Corpos negros desafiando verdades

    Cascudo no revela/esconde de Áfricas no Brasil

    É impossível falar a homens que dançam

    Animistas/fetichistas? Dizem eles

    A subliminar arte da memória negra em diáspora

    Decolonialidade de corpos e saberes: ensaio sobre a diáspora do eurocentrado

    Apresentação da primeira edição

    Nós não somos donos de nada,e o que recebemos temos que passar adiante.

    Vovó Maria Joana Rezadeira¹

    Reunindo pesquisas em literatura oral; danças, festas, gestos e ritmos de corpos negros; testemunhos carregados de religiosidade penitencial; imagens ou iconografia comprometidas com a implosão de racismos e práticas coloniais, delinearam-se questões, interrogações, estratégias contradiscursivas que incentivaram a publicação conjunta destes ensaios.

    Ao pesquisar, desde 1998, o perdurante corpo a corpo letra/voz/imagem da literatura oral no Nordeste do Brasil, emergiram visões de mundo, poderes, crenças e saberes de africanos e descendentes, em criativas interações na constituição de um campo político cultural na região, com registros desde cantadores de fins do século XVIII. O surpreendente, ao acompanhar narrativas de animais nessa literatura – conforme Gilberto Freyre, sua presença indica histórias que africanas contavam nos engenhos –, foi perceber que, nas injunções com bichos e outras forças de uma natureza viva e atuante, subjaz concepção de unidade cósmica de povos e culturas em diáspora. De acordo com Amadou Hampâté Bâ, guardião de tradições de Áfricas do Oeste, o universo visível é concebido e sentido como o sinal, a concretização ou o envoltório de um universo invisível e vivo, constituído por forças em perpétuo movimento, no sentido de tradição viva (Hampâté Bâ, 1982, p. 173).

    Cosmologia, ética e estética de culturas populares negras fluem em cantorias e folhetos de cordel, festejos e performances, como em pelejas entre tons contrastantes de xilogravura. Pensados como territórios de oralidade, intertextos dessa literatura sustentam lutas de africanos por liberdade e afirmação de sua condição humana.

    O desdobrar atenções a museus, galerias de arte e exposições, como à música e cinema negros, tem permitido outras aproximações a culturas africanas e da diáspora. Traços de seus horizontes delineiam-se em provérbios e expressões artísticas, extravasam em danças, ritmos e instrumentos musicais, não só na arte de fabricar artefatos sonoros com toques e tons de suas línguas, como em habilidades de comunicação audiovisuais que desafiam leituras ocidentais.

    Recolhidos, enquanto indícios de histórias banidas, corpos negros fazem-se presentes em vários locais e momentos, como é possível entrever em Tradições de oralidade, escrita e iconografia em literatura de folhetos: Nordeste do Brasil, 1890/1940. Insinuando-se em fronteiras, articulando o semelhante à diferença, suas inesperadas performances configuram-se em fatigante trabalho de romper brechas, tornar visíveis e audíveis lugares de memória entre o gesto e a voz.

    Em realidades vivenciadas sem apartações entre reinos humano e espiritual, animal, vegetal e mineral, suas crenças, sons e palavras irrompem em exercícios imprevisíveis. Como em Oriki de Xangô, captado por Antonio Risério. Realçados como textos criativos ou práticas textuais extraliterárias, independentes do universo greco-latino, orikis iorubá articulam canto tonal e acústico –

    Rompemuros

    Rasgaparedes

    Crava pedras de raio

    Abalador

    Abalador

    Raio com raio...

    Abalador, ao som do tambor –,

    em tentativa de desmontar as armadilhas da personalidade cultural dominante e dispor suas antenas de modo a captar a maior variedade possível de sinais de culturas emitidos aqui e ali (Risério, 1993, pp. 21 e 35).²

    Nesta e na outra margem atlântica, em híbridas e renovadas encenações, africanos recortaram, enfrentaram, interromperam estruturas e poderes excludentes com ironia, astúcia e anuência de seus ancestrais. Revelando incoerências de discursos cronológicos, deixaram latências de histórias e geografias esquecidas, como suportes de memorização em tempos trans-históricos.³

    Acompanhando Hampâté Bâ, que viveu, no Mali, a tradição viva, em suas redes de palavra no fazer-se de pessoas em comunidades de sabedoria oral, foi possível apreender viveres em culturas da voz⁴ duelando com culturas da letra. Questões presentes em Corpos sem fronteiras e Corpos negros desafiando verdades. Em pulsares efêmeros e dispersos, que rastreados e articulados ganham densidade histórica, marcas de corpos e de religiosidades disseminadas sob o signo da inversão e insurgência a cânones da lógica litúrgica, foram captados no ensaio Artimanhas da história.

    Ao conjugar narratividades da diáspora no Brasil, despontaram linguagens corporais e sensibilidades de herdeiros de matrizes orais africanas, prefaciando disjunções sonoras e gestuais. Nestas, protagonistas de histórias e culturas orais, em regimes de símbolos e de energias de seus corpos comunitários (Gil, 1997), traduziram traumas e transgressões a sofrimentos cotidianos. Em contínuo negociar e refazer de suas inserções, povos e linguagens africanas seletivamente (re)significaram suas tradições, reinventando Áfricas no Novo Mundo. Áfricas de difícil recriação e reconhecimento, como em Cascudo no revela/esconde de Áfricas no Brasil.

    Seus processos de renovação e incorporações culturais, vibrantes, dramáticos, celebratórios, vivenciados entre pares do presente e do passado, em explosões de cores, gestos, ritmos, deixaram rastros. Silenciados, folclorizados, estetizados ou demonizados por concepções de vida e história predominantes no Ocidente, seus sinais iluminam memórias ancoradas em corpos negros, como em É impossível falar a homens que dançam. Do corpo e de seus prolongamentos materiais e acústicos afloram índices de costumes africanos e perfis de seus documento/monumentos, desdobrando interrogações à história.

    Nesses ensaios, herdeiros de ancestralidades africanas expressam seus universos, referentes mentais e epistemológicos em corpos e imaginários culturalmente plasmados. Mesmo sob conturbações do letramento eurocêntrico – com seus princípios e domínios privados e competitivos –, a tradição viva atualiza-se, refaz instâncias comunitárias material e simbolicamente dispostas em vínculos presente/passado, vida/morte, tradicional/moderno. Movendo-se subterraneamente, gêneros orais vêm burlando impossíveis esquecimentos e práticas de apaziguamento racial e cultural.

    Hoje, persistem como alteridades políticas que resguardam modos de sentir e transgredir a ideários da modernidade ocidental, projetando imagens, textos e identidades paradoxais. Sinais de tradição viva em seus códigos de vigência, em sua corporeidade e formas de ocupar tempos e espaços, em seus patrimônios tangíveis e sensíveis, reverberam em situações limítrofes. Foram surpreendidos, lidos e vasculhados em ires e vires, acompanhando pensadores e artistas envolvidos em seus laços, desde nossas interações com utopias de Walter Benjamin e Édouard Glissant, no sentido de lutas culturais sustentadas pelo cultural studies ao centrar-se em formas de viver, sentir e pensar de grupos sociais, em indisciplina perante cânones acadêmicos.

    Na contracorrente do domínio ocidental nos modos de pensar, barbarizar e denegar povos e culturas extraeuropeias, mais que abraçar tradições vivas represadas da porta de casa para dentro, Walter Benjamin deteve-se a lembrar desde fragmentos. Não para preencher lacunas e reconstruir passados, mas para renovar pelejas, solapando estratégias dominantes.

    Trazer Benjamin, que viveu e filosofou em fronteiras oral/escrito de perseguidas tradições judaicas, para este corpo a corpo com renegadas memórias de Áfricas e suas diásporas, significa mergulhar em imponderáveis da história. Abandonar discursos e temporalidades universais no mapeamento geo-histórico foi preliminar dessas atenções a memórias ancoradas em experiências dos que só têm no corpo e em suas formas de comunicação heranças de seus antepassados e marcas de suas histórias. Em contínuos desterros, sem construídas séries documentais, vivendo e transmitindo heranças em performances, recursos linguísticos e artísticos, povos africanos pluralizam nosso alcance de acervos históricos, monumentos e patrimônios audiovisuais, situando a necessária arqueologia de saberes orais, a ser enunciada e valorizada.

    Benjamin tornou-se presença indelével, nesses ensaios, por sua procura por historicidade que, sem ser acúmulo de conhecimentos, detém-se em insondáveis processos de rememoração, e por sua percepção da luta cultura/barbárie por documentos históricos. Conforme Gagnebin, trata-se de saber considerar a realidade dos objetos de maneira suficientemente crítica para nela descobrir, na sua constituição mesma, os rastros de uma outra configuração, uma vez que os elementos mais díspares testemunham um outro ordenamento ideal onde poderiam ser reintegrados na sua verdade perdida. E como as teses de Benjamin prenunciam, sinais vislumbrados "só serão verdadeiramente salvos quando formarem uma constelação, tais estrelas, perdidas na imensidão do céu, só recebem um nome quando um traçado comum as reúne" (Gagnebin, 1994, pp.15 e 18).

    Tal atenção, não sendo nem gratuita nem estetizante, mas orientada por exigência ao mesmo tempo epistemológica e teológica: aquela da salvação (ibid., p. 16), aquela comprometida com os que estão nas dobras do dominante⁶, não pode ignorar que a promessa de uma outra ordem não significa garantia de cumprimento da profecia. Recontar sinaliza, de maneira inelutável, o reconhecimento da perda, a recordação de uma ordem anterior e a fragilidade desta ordem (ibid., p. 17). Em filosofia de história aberta, o passado dirige apelo ao presente que contém os imponderáveis da luta de um fazer-se histórico sempre em movimento de relações com a diversidade, conforme o poeta e ensaísta da diáspora, Édouard Glissant, enfrentando a globalização (Glissant, 2005).

    Pensar desde a metáfora de visualizar constelações em pontos dispersos pode articular-se à poética política desse pensador da Martinica, que investindo contra a falsa universalidade do pensamento sistêmico, abraçou "pensamentos de rastro/ resíduos", descontínuos, intervalares, articulando rizomas (ibid., pp. 20 e 29).⁷ Em assumida maneira de trabalhar­ errática, entrelaçada, anárquica – da qual se desculpa⁸ – Glissant enuncia um pensar na alquimia de matrizes orais e escritas de sua ancestralidade africana e formação europeia.

    Em dinâmicas de crioulização, onde laços se refazem ao permutar com o outro sem diluição, Glissant sentiu a diáspora. Fugindo da imagem identidade como raiz única ao encontro de identidade como rizoma, abandona o previsível da mestiçagem pelo imponderável de "culturas compósitas", advindas do pulsar de povos e línguas em diásporas no Novo Mundo (2005, p. 27).⁹ Daí investir em olhar que abarque, com um só impulso a platitude vertical e o acúmulo rugoso do real, (ibid., p. 14) que irrompe e irradia a presença africana no espaço tempo Caribe, entendido como área cultural desde o sul dos Estados Unidos ao Norte e Nordeste do Brasil.

    Além de questionamentos a concepções de tempo, história, do­cumento/monumentos abertos por Benjamin¹⁰; e a crítica a sincretismos, por Glissant, assume centralidade, no último ensaio, debate atual em torno de opção descolonial com projeto de decolonialidade racial e epistêmica do poder, do saber, do ser. Na contramão de abstrações cartesianas, diversos projetos e perspectivas políticas – diversidade no plano epistêmico, ético e cosmológico –, visam construir um mundo ‘pluriversal’ (Grosfoguel, 2010, pp. 120-121)¹¹.

    Em Decolonialidade de corpos e saberes: ensaio sobre a diáspora do eurocentrado, apreende-se o racismo como postura e episteme constitutiva da modernidade colonial, enquanto lógica que dispõe costumes, saberes e fazeres de povos, comunidades e culturas entre central e marginal. A atualidade crítica ao colonialismo aponta limites de conhecimentos que sustentam olhar eurocentrado e a emergência de pensamentos liminares na percepção que:

    o ponto central de outras perspectivas epistemológicas está na relação estreita entre o lugar de enunciação, isto é, a localização geopolítica e corpo-política do sujeito que fala nas coordenadas do poder global e sua inserção na produção de conhecimento. (Grosfoguel, 2006, p. 151 e Mignolo, 2003)

    Reunir esses ensaios, com pesquisas no vai e vem de fluxos atlânticos, permite evidenciar como o trabalho de garimpar iluminações locais e pontuais permanece fragmentário e incide em repetições. Como comentou Glissant, Penso que a repetição constitui uma das formas do conhecimento do nosso mundo; é repetindo que começamos a ver os indícios de uma novidade que começa a aparecer (Glissant, 2005, p. 41).

    E aparece como em Oriki de Xangô, rachando escaninhos acadêmicos, rasgando compêndios, invadindo museus e monumentos consagrados, estilhaçando tempos, refazendo currículos, materiais pedagógicos e suportes que encobrem histórias ao sustentarem pretensões de uma identidade e cultura nacional.

    Raios e sons anunciam outras espiritualidades, ritmos, cantos, danças do multiétnico e pluricultural Brasil. Como emergem em rituais liminares, marcados por imagens e metáforas de cognições silenciadas, com ruídos vem abalando ordens de um mundo já naturalizado. Foi Thompson (1998), em direção à história vista de baixo, que enfatizou barulho estridente, cacofonia rude ou música de algazarra como um dos modos simbólicos mais antigos e mais constantes de expulsão do mal ou do outro.¹²

    Nesse sondar mundos do outro da raça, da história, da oralidade, da civilização, da colônia, além de incomensuráveis desafios, revelam-se potenciais da condição humana. Se diversificar arco de documentos históricos faz repensar museus, acervos, abordagens, conceitos atribuí­dos a povos de línguas orais, interagir com seus códigos de produção/transmissão de saberes certamente revigora fontes e recursos de vida em Terra esgotada.

    Defrontando-se com desafios em relação a culturas constituí­das em torno de procedimentos de transmissão e não do transmitido em padrões ocidentais, o filósofo africano Mamoussé Diagne, da Universidade de Dakar, retomou Michel Foucault, em Arqueologia do saber (1969), e Jacques Goody, em A lógica da escrita e a organização da sociedade (1986). Discutindo a lógica do oral, seu patrimônio, seu vir a ser arquivo e arqueologia de saberes, estruturada em condições de enunciação, ignoradas em Ocidente estruturado em sistemas de enunciabilidade, provoca debates em outros patamares (Diagne, 2005).

    Na perspectiva que o arquivamento histórico, notadamente em ausência de escritos, coloca mais nítido questões vitais para todas as sociedades, Diagne pergunta: A quem interessa lembrar? Quem quer compartilhar suas lembranças e necessita meios de obrigar outros a compartilharem? (Diagne, 2011, pp. 633-634).

    Questões já trabalhadas por Louis-Jean Calvet. Como guardar a memória da experiência humana e torná-la presente em um lugar e tempo o que está ausente? Decifrando engenhosos procedimentos memoráveis, criados por povos e línguas orais, consideradas inacabadas, incompletas por imperialismo cultural em sua variante fonética (Calvet, 1984; 2008, p. 22), esse linguísta francês ampliou níveis de exclusão. Contrário ao uso de não civilizados e sem escrita como sinônimos, denunciou certas formas de racismo que ajudaram a consolidar a superioridade de nosso Ocidente, surpreendido com a possibilidade de uma parte da humanidade ter-se convertido em juiz da outra (ibid., pp. 16 e 21).¹³

    São questões dessa ordem que vêm sendo enfrentadas por estudiosos africanos, latinos, europeus, neste limiar de século, e que ainda não reper­cutiram entre nós. Pensando nesse campo de debates, Souleymane Bachir Diagne, filósofo senegalês na Universidade de Colúmbia, organizou a publicação Philosopher en Afrique uma atividade e não uma essência –, com textos de filósofos africanos em Diálogo filosófico inter-regional África-América, reunido pela UNESCO, nos Estados Unidos, em 2011. Pelas intervenções ficam plausíveis deslocamentos que, deixando filiação vertical rumo a universos em diagonal ou lateral, com travessia entre pensares africanos e ocidentais, lembram abordagem em rizoma, proposta por Glissant.

    Contra a racionalidade técnica e distúrbios de comunicação em Áfricas, seus filósofos voltam-se a suas tradições, em debates de, com e contra a Teoria Crítica. Jean-Godefroy Bidima, atualmente na Universidade de Tulane, propõe encontro/criação que revitalize heranças filosóficas orais e escritas, concebendo prática filosófica africana como ‘travessia’, conceito além armadilha da universalidade ou particularidade, valorizando não tanto o dado transmitido, mas a transmissão em si mesma (Bidima, 2011, pp. 672-686).

    Em leitura descontinua da história africana, Bidima atinge o cerne de práticas orais ao centrar-se na palavra de quem fala, seu modo de conhecer e transmitir, enfatizando a palavra como fundamento na constituição de espaço público em África. Insistindo "oralidade não se reduz à palavra, pois o gesto e toda a performance corporal são partes constitutivas" de sua ex-pressão, reitera: "Há oralidade onde há ex-pressão, que entendemos ato de surgir do cruzamento da palavra, do corpo, do Sujeito no mundo, ação e reação."

    Oralidade como ex-pressão será assim a face de cruzamento que não se reduz, nem 1) a uma concepção dualista: oralidade versus escrita, ciência e precisão ao lado da escrita, enquanto imprecisão com suas nebulosas míticas seriam força da oralidade; nem 2) a uma aproximação monista: oralidade reduzida à palavra e ao ritmo; nem 3) uma compreensão dialética onde a oralidade seria apenas um momento, metáfora da escrita, esta última permanecendo seu fundamento.

    Privilegiando a palavra sem a ela se reduzir, convocando o gesto sem nele demorar, atravessando o mundo ao mesmo tempo em que o eleva à dimensão simbólica, a oralidade não se estabelece num lugar para dele fazer sua morada, em vez disso se aprofunda no seio de todo lugar, alguma coisa como não-lugar (u-topos) abrindo à experiência. (Bidima, 2011, pp. 683-684)

    Assumindo experiência no sentido de Benjamin, que pressentiu tragédias em viveres europeus minados por perdas na capacidade de produzir instâncias de comunicação articuladas a expectativas comuns, chegou ao pensar proverbial desse filósofo nos anos 1930: Quem é ajudado, hoje, por um provérbio oportuno? (ibid., p. 684). Diante da banalização da política e da vida pública, Bidima considera que o verdadeiro desafio da oralidade em África, hoje, situa-se na questão:

    como, habitando a experiência, é possível criar não um espaço estreito e reduzido a nossos pequenos hábitos conceituais e políticos, mas um lugar de passagem que ultrapasse os limites e reformule elocuções, fraseados e projetos? (Ibid.)

    Tais expectativas frente práticas de filosofia política comunitária, que não deixam ninguém de fora, visando discussões até consenso,¹⁴ lembram imagens, cenário e personagens do filme Bamako (2006), com roteiro e direção do cineasta Abderrahmane Sissako. Em linguagem cinematográfica, projeta julgamento imaginário do FMI e do Banco Mundial, por parte de cidadãos africanos que decidem processar instituições financeiras internacionais, responsáveis pelo endividamento do continente. Em quintal de vida cotidiana africana, inventariando raízes populares de "representação substancial – em que a palavra institui um espaço público" (Bidima, 1997, p. 13) –, seu roteiro constrói-se com argumentos de populares, como palavras de ancião, até ex-Ministra de Cultura no Mali, Aminata Traoré, partícipe dessa filmagem na contramão de discursos do liberalismo de elites africanas.¹⁵

    Mas esse oásis africano – como se conhece o cinema em Áfricas – vem secando em virtude de financiamentos europeus condicionarem sua produção e circulação. Em balanço da narrativa do cinema africano, o cineasta e professor Manthia Diawara lastima perda de autonomia de quando éramos ao mesmo tempo tradicionais e modernos e a fronteira entre o que é ocidental e tradicional não emitia efeitos de explorações em direção a um nacionalismo, para não dizer um tribalismo, que se agrava (Diawara, 2007, pp. 68 e 75).

    Longe de mediações, práticas colonialistas no cinema, na vida pública e outras instâncias africanas, entrelaçadas aos interesses de elites locais e externas, desdobram indicadores férteis em termos de fractura colonial.¹⁶ A nitidez dessa imagem vem acompanhada por outra, representada na expressão Afrique: Mondialisée mais pas dupe – África: globalizada mas não enganada.¹⁷ Perfis de uma e outra encontram-se nestas memórias ancoradas em corpos negros.

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    1 Maria Joana Monteiro, Vovó Maria Joana Rezadeira (1902/1986). Nasceu no Rio de Janeiro, viveu no Morro da Mangueira e em Serrinha, onde participou da fundação da Escola de Samba Império Serrano. Cf. encarte do CD Jongo da Serrinha (Compact disc Digital Áudio, Programa de Bolsas da RioArte, RJ, 2002).

    2 Orikís iorubá são poemas em linguagem figurada; devem sua denominação à "fusão vocabular, palavra-montagem, reunindo as expressões orí (cabeça-origem) e ki (verbo: saudar)".

    3 Expressão de Haroldo de Campos, no sentido que (...) fontes orais conseguem escapar à rasura e continuam a manar e fluir onde quer que as culturas não-escritas tenham resistido e sobrevivido no tempo trans-histórico que lhes é peculiar. Cf. Campos (in Risério, 1993).

    4 Sobre o desprezo da voz no Ocidente, lendo "a história da metafísica como uma desvocalização do logos de Platão a Derrida", cf. Cavarero (2011).

    5 Perspectivas captadas em projetos de pesquisa Culturas da voz em circuitos África, Brasil, Caribe, financiado pelo CNPq; Identidades diaspóricas em trânsito no Atlântico sul: áreas de culturas negras entre África, Brasil, Caribe, desenvolvido no âmbito de Convênio Capes/UT, nos últimos dois biênios.

    6 Expressão de Deleuze e Gatarri (1996).

    7 Contra pensamentos de sistema ou sistemas de pensamento [que] foram prodigiosamente fecundos, prodigiosamente conquistadores, prodigiosamente mortais, Glissant propõe pensamentos de rastro/resíduos, que não seja nem dominador, nem sistemático, nem imponente, mas talvez um não-sistema intuitivo, frágil e ambíguo, que articule rizomas, que convenha melhor à extraordinária complexidade e dimensão de multiplicidade do mundo no qual vivemos.

    8 Desafiando, em variâncias, gêneros literários do Ocidente, Glissant legou vasta obra em deslocamentos de romances poemas para contos e peças de teatro, poesias e inúmeros ensaios. Iniciou essas conferências se desculpando por forma de pensar repetitiva em que a fala predomina sobre reservas da escrita.

    9 Glissant explicita que tomou emprestado de Deleuze e Guattari a distinção entre raiz e rizoma. Estes autores propõem do ponto de vista do funcionamento do pensamento, o pensamento da raiz e o pensamento do rizoma. A raiz única é aquela que mata à sua volta, enquanto o rizoma é a raiz que vai ao encontro de outras raízes. Apliquei tal imagem ao princípio de identidade rizomática que me é própria.

    10 A biblioteca de Benjamin incluía milhares de fragmentos orais, como provérbios, adágios, aforismos, parábolas, fábulas, contos, ditos populares, recolhidos em arte de colecionar como processo de renovação. Cf. Benjamin (1987, pp. 227-235).

    11 Todas as traduções de citações de textos em língua estrangeira são de nossa responsabilidade.

    12 Estudos retomados em 2001 (p. 249).

    13 Na publicação original (Paris, 1996), Jean Calvet, da Sorbonne, é apresentado com múltiplas investigações de campo em todo mundo, falando várias línguas e lendo escritas distintas.

    14 Cf. Ksavi Wiredu, filósofo de Gana (apud Chike, 2011, pp. 639-649).

    15 Sobre emergência do neoliberalismo em África, como imitação do Ocidente, denunciando o desvio em relação a um pensamento africano, cf. Hensbroek (2011, pp. 656-657).

    16 Sobre fractura colonial, cf. Blanchard, Bancel e Lemaire (2005).

    17 Mondialisée mais pas dupe, quadro do artista Bruce Clarcke, projetando expressão que migrou para dossiê de Africultures, 66 (2006), contrário ao jogo ultraliberal da diluição do diverso, reafirmando diversidade das Áfricas no coração da globalização e no coração da solução, como continente mais globalizado e talvez o menos enganado nas disputas.

    Apresentação da segunda edição

    O conceito de rastro é caracterizado por sua complexidade paradoxal: presença de uma ausência e ausência de uma presença

    Jeane Marie Gagnebin (2012, p. 27)

    Em tempo de lutas políticas contra o esquecimento ou ao que escapa à consciência individual ou histórica, não poderia pensar em nova edição destes ensaios sem rever algumas passagens e, acima de tudo, incluir mais dois estudos que já estavam em andamento na preparação da primeira edição. De outra parte, aproveito para reverenciar Stuart Hall, situando suas reflexões no contexto da cultura contemporânea pós-colonial, entre intelectuais envolvidos com lutas culturais e raciais, sem perderem de vista inserções na contramão da expansão do ocidentalismo, hoje sob crítica persistente.

    Um dos novos textos, Animistas/fetichistas? Dizem eles, aborda conjugações cultura/natureza, sagrado/profano, no universo cósmico de culturas

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