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Peças psicoexistenciais e protossurrealista
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Peças psicoexistenciais e protossurrealista
E-book227 páginas3 horas

Peças psicoexistenciais e protossurrealista

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Sobre este e-book

O último trem para os igarapés, Corpo corpóreo e As três graças são as peças que integram o terceiro volume do Teatro de Luiz Marinho, Para este volume, foram selecionadas as peças psicoexistenciais e protossurrealistas do dramaturgo, totalmente diversas das suas peças de caráter regionalista.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento1 de fev. de 2019
ISBN9788578587482
Peças psicoexistenciais e protossurrealista

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    Pré-visualização do livro

    Peças psicoexistenciais e protossurrealista - Luiz Marinho

    Copyright © 2019 Luiz Marinho

    Grafia atualizada segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, que entrou em vigor no Brasil em 2009.

    Direitos reservados à

    Companhia Editora de Pernambuco – Cepe

    Rua Coelho Leite, 530 – Santo Amaro

    CEP 50100-140 – Recife – PE

    Fone: 81 3183.2700

    M338t

    Marinho Filho, Luiz, 1926-2002

    Teatro completo : peças psicoexistenciais e protossurrea-listas / Luiz Marinho ; organização, introdução e notas: Anco

    Márcio Tenório Vieira. – Recife : Cepe, 2019. v. 3.

    1. Teatro brasileiro – Pernambuco. 2.

    Teatro – Pernambuco. I. Vieira, Anco Márcio

    Tenório. II. Título.

    CDU 869.0(81)-2

    CDD B869.2

    PeR – BPE 19-31

    ISBN: 978-85-7858-748-2

    o último trem para os igarapés

    O último trem para os igarapés foi escrito em 1987. Em março de 2002, o projeto Todos Verão Teatro, promovido pela Federação de Teatro de Pernambuco (Feteape), homenageia a memória de Luiz Marinho (morto no dia 3 de fevereiro daquele ano) e o ator e diretor João Ferreira. A homenagem a Marinho se dá com a leitura dramatizada do inédito O último trem para os igarapés e o já encenado, A promessa. A primeira leitura é dirigida pelo ator e diretor Jorge Clésio, e acontece no teatro do Sesc Santo Amaro, no dia 18 de março. A segunda leitura fica sob a direção do ator e diretor Roberto Lúcio. O projeto foi encerrado no dia 27 de março com mais uma encenação de Um sábado em 30, pelo TAP. No dia seguinte, segunda-feira, o carioca Antônio Guedes, diretor da Companhia do Pequeno Gesto, realizou uma leitura dramatizada de Viva o cordão encarnado, no teatro do Sesc de Santo Amaro.

    O último trem para os igarapés foi publicado em 1987, na revista Palco Nordestino, (s.l.), p. 13-32. Para esta edição, nos valemos da versão digitalizada que se encontra no acervo de Luiz Marinho.

    Até onde pesquisamos, não há registro nem nos jornais, nem na programação oficial do projeto Todos Verão Teatro, promovido pela Federação de Teatro de Pernambuco (Feteape), dos atores que promoveram a leitura dramática de O último trem para os igarapés, apresentada no teatro do Sesc Santo Amaro, Recife, em 18 de março de 2002.

    PERSONAGENS

    Otávio (19 anos)

    Emanuela (19 anos)

    Silvana (36 anos)

    Jardelina

    Laura

    Guida

    Anajara

    Carlindo

    Danilo

    Coronel Vitorino

    Alagoano I

    Alagoano II

    Guilherme

    Arcanjo (20 anos)

    Fregueses

    PRIMEIRO ATO

    Um salão grande com várias portas que supostamente darão para quartos situados à direita e à esquerda. Ao fundo, porta grande e duas janelas que darão para o exterior. Várias mesinhas com cadeiras e um pequeno balcão de bebidas. É uma pensão alegre.

    É noite. Estão em cena Otávio, Emanuela, Anajara, Guida e Silvana. Todos estão sentados às mesas.

    Otávio, sentado sobre uma das mesas, penteia suavemente Emanuela que, sentada numa cadeira, reclina a cabeça nos joelhos dele. Ela prende distraidamente nos dentes um medalhão de louça que está preso ao seu trancelim.

    Há uma total apatia no semblante dos presentes. Fundo musical: A última esperança. Penumbra. A luz passeia pelos presentes e para sobre Otávio e Emanuela.

    Atenção: Presume-se que a pensão fica situada perto de linha de trens. Há, vez por outra, ruído de passagem de trens, sendo muitas vezes, tais ruídos, funcionais dentro da ação.

    Otávio

    (Segurando) Acho linda esta medalha!

    Emanuela

    É Santa Terezinha.

    Otávio

    Parece com você.

    Emanuela

    Tenho ela desde pequena. Ela me protege.

    Otávio

    Protege?!

    Emanuela

    (Dando de ombros) Me acompanha...

    Otávio

    (Absorto) Acompanha... (Os dois riem com tristeza. Ouve-se ruído de trem que passa e depois vai se afastando. A luz passa para a dupla Silvana e Guida.)

    Silvana

    Se meu filho for vivo, está exatamente com a idade de Otávio. Pode até ser louro, como ele, ter a mesma cor – o pai era um marinheiro americano –; o que mais me impressiona, é que ele tem o mesmo sorriso inocente de Ted. Foi duro eu perder meu filho! Ah, meu Deus! Ainda não consigo me conformar!

    Guida

    Você nunca teve notícias dele, não?

    Silvana

    Não! Nunca!... Fiquei o resto da minha vida numa eterna procura, mas em vão. Mas... onde eu encontrar aquela mulher... vou reconhecer! Sua imagem está viva dentro de mim!

    Guida

    Que mulher?

    Silvana

    A que roubou meu filho. São 19 anos... mas lembro-me de todos os detalhes... até o seu nome... Chamava-se Armandine! Nunca vou esquecer este nome Ar-man-di-ne!

    Guida

    Era sua amiga?

    Silvana

    Não! Conheci-a na estação de trens. Foi tudo tão rápido: o encontro, o conhecimento, a amizade travada... Íamos viajar...

    Guida

    E você passou logo a confiar!

    Silvana

    Ela me parecia uma pessoa fina, educada... tomou-se de encantos pelo meu filho... pediu para segurá-lo um pouco, eu entreguei... Os trens estavam todos atrasados, demorando a partir... eu estava precisando de ir ao toalete...

    Guida

    E deixou a criança com ela!...

    Silvana

    É... confiei... Quando voltei, já iam partindo vários trens, inclusive o que eu ia tomar... E ela não estava mais. Havia desaparecido com o meu filho. Gritei, gritei, gritei, ninguém se incomodou comigo. Devo ter desmaiado, pois quando fui dar conta de mim, estava no ambulatório da estação. Chamaram a polícia, mas eu estava tão atordoada, tão confusa, que não sabia dizer direito nem quem eu era, para onde ia viajar, quem era a tal mulher, se o menino era mesmo meu... Concluíram que eu era ou louca, ou vigarista, e me mandaram desaparecer dali! Armandine me parecia ser uma pessoa rica... espero, pelo menos, que meu filho tenha sido bem cuidado...

    (A luz passa para Anajara, que está sentada à outra mesa, fumando e bebendo. Ela canta simultaneamente com o fundo musical A última esperança. Depois, entre rindo e séria, fala:)

    Anajara

    Isto é tão triste para quem tem mãe na zona! (Todos riem e, neste momento, faz-se luz geral e entra Laura.)

    Laura

    Tia Jardelina acabou de falar comigo. Quer que a gente aumente o preço. Que é que vocês acham?

    Emanuela

    Eu fico tão desajeitada para falar em preço! Sei lá! Acho tão estranho... parece mercadoria... fico com tanta vergonha!

    Anajara

    Emanuela é tão vergonhosa que tem vergonha até de tirar as calças! (Riem.)

    Guida

    Eu nem sei mais o que é vergonha! Perdi a minha, quando perdi meus tampos.

    Anajara

    (Rindo) Se Emanuela pudesse, costurava tudo e sentava praça num convento!

    Otávio

    (Rindo) Não é sentar praça não, criatura! É recolher-se!... Recolher-se a um convento!

    Laura

    Falou a voz da experiência. Sabe, gente, Otávio já foi seminarista.

    Otávio

    Experiência que não me deixou saudades.

    Laura

    (Com malícia) Mas sente umas saudadezinhas dos garotos seminaristas, não é? Pelo menos eles devem ter sentido muita falta de você!

    Otávio

    Deixa para lá!

    Laura

    Sei tudo, meu filho! Olha, naquele tempo eu morava em Olinda, bem perto do seminário. De lá saiam muitas estórias!

    Otávio

    E também muito boato. Lá fora as estórias eram muito alteradas... mas, se lhe agrada contar as estórias que sabe, fique à vontade! Sei que tem um rosário delas. A esta altura do campeonato, nada mais me abala. Fala!

    Laura

    Pelo preço da fatura. Se alguma coisa estiver alterada, você corrija.

    Otávio

    Conte o que lhe contaram, sei que lhe dá o maior prazer.

    Laura

    Não, não tenho prazer! Acho que todos aqui devem estar com o livro aberto. Conta em dia!

    Anajara

    Eita que coisa misteriosa! Conta logo essa estória, ou então muda de assunto.

    Otávio

    Vá, Laura! Até eu estou curioso em saber da minha estória...

    Laura

    Bem, vou falar... Otávio, que todos conhecem, esta linda criança loura que está aqui em nossa frente... quando era bem mocinho, entrou para estudar no seminário. Tudo ia bem, mas tempos depois começou a aparecer menino pálido,

    de olheiras, desmaiando em plena missa...

    Otávio

    (Assumindo) O jejum para a missa matinal foi suspenso, não foi isto?... Vá, continue!

    Laura

    Exatamente! Mas mesmo assim os meninos continuavam a ter desmaios... e cada vez mais!

    Otávio

    Um dos rapazes foi hospitalizado... Houve reunião de pais, irmãos superiores e médicos...

    Laura

    Isto! Isto! Sabem o que estava acontecendo? Só depois foi descoberto... (Faz pequena pausa e olha para Otávio.)

    Otávio

    Pode falar! Conte tudo, eu assumo!

    Laura

    Durante a noite, Otávio saía de cama em cama confessando os seminaristas. Tinha seminarista de se confessar, duas, três vezes por noite!

    Otávio

    (Solene/dramático) Aliviando o corpo do peso da luxúria, para que leves as almas dormissem em plena paz, livres de sonhos pecaminosos. Gostou?

    Laura

    Não sei. Mas sei quem não gostou! O capelão!

    Otávio

    (Sério) Grandessíssimo filho da… deixa pra lá!

    Laura

    Uma certa noite, o capelão, que já vinha desconfiado, fez uma ronda no dormitório...

    Otávio

    Tenho minhas dúvidas sobre suas reais intenções durante as rondas... Mas, fale! Quem está na berlinda sou eu!

    Laura

    Bom, ele pegou este moço e um seminarista em plena comunhão, na hora exata em que ele tomava a hóstia do seminarista! (Riem.)

    Otávio

    (Abaladíssimo) Pare! Não repita isto! É uma comparação grosseira! Desrespeitosa! E de muito mal gosto! Nunca brinquem com as coisas da liturgia! Comigo, digam tudo! Mas respeitem as coisas sagradas!

    Laura

    E coisa de seminarista, não é sagrada não, bem? (Risadagem.)

    Otávio

    Por favor! Levem a sério! Respeitem! Assim não dá! Sei que vocês estão noutra.... mas procurem entender! Vocês podem caçoar, mas, vejam bem, eu, não posso!

    Emanuela

    Eu sei de que você está falando, Otávio. Olha, minha gente, há o sagrado e há o profano. Ambos têm que ser respeitados, mas com separação! Não devem ser misturados.

    Anajara

    Eu não digo que Emanuela é mesmo das igrejas! (Todos riem.)

    Guida

    Mas quem anda misturando as duas coisas aqui não somos nós! É seu Otávio! Nós, aqui, só temos um partido: o profano. (Risos.)

    Otávio

    Tem razão! Reconheço o meu erro! Mas por isto, já paguei. Fui expulso, fui esfolado, apedrejado, excomungado... Mas, ainda restam, dentro de mim, certos princípios... estes, não consigo abjurar...

    Emanuela

    Mas, por que estamos falando tanto na vida particular de Otávio? O assunto era bem outro!

    Silvana

    Era, sim! Estávamos discutindo sobre o aumento que tia Jardelina quer implantar!

    Guida

    E como vai ser esse aumento?

    Silvana

    Pois é! Como é que a gente vai dizer aos homens para aumentar?

    Guida

    Vai ser pelo tamanho? (Risadagem.)

    Anajara

    Se fosse assim, Maria Tabocão ia ficar rica!

    Otávio

    Pelo amor de Deus! Vocês hoje estão num astral! Respeitem quem já morreu!

    Guida

    (Isolando-se) Fica para lá, em paz!

    Otávio

    Diga uma coisa: quanto é que vocês estão cobrando atualmente?

    Guida

    Cinquenta paus!

    Otávio

    Que fartura, eh? (Riem) E esse preço já não está bom? Aliás, bom demais?... Talvez até alto!

    Anajara

    Está claro que você não valoriza!... Você se interessa por corpo de mulher?

    Otávio

    Não, não! A jogada é outra!

    Guida

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