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Um sonho de liberdade
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E-book290 páginas4 horas

Um sonho de liberdade

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Sobre este e-book

Dsurante a escravidão espiritos que aqui se encontravam para cumprir uma encarnação dolorosa foram postos a provas para ver se estavam mesmo seguindo a a tarefa por eles pedida no plano espiritual . Jaco era um deles, negro, escravo , bondoso e humilde estava seguindo os planos por ele traçado na espiritualidade, ate se apaixonar pela linda sinha filha do fazendeiro seu senhor. Começava ai a saga que lhe faria sofrer e se revoltar ao descobrir que seu amor era impossivel. Teria de mudar toda sua trajetoria par o recomeço de sua jornada na Terra..
IdiomaPortuguês
Data de lançamento10 de nov. de 2019
ISBN9781526016201
Um sonho de liberdade

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    Um sonho de liberdade - Liege Castro

    UM SONHO DE LIBERDADE

    Psicografia Leandro quinto livro

    CAPÍTULO I

    JACÓ

        O céu brilhava ponteado de estrelas e a lua cheia estava deslumbrante. Corria uma fresca aragem, o perfume das flores era um presente para quem vivia sentindo o cheiro desagradável que vinha do curral, e a calma que reinava contrastava com o burburinho que durante o dia era uma constante na fazenda. Logo cedo começava o cantar dos galos, o mugir do gado, o canto triste dos negros que iam para a lavoura e o lamento dos carros de boi seguindo para a lida.

      O dia começava antes de o sol nascer, e só terminava bem tarde após o feitor fazer a contagem dos escravos na senzala. Era então que os escravos podiam ter algum descanso, comer o angu com feijão e jogar um pouco de água nos corpos suados pela labuta do dia.

      Era assim que a vida corria, sem nenhuma mudança, tudo sempre igual na vida de tantos negros escravos que trabalhavam na fazenda Santa Maria, era ali que muitos nasciam e morriam sem terem saído para algum outro lugar.

    Pai Jacó era um deles, um negro velho escravo, que desde que se lembrava vivia ali, naquele pedaço de chão, perdido no interior de Minas Gerais. Jamais saiu daquelas bandas e nunca calçou um par de botinas, sua única vaidade era o velho chapéu que ganhou certa vez do antigo sinhô, pai da agora dona sinhazinha Linda já que o velho Antero havia morrido, fazia muitos anos.

      Desde criança viveu ali na velha tapera junto de sua mãe a escrava Dolores,

    E só se afastou algum tempo quando foi para o quilombo, mas isso é outra historia, que o negro velho e cansado ficava a relembrar.

    Jacó era um negro escravo forte, de pele reluzente, dentes muito branco e sorriso aberto. Seu peito forte e musculoso foi talhado na lida da lavoura, plantando e arando a terra, era também um bom vaqueiro cuidava do gado com muito zelo, pois adorava cavalgar levando a boiada para pastar naqueles imensos prados cobertos de verdejante capim. Nasceu para ser boiadeiro, dizia orgulhoso.

      Não havia um boi bravio que ele não enfrentasse e nem cavalo que ele não domasse. Era de fato o melhor naquelas bandas.

      Cresceu trabalhando debaixo do sol quente e da chuva, nada lhe tirava o bom humor e o sorriso franco do rosto. Era o que podemos chamar um belo homem, e as moças da fazenda, não escondiam sua admiração pelo jovem escravo, que lhes atiçavam a imaginação, afinal não era sempre que havia um jovem negro tão bonito por perto.

        Ele sabia disso e se fazia de rogado, era como se diz, um homem difícil de ser conquistado.

        Não havia naquela fazenda esquecida no interior de Minas, um escravo como Jacó: era inteligente, ágil, forte e matreiro. Sabia como ninguém andar pelo meio do mato, caçando e pegando folhas de plantas para sua velha mãe fazer suas porções, ela era quem cuidava das doenças dos escravos e também era a parteira. Todo negrinho que tivesse nascido ali era ela quem havia feito o parto.

        Jacó era também quem cuidava das doenças dos animais, sabia preparar remédios que curavam o rebanho de bicheira, mordida de cobra e até algum envenenamento quando um animal comia sem querer uma erva venenosa.

      Seus donos, o fazendeiro Antero e sua esposa dona Graça, tinham por ele alguma estima se podemos chamar assim o fato de terem para com ele cuidados que não tinham com os outros escravos.

      Afinal, Jacó foi sempre um negro algo diferente e sempre se distinguiu dos companheiros de escravidão. Era educado e sabia coisas que os outros não sabiam, mesmo sem ter tido nenhum educação especial, era assim por natureza.

        Estava sempre alegre e sorridente, não se queixava da escravidão e do trabalho, era o primeiro a se apresentar na hora da chamada, pela manhã.

        Era costume na fazenda contarem-se os negros pela manhã e à noite, porque os escravos andavam muito ariscos e fugiam quando havia um jeito, escondiam-se nas grutas e iam para os quilombos que aumentavam a cada ano. Jacó, este não falava em fugir, jamais havia apanhado por faltar com o respeito ao feitor e nem brigar com seus companheiros de cativeiro.

      Todos o respeitavam e amavam devido ao seu gênio bondoso e brincalhão.

    As moças da senzala tinham toda certa queda por ele, mas até então, não havia ninguém que houvesse bulido com seu coração, conforme ele dizia.

    Um dia quem sabe, aparece alguém que vai me fazer bater forte o coração e o sangue correr mais forte nas veias, dizia para sua mãe, a bondosa mãe Dolores, que se preocupava com esse seu jeito de ser. Ela sonhava que ele arranjasse uma boa moça e se juntasse com ela para lhe dar netos, era a lei natural, era a lei de Deus.

    - Meu filho, você precisa se casar, dizia mãe Dolores enquanto alisava os cabelos crespos do filho.

    - Mãe, por agora não quero, acha que não ta na hora de eu me casar, quero viver sozinho com tu, que é a minha família. Sou escravo e não desejo colocar no mundo outras criaturas pra viver no cativeiro como nós.

    Quem sabe, um dia não sei quando nós havemos de ser livre, tem alguma coisa dentro de mim que me diz isso, eu vou esperar a liberdade chegar.

      - Não fala assim meu filho, que se te escutam te levam pro tronco, ocê nunca foi pro tronco e não sabe o que é a gente apanhar amarrado e quando terminam de bater jogam sal pra não dar bicheira, nas feridas!

      - Pois é mãe, por isso não quero me ajuntar com ninguém, pra mode não trazer pra essa vida, mais sofredores mais escravos.

        Um dia, Deus vai ter pena de nós e vai mandar uma boa alma que acabe com a escravidão nessa Terra do Brasil.  Eu sei que isso vai acontecer porque escuto uma voz que me fala sempre pra eu ter paciência que ela vai chegar, a nossa libertação.

      -Tomara meu filho, que esse seu sonho se realize porque eu já to velha e espero isso desde menina. Já vi muita coisa acontecer, mas a escravidão acabar, não vi. Vejo só o sofrimento dos negros, os brancos enricando a custa do suor e das lágrimas dos escravos. Os anos passam, mas tudo continua igual ninguém tem pena dos nossos sofrimentos, nós é pior que os animais que eles tem, porque dos bichos eles tratam, tem cavalo aqui na fazenda que não pode nem levar chicotados no lombo, e nós apanhamos sem dó nem piedade, por qualquer coisa à toa.

    - Mãe, isso um dia vai acabar, tenha fé em N.SR. Jesus Cristo que sofreu para nos salvar, não é isso que o padre diz, quando vem rezar a missa aqui na fazenda?

    - É verdade meu filho, eu tenho de assistir a missa para poder fazer nossos cultos, se nós não reza as reza deles não podemos reza a nossa reza, não é?

    - É nós temos de dizer que acredita nos santos dos brancos pra poder fazer nossas orações pros santos de nossa crença, os brancos não gostam de nossa maneira de rezar pros nossos orixás, os deuses que cultuamos lá na África. Temos de dizer que eles são os santos dos brancos, senão nós apanha feito bicho do mato.

      Assim Jacó e sua velha mãe conversavam escondidos na calada da noite, para que os outros escravos não os ouvissem, porque no meio deles havia também os delatores, escravos que contavam pra o feitor o que escutavam dos companheiros na tentativa de obterem melhor tratamento.

      Desde que o mundo existe acontece este triste fato alguém delatando o próximo para tirar vantagens porque se existe o delator, existe aquele que o incentiva para ficar sabendo o que se passa e assim tomar decisões contra quem pode ser um suposto inimigo. Entre os negros havia aqueles que traiam seus iguais para agradar aos seus senhores.

        E assim, a vida ia passando para aqueles pobres seres sem nenhuma perspectiva de que a tão sonhada liberdade fosse de fato acontecer.

    A vida na fazenda corria sempre igual para aos seus moradores, principalmente os escravos, que só podiam trabalhar sem terem nada para lhes dar um momento de alegria. Aos domingos o padre da vila mais próxima, após rezar a missa, ia de charrete até a sede da fazenda e oficiava uma missa para seus moradores porque o proprietário era pródigo e fazia grandes doações para as obras de igreja. Então os negros eram obrigados a comparecerem ao oficio, ficando do lado de fora da pequena capela, escutando o que dizia o vigário e seguindo o ritual imitando os que estavam dentro. Já haviam se acostumado e faziam automaticamente todas as orações, se não levavam castigo, e ficavam proibidos de prestarem seus cultos aos deuses africanos que haviam incorporado aos santos católicos num sincretismo bem inteligente.

      Para cada santo da igreja, eles colocaram um orixá africano e então era permitido que eles fizessem suas festas e dançassem para seus santos.

      Jacó era inteligente e sabia como fazer para que seus companheiros fizessem tudo direito para não desagradar aos senhores assim em todas as grandes datas religiosas dos brancos eles também comemoravam as das suas divindades que acabaram sendo incorporadas à crença até dos católicos , como vemos hoje em várias festas em que se cultuam Yemanjá, como Nossa. Senhora São Jorge como ogum, etc.

      Assim viviam aqueles pobres homens que um dia foram trazidos de sua terra como escravos e que sonhavam com uma liberdade que ainda estava longe de chegar, pois o trabalho escravo era quem tocava a economia do Brasil desde quando ainda era colônia de Portugal.

      Certo que em algum lugar, algumas vozes às vezes se levantavam tentando despertar nos homens brancos a consciência para a situação infeliz dos negros, mas a sociedade da época não estava ainda preparada para escutar a voz do coração. Todos viviam escorados nos braços dos escravos, tanto no campo como nas cidades, ninguém podia imaginar o Brasil sem os escravos que eram sua fonte de riqueza, pois trabalhavam sem ter remuneração, comiam o que sobrava das mesas dos senhores e até eram vendidos como simples mercadorias para encher os bolsos dos seus senhores quando precisavam de dinheiro. Sofriam, choravam, sentiam frio e fome, sem direito à coisa nenhuma, sós deveres: dever de trabalhar de sola sol, de obedecer sem discutir as ordens e apanhar sempre que o feitor achasse que era preciso; aliás, esse era o único direito deles! Eram obrigados a sentir seus problemas calados, trabalhar mesmo doentes, somente podiam pensar porque nos seus pensamentos os senhores não podiam mandar.

      Então eles sonhavam... Sonhavam com a liberdade, sonhavam que um dia seriam todos tratados como seres humanos, que eram e este sonho eles tentavam realizar fugindo para os quilombos, mesmo com o risco de serem mortos, pois negro fugitivo sempre acabava morto quando era descoberto e preso.

      Jacó então sonhava, mas não desejava ser um negro fugitivo ou morto, queria ser livre e poder gozar a liberdade e por isso esperava com confiança em Deus que seus desejos seriam um dia satisfeito. Procurara ganhar a confiança dos patrões para poder ter uma vida menos sofrida, já que cumpria tudo com boa vontade e não ia pro castigo no tronco.

      Foi criado solto e ia brincar com os filhos dos donos da fazenda, que não se importavam que seus filhos brincassem com os negrinhos filhos dos escravos e Jacó era o mais chegado, tinha quase a mesma idade do filho do senhor. Alberto, menino forte e brincalhão, era de fato companheiro do negrinho Jacó, arteiro e cúmplice nas travessuras.

    Havia também a filha, uma menina graciosa, loura e meiga, seu nome já dizia tudo: chamava-se Laurinda, mas o seu apelido era Linda, todos gostavam dela por causa do seu comportamento sempre simpático e bondoso, era mais nova que o irmão e por ser menina não podia brincar no meio dos garotos, e assim ficava sentada no banco da varanda, quase sempre só observando as traquinagens dos meninos. Às vezes a filha de Zefinha a negra que cozinhava, vinha brincar com ela, mas como era maiorzinha já começava a ter o que fazer, ajudando a mãe no serviço, lavava louça e picava legumes.

        Dona Graça a esposa do senhor Antero dono da fazenda era uma mulher como eram a grande maioria das mulheres daquele tempo, submissa e sem voz ativa dentro da casa, só mandava nos escravos domésticos, e não interferia nos negócios do marido.Aliás, ela até gostava de viver assim sem ter que dar palpite nos problemas da fazenda, porque ela gostava mesmo era de tocar piano. Todas as tardes Dona Gracinha como era chamada sentava-se ao piano e ficava horas tocando as valsas e minuetos que a fazia lembrar-se do tempo em que vivia na corte e freqüentava os saraus em casa dos amigos dos seus pais.

    Foi em uma dessas elegantes reuniões que ela conheceu o seu marido, Antero Rodrigues de Souza que por ela se encantou e pouco tempo depois já estavam noivos com o casamento marcado, sem que ao menos ela tivesse sido consultada, como era o costume naquela época.Os pais é que aceitavam ou não o noivo para suas filhas e recusar um partido como Antero, não passou pela cabeça dos pais de Gracinha, que andavam bem ruins de finanças.

        Logo se casaram e foram viver na fazenda que ficava situada entre as montanhas de Minas, e a vida da jovem passou a ser uma rotina sem graça para a moça da cidade. Seu único passa tempo era o piano que trouxe na bagagem, a moça acostumada como o conforto da cidade não gostava da vida na fazenda, mas não podia falar para o marido e então ela desabafava no piano sua tristeza tocando as melodias que a faziam se lembrar das festas que freqüentava antes de se casar.

      Os filhos eram também sua alegria, mas eram as escravas que cuidavam de tudo inclusive das crianças ela não precisava se preocupar com as obrigações rotineiras e nem ter trabalho com eles. Então era só para brincar e conversar que ela encontrava os filhos, principalmente Alberto, que ficava muito tempo correndo pelos campos com os outros meninos.

      A menina era como uma boneca, muito bonita e meiga, D. gracinha gostava de ficar com ela após as mucamas terem tratado, alimentado e enfeitado a garotinha.

        O marido não era mau para ela, mas muito severo não se permitia uma convivência mais íntima, mais carinhosa e ela então sentia a solidão vivendo naquele pedaço de sertão, longe de tudo. Às vezes passavam meses sem verem alguma pessoa estranha, não recebiam os conhecidos, pois a dificuldade de transporte impedia que as visitas fossem mais constantes.

        A vida seguia seu curso, tudo acontecia como se os dias fossem cópias uns dos outros, o que os tornavam diferentes eram as mudanças da natureza, em certas épocas os dias eram radiosos com o sol brilhando em outros vinham às chuvas torrenciais, fazendo que os habitantes da fazenda ficassem presos dentro de casa, pois as estradas se tornavam lamacentas e intransitáveis.

        O tempo foi passando e chegou à hora dos meninos já então crescidos irem para a cidade estudar.

        Alberto foi para um colégio no Rio de Janeiro para se formar doutor como era de praxe entre as famílias abastadas, e Linda foi mandada para um colégio de freiras em Diamantina, para estudar e se preparar para arranjar um bom casamento, sonho de todos os pais para suas filhas.  Nesses colégios as moças aprendiam a bordar, tocar piano, costurar além das materias normais, pois era de bom tom que as donzelas soubessem essas prendas domésticas para encantar os futuros candidatos a maridos. Aprendiam também as boas maneiras sociais como receber os convidados e de arrumar uma bela mesa e outras futilidades.

    Com os filhos longe da fazenda a vida de Dona Graça transcorria ainda mais monótona, os dias se arrastando vazios.

      Mas finalmente chegou o momento da volta de Linda a casa. Estava completada sua educação, podia ser apresentada á sociedade para que arranjasse um marido, conforme o esperado.

    Em um dia radioso, chegava à fazenda uma carruagem trazendo para casa a filha de dona Graça, agora transformada em uma moça bonita e elegante, não mais a menina tímida e meiga, mas uma bela mulher trajando um vestido bem à moda e gosto das donzelas da época. Usava nos cabelos louros e cacheados um elegante chapéu, e nas mãos delgadas luvas de delicada renda.

      Tudo nela era gracioso e já nem de longe lembrava a garota que partiu para ir estudar fora, e nem se parecia com as moças daquele lugar escondido em meio ás montanhas mineiras.

        Sua mãe correu ao seu encontro, chorando de alegria, afinal a filha voltava para casa, depois de tantos anos, com a educação completa, era uma verdadeira representante da família e da casta social a que ela pertencia. Tudo que uma representante da sociedade daqueles tempos tinham que aprender Linda havia aprendido, tocava piano, bordava, sabia receber, falava uma língua estrangeira, no caso o francês, que estava na moda dos salões elegantes, e lia os autores próprios para as moças de sua idade. Além disso, sabia se trajar com muita classe e requinte.

      - Dona Graça apertou a filha nos braços com verdadeira alegria no coração e brilho no olhar.

      - Minha filha!  Disse entre lágrimas a feliz mãe, você está linda! Que bom que voltou, eu já não agüentava mais a saudade e a solidão.

      -Mamãe, que prazer em rever a senhora e voltar para minha casa. Eu também morria de saudades de tudo isso aqui e principalmente do seu carinho e da comida da Zefinha, na verdade estava com saudades de todos e desta linda fazenda!

      - Então vamos entrar que lá dentro tem uma imensa mesa posta para você matar as saudades com tudo que você gosta.

    - Onde está papai?Porque não veio me receber?

    - Seu pai foi viajar para fazer uns negócios, mas já deve estar em casa amanhã ou depois. Ele também sente muitas saudades de você.

    - E meu irmão? Como vai?  Ele já deve estar quase formado, não é?

    - Sim seu irmão está um belo mancebo e já é quase doutor. Logo estará de volta para tomar conta dos negócios do seu pai que anda muito cansado. Sinto muita saudade e falta de vê-lo correndo por estes campos.

    - Pois é mamãe logo estaremos todos juntos e então poderemos fazer lindas festas aqui na fazenda, e quem sabe até irmos de vez em quando para o Rio de Janeiro e aproveitar o conforto da corte, não é?

    -Sim, filhinha assim será, seu pai já providenciou uma bela casa lá para nós, porque seu irmão precisa abrir um escritório para advogar e nós devemos passar uma temporada por lá. Você  deve freqüentar lugares elegantes, ir aos teatros, a opera, e saraus para encontrar um cavalheiro à sua altura para casar.

    - Nossa mãe, eu nem bem voltei e já está querendo se livrar de mim? Não tenho pressa em me casar, quero antes aproveitar a minha vida. Só me casarei com um homem a quem amar, não me arranjem marido, por favor! Isso só traz infelicidade.

    - Não fale assim perto do seu pai, ele não gosta de certas idéias e você sabe que até para ir estudar fora foi muito difícil para que ele concordasse e só deixou porque era em um colégio de freiras.

    - Está certa mãe, não falo nada sobre isto com o pai, mas não me caso sem gostar do futuro marido. Não desejo passar ao resto da vida fingindo um amor que não sinto para não contrariar meu pai.

    - Bem filha vai comer, você deve estar cansada e desejosa de se trocar, tirar esse vestido empoeirado e ficar mais à vontade e ver sua casa de novo!

      Entraram na enorme sala onde uma mesa comprida e forrada com uma linda toalha bordada, estava repleta de deliciosas quitandas, como eram chamados os doces, biscoitos feitos na fazenda. Era de tirar o fôlego e dar água na boca, tal a quantidade dos doces e pudins que ali se encontravam. Jarros com sucos de frutas das mais variadas, e flores em cima dos móveis faziam a alegria daquele momento. Afinal era a caçula a sinhazinha que estava de volta ao lar, depois de tantos anos longe de casa.

    - Naquele tempo, não havia férias como agora, aos alunos ficavam internados nos colégios e não vinham para casa, até porque as distancias eram enormes e as dificuldades de transporte eram desanimadoras. Então raras vezes os pais iam visitar os filhos e os colégios tinham regulamentos severos, não permitindo saídas, era como se as moças principalmente entrassem para um convento e muitas vezes algumas terminavam se tornando freira devido ao modo de educação que recebiam.

      As famílias ricas que podiam pagar colocavam suas filhas para que tivessem uma educação mais primorosa e assim se destacarem nos salões da sociedade. As de famílias pobres, que não podiam pagar eram encaminhadas por algum padre do lugar onde moravam para que ali então fizessem os votos e se tornassem freiras. Era assim com os rapazes também, os próprios pais faziam o acordo com os sacerdotes deixando os filhos nos colégios para tomarem a batina, muitas das vezes para cumprirem promessas feitas por eles.

        E assim a igreja tinha muitos servidores fossem como freiras ou padres mesmo que não houvesse por parte deles a verdadeira vocação.

    Dona Graça feliz não sabia o que fazer para demonstrar à filha sua alegria e satisfação pela volta de sua bonequinha como ela costumava chamar a filha.

    Depois de tanto tempo fora de casa, Linda encontra-se novamente na fazenda de tantas e saudosas lembranças, saboreando o lanche preparado com muito amor pelas escravas, principalmente Zefinha que sempre foi à cozinheira e gostava de fazer os quitutes para agradar sua sinhazinha, como ela chamava a meiga Linda quando criança. Linda depois do gostoso repasto, contente com a recepção foi dar uma volta pela casa grande, saiu andando, olhando tudo com carinho, até chegar à vasta cozinha, lugar que gostava de ficar, já que ali nunca parava o movimento, o dia todo o enorme fogão de lenha crepitava e nos enormes tachos Zefinha e as outras escravas faziam os deliciosos doces e biscoitos que eram guardados em potes para serem servidos à hora do café e quando tinham visitas. Elas preparavam enormes quantidades de queijos e ralavam as frutas para os doces em calda que Linda tanto apreciava. O seu doce preferido era o de laranja da terra, com queijo fresquinho, mas os de goiaba, de mamão verde e o de leite não ficavam sem que Linda os devorasse com muito prazer.

        Entrou na cozinha e aproximando-se da negra Zefinha, deu-lhe um apertado abraço e encheu seu rosto de beijos.

    - Como vai Zefinha?  Disse ainda abraçada a escrava, que chorava de tanta felicidade pela volta da moça.

    - Como oce ta crescida menina! Como ficou uma moça tão bonita cheia das elegâncias!

    - Que nada, estou do mesmo jeito que parti, só cresci e fiquei mais velha.

    - Oce ta é muito magrinha, não tinha comida naquele colégio?

    - Olhe Zefinha comida tinha, mas não como a que você faz, e nem com a fartura aqui de casa, lá era tudo contadinho, até o pão de manhã era contado e só se podia comer duas fatias.

      E tinha também um tal de jejum, que era uma tortura, eu ficava morta de fome e ia para o pátio, onde havia várias arvores de frutas e apanhava escondido das freiras para comer. Isso quando tinha no pé, porque às vezes não era tempo de frutas e o jeito era ficar mesmo com fome.

    - Meu Deus!Como é que pode? Sinhá Gracinha enchia os potes de tudo quanto era doce e biscoito para mandar lá pro colégio pra ocê, então não recebia?

    -Quase nunca Zefinha, às vezes elas me entregavam um ou outro, mas a maior parte ficava com as freiras, diziam que era para dividir com todas as meninas, só que a gente não via mais nada.

    - Nossa, que coisa feia! Ocê acostumada com tanta fartura deve mesmo

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