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O Último Voo - Waldomiro Manfroi
O Último Voo - Waldomiro Manfroi
O Último Voo - Waldomiro Manfroi
E-book171 páginas2 horas

O Último Voo - Waldomiro Manfroi

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Sobre este e-book

Em O último voo, Waldomiro Manfroi insere o leitor em uma típica roda de conversas à beira-mar, em uma praia como tantas outras do sul do Brasil. No centro da roda, encontra-se Artur, um homem profissionalmente realizado e que, chegando à maturidade, decide deixar a cidade grande para trás e fixar-se no litoral. Instado pelos amigos que o cercam a relatar uma traumática experiência de violência urbana pela qual passou e sobre a qual jamais falou abertamente, Artur enfim cede ao desafio de reviver aquele episódio que, em vários sentidos, condicionou (e, até mesmo, limitou) os seus percursos dali por diante; contudo, para fazê-lo, Artur precisará interconectar diversos outros episódios e relações, bem como trazer à cena personagens com quem cruzou em seus caminhos de vida – o enfermo Rogério, o Otimista, o Aventureiro, o Professor –, utilizando-as como caixas de ressonância para suas próprias ideias, medos e anseios. É como se, para Artur, tudo o que ele carrega dentro de si, adensado e reforçado por anos de opressão, não coubesse na história de uma única pessoa. “Estou curioso para ver o que o amigo Artur é capaz de escrever”, diz-lhe, em certo ponto da trama, o Professor, aconselhando-o a abraçar a literatura como forma de expressão, a palavra como último refúgio e boia de salvação. Desse modo, borrando as fronteiras entre a narrativa oral e a escrita, entre primeira e terceira pessoas, entre realidade e ficção, Waldomiro Manfroi nos conduz ao derradeiro voo deste seu protagonista, para quem nada do que é humano resta à margem. Rafael Bán Jacobsen Da Academia Rio-Grandense de letras Cadeira 29
IdiomaPortuguês
Data de lançamento9 de ago. de 2023
O Último Voo - Waldomiro Manfroi

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    Pré-visualização do livro

    O Último Voo - Waldomiro Manfroi - Waldomiro Manfroi

    CAPA-_LTIMO-VOO_epub.jpg

    WALDOMIRO MANFROI

    O ÚLTIMO VOO

    2ª edição

    Porto Alegre

    2023

    © WALDOMIRO MANFROI

    Coordenação Editorial

    Livraria Edgardo Xavier

    lex.com.br

    Pedagoga Responsável

    Ana Paula Ferreira Xavier

    Audiolivro

    Isabel Varriale Damian

    Capa, Projeto Gráfico e Diagramação

    Willian Castro

    editoraalcance.com.br

    Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

    (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    Manfroi, Waldomiro

    O último voo / Waldomiro Manfroi. – 2. ed. –

    Porto Alegre, RS: Livraria Edgardo Xavier, 2023.

    il.

    1. Ficção brasileira I. Título.

    23-143510 CDD-B869.3

    Índices para catálogo sistemático:

    1. Ficção : Literatura brasileira B869.3

    Aline Graziele Benitez - Bibliotecária - CRB-1/3129

    ISBN: 978-65-991811-5-3

    Apresentação

    Waldomiro Manfroi, dublê de médico e escritor, surge com mais uma obra na praça. Trata-se de um romance onde ficção e memorialismo se fundem de maneira correta. Homem de profundas vivências, viajado, acostumou-se, na rotina diária de seu consultório, com a ingente tarefa de salvar vidas de pessoas para as quais representa, não raras vezes, a última esperança. Além disso, na gestão de importantes cargos da esfera federal (professor universitário, ex-pró-reitor de extensão da UFRGS, ex-diretor da Faculdade de Medicina), enfrentou (e soube resolvê-los) naturais conflitos humanos. Toda essa bagagem, aproveitou-a muito bem como matéria-prima, reduzindo-a a palavras, através de um processo criativo seu, próprio, dando lugar a outra realidade mais verdadeira, que é a realidade ficcional.

    Na presente obra, Waldomiro Manfroi usa, como fio condutor do relato, a trajetória de um personagem que, como tantos mortais, nestes dias de violência, sofreu um assalto. Mas isto é apenas o pretexto de que se vale o autor para, concentrando o drama vivido pelo herói (para não falar em anti-herói) no crime que sofreu, abordar, nas entrelinhas (e isto constitui o maior mérito do livro) a tragédia de viver do homem contemporâneo, vítima de uma sociedade que, a pretexto de o proteger, na verdade o oprime.

    Neste sentido, o narrador vai agrupando episódios aparentemente sem importância, os quais, aos poucos, estruturando-se, vão desnudando o protagonista, em sua caminhante vida de que fala Gil Vicente, em seu Auto da Alma. Na verdade, a viagem que o personagem principal empreende pelo mundo é uma viagem que transcende o solo físico para, simbolicamente, converter-se em outra, nesta questionadora da condição humana.

    Portanto, não estamos aqui na presença de uma narrativa meramente linear. O autor pode até ter tido a intenção de contar uma história. E com certeza contou-a. Mas a verdadeira esconde-se nos desvãos dos signos poéticos, legível apenas por pessoas acostumadas a lidar com a palavra. Isto é, o leitor comum acompanhará com interesse a trajetória do personagem em suas aventuras mundo afora, até sofrendo com ele suas vicissitudes e reveses. Mas somente um leitor qualificado poderá assenhorear-se da outra história, aquela que o romance não conta. E isto, como ficou dito acima, constitui-se no maior mérito do livro. Porque, nesta última leitura é que se encontram verdades humanas, universais e perenes.

    Em determinados momentos, perpassa o texto, embora tenuemente, a preocupação com o recado, como, por exemplo, quando o personagem, em suas andanças, passa pela União Soviética. Mas esta postura logo se desfaz, o leitor praticamente nem chega a senti-la, eis que ela se dilui ao longo da obra.

    A temática encontra linguagem adequada, fluente, límpida, mantendo o leitor atento até o fim.

    Prof. Laury Maciel

    Prefácio

    Que impulso subterrâneo tem levado os médicos, especialmente no Rio Grande do Sul, a produzir literatura?

    Médico era Caldre e Fião, o patriarca de nosso romance, o patriarca Simões Lopes Neto, teria sido estudante de Medicina, não concluindo o curso. Era também a ambição de Érico Verissimo formar-se em uma profissão que, mais tarde, muitos de seus personagens abraçariam... Após levar bomba duas vezes no vestibular de Medicina, Josué Guimarães desistiu. Em compensação, o Jornalismo e a Literatura ganharam. Médicos como Dyonélio Machado, Cyro Martins, Moacyr Scliar e, mais recentemente, Celso Gutfreind e Fernando Neubarth, duas ótimas afirmações literárias, têm enchido milhares de páginas que figuram, certamente, entre as melhores escritas entre nós.

    Será a proximidade concreta da dor e do sofrimento, a convivência quase que permanente com a morte que os leva à criação artística? Uma recusa da finitude, do efêmero, da desintegração a que o tempo tudo submete? Perguntei isto ao doutor Waldomiro Manfroi, mas sua resposta, como dos outros escritores médicos, foi vaga, genérica. A exemplo daqueles personagens de J. J. Veiga, eles parecem guardar um segredo, um saber inviolável e inatingível que os arrasta, como diria Flaubert (apud Vargas Llosa), para a orgia perpétua da Literatura.

    O segredo de Waldomiro Manfroi nasce desta necessidade oculta da escrita.

    Não é autobiográfico, no sentido clássico do termo, mas percebe-se no texto a vivência do médico. Diante de uma plateia composta de amigos de veraneio, em uma praia qualquer do sul, Artur vai narrar um caso de assalto do qual foi vítima. Em volta desta simbólica roda de fogo, todos esperam por emoções fortes e aterrorizantes. Narrador ardiloso, Artur tece, antes de tudo, a história de sua vida, selecionando os momentos decisivos, buscando ações fundamentais e tirando do passado motivos de reflexão existencial e metafísica. A consciência evocadora não se limita aos fatos; investiga, questiona, debate diante de ouvintes, cada vez mais, curiosos.

    Velho filão de romance, a memória, que rompe os diques do passado, encontra aqui mais uma manifestação: mergulhando no tempo pretérito, Artur se desnuda existencialmente e cativa, não apenas os amigos, mas também os leitores. O último voo reserva muitas surpresas.

    Sergius Gonzaga

    I

    Águas mornas, sempre azuis, areias alvas, mata de picos íngremes, estradas primitivas e empoeiradas atraem para este recanto milhares de pessoas durante os meses de verão. Como fugitivas, elas se afastam dos centros urbanos para conviver com a intimidade da natureza. Vêm de longe. Cortam centenas de quilômetros de asfalto, em filas intermináveis, na rabeira de truculentos caminhões e de vagarosos ônibus vomitadores de fumaça. Durante a perigosa viagem, todos sonham com dias de muita paz, de convivências íntimas, de reencontros com o passado e de estímulos para o presente.

    A natureza, com seus predicados, a todos acolhe, sem discriminação. Ela abre o calor do seu ventre, de dezembro a março, para hospedar os visitantes e se colocar à disposição para que cada um se sinta parte do todo. As águas, com espumas leitosas, ao alcance de quantos as queiram desfrutar, os morros dependurados, bem perto, para serem admirados ou desbravados. Nessa convivência entre natureza e pessoas, se entrelaçam múltiplos desejos, experiências e comportamentos.

    Há os que vêm para se banhar, sentir o sol na pele, sentar em cadeiras à sombra de guarda-sóis, conversar, beber, comer, dormir e, no outro dia, recomeçar na mesma rotina, sem permitir que o ambiente lhes abra novas perspectivas para a mudança de hábitos. Há os que vêm para admirar os segredos nas águas profundas. Mas há os que trazem seus barcos com equipamentos de mergulho e arpões para capturar os habitantes do paraíso submerso. Outros, expondo seus belos corpos e seus encantos joviais, montam em corcéis de fibra e fundem-se com o vai e vem das ondas.

    Há os que praticam frenéticas corridas ou demoradas caminhadas ao longo da baía, ou por entre desfiladeiros perfumados pela vegetação. Há os que trazem seus livros para, nos momentos de refúgio, se encontrar com os que registraram em frases ou em versos o que as vivências do mundo lhes proporcionaram. Muitos vêm à procura de novas amizades. Outros aspiram a anseios amorosos, sonhos e desejos não vividos na rotina do dia a dia, acreditando que a magia da natureza possa reanimar corpos já dormentes.

    Há os que chegam para manter seus hábitos gastronômicos e suas dependências alcoólicas e para repetir, em cada nova amizade, noitadas de muita comida, muita bebida e animada conversa.

    Mas há, também, os que vêm para ficar.

    Artur, há anos, veraneava aqui. Vivia em cada período um mundo diferente, já que seus amigos mais próximos frequentavam outros balneários. Suas amizades na temporada eram passageiras. Amizades de praia. Terminado o veraneio, cada um tomava seu caminho e só voltavam a se encontrar no outro ano. Só que neste ano, para Artur, tudo soava diferente: ele viera para ficar. Aposentado, depois de somar, dividir e multiplicar as oportunidades que lhe restavam, decidiu viver neste recanto que fora, durante parte de sua vida, um ambiente estimulante.

    O lugar, agora transformado em morada definitiva, continuaria a lhe proporcionar os mesmos encantos? É o que ele pretende descobrir. Tem todo o tempo necessário para ver, ouvir, pensar, meditar, sonhar e reaprender como existir, afastado do que fora seu mundo, e de quase todos com quem o compartilhara.

    Para se adaptar à nova vida, Artur procura pedaços de si em novas amizades. Com essa determinação, em cada encontro, ele abre sua alma às trocas. Assim, numa bela manhã ensolarada, ele se aproxima do seu velho grupo de amigos já organizado, debaixo de guarda-sóis, pronto para desfrutar prazerosas horas à beira da praia.

    Nas águas em frente, gaivotas, depois de empreenderem mergulhos demorados, emergem com peixes nos bicos. Um barco a vela se aproxima da praia ao vagar das ondas. Traz em seu convés, para estimular a imaginação dos que se acomodam na areia, além do capitão de boné branco e peito desnudo, um grupo de belas mulheres com os corpos tostados pelo sol.

    Um veleiro é sempre capaz de estimular as pessoas a empreenderem viagens sem um norte definido. Quando todos embarcavam em seus veleiros imaginários, Gilberto, o mais inquieto do grupo, desfaz os sonhos dos amigos, com uma instigante pergunta:

    – Vocês sabem!... Vocês sabem quanto custa um veleiro destes? O dono deste veleiro deve ser um magnata ligado aos negócios escusos, nacionais e ou multinacionais.

    O grupo, até então indiferente, começa a prestar atenção nas perguntas do amigo.

    – Como ia dizendo – continua Gilberto, tomando conta da conversa –, acho que nenhum de nós, com o nosso trabalho de vida inteira, consegue comprar e equipar um desses veleiros.

    – Por falar em veleiro, um amigo meu, que veio pela primeira vez veranear aqui na nossa praia, passou momentos de cachorro, duas semanas atrás – intervém Reinaldo, inclinando o corpo para o lado de Gilberto, tomando o cuidado de cobrir a boca com a mão em concha, para que as mulheres não o ouvissem.

    E vendo que as mulheres não se interessavam ou não ouviam o que falavam, Reinaldo acrescentou os detalhes do que lhe contaram. Devido à insistência dos filhos e influenciado por alguns amigos, que por aqui há anos veraneavam, o amigo alugou uma casa na beira da praia e trouxe toda a família. Entusiasmado com a perspectiva de novas aventuras, antecipou a vinda por alguns dias, porque lhe contaram que sempre havia festa com fogos de artifício, muita alegria, bebida e comida à vontade, para comemorar a virada do ano. Não fora um desses barcos, a festa teria sido inesquecível, pois tinha todo o deslumbramento que o amigo imaginara.

    A festa transcorria animada, quando, madrugada alta, ele foi informado que sua filha de dezesseis anos fora dar uma volta de barco com amigos. Ele ficou aguardando seu regresso à beira da praia até o dia amanhecer. Como a filha não aparecesse, procurou-a na polícia, nos hospitais e até no necrotério, tal era seu desespero. Finalmente, no fim da tarde ela regressou.

    E, num... Tudo bem?... Feliz Ano Novo para todos, foi para seu quarto e dormiu.

    O resto da história não conhecia, porque, quando saíra da casa do infeliz amigo, a filha continuava dormindo, e ele cada vez mais transtornado.

    – É, tudo por causa de um desses barcos – intervém Gilberto, imitando um sorriso de hiena.

    – Vocês sabiam que a Márcia, aquela moça gordinha que trabalhava no posto dos correios, muito amiga de todos, foi assassinada, duas noites atrás?

    – O quê? Aquela moça bonita?

    – Como aconteceu?

    Passaria a versão do fato, conforme ouvira. Ela estava na casa da irmã, que era casada com um pescador, desses que permanecem meses em alto-mar, longe da família. O cunhado da Márcia teria regressado sábado à noite, de modo inesperado. Como de hábito, antes de se dirigir para casa, decidiu rever os amigos, no habitual boteco dos pescadores. Entre um liso e outro de cachaça, o pescador começou a ficar desconfiado com certos comentários dos amigos, em especial quando o ceguinho João, aquele que nada vê, mas tudo sabe, perguntou para o pescador:

    – Então, voltando para casa de surpresa, José? Algum problema com

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