Encontre milhões de e-books, audiobooks e muito mais com um período de teste gratuito

Apenas $11.99/mês após o término do seu período de teste gratuito. Cancele a qualquer momento.

O Dia em que Deus Chorou
O Dia em que Deus Chorou
O Dia em que Deus Chorou
E-book247 páginas3 horas

O Dia em que Deus Chorou

Nota: 0 de 5 estrelas

()

Ler a amostra

Sobre este e-book

Imagine que você pudesse se tornar Deus. O que faria? Como alcançar essa condição? E se a única forma de você existir seja criando algo vivo, sendo o Senhor dessa criatura? Pode ser que nada disso seja possível ou mesmo que toda a humanidade nem ao menos exista, sendo apenas um mero sonho divino. Quando Ele acordar, será o fim do mundo. Isso é verdade ou não passa de uma crise de loucura dos personagens?

É noite. Chove muito. Um acidente. O condutor morre. Jacques está sozinho, perdido, no meio do nada. Ele corre até encontrar abrigo. A pessoa e o local que ele conhece depois disso mudarão sua vida para sempre. Todas as certezas dele a partir de então são destruídas. O que seu misterioso anfitrião esconde? De quem é o túmulo que ele encontra? Ele está louco? Morto? Ele existe realmente? O que é o vulto que o persegue? A única coisa que ele sabe é que a cada dia que passa, é como se um novo universo fosse criado dentro dele mesmo.

O Dia em que Deus Chorou não é uma obra religiosa e sim um romance onde em meio ao suspense da narrativa, o leitor é apresentado às ideias e teorias dos personagens a respeito de diversos assuntos. O texto é narrado em primeira pessoa e transmite a quem o lê todas as angústias e dúvidas de uma mente paranoica que tenta manter-se lúcida em meio a um ambiente de incertezas.

IdiomaPortuguês
Data de lançamento3 de dez. de 2014
ISBN9781310223532
O Dia em que Deus Chorou
Autor

Igor De Alcantara

Nascido na pequena cidade de Janaúba-MG em 07 de Maio de 1977, Igor Alcantara mudou-se logo cedo para Brasília-DF, onde viveu a maior parte de sua vida, tendo morado ou visitado quase todas as unidades da federação.Desde cedo ele foi levado a ler compulsivamente. Como estudava no período da manhã e morava longe, só podendo voltar para casa à noite, gastava suas tardes em uma biblioteca de Brasília.Por isso, desde seus nove anos de idade, leu diversos clássicos da literatura. Aos dez anos já conhecia a obra de Oscar Wilde, aos onze já havia lido Homero e Dante e aos doze, todas as peças de Shakespeare e boa parte dos livros de Kafka, Dostoievski e Machado de Assis, seus autores preferidos.Seu primeiro conto, “A Flor de Moscou” foi escrito aos onze anos. Desde então ele nunca parou de escrever. Boa parte do que produziu foi perdido, mas algumas coisas ainda persistem. Outras tantas obras ele simplesmente escreveu como presente a alguns amigos, não guardando cópias das mesmas. Já algumas foram perdidas durante o tempo.Igor Alcantara é um autor que acredita que escritores precisam se arriscar em terrenos antes não explorados. Por este motivo seus livros são de estilos diferentes entre si. É apenas saindo da "zona de conforto" que se pode realmente evoluir na arte das palavras.Apenas após os trinta anos de idade publicou algumas de suas obras escritas no passado e textos inéditos. Com as novas tecnologias gráficas, esse antigo sonho tornou-se realidade.Logo após a publicação, algumas de suas obras foram premiadas em diversos concursos literários, o que representou o início do reconhecimento de seu talento como escritor.Se quiser saber mais sobre Igor Alcantara, além de obter informações adicionais sobre este e outros livros, visite a página pessoal do autor:http://www.igoralcantara.com.br

Leia mais títulos de Igor De Alcantara

Relacionado a O Dia em que Deus Chorou

Ebooks relacionados

Romance de Suspense para você

Visualizar mais

Artigos relacionados

Categorias relacionadas

Avaliações de O Dia em que Deus Chorou

Nota: 0 de 5 estrelas
0 notas

0 avaliação0 avaliação

O que você achou?

Toque para dar uma nota

A avaliação deve ter pelo menos 10 palavras

    Pré-visualização do livro

    O Dia em que Deus Chorou - Igor De Alcantara

    Posso dizer, sem dúvida alguma, que este livro é até o momento a obra de minha vida. Não pelo fato de ser o melhor romance que escrevi, mesmo talvez sendo. Muito menos por acreditar em suas ideias, boa parte delas eu discordo. De todo modo, considero-o o livro mais importante que já escrevi, incluindo meus manuscritos jamais publicados, pelo esforço que tive ao fazê-lo.

    O Dia em que Deus Chorou foi escrito no ano de 1997. Terminei-o exatamente no dia 07/07/1997, dois meses após eu completar vinte anos de idade. Existia apenas uma cópia, escrita à mão em um caderno. Chorei ao terminá-la. Aquele não foi apenas o dia em que Deus chorou, mas o dia em que eu também chorei. Foi a única vez que um texto produzido por mim provocou tal efeito.

    Emprestei essa única cópia ao meu amigo, meu melhor amigo, Bráulio Souza. Ele leu e não poupou elogios ao texto. Conversamos muito a respeito. Houve, no entanto, um problema. Quando pedi a obra de volta, ele procurou, mas não conseguiu achá-la. Havia perdido.

    A perda de minha mais intensa criação até então me doeu muito. No entanto, não me lamentei por muito mais tempo. Aproveitei que tudo ainda estava recente em minha cabeça e, na mesma semana da perda, tratei de reescrever a obra desde o início.

    O trabalho foi árduo, mas fui compensado com o resultado final. Por incrível que pareça, a segunda versão do livro teve a mesma quantidade de páginas da primeira. Exatamente a mesma! E não o fiz de propósito, foi mais um fato curioso acerca desta obra.

    O tempo passou e não me lembrava de onde tinha guardado os manuscritos da nova versão. Mudei-me de casa algumas vezes e inclusive de cidade. Foi quando ao final de 2010, achei o livro, escrito em um velho caderno. Entreguei à minha esposa que o leu com voracidade. Foi ela quem me disse: você precisa publicar isso.

    Foi exatamente o que fiz, após um árduo trabalho de digitação. Finalmente a obra foi publicada, no dia 07/07/2011, quatorze anos após sua primeira versão ser escrita. Foi uma dívida paga com o meu passado.

    Tive a oportunidade de mudar o texto e esse foi um desejo grande. Tanto tempo depois, apurei um pouco minha técnica. Todavia, contive esse desejo e mantive o texto original, para que deste modo o leitor pudesse ter contato com o escritor que fui aos vinte anos.

    Espero que aproveite essas páginas. Entenda que o estilo da narrativa procura transmitir as emoções pelas quais passa o personagem principal. Se às vezes é monótona, é porque ele se sente assim, se é repetitiva, é por razão da própria mente conturbada do narrador.

    Não desejo que chores ao final, como eu o fiz. Tive essa reação porque esta é minha criação, minha chance de existir. Espero, entretanto, que quando ler o último parágrafo tenha o sentimento de ter gasto o seu tempo de forma proveitosa e que esteja feliz por assim tê-lo feito.

    O Autor.

    Capítulo 1

    Chovia muito naquela tenebrosa noite de novembro. O inverno aproximava-se e este fato já podia ser notado pelo frio que se fazia sentir. O condutor transportava-me com extrema velocidade. Éramos os únicos na estrada. Não percorríamos um caminho usual, mas o dito condutor disse que por ali chegaríamos mais rápido ao nosso destino.

    Minha cabeça repousava no vidro ao lado, de onde eu podia ver as gotas da chuva pelo lado de fora. Era interessante o movimento da água na janela. Cada gotícula parecia ter a sua própria vida, com uma personalidade individual. Elas caminhavam diante de meus olhos com maior sutileza que uma dama em seu baile de casamento. E era exatamente isso que pareciam fazer: dançar. O som do vento que movimentava as folhas das árvores funcionava como música, disso eu me lembro muito bem.

    Se pensas que, pelo que narrei até aqui, a noite era calma e desprovida de preocupações, engana-se terrivelmente. Uma sensação de perigo iminente tomava minha alma e tirava-me o sono. Apesar da temperatura, um suor frio encharcava-me como se eu estivesse exposto à chuva. A visibilidade era mínima e a chuva aumentava a cada minuto. Só víamos alguma coisa além de três metros quando algum relâmpago cortava o céu e iluminava nosso caminho. Os trovões eram tão altos que mais pareciam um estrondoso grito de Deus, despejando em nós a sua ira.

    Quando apareciam tais relâmpagos e a claridade era plena por cerca de três segundos, eu podia ver os galhos das árvores na floresta imitando braços putrefeitos em busca de uma próxima vítima, que poderia ser eu. A certeza de que algo aconteceria aumentava cada vez mais, porém na mórbida curiosidade fazia-me querer continuar naquela estrada. Um sombrio medo começava a me dominar, findando com os poucos resquícios de sono que eu ainda possuía.

    As batidas de meu coração, de tão rápidas e fortes, mais pareciam os sons dos tambores de alguma tribo primitiva iniciando um ritual de sacrifício. Minhas mãos tremiam e, de um instante para o outro, o antigo calor que me fizera suar se transformou num intenso frio. Mesmo estando muito agasalhado, eu me sentia como se estivesse sido jogado na neve despido. Aos sons dos meus tambores cardíacos, misturavam-se vozes que não existiam, mas que eu imaginava ouvir.

    O medo agora havia se transformado em pavor e este mesmo pavor se converteu em terror, um doce e desesperado terror. Eu ainda não sabia que era uma força superior quem havia me atraído para aquele lugar. Um ser mais poderoso que eu. Era como se estivesse buscando algo em algum local distante do universo que só poderia ser encontrado através de uma introspecção profunda. Minha mente já parecia ter passado por tudo aquilo, mas nem por isso denomino este momento como um mero dejà-vu. Era algo além; eu me sentia como no meio da encruzilhada dos tempos, onde passado, presente e futuro coexistiam.

    A tempestade aumentava na medida em que meu desespero tornava-se incontrolável. Meu terror não era pelo medo de algo acontecer, pois eu sabia que aconteceria, era pela dúvida do que poderia ocorrer. Eu e o condutor éramos incomunicáveis, o que só aumentava minha angústia. Levei minhas mãos à cabeça e comecei a rezar desesperadamente em busca de algum auxílio. É impressionante como apenas nestes momentos nós nos lembramos de Deus.

    O galope dos cavalos misturava-se à minha respiração ofegante compondo a mais tenebrosa sinfonia jamais tocada por nenhum mortal. O som dos cascos indo de encontro ao chão enlameado parecia a pulsação do próprio demônio. Estes mesmos cavalos deveriam ter os olhos vermelhos como o fogo do mais baixo inferno. Em seus corpos, caso fechasse os meus olhos, não seria difícil imaginar longos pares de asas negras como as de um morcego. As vibrações que eu sentia eram realmente muitíssimo pesadas.

    Eu não mais possuía família, fui abandonado à minha própria sorte. A felicidade que tive foi ter sido, logo criança, adotado por um nobre de invejável respeito. Ele fez-me seu criado de confiança. Desde cedo tive uma boa educação, o que me possibilitou ser aceito na corte. Estava de viagem ao sul do país para cumprir o desejo de meu patrão. Sentia-me honrado por ter sido escolhido para a missão, era uma espécie de reconhecimento pelos anos de leais préstimos.

    Senti que o condutor também estava apavorado. Talvez ele também pressentisse que algo haveria de acontecer muito em breve. Enquanto eu dispunha de certo conforto no interior da carruagem, ele estava exposto à chuva, completamente encharcado. Seu chapéu já havia sido jogado para longe pela força do vento. Pude perceber, olhando-o pela janela lateral, que seu queixo batia tamanho era o frio que sentia. Pensei em fazê-lo parar para dormirmos dentro da carruagem até a chegada do dia, mas o medo de sermos atacados por alguma criatura fez-me ficar calado.

    A cada relâmpago que iluminava o nosso redor, eu parecia enxergar seres monstruosos no meio da floresta. Na verdade, não existia nada além da vegetação local, mas o medo fazia-me ver coisas. Acreditava, na minha tola imaginação, que o perigo viria de alguma destas criaturas imaginárias. Muitas das aberrações que eu parecia ver eram, na verdade, galhos secos ou folhas grandiosas. A escuridão possui a incrível capacidade de modificar as formas da natureza fazendo-as parecer com criaturas horrendas.

    Foi então que, durante um dos relâmpagos, um vulto atravessou na frente da carruagem de forma assustadora e veloz. Parecia algo sobrenatural. Ouviu-se um grito alto e grave, era o condutor amedrontado. Os cavalos se assustaram, desprendendo-se da carruagem. A carruagem pendeu de lado e capotou. Não sei quantas vezes ela virou, mas o fato é que bati minha cabeça com inigualável força e desmaiei.

    Foi com dificuldade que abri os olhos vários minutos depois. Sentia muita dor na cabeça, nas pernas e no ombro. Não sei por quanto tempo fiquei desmaiado, mas creio que não foi pouco. A lama havia invadido o interior da carruagem e eu estava todo sujo. A porta da carruagem estava travada contra o chão; afinal, havíamos capotado. Estava preso e sem condições de sair.

    Batia nas paredes de madeira e comecei a gritar por socorro desesperadamente. Mesmo que ali alguém estivesse para nos ajudar, não ouviria meus gritos por que o som dos trovões era muito mais alto. E o condutor? Onde estaria ele? Provavelmente, pensei eu, estava também desmaiado lá fora. A situação era tão angustiante que me ajoelhei e comecei a chorar.

    Em um relance de racionalidade, conclui que o melhor seria tentar sair de dentro daquela carruagem. Olhei para todos os lados e descobri como fazer isso. Deveria quebrar a janela lateral esquerda, que agora era o teto, e sair por ela. Eu não tinha forças para isso, a morte era quase certa. No entanto, algo estranho ocorreu. Alguém do lado de fora esmurrou o vidro e abriu assim uma passagem para que eu pudesse me salvar.

    Essa mesma pessoa ergueu o braço para que eu me apoiasse. Julguei ser o condutor da carruagem. Fiquei um tempo indeciso se deveria ou não aceitar o auxílio, mas logo vi que não teria outra opção. Com muito esforço, ele me ergueu e assim me tirou de dentro do acidentado coche.

    Ao fazer isso eu senti pontas de vidro cortando-me por todos os lados. Tentei agradecer ao meu bem-feitor, mas não conseguia ver o seu rosto. Era como se uma nuvem negra me impedisse de fitá-lo. Ele olhou para mim por algum tempo. Era estranhamente familiar. Fiquei alguns segundos deitado sobre a carruagem, observando-o sem o ver, até despenquei no chão e desmaiei.

    Após acordar, eu já estava sozinho. Rastejei alguns metros pelo solo enlameado. Sentia toda a fúria da chuva se expressando em cada gota d'água que tocava meu corpo. Após breve procura, avistei o condutor caído a alguns metros de onde eu estava. Foi com bastante dificuldade que eu consegui chegar onde ele se encontrava. Precisava ajudá-lo e agradecê-lo por ter salvado a minha vida.

    Olhei-o com atenção e percebi que ele havia batido a cabeça em uma pedra. Sacudi-o na tentativa de acordá-lo, mas ele permanecia imóvel. Coloquei meus dedos sob suas narinas e constatei que ele havia parado de respirar. Comecei a me desesperar, mas ainda tinha esperança. Encostei então meu ouvido em seu tórax para verificar seus batimentos cardíacos e constatei o pior: nenhum som havia. Ao erguer sua cabeça com minha mão esquerda vi que seu crânio havia sofrido uma fratura grave. Pedaços de cérebro misturavam-se ao sangue e à chuva. Neste instante aceitei o óbvio: Ele estava morto!

    Comecei a chorar compulsivamente. Meu pranto não era pelo condutor, eu nem o conhecia muito bem. Chorava por estar naquela situação extremamente difícil. Chorava também por perceber que minha mórbida previsão de que algo aconteceria se concretizara. Soltei um profundo grito para o céu em resposta ao responsável por tudo aquilo. Não sei quanto tempo gritei, mas isso também não importa. Parecia que eu não havia sido notado, pois a tempestade bem como os trovões continuava e não davam o menor sinal de compaixão para comigo. Se alguém me visse, creio que não notaria meu choro, pois as lágrimas, desde o início, se confundiram com a própria chuva.

    Percebi que precisava fazer algo para que também não morresse. Pensei em continuar pela estrada, mas essa ideia foi logo descartada. Era uma via não usada e perigosa, sem contar que a vila mais próxima ficava há três dias se eu fosse a pé. Como eu não poderia ficar lá parado porque seria apressar minha morte, a única saída era adentrar na floresta e procurar um abrigo para me proteger até o fim da tempestade. Levantei- me, dei uma última olhada na carruagem tombada e no cadáver do condutor e comecei a andar.

    A tempestade não mais representava meu maior problema, pois eu já estava tão encharcado que era impossível molhar-me mais. O que realmente me incomodavam eram as feridas que havia se formado em todo o corpo. A cada passo que eu dava mais sentia as dores profundas que me faziam perder o fôlego. Boa parte das minhas vestimentas já tinha sido manchada pelo vermelho. Era o sangue que escapava de minhas veias e gotejava no chão. Corria semelhante a alguém fugindo de seu pior temor. Minha velocidade e destreza em desviar dos obstáculos eram incríveis. Mesmo estando tão escuro, minha fuga estava sendo muito bem sucedida. O pavor, pelo nosso extinto de sobrevivência, aumenta nossa energia e capacidade visual. Não foi diferente comigo.

    Após muito correr avistei e toquei algo muito curioso. Era um muro alto e aparentemente forte. Eu estava no meio da floresta, como poderia ali ter um muro? Isso era algo um tanto quanto estranho para minha cabeça. O normal era existir muros próximos a estradas ou cidades, mas não dentro de uma floresta. Quem seria louco ou estúpido o suficiente para construir aquilo logo ali? E que utilidade teria? Não havia explicação lógica para isso, mas no estado em que me encontrava eu não possuía nenhuma escolha. Se for um milagre existir um muro ali, deveria me aproveitar disso. Fui andando e apalpando o muro tentando encontrar um abrigo.

    Não muito tempo depois, para a minha felicidade, minhas mãos foram de encontro a um portão. Era grandioso, feito de um metal altamente trabalhado. Nas extremidades laterais havia dois anjos, um de frente para o outro. Cada um deles possuia uma lira, creio que para dar boas-vindas a quem chegasse. Entretanto, quando um relâmpago possibilitou-me ver melhor, eu percebi que seus olhos puros disfarçavam um sarcasmo quase demoníaco. Isso, no entanto, não me assustou. Empurrei o portão e me surpreendi ao notar que o mesmo estava aberto. No início vacilei, mas logo vi que entrar era a única solução.

    Entrei e os portões fecharam-se logo após. Virei-me assustado, mas logo vi que nada mais era do que uma rajada de vento. Comecei a caminhar lentamente mesmo com tão furiosa tempestade. Notei, mesmo sem ver, que os anjos acompanhavam meus passos com seu olhar. É estranha a sensação de ser observado. Os trovões pareciam ser mais altos e raivosos. Os relâmpagos eram mais intensos. A chuva, de tão violenta, feria meu corpo como pregos espetados na pele.

    Andei um pouco e surpreendi-me ainda mais. Como poderia? Ao erguer meus olhos, vi no meio da escuridão um grandioso e imponente castelo. Ali era uma floresta, como poderia existir um castelo em tal lugar? Não seria uma ilusão aquilo? Eu estava ferido e cansado, chovia muito forte, poderia ser um delírio. Mas, se fosse um delírio, porque por que tais imagens não desapareceram após um tempo?

    Ou então, quem sabe, não era tudo um terrível pesadelo? Essa ideia pareceu completamente agradável, pois se eu realmente estivesse em um sonho tudo o que havia acontecido fora irreal. O condutor estava vivo e a carruagem ainda corria pela estrada. Relaxei um pouco com esse pensamento, mas logo depois ocorreu-me duas interrogações: por que, se tudo era mesmo um sonho, o castelo mostrava-se tão real e as feridas doíam tanto? E por que já não havia acordado? Decidi que era melhor encarar os fatos e procurar sair deles. Por este motivo comecei a andar em direção à entrada do castelo.

    Cada passo parecia uma jornada. Andava e era como se não saísse do lugar. É uma sensação horrível essa que eu sentia. O que eu queria realmente era entrar em algum lugar para me abrigar da tempestade. Foi então que me ocorreu um pensamento: E se os donos do castelo não permitissem minha entrada? O que deveria fazer? Implorar? Procurar outro local? Desistir de tudo e esperar a morte que, creio eu, não tardaria a chegar? Eu estava muito cansado para tomar uma decisão segura, mas era preciso escolher um caminho no meio de tantos problemas.

    Quando menos percebi já estava em frente à porta do castelo. Fiquei por alguns segundos apenas observando a imponência da construção. Cada detalhe deveria ter sido minuciosamente pensado para no final compor uma obra de tão respeitável grandeza. Resolvi bater à porta para avisar aos moradores que havia alguém do lado de fora com um ardente desejo de entrar. Bati três vezes e esperei. Foram batidas fortes, mas ninguém veio abrir. Bati mais três vezes. Aguardei mais uns instantes com uma irritante impaciência, mas não ouvi nem o som de alguma pessoa se aproximando. Então dei quatro batidas com força maior ainda.

    Estava ficando aflito. Suava muito. Meu coração disparava e minha respiração era ofegante. E se não houvesse ninguém lá? Poderia ser um castelo abandonado. Pareceu-me uma possibilidade bastante lógica. Estava no meio de uma floresta, por que alguém moraria ali? Decidi que bateria mais uma vez e depois iria andar pelo terreno tentando achar um abrigo.

    Foram sete batidas em um ritmo quase de súplica. Olhei desolado para a porta que não se abriu. Uma tristeza imensa invadiu minha alma. Virei-me de costas para o castelo e comecei minha nova busca. Uma lágrima brotou de meus olhos e se desfez em minha face sofrida. Foi então que, por volta do terceiro passo, uma voz que eu jamais esqueceria encheu meu acelerado coração de alegria e esperança ao dizer:

    - Não desejas entrar, cavalheiro?

    Voltei-me para traz e vi uma porta aberta. O homem que me falou aparentava ter quarenta anos de idade. Possuía uma doçura nos lábios e uma sinceridade no olhar jamais imaginados. Senti um impacto ao encará-lo, era como se estivéssemos destinados a nos conhecer. Seus cabelos ainda não haviam perdido a coloração. Seu rosto ainda não aparentava possuir rugas. Pelos trajes, imaginei que era o dono da casa. Eram roupas que invejariam os nobres da

    Está gostando da amostra?
    Página 1 de 1