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Coleção Religare: Um Novo Paradigma De Espiritualidade
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E-book332 páginas4 horas

Coleção Religare: Um Novo Paradigma De Espiritualidade

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Sobre este e-book

Neste volume, o autor trata dos valores espirituais que os planos superirores sempre ofertaram para a humanidade. No entanto, esses valores sofrem a influência das limitações humanas, do ego, da cultura, da linguagem, do cérebro humano e as limitações do nosso entendimento. O autor aceita o desafio de Feuerbach e Kant, que nos mostram como somos limitados para falar sobre o que nos transcende. No entanto, a filosofia e a religião, e, aos poucos a ciência, podem trabalhar com dados que a cada dia nos chegam através de experiências transcedentais como a mediunidade, as Experiências de Quase Morte, e os relatos de crianças sobre reencarnação. Vale a pena também percorrer o legado da humanidade sobre espriritualidade. Tudo o que se escreveu baseado nas intuições que vieram dos planos mais altos, mesmo com as distorções impostas devido à condição humana. Tudo isso forma um manancial imprescindível que escreve a história das buscas humanas pelo transcendente e o processo de crescimento espritual da humanidade.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento28 de jan. de 2023
Coleção Religare: Um Novo Paradigma De Espiritualidade

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    Coleção Religare - Edomberto Freitas Alves Rodrigues

    Coleção Religare: um novo paradigma de espiritualidade

    Volume IV - A descida dos valores espirituais

    Edomberto Freitas Alves Rodrigues

    Clube dos autores (independente)

    O autor

    Edomberto Freitas Alves Rodrigues. Formado em História pela UFMG e Filosofia pela PUC-MG. Professor de história em BH e Betim. Pesquisador de espiritualidade e filosofia. Escreveu a coleção Religare, dialogando com várias áreas do conhecimento humano, entendendo que não devemos compartimentalizar o saber. Afinal, no universo tudo está integrado. Só uma visão holística do real poderá possibilitar uma maior aproximação da verdade, que todos dizem possuir, mas que nossa condição humana e limitada permite apenas aproximações. Assim, não há pretensão de verdade pelo autor, mas uma busca sincera e apaixonada pelo conhecimento.

    Capa: Edomberto Freitas e Valéria Franco

    Revisão: Kainara Brenda da Silva

    Coleção em 5 volumes

    Título da coleção: Religare: um novo paradigma de espiritualidade

    Volume IV: A descida dos valores espirituais

    1ª Edição: Janeiro de 2023

    SUMÁRIO

    SUMÁRIO

    Introdução

    A descida dos valores espirituais

    Capítulo 1

    Gurdjieff e os quatro caminhos

    Capítulo 2

    Kant e Feuerbach: os limites da razão para alcançar o transcendente

    Capítulo 3

    Lao-Tsé e confúcio

    Capítulo 4

    Bramanismo, Hinduísmo e budismo: as primeiras técnicas de libertação

    Capítulo 5

    Zoroastrismo

    Capítulo 6

    Cristianismo gnóstico

    Capítulo 7

    Outros gnosticismos: a Cabalá e o Sufismo

    Capítulo 8

    Mediunidade e ciência em busca do transcendente

    Capítulo 9

    Xamanismo

    Capítulo 10

    O Universo é mental

    Capítulo 11

    Uma reflexão sobre o Universalismo Crístico

    Capítulo 12

    Da África, o ubuntu

    CONCLUSÃO

    BIBLIOGRAFIA

    Introdução

    A descida dos valores espirituais

    Neste volume, vamos trabalhar com a seguinte especulação: o trabalho da espiritualidade superior de trazer intuições que possam auxiliar no progresso da humanidade para o religare encontra inúmeras dificuldades e barreiras, impostas pela linguagem, pela cultura, pelos dogmas estabelecidos, pelo ego, pelas inúmeras leituras que se pode fazer de uma mesma intuição etc.

    Quando um ideal ou conhecimento desce das elevadas esferas, onde o pensamento acessa com mais facilidade o conhecimento universal, para o meio denso, em que o pensamento se limita às condições da razão possível ao homem na esfera física, é natural que ele seja deformado. Mas os espíritos superiores, em seus incansáveis esforços para auxiliar aqueles que estão na retaguarda evolutiva, encontraram muitos caminhos para lançar suas sementes intuitivas no campo das agruras humanas.

    Um dos caminhos foi possibilitar encarnações de espíritos com notáveis conquistas espirituais para que pudessem ser instrumentos mais capacitados na recepção das intuições elevadas. Mas isso não significou que as barreiras não existissem. Uma vez no campo terreno, esses ousados colaboradores encontraram dificuldades próprias do meio físico denso. A linguagem inapropriada para a transmissão dos elevados conceitos, as barreiras impostas pelos dogmas estabelecidos, o próprio ego eneagramático a que cada ser se vincula e, quando não devidamente trabalhado, tudo isso e muito mais oferece dificuldades para a pureza das intenções superiores.

    Assim, muitos missionários dos planos maiores se viram limitados e falaram desse lugar estreito e a partir de sua perspectiva limitada. Embora isso não signifique que tudo ficou perdido, afinal cada um contribui segundo sua condição evolutiva para compor o imenso mosaico de valores espirituais que, no fim, auxiliaram a humanidade em sua jornada para o seu telos.

    No entanto, muitas contribuições valiosas foram perdidas nos embates e confrontos de diferentes visões e leituras da verdade. Uma que vamos nos aprofundar foi a perseguição aos cristãos gnósticos, que, se não houvesse ocorrido, a teoria da queda seria hoje muita mais difundida e aceita, pois ela era um traço recorrente e essencial no corpo da doutrina gnóstica. Mas quis a sabedoria divina que a vasta biblioteca de Nag Hammadi fosse reencontrada, possibilitando o conhecimento de outras vertentes do cristianismo.

    Os espíritos superiores sabiam que qualquer pretensão de universalidade seria ilusória para seres tão desiguais em conquistas interiores. Por outro lado, alguns sentem mais atração por mensagens mais emocionais, outros por mensagens mais intelectuais e outros por caminhos que trabalham mais o corpo físico, explorando as danças e outros rituais que exigem mais o corpo físico. Dessa forma, variados missionários vinham para trabalhar mensagens diferenciadas na forma de expressão para que todos pudessem ser contemplados em suas idiossincrasias.

    Da incompreensão das especificidades humanas veio, muitas vezes, a tentativa de universalização de mensagens que se enquadravam melhor para determinada cultura ou ego. A intolerância e a perseguição foram o resultado dessa pretensão. Assim, missionários tiveram que vir trabalhar os valores da tolerância e respeito pela liberdade de pensamento para que a humanidade não perseverasse em sua sanha de dogmatismo e violência.

    Embora muitos grupos ainda hoje tenham como ideal universalizar sua mensagem particular, a força dos Direitos Humanos, implementados pelas constituições laicas, tem tratado de colocar o valor da tolerância acima do valor da universalidade, que só pode assumir ares arbitrários no contexto evolutivo em que a humanidade se encontra. Aprofundaremos essa análise no capítulo Uma reflexão sobre o Universalismo Crístico.

    De maneira geral, como nós já comentamos, os homens acabam por interpretar as intuições dos planos superiores dentro de sua condição humana e imperfeita. É assim que a intuição sobre Deus foi antropomorfizada, com o Ser Superior sendo visto com as próprias características humanas elevadas à perfeição. Faremos um estudo detalhado dessa característica humana, mas, no final, perceberemos que essa projeção não é de todo equivocada, uma vez que somos fractais da grande consciência geradora. É natural, então, que tenhamos algo Dele em nós, mas que precisa ser melhor dimensionado.

    Outra coisa precisa ser esclarecida. Como vamos percorrer várias religiões da humanidade, muitos poderão indagar por que ficou faltando essa ou aquela. Quero frisar que não temos a intenção de fazer uma história das religiões, tarefa grandiosa e louvável, mas já foi feita com competência por muitos, entre os quais Mircea Eliade. Aqui percorreremos algumas expressões da religiosidade universal, sabendo que muitas religiões importantes foram deixadas de fora, mas tínhamos que fazer escolhas.

    De qualquer forma, acreditamos que para a nossa intenção aqui, que é mostrar os desafios de se fazer expressões de elevado cunho, descer em um ambiente extremamente problemático e limita­do, que é o meio físico, com o objetivo de promover valores que possam guiar os seres humanos em sua jornada para o religare, as escolhas que aqui fizemos servirão perfeitamente. Vale lembrar que não vou julgar em que grau as intuições foram bem ou mal traduzidas, pois para isso eu teria que estar na perspectiva privilegiada do plano espiritual, o que não é verdade. Mas, sempre que possível, procurei analisar como a perspectiva eneagramática pode ter interferido nas intuições.

    Finalmente, queremos dar uma contribuição para a tolerância, ao mostrar que as religiões, cada qual a seu modo, são uma forma de se traduzir elevadas intuições que compareceram ao longo da história como uma forma de Deus lançar o seu auxílio amoroso para que o homem possa retornar ao seu aprisco verdadeiro.

    Capítulo 1

    Gurdjieff e os quatro caminhos

    Gurdjieff foi um dos expoentes que percebeu que existem vários caminhos para tipos diferentes de pessoas. Esses caminhos relacionam-se com os tipos de homens, segundo ele, os números 1, 2 e 3, que explicamos no volume I. Relembrando, o tipo nº 1 é aquele que está mais relacionado com o seu corpo, o nº 2 aquele mais emocional e o nº 3 é o mais intelectual. Para cada um desses tipos existem caminhos que cada qual se identificará mais, devido aos aspectos mais predominantes de seu Ser. Gurdjieff acreditava que isso era incompleto e ineficaz para uma proposta de desenvolvimento harmonioso do homem e, por isso, ele propôs o chamado Quarto Caminho, em que se trabalhariam diferentes exercícios com o objetivo de estimular e desenvolver as múltiplas dimensões do homem de forma harmoniosa.

    Gurdjieff ensinava que o homem não possui a imortalidade, podendo conquistá-la mediante exercícios que poderiam produzir corpos espirituais que poderiam sobreviver à morte física. Esses caminhos poderiam fazer com que o homem conquistasse tais corpos. Na coleção Religare defendemos que o homem já possui tais corpos superiores, o que falta a ele é conquistar em si o altruísmo, fim de sua estadia aqui nesse plano denso. No entanto, acreditamos que Gurdjieff acerta ao ver o homem como um ser desarmônico em seu desenvolvimento das suas múltiplas dimensões, pois sempre sobressai um aspecto em detrimento dos outros. Essa desarmonia é que leva o ser a se identificar com determinados caminhos que refletem o aspecto predominante nele. Veremos, em alguns casos, que os missionários que trouxeram os diferentes caminhos também eram egos que projetavam em seus ensinamentos suas perspectivas egoicas. Como vimos no volume I, a única exceção foi Jesus, que transitava com equilíbrio pelos aspectos positivos de cada ego.

    Dito tudo isso, vamos aos caminhos, conforme teorizados por Gurdjieff.

    O caminho do faquir

    O caminho do faquir relaciona-se com o tipo 1, mais físico. Assim, esse caminho consiste em lutar contra o corpo até impor a vontade sobre ele, conquistando o poder sobre o corpo. O faquir consegue isso depois de um longo tempo de treinamento, com muitas horas de posturas determinadas sem se mover. Segundo Gurdjieff, alguns chegam a perder alguns movimentos, necessitando de ajuda para se limpar e alimentar. Se não morrer, a vontade física desenvolve-se nele, podendo desenvolver um quarto corpo espiritual. Mas suas dimensões emocional e intelectual não se desenvolvem. Tem vontade, mas não sabedoria para aplicá-la. Assim, não a utiliza para alcançar conhecimento ou aperfeiçoar-se a si mesmo.

    Segundo Gurdjieff, geralmente os faquires não escolheram esse caminho por sentimento religioso ou por admiração dos seus objetivos, mas muitos são recrutados por faquires que adotam órfãos para torná-los seus alunos. Pode acontecer também que uma alguém se sinta tocada pelo espetáculo dos faquires e torne-se sua seguidora. De qualquer forma, esse caminho exige apenas a imitação dos discípulos. Embora Gurdjieff fale apenas dos faquires, podemos depreen­der que existem outros caminhos que dão ênfase na dimensão física, com muita expressão de danças e rituais que exigem a vontade sobre o corpo. É possível que pessoas que tenham foco maior na dimensão física se sintam atraídas por esses caminhos.

    O caminho do monge

    Esse é o segundo caminho na teoria de Gurdjieff. Um caminho de fé, de sentimento religioso e dos sacrifícios. O sacrifício maior nesse caminho está mais relacionado com os sentimentos, na tentativa de submeter as outras emoções a uma só: a fé. Segundo Gurdjieff, esse esforço faz com que surja, nesses adeptos, a unidade, a vontade sobre as emoções. No entanto, suas dimensões física e intelectual podem permanecer subdesenvolvidas. Como no caso do faquir, o monge também não tira proveito de sua unidade e vontade, pois falta a ele o cultivo das dimensões intelectuais e físicas. Mas raros são os que conseguem esse complemento evolutivo em uma vida.

    Novamente, embora Gurdjieff não faça essa afirmação, podemos enquadrar nesse caminho todas as religiões que colocam o sentimento da fé como sua principal diretriz. Muitas religiões vivem para adorar e vivenciar a fé até suas últimas consequências. Para muitos, a fé conduz a alma para o Céu, libertando o indivíduo do inferno eterno. Se observarmos, muitos caminhos colocam a razão subserviente à fé, impedindo que as pessoas percebam as contradições e incongruências de suas religiões. Se a razão entra em conflito com a fé, fica-se com a fé e abandona-se a razão. Embora a modernidade já tenha relativizado esse conflito, tendendo para uma maior aceitação da ciência, não são poucos os que vivenciam a fé como a direcionadora da vida, em detrimento da razão. Esses caminhos atraem naturalmente para suas fileiras os egos mais emocionais, o que Gurdjieff chamava de homem nº 2.

    O caminho do Iogue

    Esse é o caminho que põe ênfase no conhecimento, no intelecto. O Iogue desenvolve bastante o intelecto, mas seu corpo e suas emoções permanecem não desenvolvidos, e, como o faquir e o monge, fica incapacitado de tirar proveito de sua vitória incompleta. É aquele que sabe tudo, mas não pode fazer nada. Para isso, ele precisa completar seu desenvolvimento, cuidando de suas dimensões afetiva e física. Para Gurdjieff, o iogue tem a vantagem de compreender sua posição, sabendo o que lhe falta e a direção que deve seguir. No entanto não é comum as pessoas prosseguirem e avançar no seu pleno desenvolvimento, alcançando a plenitude.

    Há caminhos, como os gnósticos, em que o aspecto conhecimento é o mais importante. Neles, a libertação vem do conhecimento, principalmente o conhecimento de si mesmo.

    A proposta de Gurdjieff: o quarto caminho

    Para Gurdjieff, o desenvolvimento do homem não é uma lei natural, o que explica as dificuldades de seu aperfeiçoamento. Nessa coleção, no capítulo 13, colocaremos as teorias da redenção, evolução, queda e descida em perspectiva para que o leitor escolha a que se identifica mais. Nas três últimas teorias, os homens têm inúmeras vidas para aperfeiçoarem (queda e evolução), ou criarem experiências (descida), mas nessas escolas espirituais o homem não precisa criar um corpo espiritual com sua vontade para adquirir a imortalidade, esse já é um atributo natural seu.

    Já em Gurdjieff, a imortalidade não é um atributo natural, mas deve ser adquirida por esforço, através de uma proposta muito interessante de desenvolvimento harmonioso do homem. Em uma época em que não havia conceitos como inteligências múltiplas e inteligência emocional, Gurdjieff, de forma pioneira e visionária, percebeu o homem formado por dimensões emocionais, intelectuais e instintivas e física, e que essas dimensões quase nunca se desenvolviam de forma harmônica, mas tendendo para uma das dimensões. Assim, ele elabora sua proposta que deu o nome de Quarto Caminho.

    Nesse caminho, o ser humano é levado, através de exercícios especializados, a desenvolver todos os seus aspectos simulta­neamente. É um trabalho sobre as três dimensões ao mesmo tempo. Enquanto o faquir é dono do seu corpo, mas não dos pensamentos e emoções; o monge é senhor de suas emoções, mas não do seu corpo e pensamentos; o iogue é senhor do pensamento, mas não do corpo e emoções; no quarto caminho, pretende-se trabalhar ao mesmo tempo pensamento, corpo e emoção, com exercícios sobre os três planos. Um exemplo eram exercícios com movimentos ritmados por músicas, em que se faziam contagens ao mesmo tempo. Então, ao contrário do faquir que precisa de mais sofrimento físico, o monge que precisa de uma tensão emocional e o iogue que precisa de um dia de exercícios mentais, o homem com a sabedoria do Quarto Caminho sintetizaria tudo em um exercício que requer várias de suas habilidades ao mesmo tempo.

    É possível dizer que o homem pode levar várias vidas para desenvolver o que, se fosse corretamente conduzido, poderia avançar bastante em uma vida. Uma das possibilidades é a educação que trabalha em várias frentes como a proposta do Quarto Caminho. Essa ideia trabalhamos no volume I, na Parte IV.

    A descida dos valores espirituais e o Eneagrama

    Nesse volume, tentaremos demonstrar que não são apenas os caminhos que seguem determinação unidimensional, mas muitas vezes a descida dos valores espirituais, afinal ela é feita por seres humanos que têm ego, mesmo que já aperfeiçoado em alguma dimensão.

    Como vimos no volume I, embora possamos depreender que Gurdjieff tenha tido algum contato com o conhecimento dos egos eneagramáticos através do conceito de defeito principal, ele não o desenvolveu com seus alunos, ficando uma lacuna que depois foi preenchida, primeiramente por Ischazo e depois por Naranjo, para o bem do conhecimento universal. Assim, sempre que possível e munidos desse conhecimento, podemos analisar como a descida dos valores espirituais obedeceu à carga egoica dos missionários espirituais, que eram também seres em evolução e aperfeiçoamento.

    Quando olhamos para o Eneagrama, podemos ver representado nele os grupos de egos que se circunscrevem na denominação gurdjieffiana de homens nº 1, 2 e 3.

    Homens nº 1 – egos 8, 9 e 1

    Homens nº 2 – egos 2, 3 e 4

    Homens nº 3 – egos 5, 6 e 7

    Assim, com a ajuda do conhecimento do Eneagrama, vamos interpretar alguns dos avatares espirituais e ver como seus egos limitaram, mas, ao mesmo tempo, contribuíram para o avanço da humanidade. Isso porque, por conter diferentes visões eneagramáticas, puderam alcançar diferentes egos, que se identificavam com aquele caminho e sua linguagem mais intelectual, mais emocional ou mais física. Dessa forma, contemplaram todos os egos.

    Quando nos esforçamos no sentido do autoconhecimento, podemos perceber que nosso ego direciona nossas escolhas e, assim, identificamos os nossos interesses. Fiquei surpreso, quando folheando o livro Eneagrama, as nove faces da alma, deparei-me com o seguinte texto sobre o ego 5:

    Além da filosofia, o tipo CINCO sente-se atraído, desde a infância, para a mística religiosa. Todas as religiões desenvolveram um ramo místico. Há correntes místicas no hinduísmo, no budismo e nas religiões dos índios americanos; no islã temos o sufismo, no judaísmo o hassidismo (e partes da cabala), no cristianismo, a mística medieval de Mestre Ekhart e de seus discípulos; encontramos correntes místicas nas igrejas ortodoxas do Oriente (filocália; mística heclesiástica dos monges do Monte Atos) e, inclusivo, no protestantismo (por ex. Gerhard Teerstegen). O Dicionário das Religiões define assim a mística: Absorção da pessoa em Deus ou no Divino, ou talvez em algo que ainda está por trás de Deus, um ‘vazio’ ou ‘não-ser’. Gerhard Wehr fala da experiência de um contato imediato e intuitivo com Deus, respectivamente com o Absoluto ou com o incondicional. E por esta razão é notório que muitas figuras de mulheres marcaram e influenciaram sobretudo a mística islâmica e cristã. O tipo CINCO tem mais facilidade do que os outros para conseguir aquela visão interior ou aquele olho interno.[1]

    O surpreendente para mim foi constatar que muito do que escrevi no Volume II, A metafísica da Criação, estava imbuído da descrição acima. Outra surpresa foi perceber que os meus esquemas dos capítulos para esse volume contemplavam justamente as místicas cristã da gnose, a mística islâmica do sufismo e a mística judaica da Cabala. Assim, nada mais era que a tendência do meu ego direcionar o que eu estava escrevendo e exploraria nesse Volume IV. Ficou então evidente, mais uma vez para mim, que o nosso ego está sempre direcionando nossa linha de interesses e como vamos aplicar nosso tempo. Até a decisão de escrever essa coleção nada mais foi que a tendência do meu ego de procurar insaciavelmente pelo conhecimento, principalmente abstrato e teórico, em detrimento de vivências verdadeiramente espirituais. Mas isso já é assunto para o próximo volume V.

    Quando a espiritualidade superior planeja a descida de valores espirituais das elevadas esferas para o plano físico, eles esbarram nessas limitações dos seres humanos. De qualquer forma, todas essas descidas produzem um montante de contribuições que juntas poderão oferecer um quadro mais completo do real e do ser humano. Como dissemos no Volume I, é provável que o único missionário que escapou da armadilha egoica tenha sido Jesus, pois que ele demonstrava em si os traços positivos de todos os egos, o que demonstra seu elevado nível evolutivo.

    Veremos como a diversidade dos egos e seus anseios produziram movimentos religiosos e caminhos espirituais. Tudo o que se produz culturalmente na sociedade está, de alguma forma, sob a luz do ego ou da sua contrapartida na forma da essência de cada um, que intuímos. Embora nem sempre foi possível fazer isso, por exemplo, quando uma doutrina está desvinculada de um personagem histórico e apresenta-se como contribuição de muitas mãos anônimas. Nesse caso, ficamos apenas na doutrina em si, sem analisar as interferências do ego.

    Capítulo 2

    Kant e Feuerbach: os limites da razão para alcançar o transcendente

    Há uma classe de missionários que são mal-entendidos. São aqueles que veem para desvendar os limites dos seres humanos e seus equívocos sobre as religiões, ciência etc. Opiniões que resultam em contraditórias atitudes violentas, quando comparadas aos ideais elevados que juravam defender. Eles lançaram para nossa inteligência o desafio de equacionar essas contradições e limites para que pudéssemos refazer nosso pensamento em bases mais verdadeiras e coerentes. Deveriam ser estudados por todos os teólogos e por aqueles que se interessam pelo estudo de qualquer doutrina religiosa ou espiritualista, mas, ao contrário, são relegados ao esquecimento, ignorados, pois são desconcertantemente convincentes em seus argumentos.

    ​Ler Feuerbach, por exemplo, é garantia de conflito interno com nossas crenças, que são desmascaradas em sua infantilidade e limitações humanas. No entanto, suas ponderações deveriam ser encaradas como um convite para revermos nossas convicções, buscando caminhos para o amadurecimento de nossas crenças. A fé não deve temer encarar a razão face a face, pois é ela, a razão, que pode corrigir seus excessos, suas contradições, suas limitações, sua intolerância e arrogância.

    ​A experiência de ler Kant e Feuerbach foi, para mim, fascinante e angustiante ao mesmo tempo, pois colocou um desafio para minha inteligência: como continuar acreditando no transcendente e, ao mesmo tempo, entender como nossas concepções do sagrado estão delimitadas pela nossa condição do entendimento humano, limitado, falho, estreito e questionável. Coloquei para mim um desafio: tentar dar uma resposta para Feuerbach, demarcando as possibilidades que estão postas para a humanidade e os caminhos que temos para dar ao transcendente o mínimo de razoabilidade. Temo que esse desafio seja superior às minhas capacidades, afinal para atingi-la satisfatoriamente eu teria que falar de um lugar sobre-humano, o que obviamente não é o caso. No entanto, nesse caminho, muitos podem ser os nossos ganhos, e isso é o que veremos neste capítulo.

    KANT

    ​Antes de falar de Kant, vamos tomar conhecimento dos problemas que estavam colocados, em seu tempo, por pensadores anteriores ou contemporâneos seus.

    ​Fé e razão se digladiavam desde a Idade Média com a escolástica, que propunha a submissão da razão à fé. A verdade, para os escolásticos, seria alcançada apenas pela fé, uma vez que ela era revelada na Bíblia e pelos profetas de Deus.

    ​Nos movimentos humanista e iluminista, pensadores como Voltaire, se incumbiram de reverter essa equação, delimitando o campo para a fé e outro para a razão, mas, nessa nova equação, a razão ganhava um papel destacado, ela era alçada ao alto posto de direcionadora da humanidade para o progresso e a felicidade. Com ela, poderíamos lançar luz sobre o obscurantismo, muitas vezes promovidos pela fé daqueles que queriam que os dogmas fossem aceitos, sem contestação e até curvados pela força da espada e da fogueira. Voltaire não cansou de denunciar as perseguições a cientistas como Bruno e Galileu, à ciência copernicana etc. Tantas vezes a Igreja tornara-se responsável pelo atraso da Ciência ao perseguir aqueles que se propunham revelar ideias revolucionárias no campo do conhecimento científico. Mas, agora, os iluministas traziam a solução para esses desmandos: a razão deveria ser nossa condutora segura para o progresso e contra as arbitrariedades da intolerância e a superstição.

    ​Para muitos, essa nova fé na deusa Razão trouxe o ateísmo e um materialismo inflexível. Agora nada iria existir a não ser átomos e vazio. A fé foi destroçada e velhos dogmas desapareceram. Segundo Will Durant[2], Helvetius e Holbach fizeram com que o ateísmo ficasse tão em voga nos salões da França,

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