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"histórias De Alexandre" Por Graciliano Ramos
"histórias De Alexandre" Por Graciliano Ramos
"histórias De Alexandre" Por Graciliano Ramos
E-book89 páginas1 hora

"histórias De Alexandre" Por Graciliano Ramos

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Sobre este e-book

Histórias de Alexandre reúne uma série de narrativas curtas que exploram diversos temas e situações. Cada conto apresenta uma história independente, permitindo uma ampla diversidade de assuntos e abordagens. Os contos de Histórias de Alexandre tratam de questões sociais, psicológicas ou do cotidiano, refletindo a habilidade de Graciliano Ramos em criar narrativas envolventes e explorar diferentes aspectos da condição humana. Cada história é uma peça única que contribui para a riqueza e complexidade do conjunto da obra.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento30 de jan. de 2024
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    "histórias De Alexandre" Por Graciliano Ramos - Graciliano Ramos

    HISTÓRIAS DE ALEXANDRE

    GRACILIANO RAMOS

    mafraeditions.com

                              Apresentação de Alexandre e CESÁRIA

    NosertãodoNordesteviviaantigamenteumhomemcheio deconversas, meio caçador emeio vaqueiro, alto, magro, jávelho, chamado Alexandre. Tinha um olho torto e falava cuspindo agente, espumando como um sapo-cururu, mas isto não impedia que osmoradores da redondeza, até pessoas de consideração, fossem ouvir ashistórias fanhosas queelecontava. Tinha uma casa pequena, meiadúzia de vacas no curral, um chiqueiro de cabras e roça de milho navazantedo rio. Alémdisso possuía uma espingarda ea mulher. Aespingarda lazarina, a melhor espingarda do mundo, não mentia fogo e alcançava longe, alcançava tanto quanto a vista do dono; a mulher,Cesária,faziarendaeadivinhavaospensamentosdomarido.Emdomingos e dias santos a casa se enchia de visitas — e Alexandre,sentado no banco do alpendre, fumando um cigarro de palha muitogrande,discorriasobreacontecimentosdamocidade,àsvezesseenganchavaeapelavaparaamemóriadeCesária.Cesáriatinhasempreumarespostanapontadalíngua.Sabiadecortodasasaventuras do marido, a do bode que se transformava em cavalo, a daguariba mãedefamília, da cachorra morta por um caititu acuado,pobrezinha,amelhorcachorradecaçaquejáhouve.Eaquelenegócio de onça-pintada que numa noite ficara mansa como bicho decasa? Era medonho. Alexandre tinha realizado ações notáveis e falavabonito, mas guardava muitas coisas no espírito e sucedia misturá-las.Cesária escutava e aprovava balançando a cabeça, curvada sobre aalmofada trocando os bilros, pregando alfinetes no papelão da renda. E quandoohomemsecalavaoualgumouvintefaziaperguntasinconvenientes,levantavaosolhosmiúdosporcimadosóculosecompletavaanarração.

    Essecasaladmirávelnãobrigava,não discutia. Alexandreestava sempredeacordo com Cesária, CesáriaestavasempredeacordocomAlexandre.Oqueumdiziaooutroachavacerto.Eassim,tudosecombinando,descobriamcasosinteressantes que se enfeitavam e pareciam tão verdadeiros como aespingarda lazarina, o curral, o chiqueiro das cabras ea casa ondeelesmoravam.Alexandre,comojávimos,tinhaumolhotorto.Enquanto ele falava, cuspindo a gente, o olho certo espiava as pessoas,mas o olho torto ficava longe, parado, procurando outras pessoas paraescutar as histórias que ele contava. A princípio esse olho torto lhecausava muito desgosto e não gostava que falassem nele. Mas com otempo seacostumou edescobriu queenxergava melhor por elequepelo outro, queera direito. Consultou a mulher:

            — Não é, Cesária?

    Cesária achou que era assim mesmo. Alexandre via até demais poraquele olho: Não se lembrava do veado que estava no monte? Pois é.Um homem de olhos comuns não teria percebido o veado com aqueladistância. Alexandreficou satisfeito ecomeçou a referir-seao olhoenviesado com orgulho. O defeito desapareceu, e a história do espinhofoi nascendo,comotinhamnascidotodasashistóriasdele,comacolaboração de Cesária. São essas histórias que vamos contar aqui,aproveitando a linguagemdeAlexandreeos apartes deCesária.

    10 dejulho de1938.

    primeira aveNtUra de AlexaNdre

    Naquelanoitedeluacheiaestavam acocorados os vizinhos nasalapequenade Alexandre: seu Libório, cantador de emboladas, o cego preto Firmino e mestreGaudênciocurandeiro,querezavacontramordedurasdecobras.DasDores,benzedeira de quebranto e afilhada do casal, agachava-se na esteira cochichandocom Cesária.

    —  Vou contaraos senhores... principiou Alexandreamarrando o cigarro depalha.

    Osamigosabriram osouvidoseDasDoresinterrompeuocochicho:

    —Conte, meu padrinho.

    Alexandre acendeu o cigarro ao candeeiro de folha, escanchou-se na rede eperguntou:

    —Os senhores jásabem porqueéqueeutenho um olho torto?

    MestreGaudêncio respondeu quenão sabiaeacomodou-senum cepo queserviadecadeira.

    —  Pois eu digo, continuou Alexandre. Mas talveznem possaescorrertudohoje, porque essa história nascede outra, e é preciso encaixar as coisas direito.Querem ouvir?Senãoquerem,sejam francos: nãogostodecacetearninguém.

    Seu Libório cantador e o cego preto Firmino juraram que estavam atentos. EAlexandreabriu atorneira:

    —Meu pai, homem de boa família, possuía fortuna grossa, como não ignoram.Anossafazendaiaderibeiraaribeira,ogadonãotinhacontaedinheiroláem casaeracamadegato. Não era, Cesária?s

    —Era,Alexandre,concordouCesária.Quandoosescravosseforraram,foi

    um desmantelo, mas ainda sobraram alguns baús com moedas de ouro. Sumiu-setudo.

    SuspiroueapontoudesgostosaamaladecourocruondeseuLibóriosesentava:

    —Hojeéisto.Vocêselembradonossocasamento,Alexandre?

    —Sem dúvida, gritou o marido. Umafestaquedurou setedias. Agoranão se fazfestacomoaquela.Masocasamentofoi depois.Ébom nãoatrapalhar.

    —   Estácerto,resmungoumestreGaudênciocurandeiro.Ébomnãoatrapalhar.

    —  Então escutem, prosseguiu Alexandre. Um domingo eu estavano copiar,esgaravatandoasunhascom afacadeponta,quandomeupai chegouedisse:

    Xandu, você nos seus passeios não achou roteiro da égua pampa? E eurespondi: — Não achei, nhor não.Pois dêumas voltas por aí, tornou meupai. Vejaseencontraaégua.Nhor sim.Peguei um cabresto esaí decasa antesdoalmoço,andei,virei,mexi,procurandorastosnoscaminhosenasveredas.

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