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Você vai ficar?
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E-book478 páginas6 horas

Você vai ficar?

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Sobre este e-book

Laura era uma chef renomada, que tinha conquistado fama por seu incrível trabalho,
não só com seus pratos deliciosos, como também por seu trabalho reestruturando
restaurantes que um dia tinham sido famosos. Aquele dia era um dos seus últimos de
trabalho, já que teria que fazer uma pausa para o nascimento do seu primeiro filho. Ela
mesma havia decidido preparado o prato do cliente, quando a garçonete avisou que
ele estava de mau humor. Quando sua presença foi solicitada no salão, Laura, que
tinha uma paciência exemplar, não pode deixar de ficar irritada, já que se sentia
extremamente cansada e com dores intensas em suas costas, devido ao peso de sua
barriga de 8 meses de gestação. Ao sair pela porta da cozinha, avistou logo o cliente
que estava tumultuando seu dia, que a olhava em um misto de fúria e curiosidade.
Parecia realmente aborrecido. Seu rosto tinha expressões fortes e obstinadas, e
apesar de carregar a pior cara de irritação possível, conseguiu fazer o estômago de
Laura esfriar assim que seus olhos se cruzaram, enquanto ela o observava da porta
da cozinha. É só azia, pensou ela, enquanto percebia que ele era realmente um
homem muito bonito, como a garçonete havia dito. Permaneceram se encarando por
mais alguns segundos, então Laura abaixou o olhar e seguiu em direção a ele.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento23 de fev. de 2024
ISBN9789893759042
Você vai ficar?

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    Pré-visualização do livro

    Você vai ficar? - Marcela Patareli

    © 2023, Marcela Patareli e Primeiro Capítulo

    E­-mail: geral@primeirocapitulo.com

    Título: Você vai ficar?

    Editor: Vitória Scritori

    Coordenador Editorial: Vasco Duarte

    Capa: Vasco Duarte

    Composição Gráfica: Manuela Duarte

    Revisão: Carolina Ribeiro

    1.ª Edição: Novembro, 2023

    ISBN: 978-989-37-5904-2

    Marcela Patareli

    Você vai ficar?

    Portugal | Brasil | Angola | Cabo Verde

    Agradecimentos

    Essa jornada de escritora tem sido deliciosa e inspiradora. Tenho sido abençoada por Deus, em cada sonho realizado. Toda minha inspiração e dons, vem de Suas mãos doces e gentis. Sou muito grata a Ele por ter me mostrado esse caminho, que tem me proporcionado momentos incríveis.

    Quero muito agradecer a muitas pessoas que tem feito parte dessa minha trajetória como escritora: meu marido, Giovani, que sempre acreditou em mim e me incentivou a escrever minhas histórias (nossa própria história me inspira muito! Eu amo você!); meus filhos lindos, Daniel, Diogo e Benjamin, que me servem de inspiração quando o assunto são crianças lindas e fofas; minha mãe, que apesar de reclamar que passo muito tempo escrevendo no quarto, hehe..., tem muito orgulho de mim. Ela também é uma grande inspiração quando preciso escrever sobre mães fortes; meu irmão, Harley, que me apoiou para a realização dessa segunda edição, sempre interessado em como estava o andamento da história; minha querida amiga Ludmylla, que sempre me estimula a continuar, me ajudou a escolher os nomes dos personagens principais e sempre lê em primeira mão minhas histórias. Até ouve elas, antes mesmo de irem ao papel; minha amiga e revisora Carolina Ribeiro, que disponibilizou seu tempo mais do que corrido para me ajudar na correção desse livro, sempre preservando meu estilo de escrita e criação, e fazendo tudo com muito carinho e dedicação; minha amiga advogada Caroline, que me ajudou com as dúvidas a respeito da área jurídica em uma parte do livro e que é fã de carteirinha do meu trabalho.

    Agradeço também aos meus leitores. Vocês não sabem o quanto me alegram quando me contam suas experiências com o meu trabalho. Meu coração se aquece demais, a cada vez que conheço cada um de vocês.

    Também agradeço a editora primeiro capítulo, que tem acreditado em meu trabalho e tem me ajudado nesse processo.

    Obrigada também, a todos os meus amigos e familiares, que vem apoiando meu trabalho. Me sinto agraciada por poder contar com vocês em minha vida.

    Capítulo 1

    Osol brilhava intensamente naquela sexta­-feira. Uma onda de calor devia estar chegando na cidade, já que era o terceiro dia consecutivo em que não se via nenhuma nuvem no céu. Daniel desceu do carro, sentindo a troca de calor do ar­-condicionado para a temperatura ambiente, que facilmente estava acima de 30 graus celsius. Ele apressou seu caminhar até o restaurante que havia escolhido para almoçar naquele dia, tentando assim permanecer no sol por pouco tempo, já que o calor estava muito intenso. Seu humor estava bastante alterado, não só pelo calor, mas por causa do dia que não estava sendo nada agradável em seu trabalho. Quando sentia que seu mau humor estava saindo pelos poros, ele comia alguma coisa bem gostosa, numa tentativa de melhorar o seu estado. Se já não era fácil lidar consigo mesmo, imagina para as pessoas ao seu redor. Antes de entrar no restaurante, o telefone tocou no bolso de seu terno. Ele o pegou e atendeu rapidamente, parando na porta do restaurante, onde havia a sombra de um toldo.

    – Diga.

    – Sr. Hill, teremos que remarcar a reunião novamente. A sra. Peres não poderá vir, pois tem uma viagem de última hora.

    – Srta. Rita, diga para a sra. Peres que não ficarei mais no caso dela. Estou cansado de movimentar minha agenda para atender aos caprichos dela. Não estou mais interessado. Pode avisá­-la. E não modifique a forma como estou lhe passando este recado. Use as mesmas palavras para dispensá­-la.

    – Sr. Hill, a sra. Peres é amiga de longa data do diretor Johnson, não ficará bom para mim...

    – Não estou nenhum pouco preocupado com o que Petter vai achar sobre isso, srta. Rita. Faça o que estou lhe mandando e não me aborreça mais com isso.

    E então desligou o telefone. Que dia tenebroso era aquele que estava tendo! Depois de uma reunião de mais de 4 horas com um cliente que não entende que a lei não funciona para o seu próprio benefício, agora tenho que aturar amiguinhos sem compromisso, de seu próprio funcionário. Até parece! Pensou Daniel, respirando profundamente. Tentou alargar a gravata que lhe apertava, passando o dedo por dentro da gola de sua camisa, que já estava úmida de suor. Ele levantou seus olhos para a fachada do restaurante, mas não compreendeu bem o que estava vendo. Aquele restaurante não parecia ser o mesmo que frequentava há anos. Será que estou no lugar errado? Pensou ele, verificando o prédio e vendo que o nome no letreiro era sim do restaurante que procurava, Le Manon. Então, sabia que estava no lugar certo, mas não reconhecia o local. Havia muitas pessoas entrando no restaurante, que agora possuía uma enorme porta de vidro, onde antigamente tinham sinuosas portas de madeira maciça. Toda a pintura que antigamente era em amarelo com detalhes vermelhos, agora estava em tom verde claro. Não que não estivesse bonito o novo design, mas ele não esperava encontrar o restaurante modificado, não daquele jeito.

    – O que está acontecendo com esse dia? – Murmurou sem paciência para ele mesmo, apenas para registrar sua indignação em relação aquele dia. Respirou fundo, soltando o ar fortemente pelo nariz. E de cara amarrada entrou no restaurante, se dirigindo para a única mesa disponível, que estava no meio do salão. Pelo menos a ventilação havia melhorado, e o ar­-condicionado estava em uma temperatura agradável. Mas não importava, esse não era o lugar que ele esperava encontrar, as recordações que tinha com aquele ambiente já não existiam mais. Se despiu do casaco do terno que estava vestindo, colocando­-o no encosto da cadeira à sua frente para que não amassasse, já que logo teria que ir ao tribunal. Enquanto se ajeitava, observava todas as mudanças que seu restaurante favorito havia sofrido, sentindo uma imensa angústia por isso. Na verdade, não havia sobrado nada da decoração anterior. Será que o cardápio havia sido modificado também? Ele pensou, se irritando um pouco mais, ainda que isso parecesse impossível. Se isso fosse verdade, era melhor nem ficar ali. Não encontraria o conforto que esperava ter no sabor do prato de que sempre gostou, desde criança.

    – Boa tarde senhor. Meu nome é Érica e irei atendê­-lo hoje.

    Érica era uma moça simpática, baixa, de cabelos loiros e sorriso alegre. Estava animada com as mudanças que o restaurante estava vivendo.

    – O que houve com esse lugar? – Perguntou Daniel, sem rodeios.

    – Ah, sim! Passamos por uma ótima reestruturação em nosso restaurante. Precisávamos dar uma repaginada em nossa decoração e cardápio, então o sr. Benoit contratou uma chef especializada nesse tipo de reestruturação, e agora estamos assim. Está sendo um grande sucesso, como o senhor pode ver.

    A garçonete falava animada, apontando para alguns lugares de destaque.

    – Não havia necessidade de nada disso. O restaurante estava bom como era.

    Érica ficou intimidada com a forma ríspida que Daniel respondeu e diminuiu seu sorriso, vendo que o cliente não estava tão satisfeito quanto ela.

    – Todos os pratos do cardápio foram modificados? O Filé cointreau com fritas, também? – Continuou Daniel, não olhando para a moça, ainda inspecionando o local com os olhos.

    – Não, senhor! Esse prato não foi modificado.

    Ele olhou para ela com atenção e alívio.

    – Ótimo! Finalmente uma boa notícia. Vou querer esse prato, o ponto da carne é ao ponto para mal passado, ok? Nada cru.

    – Pode deixar, senhor. Avisarei a cozinha. Gostaria de pedir algo para beber também?

    Daniel reparou que a garçonete frisou com a caneta duas vezes o pedido que havia feito. – Traga uma taça de vinho tinto seco. O mais antigo que tiver na casa.

    – Sim, senhor. Temos um cabernet sauvignon que tem uma excelente aprovação.

    – Ok! Pode ser então, obrigado.

    – Logo voltarei com a entrada, senhor.

    – Não precisa, apenas meu prato. Estou com pressa.

    – Como quiser!

    Érica saiu meio angustiada, sabendo que aquele cliente em potencial poderia arrumar uma confusão a qualquer momento, tendo motivo ou não. Foi diretamente para a cozinha passar o pedido. Entrou pela porta se deparando com o frenesi da cozinha, que funcionava com muito vigor. O cheiro que exalava era realmente magnífico!

    – Pedido da mesa onze. O cliente está com pressa.

    – E quem não está com pressa, em uma quarta­-feira, às 13 horas. – Respondeu Jamie, subchefe do restaurante, enquanto mexia a frigideira no alto, próximo ao fogo.

    – Sim, mas esse também está de mau humor.

    – Podemos melhorar o humor dele com um prato nosso, não podemos? – Perguntou a chef Laura, responsável pela reestruturação, enquanto passeava pelos funcionários, fiscalizando a execução dos pratos. Laura esticou as costas, movimentando a barriga de 8 meses de gestação.

    – Sim, chef! – Foi a resposta em uníssono dos funcionários que se apressavam em fazer suas tarefas.

    – Passe aqui o pedido dele que eu mesma irei providenciar. – Disse ela, esticando a mão para Érica e pegando o pedido. – Ah, sim! Um entrecôte com fritas, esse prato permanece o mesmo!

    – Sim, ele fez questão de saber se o prato era o mesmo ou se teria sido modificado. Não ficou feliz com as mudanças do restaurante. – Falou Érica, fazendo uma careta.

    – Vamos tentar mudar o humor dele, então! – Laura deu uma piscadinha para a garçonete, que já se dirigia de volta para o salão.

    – Tenho que voltar. O restaurante está lotado!

    Alguns minutos se passaram, enquanto Daniel respondia seus e­-mails e mensagens no telefone, quando foi surpreendido com seu prato já a sua frente. Ele arregalou os olhos e conferiu o relógio e sim, o tempo de preparo havia sido rápido, em média 15 min. Porém, quando olhou para o prato novamente, reparou que não era o mesmo que sempre pedia. A raiva que já havia se alojado nele naquele maldito dia, e que ele vinha tentando controlar, sem muito sucesso, explodiu. Isso era inaceitável! Ele se lembrava de ter perguntado para a atendente se o prato havia sido mudado. Quando olhou para ela, a mesma sorria com um ar de satisfação, como se tivesse feito uma grande façanha.

    – O que é isso? – Perguntou ele, sem nem mesmo tocar no prato, encarando a moça.

    – O seu pedido, senhor! – Respondeu ela rapidamente, ainda sorrindo, apesar de ver a carranca que o cliente fazia. Tá... nem é a pior carranca do mundo. Por mais que tente ficar feio, o homem é bonito demais para tal façanha. Pensou Érica, observando a cena que estava chegando.

    – Claramente, este não é meu pedido. – Disse Daniel, ainda mais baixo.

    – O senhor...

    – Quero falar com o chef! Chame­-o aqui, por favor. – Ele afastou o prato à sua frente, sem olhar para a garçonete.

    – Sim, senhor! – Érica saiu em disparada para a cozinha, sentindo o estômago embrulhar e resmungando: – Eu sabia, eu sabia!

    Entrou na cozinha falando alto.

    – Chef, o cliente da mesa onze, está solicitando sua presença.

    Laura estava montando um prato, com o corpo inclinado sobre ele. Estava morrendo de dor nas costas por causa do peso da barriga. Já deveria ter parado de trabalhar desde que começou a se sentir estafada, mas se negava a parar antes do bebê nascer.

    – O cliente do entrecôte? – Perguntou ela, parando a mão no meio do caminho, que levava rabanetes que complementariam uma salada.

    – Ele mesmo! Tinha certeza de que aquele homem havia entrado aqui carregado de insatisfação. Está bem agitado, apesar de ser um pedaço de mal caminho. Não que isso tenha alguma coisa a ver, claro. – Terminou ela, sorrindo de nervoso.

    A chef endireitou a coluna e forçou a barriga para frente, tentando amenizar a dor que estava sentindo.

    – Denis, você pode terminar a montagem deste prato para mim? – Perguntou ela, puxando papel toalha do rolo que estava ao seu lado e secando as mãos.

    – Sim, chef! – Disse Denis rapidamente, assumindo o serviço dela.

    Laura caminhava para a porta com uma pequena expressão de irritação em seu rosto. Apesar de ser bem paciente com clientes insatisfeitos, que na maioria das vezes não tinham motivo, estava bem cansada, no fim da gestação e da sua paciência. Passou pela porta da cozinha, antes jogando o papel úmido no lixo e tirando a touca de pano que usava na cabeça. Avistou de longe um homem na mesa onze. Parecia realmente aborrecido. Seu rosto tinha expressões fortes e obstinadas, e apesar de carregar a pior cara de mau humor, conseguiu fazer o estômago de Laura esfriar, assim que seus olhos se cruzaram, enquanto ela o observava da porta da cozinha. É só azia, pensou ela, enquanto reparava que realmente ele era um homem muito bonito, como Érica havia dito. Permaneceram se encarando por mais alguns segundos, então Laura abaixou o olhar e seguiu em direção a ele.

    Daniel estava tão aborrecido com todos os acontecimentos do dia, que havia resolvido que descontaria tudo no chef daquele maldito restaurante, que já não era mais o mesmo de que se lembrava. Estava muito frustrado com todas as mudanças que haviam feito. Ele frequentava o restaurante desde que era menino, com seus pais. Aquele lugar tinha um significado importante para ele e suas recordações, que estavam sendo apagadas. Então o chef, que era o responsável por aquele restaurante, ouviria sua indignação. Ele estava decidido. Só não esperava ver uma mulher saindo da porta da cozinha, a chef e não o chef. Muito menos, que fosse uma chef grávida.

    – Boa tarde, senhor! – Começou Laura com cortesia. – O senhor pediu para me chamar?

    Daniel não havia tirado os olhos dela, desde que a avistou saindo da cozinha, mas a chef tinha recuado o olhar. Era muito bonita, reparou ele rapidamente, enquanto a chef se aproximava. Tinha cabelos claros, castanhos, a pele tinha um tom iluminado e em seu rosto as feições eram harmônicas, olhos grandes, nariz pequeno e boca grande. Ele se levantou da cadeira apressadamente e até um pouco nervoso, mas não mais por causa do prato. Ele ficou vários centímetros mais alto que ela.

    – Sim, eu solicitei. Fiz o pedido de um entrecôte com fritas, que a atendente havia me garantido que não tinha sido alterado no cardápio. Mas, o que chegou até mim está longe de ser o prato que pedi. Cor dos olhos, castanho escuro, amadeirado. Pensou ele se distraindo um pouco de seu foco.

    Laura também reparava no homem, encarando­-o no fundo dos olhos, que eram bem mais claros que os dela, enxergando a arrogância dele. Como pode ser tão prepotente? Nem encostou no prato! Pensou ela irritada. Daniel não recuou o olhar em nenhum instante.

    – Entendo! Vejo que nem se quer o experimentou, para assim confirmar se era ou não o mesmo prato. Posso garantir, que apenas a montagem foi modificada, porém ele continua com o mesmo sabor.

    – A questão é que não foi esse prato que pedi! – Começou ele, antes mesmo de Laura terminar a frase. – Traga o que eu pedi!

    Laura tentou não rir do atrevimento daquele homem, mas comprimiu a boca. Quem ele pensa que é para falar comigo dessa forma? Pensou ela, ainda o encarando. Ela piscou diversas vezes e respirou fundo, discretamente acalmando o coração, que lhe parecia que ia sair pela boca, mas não deixou de encará­-lo. Sabia que estava sendo observada por outros clientes, que acompanhavam o desenrolar da situação.

    – Érica... – A chef chamou pela garçonete, que aguardava um pouco atrás, mas que prontamente atendeu ao chamado.

    – Sim, chef!

    – Leve o prato deste cavalheiro para a cozinha. – Sem esperar que a garçonete pegasse o prato, Laura o puxou da mesa calmamente, passando para a moça e continuou: – Infelizmente, ele não almoçará conosco. – Terminou ela, ainda encarando Daniel.

    – A senhora está me convidando a me retirar? – Perguntou ele, erguendo as sobrancelhas e virando um pouco a cabeça, como se não tivesse ouvido direito.

    – Por favor! – Respondeu a chef. – Não temos aqui o que o senhor procura. Espero que encontre em outro lugar. Agora, se me der licença, tenho várias mesas para atender.

    Antes de ele responder, ela virou as costas seguindo em direção a cozinha, mas assim mesmo, conseguiu ouvir Daniel dizer em alto e bom som.

    – Inacreditável! Fico satisfeito em cumprir suas expectativas, senhora! – Daniel puxou o casaco da cadeira com força e foi em direção a Laura, parando­-a no meio do caminho.

    – Nunca fui tão desrespeitado! – Disse ele bem baixo, chegando o rosto dele bem próximo ao dela, a encarando fixamente nos olhos. Mas em um breve momento, baixou os olhos para encarar a boca dela, rapidamente.

    – Eu digo o mesmo! – Respondeu ela friamente, o encarando de volta.

    Os dois permaneceram assim, até Daniel fechar os olhos virando a cabeça de lado. Ele seguiu para a porta de saída, indo embora.

    Laura não saiu do lugar. Observando aquele homem enorme saindo pela porta. Na verdade, olhou as costas dele, que eram grandes e largas. Estava claramente alterada e precisava se recompor. Ela fechou os olhos, apertando os dedos contra eles com uma mão, enquanto a outra se apoiava em sua cintura. Logo sentiu­-se um pouco melhor, mas não teve coragem de olhar para a plateia, que os assistia. Que vergonha estava sentindo, tudo por causa daquele ignorante! Mesmo lhe faltando coragem, virou para olhar os clientes no salão do restaurante.

    – Peço perdão a todos por ter atrapalhado o almoço. Teremos sobremesas gratuitas como compensação. – A chef sorriu amigavelmente, para ninguém em especial, mas pode ouvir um burburinho de apoio dos clientes. Aliviada, seguiu para cozinha, tentando recobrar sua sanidade. Mas assim que passou pela porta, sentiu algo quente molhando suas pernas. Ao olhar para baixo, viu uma enorme poça de água.

    – Ah, não é possível! – Resmungou ela baixinho para si, enquanto levantava a cabeça passando a mão pela testa.

    – Érica... – Chamou ela novamente pela garçonete. – Parece que precisarei da sua ajuda novamente. O bebê está nascendo.

    – Ah meu Deus, Laura! – Gritou a moça desesperada.

    – Shhhh...! Não queremos mais confusão, certo? – Reclamou a chef, apertando as duas mãos na barriga e arregalando os dois olhos, enquanto sentia a primeira contração.

    Érica correu para o lado de Laura, sem saber realmente o que podia fazer para ajudar. A cozinha toda parou, observando o rosto de desespero da chef e de Érica.

    Laura havia fechado os olhos, sentindo a barriga menos rígida e quando abriu os olhos novamente, viu todos olhando para ela.

    – Voltem ao trabalho! – Gritou. – O restaurante está lotado! Não quero atrasos, ouviram? – Sim, chef! – Todos responderam.

    – Jamie, assuma o comando! – Disse Laura, andando bem devagar, tirando o jaleco da cozinha. Érica vinha logo atrás com os braços estendidos, como se tentasse apoiá­-la, mas sem nem mesmo encostar nela.

    – Sim, chef! – Respondeu o subchefe, já dando comando para os preparos dos pratos.

    Érica pegou a bolsa e o casaco vermelho que Laura havia colocado pela manhã por cima de um conjunto de calça e blusa bege. E de mãos dadas, as duas saíram pela porta dos fundos, lentamente.

    – Érica, pegue meu celular e ligue para minha mãe. Ele não tem senha. Tirei logo que cheguei no sétimo mês, pensando que uma coisa assim poderia acontecer.

    Laura respirava com dificuldade e pausadamente. Sentiu outra pontada na barriga devido à contração, e apertou a mão da amiga com tanta força que Érica gritou.

    – Só um minuto! – Sussurrou enquanto sentia a barriga voltando da contração. – Pronto! Desculpe!

    – Acho que terei de ir ao hospital também! Você deve ter quebrado algum dos meus dedos. – Laura riu, soltando a mão da amiga.

    – Um dia te recompenso por isso! Agora peça o táxi e ligue para minha mãe! – Disse Laura, parando na esquina onde haviam chegado.

    Érica pegou o telefone, ligando para o nome mamãe gravado na agenda, enquanto gesticulava para um táxi que estava se aproximando. O dia estava quente e as duas estavam no sol, próximas à avenida principal.

    – Joana, a Laura está em trabalho de parto! Está indo para o hospital agora. Ok!

    – Sua mãe está indo para a maternidade. – Disse a amiga, enquanto colocava Laura dentro do carro. – Eu vou com você!

    – Não vai mesmo! – Respondeu Laura, segurando o braço da amiga. – Preciso de você lá dentro. Minha mãe vai estar comigo assim que eu chegar ao hospital. Ajude Jamie com tudo.

    – Tem certeza? Você não deveria estar sozinha! Não quer que eu ligue para seu marido? – Érica bateu a porta do carro, passando pela janela a bolsa e o casaco da amiga.

    Laura rendeu­-se a um pouquinho de desespero, por estar sozinha indo para o hospital para ter seu filho. Enrugou levemente o queixo, como se fosse chorar, mas logo se conteve.

    – Para que eu ligaria, Érica? Ele não irá! – Disse ela sentindo o peso de suas palavras no coração. Uma criança estava chegando ao mundo, porém o pai não se importava com isso.

    – Deixe que pelo menos ele saiba. Quem sabe não amolece aquele coração de pedra?

    – Eu preciso ir! Faça como achar melhor. – Laura sorriu tristemente para a amiga. – Que Deus abençoe seu parto! Que vocês dois estejam sob a proteção Dele.

    – Obrigada! – Respondeu, sentindo outra pontada na barriga. – Vamos moço, correndo! Maternidade Helena Baptista.

    – Sim, senhora! – Disse o motorista. – Pode deixar que cuido dela.

    O taxista saiu com o carro, enquanto a contração de Laura se prolongava e doía de tal forma que ela gritou. Só não tinha certeza se era de dor ou de desespero, por estar sozinha.

    Capítulo 2

    Noah chegou alguns dias antes do previsto e de maneira surpreendente, mas Alan não apareceu na maternidade para conhecer o filho. Apesar de estar sem o marido, Laura sentiu uma emoção tão maravilhosa quando finalmente pode estar com o filho nos braços, que a fez esquecer da solidão que sentia há tanto tempo, e que a estava consumindo. Sentir o calor daquele pequeno pacotinho em seu colo, ouvir o choro sentido do bebê por ter sido tirado de dentro da barriga quentinha de sua mãe. A primeira vez que o olhou nos olhos, observou cada detalhe daquela perfeição de Deus em seus braços e chorou profundamente! Sentiu que não existia nada mais maravilhoso para ela do que ter gerado aquela vida.

    – Vou te amar para sempre, querido! – Sussurrou Laura para seu filho, esfregando o narizinho dele com o dela. Ela inspirou pela primeira vez o cheiro delicioso que seu bebê tinha e sorriu para ele, garantindo que faria qualquer coisa pela felicidade dele.

    A mala do bebê, a dela e a cadeirinha do carro foram trazidas por sua mãe. Ela havia passado na casa de Laura para pegar tudo, e quando chegou ao hospital, a filha já havia dado à luz, sozinha! Joana não estava nada contente com a atitude do genro em relação à filha, mas Laura havia implorado a ela que não se intrometesse, então estava cumprindo sua palavra, amargamente.

    – Minha filha... – Disse ela ao entrar no quarto do hospital, atrapalhada com tantas coisas que trazia. Não esperava já encontrar seu neto no colo de Laura. – Meu Deus, ele já nasceu?

    – Sim, mamãe! Não levou nem uma hora. Ele é muito apressado! – Respondeu a filha, sem tirar os olhos de seu menino. Ela sorria.

    O médico ainda se encontrava no quarto, fazendo um relatório, quando Joana perguntou a ele, enquanto caminhava até a filha:

    – Doutor, minha filha e meu neto estão bem?

    Joana chegou perto de Laura e deu um beijo na testa da filha, acariciando sua cabeça. Estava angustiada por vê­-la passando por tudo sozinha. A avó olhou para o neto amorosamente, passando a mão em sua cabeça pequenina.

    – Sim, senhora! Ambos são fortes. Se não fosse o protocolo, mandaria os dois para casa hoje mesmo. Mas os manteremos aqui por mais um dia. Amanhã poderão ir.

    – Que notícia maravilhosa! Filha, ele é perfeito! – Joana rodeou a cama, para poder ver o rosto do neto mais de perto.

    – Não é, mamãe? Realmente lindo! – Laura chorava, contidamente, enquanto respondia.

    – Minha querida, não chore, por favor! – Joana segurou o rosto da filha com as duas mão e a beijou no rosto.

    – Eu estou bem! É choro de alegria. – Laura disse tentando segurar as lágrimas, fechando os olhos.

    – Vou deixá­-las à vontade! Qualquer coisa é só chamar a equipe de enfermagem.

    – Obrigada por tudo, doutor. – Agradeceu a paciente.

    A

    No dia seguinte, quando chegou em casa, Alan ainda não havia voltado do trabalho. Laura estava bem recuperada, apesar de cansada. O bebê estava dormindo, então ela resolveu descansar também. Acordou quando ouviu o barulho do chuveiro ligando. O marido havia chegado. Não tinha ido falar com ela, mas talvez fosse porque ela estava dormindo. Laura se levantou para ver o bebê, que continuava dormindo profundamente. Quando saiu do quarto dele, se encontrou com Alan, que fingiu não a ter visto e passou direto para a cozinha. Ela ficou parada no corredor, sem acreditar que o marido havia passado por ela sem ao menos perguntar se ela estava bem.

    – Nós precisamos conversar! – Disse ela para as costas dele, porém o marido fingiu não ouvir e entrou na cozinha.

    Noah começou a chorar no quarto, fazendo Laura mudar o foco de sua atenção. Ela voltou ao quarto rapidamente, pegando­-o no colo. Estava na hora de amamentá­-lo.

    Vários dias se passaram assim. Alan fingia que não existiam outras pessoas em casa, provocando intencionalmente em Laura a solidão. Ela sabia muito bem o que o marido estava fazendo, o motivo de tudo. Laura só não esperava que fosse durar tanto tempo. Passava madrugadas amamentando e acalentando o bebê, quando ele tinha cólicas. Ela mal via Alan, que saía cedo e voltava tarde da noite.

    Os dias foram passando, e Laura vivia um misto de alegria e angústia. Quando estava só com o bebê, se maravilhava com cada evolução de Noah, aproveitando pequenos detalhes de sua nova vida, e até mesmo o cansaço produtivo. Porém, a angústia tomava conta de seu coração todas as vezes em que ouvia a porta do apartamento abrindo e Alan passando por ela. Não existia mais nenhum relacionamento entre eles, eram estranhos vivendo dentro da mesma casa. Esse vazio que existia em relação ao marido só crescia, fazendo­-a se sentir oprimida, em uma escuridão profunda e sufocante. Cada dia que passava se tornava mais insuportável, mas ela se esforçava para não desistir, por mais que isso parecesse impossível, tentando crer que de alguma maneira o marido voltaria para ela, que Alan a perdoaria. Laura esperava, da mesma forma que esperou desde o dia em que ele parou de falar com ela, no início da gestação. A cada vez que ele chegava, a expectativa dela entrava em alerta, ansiosa para que ele parasse no quarto, que viesse ver o bebê, que estivesse sentindo falta dela, como ela sentia a dele. Que seus olhares pudessem se encontrar, para finalmente se conectarem de novo. Porém, nada mudava.

    Quando Noah estava para completar dois meses, as suas crises de cólicas aumentaram um pouco, mas nada muito grave. O bebê passou a chorar por mais tempo, e isso claramente incomodou Alan, percebeu ela. O marido resmungava, passando pelo quarto de Noah durante a madrugada, por não conseguir dormir. Laura estava nervosa, vendo a aflição que o filho sentia de dor, e não conseguindo ajudá­-lo de forma mais efetiva. As atitudes de Alan só pioravam seu nervosismo. Havia já três noites seguidas que ele parecia mais nervoso, irritado com o choro do bebê. Ele passava pelo corredor batendo os pés, indo para a cozinha. Naquela noite então, parou na porta do quarto, finalmente olhando para ela. O coração de Laura disparou de expectativa. Ela estava exausta, após várias noites em claro, com suas costas doendo e seu corpo pedindo descanso. Tudo que ela precisava era de apoio, mas ela sabia que não era isso que receberia. Alan estava com o rosto irritado, seus olhos cheios de raiva, quando ele disse alto:

    – Faça essa criança calar a boca!

    Naquele momento, a última faísca de tudo que um dia sentiu pelo marido se apagou. Ela sentiu um frio passando por seu corpo, como se um vento gelado estivesse invadindo o ambiente. Laura o encarou por um tempo muito maior do que o esperado, e em silêncio. Aquela situação em que vivia estava insuportável, não conseguiria mais. Estava desistindo, era isso. Seu casamento havia terminado. Alan enxergou dentro dos olhos dela toda a dor que ele estava causando a ela, pela primeira vez.

    Ela falou baixo, em meio ao choro de Noah.

    – Vá embora daqui! Agora!

    Sem acreditar no que tinha ouvido, Alan ficou parado, olhando para ela. O rosto dele ficou pálido e suas mãos tremiam, percebeu Laura.

    – Vá embora! – Disse ela mais alto, se enchendo de coragem. – Você não está aqui há muito tempo... Eu quero que você saia! – Terminou Laura com a voz embargada, com um choro que segurava há bastante tempo.

    Ele passou mais alguns instantes encarando Laura, e sem nenhuma palavra foi até o quarto deles, fez rapidamente uma bolsa com algumas coisas e saiu.

    Laura ouviu a porta batendo e permaneceu no mesmo lugar, ninando Noah, que não parava de chorar. Ela, sem perceber, começou a chorar também. Sentia apenas as lágrimas queimando em seu rosto. Não chorava só de tristeza. Era também um choro de alívio, por ter conseguido finalmente tomar uma atitude. Era angustiante ver aquele homem que um dia ela amou, andando pela casa como um desconhecido com quem ela era obrigada a conviver. Seu casamento havia chegado ao fim há muitos meses, mas ela se recusava a desistir. Isso porque ela não tinha percebido que ele já havia desistido dela há muito tempo. Não havia mais respeito, admiração, e muito menos amor. Havia uma obrigação que ela não aguentava mais. Não aguentava nem olhar para ele. Laura sabia de sua culpa e sentia o peso disso, mas achava que as atitudes de Alan há muito haviam passado do limite. Ele já não servia para nada mesmo. Para que suportar isso? Ela se perguntou em pensamento. Sim... havia casado por amor, e esperava que tivesse sido para sempre. Acreditava que seria. Ele foi seu primeiro amor, mas agora não passava de um estranho. Ela sabia que a culpa era dela, por ter insistido em ter filhos, por ter engravidado sem ele saber. Laura começou a soluçar em meio a um choro descontrolado. Noah finalmente tinha dormido e ela conseguiu colocá­-lo no berço. Saiu do quarto rapidamente, e ao chegar no corredor, desabou no chão. Chorava com dor, pela frustração, pelas decisões erradas, por não ter sido perdoada, pelo término, pelo sonho. Se permitiu sonhar em ter uma família e havia se tornado uma mãe solo. O choro dela se intensificou, e ela sentiu toda dor sendo colocada para fora, ela precisava disso. Precisava chorar até que os sonhos que tinha sobre aquela família sumissem, suas esperanças tinham acabado. Chorar agora parecia a única coisa que podia fazer.

    A

    Enquanto ninava Noah em pé, balançando de um lado para o outro, olhava para as fotos que ainda decoravam a sala, depois de seis meses de separação. Eram 02h30 da manhã, e parecia que finalmente Noah havia adormecido profundamente. Voltou a sentir aquela mesma culpa, que a vinha acompanhando há mais ou menos um ano e três meses, quando engravidou. Ela sabia, quando decidiu que queria um filho, que talvez estivesse arriscando seu relacionamento, já que Alan havia dito que não queria ser pai. Eles estavam juntos há oito anos, sendo quatro de casamento, então ela achava que o conhecia bem. Alan e Laura se conheceram na faculdade e juntos descobriram a vida. Logo que se formaram – ele em economia e ela em gastronomia – começaram suas vidas profissionais. Ele trabalhava para o governo e tinha um cargo muito importante. Laura começou como subchefe, mas rapidamente se tornou chef de um dos melhores restaurantes italianos de alto padrão da cidade. Então, surgiu uma proposta de reestruturar um restaurante que não ia bem, mas que um dia tinha sido famoso. O trabalho feito por ela foi incrível, e seu sucesso enorme. Seus serviços eram tão requisitados, que deixou de trabalhar como chef e dedicou­-se a consultorias, alavancando assim sua carreira e se tornando uma chef famosa, com apenas vinte e seis anos. Apesar do sucesso que havia adquirido, ainda sentia um vazio em sua vida e pensou que talvez agora, com a agenda menos comprometida, ela poderia pensar mais na família. Sim filhos, não um só, no mínimo três. Ela sempre sonhou em ter a casa cheia, com cheiro da comida que ela estaria preparando, e os meninos fazendo

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