Trilhas
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Sobre este e-book
Trilhas conta a história de Ana Estrela, uma menina órfã, que evita ser adotada a qualquer custo por outra família, enquanto procura pelos pais biológicos. Com o fechamento do orfanato onde mora, ela acaba adotada por um casal do interior, os Soares. Ana acostuma-se com a vida na fazenda e a ter os barões de Riacho Seco como os seus pais. Até que novas revelações, descobertas a partir dos diários da falecida matriarca da família, fazem com que ela questione os adotantes sobre o seu passado. Drama e emoção em uma história cheia de mistérios, ausências e procuras.
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Trilhas - Mailson Ramos
Sumário
Dedicatória
Apresentação
Uma Trilha a Mais
Estranha no Ninho
Na Boleia do Caminhão
Liames
Feliz Natal
Saudade
Autor
Dedico este livro às minhas afilhadas:
Letícia, Alessandra e Melinda.
Apresentação
A história de uma criança órfã sempre emociona. Mas as histórias das crianças órfãs que desafiam tudo para reencontrar os pais biológicos e descobrir o que aconteceu no passado são muito mais emocionantes e dramáticas. É o caso da menina Ana Estrela, que estabelece como ação mais importante para a sua vida o reencontro com os pais.
Ela não tem ideia de quem eles sejam, porque a abandonaram quando recém-nascida. Não há uma só informação. Mas a menina rechaça todas as famílias adotantes, até o orfanato em que vive na capital ser fechado. Então Ana Estrela é adotada por Edmundo Soares, o Barão do Rio Seco, e sua esposa, D. Amália. Ela vai viver em uma fazenda, ao lado dos dois filhos do casal, Mônica e Hugo.
No meio do nada, ela começa a se interessar pelas coisas da fazenda e se acostuma com o modo de viver da família; por um tempo esquece a ideia de procurar os pais. No momento em que alguns acontecimentos do passado da família Soares começam a despertar duvidas tanto em Ana como em D. Amália.
Esta história dramática e emocionante é um retrato cruel da vida de muitas crianças no país. Revela, por outro lado, o papel central dos casais que adotam crianças e lhes proporcionam não apenas um lar, mas as condições favoráveis para o seu desenvolvimento social, educacional, etc.
‘Trilhas’ é um livro infanto-juvenil, mas que discute com muita maturidade o tema da orfandade, da adoção e das crianças desaparecidas. Entre encontros e desencontros, idas e vindas, o personagem de Ana Estrela é muito representativo e belo. É uma adolescente que amadureceu exposta aos mundos representados por cada família que a adotou.
Este é o primeiro livro que escrevo sem um personagem irreverente ou sem a linguagem do humor que atravessa muitas obras desde a primeira página até o fim. O tom dramático, as lágrimas, o desespero, a eterna procura, fazem de ‘Trilhas’ um relato de sentimentos.
Como a literatura também serve para emocionar, eis aqui, modestamente, uma grande oportunidade.
Uma Trilha a Mais
A Belina Del Rey 1989 andava aos solavancos na estrada de terra batida, com o motor engulhando uma gasolina de péssima qualidade que jazia no tanque havia pelo menos um mês. A caranga desconjuntada parecia se desarticular ainda mais com as imperfeições da estrada, os pedregulhos e os bancos de areia. Subia com sofreguidão as colinas, soltando baforadas de fumaça, tossindo nuvens negras que espantavam as aves pelo caminho; nas descidas quase planava, sozinha no meio do nada, sacudindo em menor grau os seus parafusos soltos e a lataria sem soldas. Era cedo e fazia frio. As baixadas nebulosas escondiam árvores grandes, que eram notadas apenas pela copa, a flutuar fantasmagóricas sobre o nevoeiro. O chão parecia úmido, mas era apenas resultado de uma noite de bruma. O orvalho ainda pingava das folhas em gotas cintilantes. E, aos poucos, o sol foi iluminando a vegetação do semiárido que jazia escondida sob o branco véu da neblina. Primeiro apareceu uma gramínea seca, amarelada, umedecida pelo orvalho que caíra na noite anterior; depois o sol foi arrastando a luz sobre as taperas, desnudando um relevo de terra avermelhada, coberta por malvas secas e arbustos retorcidos. Quando o nevoeiro se foi, sobrou apenas a paisagem da caatinga, com a prevalência de cores amareladas e mortas. A exceção era um flamboaiã que tingia de vermelho a frente de uma casa velha, destacando-se entre angicos desfolhados e umbuzeiros cinzentos.
Irmã Celeste ligou o rádio. Entre uma estação e outra, parou na voz grave e maviosa de um locutor que falava do amanhecer no sertão, com uma viola tocando ao fundo. A freira olhava o tempo. O vento impiedoso que entrava pela janela do carro causava-lhe arrepios. Ela usava um lenço na cabeça para proteger-se do frio e já havia trocado as lentes dos óculos de descanso por lentes escuras. Tinha por volta dos quarenta e cinco anos. A pele do rosto era macia e limpa como a de um bebê. Os cabelos eram tão negros como as penas de um anu. Diziam pelos cantos que ela os pintava, mas pareciam tão naturais que ninguém se atrevia a falar em voz alta o que poderia soar como uma calúnia. Pouco saía do convento. Por um bom motivo, aquela era a terceira vez que rompia a clausura. Carregava consigo a última adolescente do Orfanato Santa Luzia, que havia sido fechado por falta de doações. O convento era mantido pelo casal Soares, que vivia no interior do estado. Após passarem por uma crise financeira, eles resolveram cancelar a ajuda, de modo que todos os órfãos foram colocados em uma fila de adoção. A última órfã foi justamente adotada por este casal. Ela vinha no banco de trás da Belina, envolvida em um cobertor de lã, agarrada a