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Transgeneridade e Previdência Social: seguridade social e vulnerabilidades
Transgeneridade e Previdência Social: seguridade social e vulnerabilidades
Transgeneridade e Previdência Social: seguridade social e vulnerabilidades
E-book289 páginas3 horas

Transgeneridade e Previdência Social: seguridade social e vulnerabilidades

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Sobre este e-book

A presente obra é fruto dos trabalhos desenvolvidos pelo Grupo de Pesquisa Transgeneridade e Previdência Social: Seguridade Social e Vulnerabilidades, que envolveu pesquisadores vinculados à Defensoria Pública da União, da Universidade Estadual do Norte do Paraná-UENP e da Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul-UEMS.

Todas as pesquisas foram conduzidas a partir da liderança do Professor Luiz Gustavo Boiam Pancotti e da Vice-Liderança de Heloísa Helena Silva Pancotti e Guillermo Rojas de Cerqueira César.

A finalidade maior foi expandir os estudos de gênero dentro da pesquisa sobre seguridade social, já que a temática ainda é desconhecida dentro desse ramo do direito. O grupo de trabalhos é heterogêneo e, em razão disso, os resultados obtidos foram abrangentes o suficiente para abarcar aspectos como hermenêutica previdenciária ante demandas que envolvem pessoas trans, ultra vulnerabilidade social e benefícios assistenciais, saúde e bioética queer, custeio, revelando-se um apanhado completo de pesquisas que se propõem a responder as maiores dúvidas da prática jurídica na seara.

É um poderoso instrumento para o operador do direito de forma geral, assim como é uma fonte para estudantes que desejam desenvolver pesquisas na área, já que cada trabalho apresenta vasta bibliografia a ser consultada.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento13 de fev. de 2023
ISBN9786525264868
Transgeneridade e Previdência Social: seguridade social e vulnerabilidades

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    Transgeneridade e Previdência Social - Guillermo Rojas de Cerqueira César

    BIOÉTICA QUEER: COMO A SEPARAÇÃO BINÁRIA PREVIDENCIÁRIA AFETA OS CORPOS TRANSVESTIGÊNERES PELA ÓTICA DA DECLARAÇÃO UNIVERSAL SOBRE BIOÉTICA E DIREITOS HUMANOS

    Eric Cordeiro Cavaca¹

    INTRODUÇÃO

    O artigo em questão se constitui a partir da conceituação de três pontos à primeira vista distintos, mas que quando analisados, discutem sobre algo de extrema importância no mundo de hoje, o qual se manifesta cada vez mais plural e diverso.

    Esse estudo, então, elencará questões inerentes à população transvestigênere² (pessoas que não se identificam com o gênero imposto ao nascimento), os princípios da bioética (linha de estudo que trata de questões éticas relacionadas à natureza) de acordo com a Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos (DUBDH) da UNESCO e, ainda, a Previdência Social brasileira, utilizando-se desses três temas para entender se as regras previdenciárias agridem ou abraçam os corpos transvestigêneres sob a ótica dos princípios bioéticos elencados na DUBDH, afinal a Seguridade Social é, constitucionalmente, universal.

    Nessa medida, o que se busca é justamente responder ao problema: A separação dual proposta pela previdência social no Brasil (não) fere os corpos transvestigêneres quando aplicado a ótica dos princípios da bioética elencados na DUBDH?

    Para isso, esse artigo se debruçará sobre quem são as pessoas transvestigêneres, do que se trata a bioética queer (sinônimo de pessoas LGBTQIAPN+) e a Declaração da UNESCO de 2005 e ainda entender a condição basilar proposta pela previdência pátria para que se torne um segurado.

    Tudo isso enquanto se objetiva a resposta à pergunta supracitada, segundo a metodologia de abordagem qualitativa, procedimento bibliográfico-documental, finalidade básica-estratégica, método hipotético-dedutivo e objetivo descritivo.

    Antes de se adentrar à próxima etapa, seguindo uma tradição queer, abre-se um momento para que seja pedido licença às pessoas dos grupos que serão, em seguida, pormenorizados, vez que não são vivências do autor, mas que ainda assim, essa análise, é condição necessária para o transcorrer desse estudo em comento.

    Portanto, entendendo o descrito, torna-se necessário iniciar a fase de desenvolvimento do presente artigo, conceituando questões inerentes às pessoas transvestigêneres; à bioética queer e à DUBDH; e pontos direcionados à previdência social pátria. Após o desenvolvimento, passará para a conclusão e, no fim, apontar-se-á eventuais limitações e potenciais recomendações.

    1 DESENVOLVIMENTO

    Nesse presente tópico será explorado o conteúdo objeto de análise desse artigo, a começar com a apresentação de quem são as pessoas transvestigêneres; seguido do que é a bioética queer; após, quais são as normas previdenciárias aplicadas no Brasil; e, finalmente, se essas normas agridem, ou não, a população transvestigênere.

    Tudo será alicerçado pelo convencionado na Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos da UNESCO de 2005, sendo o instrumento base para que a pergunta principal desse artigo seja respondida: A estruturação da Previdência Social pátria fere os direitos humanos inerentes às pessoas transvestigêneres de acordo com a bioética queer?

    1.1 DAS PESSOAS TRANSVESTIGÊNERES

    Nesse trabalho, entende-se que o caminho para que se entenda sobre o tema tratado seja uma explanação inicial de quem são as pessoas foco desse estudo. Isso se dá, pois a partir de tal entendimento, talvez, seja mais fácil perceber quais são suas chagas e como poderiam as regras previdenciárias do Direito nacional, potencialmente, ferir a essa comunidade de vulnerades (grupos de pessoas socialmente mais marginalizados que outros).

    Consequentemente, passa-se a apresentar a comunidade Transvestigênere³, a qual se subdivide em alguns grupos, como: mulheres e homens transgêneres⁴, travestis e não bináries⁵(pessoas que não se identificam como homens ou mulheres exclusivamente/separadamente).

    Antes de perceber a conceituação de homens/mulheres trans, é necessário entender a diferença de sexo e gênero. Sexo se refere ao caráter anátomo-fisiológico dos animais, inclusive humanos, pautando-se nos próprios órgãos reprodutores, diferenças anatômicas, celulares, cromossômicas, dentre outros fatores puramente biológicos (CABRAL; NICK, 2006).

    Em contrapartida, gênero é o status quo, o modus operandi social direcionado aos corpos humanos (CONNELL, 1995, p. 189), ou seja, é como a sociedade indica a maneira com a qual as pessoas devem se tratar, sendo passível de se encaixotar os indivíduos, uma vez que é a partir do gênero que se constrói o machismo misógino, a transfobia, a homofobia e outras agressões sociais, assim como ensina Judith Butler (2016).

    Conceitua-se, ainda, que pessoas nascidas com o sexo masculino são obrigadas a viver sob o espectro do gênero masculino, agindo como um homem, enquanto as nascidas do sexo feminino, gênero feminino, têm as obrigações de mulher. Gênero esse que consta na Certidão de Nascimento de todes, embora venha como sexo. E é por isso que ninguém nasce mulher: torna-se mulher (BEAUVOIR, 1967, p. 09), pois o gênero é imposto após o nascimento e é ele que definirá como essa pessoa será tratada pela sociedade em que vive.

    Assim, entende-se que homem/mulher transgênere é aquela pessoa que não se entende com o gênero que lhe foi imposto ao nascimento, ou seja, pessoa que foi designada a um gênero ao nascer, mas que não se entende como tal, e, sim, do gênero oposto (MODESTO, 2013). Logo, homem transgênere é aquela pessoa que nasceu do sexo feminino, sendo imposto a condição de ser do gênero feminino, mas que não se identifica como tal, entendendo-se como do gênero masculino, homem; e mulher transgênere é a mesma situação, mas, no caso, não se identifica como do gênero masculino, mas feminino, portanto, mulher.

    Quanto à identidade travesti, segundo Keila Simpson (2015), trata-se do rompimento do binarismo masculino-feminino, reconhecendo-se não como mulheres, mas como travestis propriamente dito. Cita, também, que as pessoas travestis existem sob o espectro feminino, exigindo sua identificação por esses pronomes e o respeito por suas vivências e individualidades.

    Em suma, travestis devem sempre ser tratadas no feminino, embora não sejam mulheres, exigindo o devido respeito, assim como mulheres são mulheres, homens são homens e agêneres, por exemplo, são agêneres (pessoas não bináries que se identificam como não tendo nenhum gênero que seja).

    Ainda em relação às pessoas não bináries, conceitua-se que:

    Gêneros não-binários: são todos gêneros que não são nem 100% feminino e nem 100% masculino. Inclui formas de neutralidade, ambiguidade, multiplicidade, parcialidade, ageneridade, outrogeneridade e fluidez de gênero. São infinitos gêneros. Pessoas não-binárias são sempre trans. (SOL, 2014, apud KRASOTA, 2016, p. 57).

    Tem-se, portanto, que pessoas não bináries são aquelas que acabam por não pertencerem ao padrão binário apresentado pela sociedade brasileira: não apenas homem, tampouco apenas mulher. Podem ser ambos, pessoas gênero fluido; podem ter nenhum gênero, pessoas agêneres; ou ter qualquer outra característica distinta que o enquadre como um dos mais de trezentos e setenta, não taxativos, outros gêneros não duais (ORIENTANDO, s/d).

    Mas é necessário ir além de suas identidades e perceber a sua vivência no que tange à violência destinada a esses corpos, um dos motivos que as fazem ser vulnerades: a expectativa de vida das pessoas trans gira em torno de 35 anos no Brasil (BENEVIDES, 2018, s/p), enquanto a das outras pessoas é de 76,7 anos (BRASILPREV, s/d). A título de exemplo, no ano de 2021 foram contabilizados 140 assassinatos de pessoas transvestigêneres, seguindo como o país que mais as matam no mundo, em números absolutos (BENEVIDES, 2022). É constatado nesse estudo da Benevides (2022) que a juventude transvestigênere vem sendo morta cada vez mais cedo, e em 2021, a vítima mais nova tinha 13 anos de idade. Em decorrência disso, ela deixa um ponto muito claro: qualquer alteração positiva na mortalidade trans não é graças a qualquer ação do governo federal ou do estado, uma vez que esses nada fizeram para ajudar essa população (BENEVIDES, 2022, p. 33).

    Tal fala traz a teoria de Michel Foucault (2012), que em 1976 trouxe o entendimento de que o Estado se utiliza da Biopolítica e do Biopoder, pensando em uma política pública de morbidade ou de vida, ao fazer viver ou deixar morrer, podendo ser direcionada a esse estudo, para as pessoas transvestigêneres, uma vez que sem o seu auxílio o futuro é não outro senão uma eminente morte violenta.

    E não é apenas essa morte que pespega o corpo transvestigênere. Com relação à educação:

    Devido ao processo de exclusão familiar, social e escolar, como já mencionado em diversas ocasiões e em pesquisas anteriores, estima-se que 13 anos de idade seja a média em que travestis e mulheres transexuais sejam expulsas de casa pelos pais (ANTRA, 2017) - e que cerca de 0,02% estão na universidade, 72% não possuem o ensino médio e 56% o ensino fundamental (Dados do Projeto Além do Arco-íris/Afro Reggae). Essa situação se deve muito ao processo de exclusão escolar, gerando uma maior dificuldade de inserção no mercado formal de trabalho e deficiência na qualificação profissional causada pela exclusão social. (BENEVIDES; NOGUEIRA, 2021, p. 43).

    Situação educacional essa que faz refletir diretamente no mercado de trabalho, então:

    Com aumento de pessoas em situação de vulnerabilidade social e de miseráveis, a crise econômica, a política e aumento do desemprego, acreditamos que se mantém atual a estimativa de que apenas 4% da população trans feminina se encontra em empregos formais, com possibilidade de promoção e progressão de carreira. Da mesma forma, vemos que apenas 6% estão em atividades informais e subempregos, mantendo-se aquele que é o dado mais preocupante: 90% da população de travestis e mulheres transexuais utilizam a prostituição como fonte primária de renda. (BENEVIDES; NOGUEIRA, 2021, p. 44).

    Ou seja, a comunidade transvestigênere se manifesta da maneira vulnerada. Isso, sem considerar as estatísticas referentes a demais agressões, como lesões corporais e casos de transfobia que agridem o corpo e a mente.

    Portanto, pessoas transvestigêneres são aquelas que fogem à regra de gênero estabelecida pela sociedade, tomando controle das rédeas de suas próprias vidas e vivências enquanto exigem respeito por serem quem são, ao mesmo tempo que são obrigadas a viverem à margem da sociedade e lutarem para não se tornar cifra oculta⁶, como aponta Benevides (2022, p. 18).

    1.2 DA BIOÉTICA QUEER

    Aqui, o estudo da bioética se aplicará não apenas às relações entre pesquisadores e sujeitos de pesquisa científica, temas biomédicos e biotecnológicos, mas de seus princípios na vida social dos corpos transvestigêneres brasileiros.

    Ao separar os radicais gregos presentes na palavra bioética, pode-se identificar que "bios representa a própria vida política, o fato de estar no mundo (GOLDIM, 2009), e ética, de ethos", pode ser entendida como o costume construído através de valores sociais, os quais vêm a estabelecer uma maneira de agir (DALLARI, 2003).

    Goldim (2009) também aponta que muitos confundem o significado de "zoe e bios". Essencialmente, essa vem trabalhar o conceito da vida social do ser humano, enquanto aquela se refere à vida natural, a que tange a biologia, tornando-se inviável utilizar de uma conceituação biológica (zoe) para definir questões inerentes à pessoa política (bios).

    O que imediatamente remete à impossibilidade de trabalhar questões de controle humano através do sexo (zoe), quando inserido na sociedade, obrigando a construção do gênero (bios) para operar tal controle. Por isso, também, Butler (2016) conceitua o gênero como algo ilusório e construído pela sociedade para controlar seus corpos, em consonância à Goldim (2009).

    Evidenciou-se que este trabalho conceitua a bioética como o estudo da vida social através de costumes enraizados por valores, regida por uma série de princípios direcionados aos vulnerades, afastando-se dos limites da biomedicina e biotecnologia.

    Também é aplicado nesse artigo o conceito de "vulnerado/vulnerada/vulnerade tal qual o proposto por Schramm (2006) ao estabelecer a vulneração". Esclarece, então, que vulnerabilidade é uma característica comum de todos os seres vivos, pois a vida é algo extremamente frágil por si só; vulneração (pessoas vulnerades), no entanto, diferencia-se de vulnerabilidade (seres vulneráveis) quando se coloca em questão que existem pessoas que vivem em extrema vulnerabilidade, como moradores de rua, presidiários, transvestigêneres, dentre outros. Há de se entender que além de tudo que torna esses grupos vulneráveis, assim como todo organismo vivo, eles são alvo de inúmeros outros riscos. Vulneráveis dentre os vulneráveis, vulnerades.

    Sendo assim, a Bioética Queer coloca em foco como esses princípios e fundamentos atuam sobre a vida em sociedade dos corpos queers (LGBTQIAPN+⁷). Inclusive, cabe colocar que essa bioética queer, ainda que partilhe da mesma população foco, segue uma linha distinta da "Queer Bioethics", proposta por Lance Wahlert (2018), considerando que essa versa sobre questões de saúde/clínica, essencialmente, e aquela busca uma vertente mais social e política de queers brasileiros.

    Neste âmbito, o que fora supracitado por Benevides e Nogueira (2021), mais a Teoria de Foucault (2012), pode ser visualizado na seguinte ilustração: ao se utilizar o Princípio do Benefício e do Dano, exigindo que os benefícios sejam exaltados e os danos minimizados, sobre dois corpos, uma mulher transgênere lésbica e um homem cisgênero hetero, observa-se que o cuidado em não causar dano e gerar benefícios ao segundo candidato é muito mais enfático do que quando se coloca em perspectiva àquela mulher, que institucionalmente é rechaçada.

    No subtópico a seguir, tratar-se-á justamente do instrumento utilizado para se tomar as conclusões desse estudo em comento, sendo ela a própria Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos (DUBDH) da UNESCO, de 2005, a qual decidiu pela ampliação da bioética para que abrangesse, entre outros, o campo social.

    2 DECLARAÇÃO UNIVERSAL SOBRE BIOÉTICA E DIREITOS HUMANOS DA UNESCO, DE 2005

    Conceitua-se que a DUBDH, fora adotada por unanimidade dos cento e noventa e um países, em 19 de outubro de 2005, pela 33ª Sessão da Conferência Geral da UNESCO, em Paris, ramificando a bioética para que se manifestasse além dos campos da biomedicina e biotecnologia, chegando ao social, sanitário e ambiental, assentando a ordem de que saúde não é um bem a ser adquirido, mas um direito humano (GARRAFA, 2006).

    Conforme explanado por Caetano e Garrafa (2014), quando a DUBDH aplica os saberes da bioética considerando as dimensões sociais, sanitárias e ambientais, ela imediatamente prioriza o respeito pela pluralidade e cultura de cada Estado ente, gerando um espaço para que cada federação olhe para si mesma e perceba quais as suas próprias necessidades. Ou seja, o que era uma ciência direcionada a uma relação paciente-médico e pesquisa-cobaia, analisando quais as questões ético-profissionais do ser humano em seu próprio âmbito de pesquisa científica, passou a abordar temas que circundam pontos, tais quais o analfabetismo, pobreza, saneamento básico, acesso a saúde e outros que fazem um vulnerável se tornar vulnerade.

    Sustenta-se, também, que a referida Declaração trouxe oito objetivos principais a se concretizar, quinze princípios basilares, como a Igualdade, Justiça e Equidade, em seu artigo 10º; o Princípio da Não-Discriminação e Não-Estigmatização, art. 11; e o Princípio do Respeito pela Diversidade Cultural e pelo Pluralismo, art. 12; além dela também trazer como eles devem ser aplicados para maior efetividade do ali proposto.

    Tudo isso será contextualizado nesse estudo, pois é a partir desses princípios, da DUBDH, e de seus direcionamentos, que a análise de agressão, ou não, do Estado brasileiro para com sua população transvestigênere ao estipular regras binárias para a Previdência Social será feita a seguir.

    3 DA PREVIDÊNCIA SOCIAL

    Esse tópico derradeiro focará no ponto que abrange majoritariamente os regimes da previdência social pátria. Logo, dar-se-á foco à conceituação básica exigida por esse instituto: a divisão humana binária de ser homem ou mulher.

    Antes de considerar o regime previdenciário do segurado (pessoa que entra com o pedido), primeiro identifica-se seu gênero e depois analisa-se questões inerentes à profissão, regime previdenciário, dentre outras considerações que se fazem necessárias perante a lei pátria (BRASIL, 1991).

    Aliás, dizer identifica-se seu gênero não seria o termo certo, devendo ser alterado para impõe-se o gênero masculino ou feminino a essa pessoa, uma vez que não são todos os gêneros compreendidos pela previdência. Até porque, como já se expusera aqui, os gêneros masculino e feminino não são os únicos existentes.

    Nos últimos anos muito vem se discutindo sobre como essa distinção, masculino e feminino, se aplicaria de forma efetiva sobre os corpos, especificamente, de homens e mulheres transgêneres. Tema, inclusive, árdua e majestosamente debatido pela Professora Heloísa Pancotti, cuja qual veio abrindo importantes caminhos para essa população em comento.

    Então, em linhas gerais, também muito graças à ADI 4275, pode-se entender que, conforme ensina Pancotti (2020), basta que esse homem/mulher transgênere tenha seus registros civis retificados, vindo a apontar o verdadeiro gênero dessa pessoa trans, o qual ela se identifica, e logo seria destinado para a categoria previdenciária pertencente. Contudo, caso não fosse aceito, caberia ao judiciário impor tal condição à autarquia. Embora a Aposentadoria Programada venha para dificultar ainda mais a aposentadoria de homens e mulheres transgêneres, uma vez que, conforme já apontado, possuem expectativa de vida de 35 (trinta e cinco) anos.

    De qualquer forma, avança-se para além da aposentadoria de pessoas que possuem um gênero binário, ainda que o caminho delas não seja fácil. Afinal, conforme já apontado nesse artigo, as travestis e as outras pessoas não bináries não são mulheres, muito menos homens exclusiva/separadamente. Então, se apenas dois gêneros são considerados para avaliação do pedido previdenciário nacional, não se percebe um caminho para encaixar essas pessoas travestis e não bináries.

    Somando a isso, aponta Maria Di Pietro (2018) que a Previdência Social, ou qualquer órgão/autarquia da Administração Pública, não pode agir de maneira não expressa em lei, ou conceder benefícios àqueles não segurados, devendo agir dentro dos parâmetros já pré-estabelecidos pela legislação, sendo seu limite, portanto, o texto da lei.

    Consequentemente, percebe-se que se não existe previsão legal que verse sobre aposentadoria de pessoas travestis e outros não bináries, fora do espectro de homem/mulher, outra deve ser a solução para tanto.

    Essa situação pode fazer inúmeras dúvidas nascerem, como: A pessoa não binárie, caso chegue na idade estabelecida e preencha as regras, deverá abdicar de sua identidade para poder aposentar? Terá ela que se aposentar de acordo com o gênero constante em seus documentos civis, o qual não o representa, ou poderá escolher o que lhe for mais benéfico? Uma mulher ou um homem cis poderão ser obrigados a se aposentarem de maneira que invalide

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