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Batucan(do) na Escola: Musicalização e Cultura pelas Práticas Percussivas
Batucan(do) na Escola: Musicalização e Cultura pelas Práticas Percussivas
Batucan(do) na Escola: Musicalização e Cultura pelas Práticas Percussivas
E-book435 páginas4 horas

Batucan(do) na Escola: Musicalização e Cultura pelas Práticas Percussivas

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Sobre este e-book

A linguagem percussiva é uma área do conhecimento musical de grande importância para o desenvolvimento educativo e formativo de um indivíduo como sujeito social. Principalmente na educação infantil e na adolescência, uma vez que essa prática envolve e desenvolve aspectos necessários à formação humana, como a expressão, a coletividade, a psicomotricidade e a reflexão. Ao associar outras questões relevantes como as questões étnico-raciais e ecológicas, cria-se uma tríade que é chave para o desenvolvimento desta obra. O presente estudo apresenta ao(à) leitor(a) as experiências musicais e formativas de um grupo percussivo intitulado "Batucan", desenvolvido com alunos de uma escola pública do interior do estado do Ceará. Esse grupo de batuque utiliza, além das suas práticas musicais coletivas, a confecção de seus próprios instrumentos por meio de oficinas recicláveis. Como o repertório rítmico trabalhado é de origem afro-brasileira, cria-se um link para a abordagem de temáticas voltadas à educação étnico-racial. Portanto, são nessas perspectivas – musical, ecológica e cultural – que o livro se estrutura e se embasa, objetivando uma análise concisa sobre os processos formativos emergidos nos integrantes a partir dessas atividades em um contexto de musicalização na escola. Não obstante, trata-se ainda de uma pesquisa minuciosa, destinada não apenas aos profissionais da área, mas àquele(a)s que, porventura, também se interessem em conhecer a diversidade de manifestações da cultura popular cearense, que utilizam as práticas percussivas de origem afro-brasileira como meio de expressão artística, de afirmação étnica e de resistência cultural.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento19 de nov. de 2020
ISBN9788547345631
Batucan(do) na Escola: Musicalização e Cultura pelas Práticas Percussivas

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    Batucan(do) na Escola - Lidonildo Costa Pereira

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    COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO

    Dedico este livro:

    A Deus, pela vida e pelas oportunidades de vivê-la plenamente.

    Aos meus pais, que, com muito amor, construíram os alicerces de minha formação educacional, capacitando-me e aconselhando-me para os verdadeiros desafios da vida.

    À minha esposa, que sempre esteve ao meu lado, incentivando-me e acreditando no meu potencial de crescimento.

    Aos meus queridos alunos que participam e já participaram do grupo afro-brasileiro Batucan, o qual faz do lixo reciclável uma obra prima para o som da batucada.

    AGRADECIMENTOS

    Ao meu querido avô Raimundo Rufino (in memoriam), que muito contribuiu para a minha trajetória formativa. Minha sincera gratidão e carinho.

    Aos meus outros avós: Maria Zenita (in memoriam), Miguel Livino e Maria Sabino (in memoriam). Obrigado pelos momentos e lembranças de felicidade.

    Ao meu irmão Lucas Costa e à sua esposa, Lenice Silveira. Grato.

    A todos os meus familiares, em especial, Gleison Charles, que compartilhou de meus sonhos e de minhas aspirações juvenis. Um abraço de irmão.

    A todos os meus amigos, especialmente a Arimar Aparecido e Vanderlândia Menezes, por terem contribuído significativamente com o sucesso deste livro.

    Aos(às) diretores(as) e coordenadores(as) que trabalham e já trabalharam na Escola Filomena Martins dos Santos. Agradeço suas contribuições.

    Aos professores, colegas e ex-colegas de trabalho. Obrigado por partilharem de momentos singulares na Escola Filomena Martins dos Santos.

    Ao secretário de Educação de Cruz Raimundo Otávio da Mota, pelo apoio e pela credibilidade em meu trabalho.

    À comunidade do bairro de Canema, pelas constantes participações e cooperações junto ao grupo.

    À diretora da Escola Fundamental São Francisco, Divani Alves, pela confiabilidade em meu trabalho. Grato.

    Aos professores doutores da Universidade Federal do Ceará: Pedro Rogério, Catherine Furtado e Marco Túlio, pelas contribuições formativas que instigaram as minhas percepções de vida. Gratidão.

    A Carlos Prado e sua esposa, Elinete Prado, pelo incentivo à realização do grupo.

    Aos amigos, professores de música do programa Música na Escola. Obrigado pela parceria e colaboração.

    A Samuel Andrade (in memoriam) e Maria Railana (in memoriam), pelas participações e pelo amor ao Batucan.

    Ao Batucan com muito amor, orgulho e carinho. Vamos todos numa só batida!

    APRESENTAÇÃO

    Sabemos que a implementação das aulas de música no currículo formal ou informal de ensino ainda é uma tarefa distante de ser concretizada pelos sistemas educacionais de nosso país, isso porque existe uma série de fatores que infelizmente impossibilitam o alcance dessa efetivação, como, por exemplo: o alto investimento financeiro destinado à aquisição de instrumentos para as escolas e para a construção de salas adaptadas, assim como a insuficiência de cursos de licenciatura em música nas instituições de ensino superior e consequentemente a carência de profissionais formados na área para atender a demanda das escolas públicas, com suas turmas cada vez mais elevadas e heterogêneas. Sem dizer que se acrescenta ainda a esses obstáculos a ausência de propostas pedagógicas e de formações continuadas a professores(as) polivalentes que lecionem essa área no ensino infantil e fundamental I.

    Nosso objetivo com este livro não é trazer receitas prontas para a solução desses desafios que dificultam a inclusão do ensino de música na escola, mas sim provocar reflexões no(a) leitor(a) acerca das potencialidades formativas de uma proposta criativa e inovadora que surge como um viés alternativo para se trabalhar o processo musicalizador de forma ecológica, cultural e acessível no contexto escolar.

    A primeira edição de Batucan(do) na Escola reúne textos de fácil entendimento que procuram sensibilizar professores, pesquisadores, alunos e interessados em geral quanto à importância das práticas percussivas coletivas e à sua capacidade de comunicação com outros campos do conhecimento, tornando-se uma ferramenta interdisciplinar dentro do currículo de ensino e um caminho eficiente para o pleno desenvolvimento de competências e habilidades artísticas nos alunos.

    Os conteúdos abordados nesta obra discorrem sobre temáticas necessárias e atuais que foram cuidadosamente elaboradas em forma de textos simples e organizados, tendo como embasamento algumas fontes bibliográficas que serviram como suporte teórico para o enriquecimento das discussões, além de minhas próprias experiências adquiridas ao longo dos anos como músico, regente, docente e pesquisador. No decorrer dos textos, exploro reflexões em busca de caminhos que pensem o potencial educacional das práticas percussivas na escola como uma importante proposta de acesso diferenciado à arte e à cultura, e aponto estratégias criativas que incentivem a formação humana e musical entre os estudantes a partir do ensino coletivo em contexto de musicalização.

    Dividido em duas partes, o livro é composto por quatro capítulos, trazendo no primeiro – Batuco lá, batuco cá, a percussão afro no Ceará – uma contextualização sobre as diversas manifestações da cultura popular cearense que utilizam a percussão afro-brasileira como forma de expressão artística e de resistência identitária. Aqui, tratarei sobre a musicalidade e as peculiaridades de grupos tradicionais que constituem o patrimônio histórico e imaterial dessa terra rica em diversidade rítmica e cultural.

    O segundo capítulo – Que rufem os tambores: competências educativas das atividades percussivas – instiga o(a) leitor(a) a refletir sobre como a proposta do ensino percussivo em contexto musicalizador na escola pode se tornar uma ferramenta formativa e de ensino-aprendizagem, possibilitando o diálogo, a sensibilização e a conscientização de aspectos inerentes às questões étnico-raciais e socioambientais entre os estudantes.

    Compondo a segunda parte do livro, trago no Capítulo 3 – O Batucan, com a licença do(a) leitor(a), pede passagem – as experiências musicais e formativas, assim como a trajetória de inserção e de legitimação de um grupo intitulado Batucan no cenário sociocultural de uma escola e de uma cidade do interior do estado do Ceará. Esse mesmo capítulo vem acompanhado ainda das narrativas dos interlocutores que contribuíram de maneira significativa para o processo de construção dessas práticas percussivas em âmbito escolar.

    Por sua vez, o Capítulo 4 – "(Re)percussão dos percursos percutidos: análise interpretativa dos recortes narrativos" – traz as vozes dos agentes prioritários deste estudo, os estudantes, em que procuro desvendar os processos de construção dos seus saberes por meio de suas próprias reflexões, confrontando paralelamente essas informações com os pensamentos de autores que embasam este trabalho, objetivando uma consistência teórica e uma interpretação correta dos dados levantados.

    Por fim, em Cortejo final, teço as últimas considerações desta obra, nas quais sintetizo e corroboro informações acerca do ensino percussivo.

    Caro(a) leitor(a), espero com este livro compartilhar aprendizagens e conhecimentos em prol de uma educação musical acessível e transformadora. Sendo assim, convido você a partir de agora a batucar comigo por meio do ritmo desta leitura, que nos levará como através de um desfile percussivo ao cortejo do conhecimento...

    O autor

    PREFÁCIO

    Escrever sobre o trabalho de Lidonildo Costa requer que se diga inicialmente que estamos tratando da produção intelectual de um dos melhores professores de música do estado do Ceará, com comprometimento que se inscreve não somente nas palavras que o tornou referência no ensino de Música, mas principalmente em uma efetiva prática docente.

    Ser professor de música nas escolas do Ceará, do Brasil e em muitos países do mundo é um grande desafio. Historicamente o nosso status dentro das escolas é o de animadores das festas do calendário escolar. Não obstante, é preciso que se reafirme que a música é uma das dimensões mais importantes da formação humana. Quando a escola se ausenta dessa responsabilidade, e, infelizmente, é o que tem acontecido, entrega uma procuração com amplo, irrestrito e universal direito à publicidade mercadológica. E os meios de comunicação de massa, mesmo em tempos de internet, reconhecem a influência da música e a utilizam com enorme eficácia, assim como fez Hitler... Com isso queremos chamar a atenção para o poder da música. Mas esse poder é utilizado pelos homens e mulheres que constroem a sociedade. Nesse sentido, a música é uma linguagem que pode produzir um discurso opressor ou um discurso libertador. A música, assim como as palavras, está à nossa disposição. O que vamos fazer com isso? Depende de cada um, de cada grupo de pessoas ou de cada instituição. O autor deste livro nos mostra um caminho que alimenta nosso otimismo na humanidade.

    Então, felizmente, em meio ao triste cenário histórico de desvalorização da música ou de valorização da música sendo utilizada para a formação do homem neoliberal, individualista, competitivo e consumista, renasce nossa esperança ao encontrar professores e intelectuais como Lidonildo Costa Pereira, que trabalha na perspectiva da formação do ser humano cooperativo, crítico e solidário. Assim, podemos nos socorrer na ideia que não existe somente no plano teórico, da construção de microclimas. Ainda que não seja possível mudar a escassez de água em todo o [Semiárido do Nordeste], é viável construirmos, nesse território, espaços com climas favoráveis ao desenvolvimento da vida. Então, o Batucan(do) na escola nos apresenta essa possibilidade de mudança para melhor. E se ainda não conseguimos mudar a educação musical em toda a rede de ensino, logramos êxito na escola Filomena Martins dos Santos em Cruz/CE, graças ao autor do presente livro.

    O título de seu trabalho já nos traz as palavras-chave para sabermos o que vamos encontrar nas páginas a seguir. Batucando anuncia os tambores, que por sua vez anunciam a cultura brasileira em sua melhor expressão; musicalização olha para o fenômeno educativo como algo que se constrói, e que não aposta na existência de manuais que sirvam como receitas de bolo, a educação musical, assim como toda a educação, é processual; cultura étnico-racial e ambiental revela seu aspecto interdisciplinar e contemporâneo, engajado com as causas da vida humana que precisa reconhecer o planeta terra como uma casa a ser bem cuidada, que necessita de iniciativas reais de mudança prática, incluindo nessa casa as relações humanas, reconhecendo que somos todos uma só raça: a raça humana; e por fim, sendo, para mim, um dos pontos altos das suas reflexões, as práticas percussivas. A percussão provavelmente é a área da música na qual melhor se reflete a cultura brasileira, na qual melhor podemos nos reconhecer em nossa inventividade, criatividade, beleza e diversidade.

    Para minha alegria e honra, que ressoa no convite para escrever este prefácio, e como leitor de seu trabalho, desejo que durante a musical leitura, cada um possa ouvir o rufar dos tambores, ver o belo cortejo da educação musical em seus batuques e seguramente reconhecer as competências percussivas compartilhadas por Lidonildo Costa Pereira. Nesse compasso da reverência à nossa educação musical brasileira e sobre a relevância e qualidade deste livro: dou fé!

    Prof. Dr. Pedro Rogério

    Pós-doutor em Psicologia Social pela Universidad de Valladolid – Espanha

    Professor do curso de licenciatura em Música – UFC– e do Programa de Pós-Graduação em Educação – UFC

    Sumário

    Entrudo

    Trajetória em Cortejo 17

    1

    Batuco lá, Batuco cá, a Percussão afro no Ceará 29

    1.1 Maracatus 36

    1.2 Bandas Cabaçais 45

    1.3 Escolas de Samba 53

    1.4 Blocos e Afoxés 59

    1.5 Bandas de Fanfarras 68

    1.6 Reisados e Grupos de Bois 72

    1.7 Grupos de Coco e Capoeira 81

    1.8 Grupos de Samba-Reggae 90

    2

    Que Rufem os Tambores 99

    2.1 A percussão Colaborativa como Espaço de Musicalização Coletiva 100

    2.2 Práticas Percussivas Coletivas como Proposta Pedagógica Interdisciplinar 108

    2.3 A Percussão Coletiva como Ferramenta Facilitadora das Relações

    Étnico-Raciais 115

    2.4 A Musicalização Percussiva como Mediadora da Educação Socioambiental 125

    3

    O Batucan, com a licença do(a) leitor(a), pede passagem... 137

    3.1 Adereços de Sucata – Batucan, o Lixo que vira Música 146

    3.2 No toque da Lata, na Batida do Tambor, vou Tocando o Garrafão, o Ganzá e o Caxixão, Acompanhado do Agogô – Trajetórias e Apresentações 162

    3.3 ECO-AFRO – Aprendizagens Formativas por meio das Práticas Percussivas 172

    4

    (Re)Percussão dos Percursos Percutidos 191

    4.1 Conhecendo o Espaço, o Objeto e as Etapas Percorridas 193

    4.2 Primeiras Impressões e Experiências 209

    4.3 Batucan(do) e Ressignificando 216

    4.4 Alcances Formativos das Atividades Percussivas 222

    4.5 Impacto Sensibilizador do Processo Musicalizador 234

    Cortejo Final

    Um, Dois, Três... Brecando... 251

    REFERÊNCIAS 257

    ÍNDICE REMISSIVO 265

    Entrudo¹

    Trajetória em Cortejo

    Professor, professor! Hoje vai ter ensaio do Batucan, não é? Por favor professor! Quero muito tocar na minha lata!

    Percutindo os Caminhos da Proposta

    O ato de construção desta narrativa faz com que a epígrafe descrita reverbere, em minha memória, lembranças que me conduzem involuntariamente à escuta dessa pertinente indagação, questionada por alunos de uma Escola Pública² do interior do estado do Ceará, cujo currículo de ensino inclui atividades voltadas às práticas percussivas, desenvolvidas por meio de um grupo intitulado Batucan³ – uma proposta criativa que viabiliza um trabalho interdisciplinar tendo a musicalização como o eixo condutor do processo de ensino e aprendizagem na escola.

    Neste estudo, me aproprio do tema práticas percussivas, como um conjunto de atividades musicais de caráter rítmico e coletivo que se encontram presentes tanto em manifestações da cultura popular quanto na cultura erudita, e que despertam habilidades artísticas, psicomotoras, cognitivas e socioemocionais nos integrantes. Além de ser uma ferramenta-chave para a construção de caminhos necessários para o diálogo intercultural, oportunizando aos praticantes um contato com elementos principalmente⁴ da cultura afro-brasileira – matriz pela qual o repertório rítmico dessas práticas encontra-se na maioria das vezes tradicionalmente enraizado.

    A ideia de que essas atividades despertam tais formações e habilidades nos participantes, e de que mesmo assim ainda encontram-se insuficientes tanto em termos de propostas efetivas nas escolas, quanto em forma de pesquisas acadêmicas, foi a base que me motivou a querer escrever sobre este livro. Por tal razão, as informações que o(a) leitor(a) identificará ao longo da obra estão profundamente alinhadas com minhas próprias perspectivas e experiências adquiridas frente aos trabalhos desenvolvidos com esse grupo, que, assim como tantos outros projetos musicais espalhados ou planejados em escolas públicas pelo Brasil, encontrou percalços ao longo de sua estruturação, tendo como um dos principais desafios a ser superados a carência de instrumentos convencionais para a realização de suas atividades na escola, fato que me levou ao encontro de uma outra forma de se trabalhar com essa modalidade de instrumentos, vendo nos resíduos recicláveis e nas oficinas ecológicas de produção musical uma alternativa criativa, acessível e inclusiva para despertar nos estudantes, aptidões musicais e valores humanos por meio de ritmos estimulantes do repertório afro-brasileiro.

    Organizado a partir de temas como Musicalização, Relações Étnico-Raciais e Educação Ambiental – contextualizados aqui sob um novo ponto de vista crítico e reflexivo –, procurei enfatizar a percussão como uma ferramenta mediadora desse processo interdisciplinar na escola, tendo em vista que esses assuntos (mesmo amparados por Lei)⁵ ainda encontram-se omitidos nos currículos de ensino, fazendo-se necessário uma reavaliação de novas propostas pedagógicas, que resgatem e reafirmem a abordagem dessas questões cruciais para a conscientização de valores educativos nos alunos.

    Partindo da escassa literatura de que trata o tema proposto – o qual não é tão abrangente e nem abordado com frequência em livros e em produções acadêmicas como: artigos, trabalhos de conclusão de curso (TCC), monografias, dissertações e teses –, discutiremos sobre como atividades dessa natureza, dentro de um determinado espaço público escolar, podem se tornar um caminho propício para a musicalização e para a sensibilização de aspectos inerentes a essas questões tão necessárias. Com isso, procuro, nesta obra, compartilhar e provocar no(a) leitor(a) reflexões e descobertas acerca dos alcances formativos emergidos nos integrantes do grupo Batucan por meio dessas atividades musicalizadoras na escola, unindo outros campos de estudo, assim como conhecimentos encontrados na literatura consagrada⁶, para me subsidiar em busca de um projeto que fomente o acesso diferenciado a outras formas de arte, de cultura e de saberes.

    Servindo-me do presente estudo, no caso, a percussão na escola, como assunto para uma abordagem conceituada sobre práticas musicalizadoras, cabe-me primeiramente narrar sobre algo da trajetória trilhada até aqui, ou seja, sintetizar em poucas laudas o percurso de minha ligação com tais atividades rítmicas, no intuito de esclarecer as experiências por mim vivenciadas enquanto músico, docente e pesquisador que sou, e que em determinado ponto desse trajeto se entrecruzam com o universo de pesquisa estudado, e como dele me apropriei e fui incorporado. Por isso, peço neste momento licença ao(à) leitor(a) para contar, em resumo, os episódios marcantes de minha vida pessoal e também profissional, em que me posiciono como autor reflexivo e como interlocutor dos fatos experienciados por intermédio da percussão.

    Essa jornada escrita e memorável inicia-se muito antes de meu ingresso como docente na escola pública, quando eu não trabalhava ainda com a possibilidade de desenvolver um grupo percussivo. Na verdade, dá-se bem mais cedo, quando inicio minha carreira artística nos palcos da vida, por meio de minha atuação como músico⁷em conjuntos musicais e em bandas – as quais fui paulatinamente absorvendo experiências, amizades e conhecimentos. Em meio a esse percurso, surgem sujeitos com papel ativo em algumas situações significativas, as quais pude desenvolver influências musicais que, posteriormente, contribuíram de forma exitosa para a minha práxis educativa.

    Meu contato com as primeiras práticas percussivas me remete aos períodos carnavalescos, épocas em que tive o prazer de conhecer vários percussionistas habilidosos, contratados pelas bandas para tocarem ritmos afro-brasileiros como: Samba-Reggae⁸, Axé-Music⁹, Swingueira¹⁰ e até o Pagode¹¹. Tais estilos musicais são tradicionalmente ligados ao carnaval baiano, e já exerciam na época, por meio da indústria midiática, grande influência musical com repercussão cultural durante essa data festiva do ano.

    Além da variação rítmica que esses músicos sabiam fazer, também pude perceber, em meio às suas práticas instrumentais, uma série de técnicas como: rulos¹², rufos¹³, manulações¹⁴, rudimentos¹⁵, rebotes¹⁶ entre outras, que eram executadas em diversos instrumentos percussivos como: congas¹⁷, timbales¹⁸, surdos¹⁹, bacurinhas²⁰ e agogôs²¹. A performance e os sincronismos de seus movimentos no palco também era algo que chamava minha atenção, pois eram conduzidos pela gestualidade e pela improvisação nos instrumentos. Vi que esses músicos possuíam, ainda, saberes relacionados às diversas terminologias empregadas no universo da percussão, tendo como exemplo os termos: convenção²², levada²³, breque²⁴, entre outros, que eram utilizados por eles durante seus diálogos e troca de experiências.

    A partir dessas convivências, ricas e instituintes, pude em certos momentos brincar²⁵com frequência em tais instrumentos durante os intervalos de ensaios, colocando em prática os ritmos que o meu olhar atento e curioso já vinha absorvendo progressivamente. Nesse processo, os atos de observação, de escuta ativa, de experimentação, de imitação e de repetição se tornaram o principal método estratégico para que eu pudesse atingir aquelas habilidades percussivas, as quais foram despertando em mim, mecanismos auditivos de apreensão de referenciais sonoros. Além disso, outra ferramenta de aprendizagem bastante comum e utilizada no meio da percussão coletiva me proporcionou o desenvolvimento de técnicas mais apuradas como: destreza das mãos, agilidade motora com baquetas, mudanças de intensidade e de velocidade e improviso. Trata-se da interação compartilhada.

    Essa forma de aprendizagem, baseada em um modelo de trocas de experiências por meio das amizades construídas entre esses músicos, contribuiu para meu aperfeiçoamento rítmico e motor, uma vez que eles sempre repassavam seus conhecimentos durante os momentos de diálogo e de descontração, me influenciando de maneira positiva e motivacional a tomar gosto por aqueles timbres e ritmos envolventes de origem afro.

    Além do caráter individual, a interação, ação de trocas [...] é extremamente relevante. Uma das características da autoaprendizagem [...] é justamente aprender perguntando, questionando, observando, reproduzindo, comparando. Pode ser um colega, um amigo, ou até mesmo um desconhecido. O que parece importar é a oportunidade, o momento. A troca ocasionada por este dar e ao mesmo tempo receber constitui, sem dúvida, um elemento não só motivador, mas também de reflexão e de ensino e aprendizagem²⁶.

    Quando da minha entrada no ensino público²⁷, anos depois de ter participado de temporadas nessas bandas, pude levar os ensinamentos, as influências e as aprendizagens que havia vivenciado nos palcos e durante minha trajetória artística para dentro do currículo de uma escola²⁸, localizada em um bairro periférico da cidade de Cruz-CE²⁹. A maioria dos alunos que frequentava essa instituição pertencia a comunidades carentes, inseridas em conjuntos habitacionais adjacentes, muitas vezes desprovidos de políticas públicas, o que de certa forma era um convite aos riscos constantes de vulnerabilidade social, em que o ócio desagregador provocava nesses jovens a busca por alternativas atrativas, que não as puramente educacionais.

    Tendo em vista esses desafios que a escola enfrentava na tentativa de combater as causas de riscos ofertadas pela sociedade, comecei a refletir sobre como a educação musical poderia nessas circunstâncias, auxiliá-la no árduo exercício dessa tarefa. Foi então que, embasado nas minhas próprias experiências adquiridas com a prática percussiva, comecei a planejar uma proposta de inclusão que vislumbrasse o ensino coletivo desses instrumentos, em horários extracurriculares³⁰, visando à ampliação do período de permanência desses jovens na escola. Em concomitância, poderia desenvolver, ainda, competências musicalizadoras neles por meio da percussão afro-brasileira, oportunizando à escola um trabalho sério de fortalecimento das relações étnico-raciais, assim como o rompimento de estereótipos preconceituosos e de desconfianças entre os discentes.

    Outro fator que me incentivava a querer implementar essas atividades diferenciadas no contexto escolar tratava-se da carência de práticas dessa natureza no cenário sociocultural da região³¹. Com exceção de pequenos grupos³² que se apropriavam da percussão como pano de fundo para destacar outros tipos de práticas ou instrumentos na cidade, não existia qualquer ação colaborativa de cunho musical que enfatizasse a cultura do batuque como manifestação artística afro-brasileira.

    A possibilidade de inserir uma proposta inédita com a percussão no

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