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Fiar, tecer e rezar: A história das mulheres na fábrica de tecidos do Biribiri
Fiar, tecer e rezar: A história das mulheres na fábrica de tecidos do Biribiri
Fiar, tecer e rezar: A história das mulheres na fábrica de tecidos do Biribiri
E-book312 páginas3 horas

Fiar, tecer e rezar: A história das mulheres na fábrica de tecidos do Biribiri

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Sobre este e-book

Fiar, tecer e rezar: a história das mulheres na Fábrica de Tecidos do Biriri é uma obra oriunda da tese de doutorado de Kátia Franciele Corrêa Borges, a qual investigou parte do processo histórico ligado às relações sociais das mulheres empregadas nessa fábrica, refletindo acerca de questões relacionadas à mulher, mundo do trabalho e formação religiosa. Organizado em seis capítulos, o livro apresenta a história de algumas mulheres que trabalhavam na Fábrica de Tecidos do Biriri, discutindo um tema que, infelizmente, ainda é bastante atual e presente no mundo do trabalho: a desigualdade de gênero.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento20 de set. de 2023
ISBN9788546224333
Fiar, tecer e rezar: A história das mulheres na fábrica de tecidos do Biribiri

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    Pré-visualização do livro

    Fiar, tecer e rezar - Kátia Franciele Corrêa Borges

    Fiar_tecer_e_rezar_a_historia_das_mulheres_na_fabrica_de_tecidos_do_BiribiriFiar_tecer_e_rezar_a_historia_das_mulheres_na_fabrica_de_tecidos_do_BiribiriFiar_tecer_e_rezar_a_historia_das_mulheres_na_fabrica_de_tecidos_do_Biribiri

    Copyright © 2022 by Paco Editorial

    Direitos desta edição reservados à Paco Editorial. Nenhuma parte desta obra pode ser apropriada e estocada em sistema de banco de dados ou processo similar, em qualquer forma ou meio, seja eletrônico, de fotocópia, gravação, etc., sem a permissão da editora e/ou autor.

    Revisão: Renata Moreno

    Capa: Vinicius Torquato

    Arte da Capa: Marcelo Brant

    Imagem de Capa: Operária Regina do Espirito Santo Fonseca (1933)

    Diagramação: Larissa Codogno

    Edição em Versão Impressa: 2022

    Edição em Versão Digital: 2022

    Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

    Elaborada por Bibliotecária Janaina Ramos – CRB-8/9166

    Índice para catálogo sistemático

    Conselho Editorial

    Profa. Dra. Andrea Domingues (UNIVAS/MG) (Lattes)

    Prof. Dr. Antonio Cesar Galhardi (FATEC-SP) (Lattes)

    Profa. Dra. Benedita Cássia Sant’anna (UNESP/ASSIS/SP) (Lattes)

    Prof. Dr. Carlos Bauer (UNINOVE/SP) (Lattes)

    Profa. Dra. Cristianne Famer Rocha (UFRGS/RS) (Lattes)

    Prof. Dr. José Ricardo Caetano Costa (FURG/RS) (Lattes)

    Prof. Dr. Luiz Fernando Gomes (UNISO/SP) (Lattes)

    Profa. Dra. Milena Fernandes Oliveira (UNICAMP/SP) (Lattes)

    Prof. Dr. Ricardo André Ferreira Martins (UNICENTRO-PR) (Lattes)

    Prof. Dr. Romualdo Dias (UNESP/RIO CLARO/SP) (Lattes)

    Profa. Dra. Thelma Lessa (UFSCAR/SP) (Lattes)

    Prof. Dr. Victor Hugo Veppo Burgardt (UNIPAMPA/RS) (Lattes)

    Prof. Dr. Eraldo Leme Batista (UNIOESTE-PR) (Lattes)

    Prof. Dr. Antonio Carlos Giuliani (UNIMEP-Piracicaba-SP) (Lattes)

    Paco Editorial

    Av. Carlos Salles Bloch, 658

    Ed. Altos do Anhangabaú, 2º Andar, Salas 11, 12 e 21

    Anhangabaú - Jundiaí-SP - 13208-100

    Telefones: 55 11 4521.6315

    atendimento@editorialpaco.com.br

    www.pacoeditorial.com.br

    Eu dedico este trabalho à minha avó Laurinda (in memoriam) mulher de fé, que com sua sabedoria popular, me proporcionou amor e sábios conselhos!

    Eu dedico também a todas as mulheres operárias e trabalhadoras. Em especial as mulheres que trabalharam na fábrica de tecidos do Biribiri. Obrigada, guerreiras, foram os rastros deixados por vocês que me impulsionaram a contar a história desta fábrica.

    GRATIDÃO

    Gratidão, palavra que, na língua portuguesa significa qualidade de quem é grato ou o reconhecimento de uma pessoa por alguém que lhe prestou um benefício, um auxílio, um favor etc.; agradecimento. Em toda a minha trajetória acadêmica conheci pessoas e instituições que contribuíram e influenciaram para que eu chegasse até aqui. Um livro é fruto de um esforço coletivo e também de momentos de abdicação e isolamento da convivência com familiares e amigos/as. Chegou o momento de agradecer a todos, todas e todes! Incorro no risco de fazer alguma injustiça, esquecendo-me de alguém.

    Gratidão à Estamparia S.A., na pessoa do diretor presidente Rogério Mascarenhas Cezarini, que possibilitou o apoio material para publicação desta obra. Gratidão a Gilberto Mascarenhas Curi (in memoriam), que me permitiu o acesso aos arquivos da fábrica, onde pude encontrar fontes valiosas. Gratidão às colaboradoras Carmen L. Buitrago Frainz, Jocelaine Miguel e Maria Aparecida de Assis Branco e aos colaboradores Gaspar do Nascimento Moraes e Edvaldo do Nascimento.

    Gratidão à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Capes, pela concessão de bolsa, sem a qual esta pesquisa não seria possível. E ao Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Juiz de Fora (PPGHIS-UFJF).

    Gratidão à Universidade Estadual de Montes Claros/ Unimontes, berço da minha formação acadêmica. De forma particular, gratidão aos professores Marcos Esdras e Pedro Ivo pela ajuda no desenvolvimento dos mapas e compilação do banco de dados.

    Gratidão às professoras Claudia Maia e Bárbara Souto, queridas companheiras de lutas e ativismos em prol do protagonismo feminino na história. Gratidão ao Grupo de Pesquisa Gênero e Violência – GPEG/Unimontes.

    Gratidão ao querido artista diamantinense Marcelo Brant que, carinhosamente, atendendo ao meu pedido, produziu a arte da capa. E a querida amiga Dayse Lúcide, autora do prefácio deste livro, por compartilhar comigo o apreço pela história de Diamantina.

    Gratidão ao João Paulo Abreu dos Santos, que esteve ao meu lado durante todo o período de levantamento dos arquivos (2015-2018), fotografando, anotando e me ouvindo.

    Gratidão ao querido James William Goodwin Junior, por compartilhar comigo sua vasta sabedoria. E, muitas vezes, me direcionar na escrita.

    Gratidão à Maria da Conceição de Melo Ferreira e seu esposo, Adilson do Rosário Ferreira. E a Raimundo Geraldo de Souza (Raimundo Sem Braço) e sua esposa pela recepção afagante na vila do Biribiri. Gratidão, também, a Maria da Conceição Assis, por se dispor a contar suas histórias e à arquiteta Rafaele Bogatzky Ribeiro Corrêa, por dispor seus desenhos sobre a vila e a igreja.

    Sou uma mulher agraciada com amigos/a valiosos/as, portanto, sou grata a vocês queridos/as amigos/as de Diamantina, Juiz de Fora, Montes Claros e Brasil afora pelo apoio imaterial.

    Gratidão à Janikelle Bessa e Sidney Pereira pelas leituras e apoio para com o meu texto quando ele ainda era um projeto de tese.

    Gratidão a toda a minha família, em especial aos meus pais Luiz e Cida Borges e à minhas irmãs Karla e Malu. Por último, gratidão a Carlos Renato Theóphilo meu namorado, amigo e companheiro com quem divido o apreço pela vida acadêmica. E, a sua filha Mari e seu filho Heitor, agora minha família também.

    E, por fim, gratidão à força cósmica que move o universo, que alguns chamam de Deus. Em especial gratidão ao sagrado feminino, às mulheres fortes e místicas que inspiram a minha escrita. Em especial, gratidão a Nossa Senhora Aparecida do Brasil, que por sua representação me inspirou a crer que o respeito à diversidade ainda é possível.

    Escrever a história das mulheres é sair do silêncio em que elas estavam confinadas. Até hoje o silêncio ainda é a prisão de muitas mulheres. Em quantas prisões silenciosas você já esteve? Você sente o grito em você? (Michelle Perrot, 2005)

    LISTA DE SIGLAS

    ACMD – Arquivo da Câmara Municipal de Diamantina

    AEAD – Arquivo Eclesiástico da Arquidiocese de Diamantina

    APE-S/A – Arquivo Privado da Estamparia S/A.

    AUOD – Arquivo da União Operária Beneficente de Diamantina

    BAT – Biblioteca Antônio Torres.

    IEPHA – Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais

    MAM – Museu Alexandre Mascarenhas

    PUPSA – Pia União do Pão de Santo Antônio

    SUMÁRIO

    Folha de rosto

    Dedicatória

    Gratidão

    Epígrafe

    Lista de siglas

    Prefácio

    Apresentação

    Introdução

    Capítulo 1

    A vila operária e as adaptações da unidade de produção fabril

    1.1 A cidade, o bispo e a fábrica

    1.2 A fábrica de tecidos do Biribiri: caracterização espacial e geográfica

    Capítulo 2

    As primeiras operárias: histórias que se contam em diamantina

    2.1 A fábrica do bispo

    2.2 Pobres órfãs-operárias

    2.3 As mudanças na administração XIX-XX

    Capítulo 3

    O perfil social da mão de obra durante as décadas de 1920 e 1950

    3.1 Serviços de homens e mulheres: a questão do gênero nas ocupações

    3.2 De meninas a operárias

    3.3 De onde provinha a mão de obra?

    Capítulo 4

    A família fábrica e os direitos sociais: construindo as bases das relações de trabalho

    4.1 A família fábrica

    4.2 Direitos Sociais

    Capítulo 5

    A associação das filhas de maria do biribri: formando a identidade da boa operária

    5.1 Fitas

    5.2 De boa jovem a boa operária

    5.3 Tecendo relações

    Capítulo 6

    Ação católica, santo antônio e flores de maio: cotidiano e circularidades culturais

    6.1 Ação Católica

    6.2 Santo Antônio

    6.3 As Flores de Maio

    6.4 Cultura do associativismo

    Conclusão

    Posfácio

    Notas

    Referências bibliográficas

    Fontes primárias manuscritas

    ANEXO I. Operárias do Biribiri fotografadas por Assis Horta (1943)

    ANEXO II. Imagens da Vila do Biribiri e da Fábrica (dias atuais)

    ANEXO III. Imagens internas da Capela do Sagrado Coração de Jesus

    ANEXO IV. Projeto arquitetônico da Capela do Sagrado Coração de Jesus

    Página final

    PREFÁCIO

    Por caminhos tortuosos se chega ao Biribiri. Você já teve a oportunidade de passear pelas terras do antigo distrito diamantino, no alto Jequitinhonha em Minas Gerais, e conhecer a vila operária do Biribiri, especialmente a fábrica do bispo? Tendo visitado ou não, a história desse local pulsa tão intensamente que o convite apresentado no presente livro é simplesmente irrecusável.

    Quem eram as mulheres que fiavam e teciam na antiga fábrica do bispo de Diamantina? Como era o seu cotidiano no período de 1918 a 1959 e quais as relações estabelecidas com o poder religioso e estatal, neste momento? Estas questões frequentam o texto de doutoramento da historiadora Kátia Borges que evidencia que a tal fábrica do bispo era organizada com a finalidade de estabelecer uma sociedade comercial solidária, modificando-se ao longo do tempo e sofrendo influências dos aspectos capitalistas que marcam a História do trabalho na região.

    A incursão que Kátia Borges faz no campo da História das mulheres, de modo especial, ganha o contorno simbólico que nos aviva a memória na perspectiva de que fiar a vida é tecer experiências, é jogar luz sobre as vivências das mulheres da fábrica do Biribiri, assinalando que debruçar sobre o tema das mulheres é revoltar-se contra os silenciamentos que aprisionam o feminino em nossa experiência coletiva. É de fato uma viagem que adentra o presente e o ausente na experiência histórica das mulheres do ponto de vista relacional, lançando mão da categoria de análise relações de gênero para compreender o imbricado mundo social que estabeleceu a partir da ação de indivíduos que enfrentavam os desafios do seu tempo.

    De um discurso filantrópico - pois a fábrica não almejava lucros conforme afirma o seu fundador, o bispo dom João Antônio dos Santos, mas sim fornecia o amparo aos necessitados - às ações de viés mais capitalista no emprego fabril, encontramos nestas páginas a trajetória de mulheres, crianças e jovens pobres da região de Diamantina que sobreviveram às peripécias do tempo e de suas ações em sociedade. A riqueza das fontes arroladas pela autora nos apresenta a 998 fichas de cadastro de pessoas que trabalhavam na fábrica de tecidos do Biribiri, das quais 875 se referiam a mulheres trabalhadoras, e o restante se referia a homens.

    A história que se dá a ver no espaço físico da vila do Biribiri conta com a Capela do Sagrado Coração de Jesus, uma casa grande para a família dos donos da fábrica, uma casa dormitório para abrigar as operárias solteiras (chamada de Convento) e uma escola. Em maio de 1889, Alice Dayrell (Helena Morley) registrou em seu diário que a vila era vista idilicamente pelos moradores de Diamantina, especialmente por ela. Conta a menina que [ela]

    não teria pressa de ir para o céu se morasse no Biribiri. Não acredito que no céu se possa ter melhor vida do que ali. Quando eu volto de lá fico com o lugar e as pessoas na cabeça muito tempo.¹

    Todavia, apesar dessa visão, a historiadora acentua que o tecido social existente naquele lugar era o de produzir disciplinarização, moralização dos costumes e normatização do cotidiano do operariado.

    Perscrutar as fontes exigiu que a autora escolhesse um método que fosse à altura de seu desafio: buscar em Carlo Ginzburg o paradigma indiciário, o qual definiu a enorme importância dos indícios e sinais presentes em pistas deixadas pela experiência humana. Dessa maneira, apresenta fartas imagens que nos transportam para o mundo fabril do final do século XIX e início do século XX, arrolando mapas e croquis diversos; fotografias encontradas nos arquivos empoeirados da fábrica e da Biblioteca Antônio Torres; tabelas, quadros e gráficos cuidadosamente construídos de modo a demonstrar como as concepções do feminino atenderam aos propósitos do masculino.

    Como não poderia ser diferente, a historiadora chama para o seu texto o diálogo com as produções historiográficas regionais, contribuindo para a compreensão da História Regional no que tange aos temas como mulher, mundo do trabalho, formação religiosa. A tessitura do texto aos poucos revela o diálogo com as pesquisas de alguns autores que se ocuparam do estudo da História de Diamantina e região entre a segunda metade do século XIX e a primeira metade do século XX, a saber: Antônio Carlos Fernandes, James William Goodwin Júnior, José Moreira de Souza, Marcos Lobato Martins, Lívia Gabriele Oliveira, Dayse Lúcide Silva Santos, dentre outros. Distribuído em seis capítulos, o leitor notará que a autora transita bem entre vários estudos, a saber: Domingos Giroletti, Douglas Colle Libby, Frederich Engels, Karl Marx, Cláudio Batalha, dentre muitos outros.

    As mudanças na administração da fábrica também são apresentadas com vistas a ilustrar o universo cultural em que estavam inseridos(as) os trabalhadores(as) da primeira metade do século XX. Para tratar da questão feminina e sua atuação social, bem como a divisão sexual do trabalho e a sua hierarquização, apoia-se nas pesquisas de Margareth Rago, Michelle Perrot, Natalie Zemon Davis, Daniele Kergoat e Joana Maria Pedro. É deslumbrado, assim, o perfil social das mulheres demonstrando as suas ocupações de acordo com o gênero, os fatores que determinaram a divisão sexual do trabalho naquele espaço, as estratégias sociais que geraram laços de dependência entre trabalhadoras, trabalhadores e patrões, e, por fim, compreendemos quem eram, como agiam e quais as concepções do feminino católico que agitavam a vida das mulheres que fiavam e teciam na fábrica de Biribiri de 1918 a 1959.

    O convite de Kátia Borges a perscrutar a identidade da boa operária, desvela em suas páginas a construção do discurso de recato e discrição feminina, transformando a boa jovem em uma boa operária. Um intricado sistema social foi desenvolvido, assentando-se nas Filhas de Maria, na Ação Católica e no Apostolado da Oração, cuja codificação gerou um comportamento feminino baseado em ideais de pureza, caridade, penitência e virtuosidade, resultando nas trabalhadoras ideais para aqueles tempos.

    Por fim, você já se indagou sobre as razões de se utilizarem as expressões infelizes órfãs, frágeis, indefesas, passivas e carentes para se referirem às mulheres empregadas na fábrica da vila de Biribiri?

    Convite aceito: vamos explorar a história das mulheres que trabalharam na fábrica pela lente de Kátia Borges e nos indagar se elas somente fiavam, teciam e rezavam?

    Dra. Dayse Lúcide Silva Santos

    Diamantina, Março/2022.

    APRESENTAÇÃO

    Percorrer a história de Diamantina é inevitável, o encontro com Chica da Silva e todas as controvérsias que envolveram a construção do seu mito. Chica ficou conhecida por ser uma mulata sedutora que conquistou o contratador de diamantes. Sedução, beleza, juventude são algumas das representações que constitui o feminino e as mulheres negras em especial, sobretudo pela ótica patriarcal, burguesa, colonial-moderna.

    Na contramão dessa perspectiva, o livro de Kátia Borges nos leva a conhecer mulheres tão comuns e extraordinárias, como deve ter sido Chica, mas ao contrário dessa, aquelas entram para a História pelo trabalho produtivo exercido nos quase um século da fábrica de tecidos do Biribiri. Seguindo indícios e pistas microscópicas deixadas em fichas de admissão de funcionárias, jornais e escritos de memorialistas locais, Kátia vai tecendo alguns fios da história de mulheres como as irmãs Aída e Elza Botelho, admitidas como operárias residentes da fábrica quando tinham apenas 16 e 14 anos respectivamente, Bertolina, Francisca, Regina do Espírito Santo, a insubmissa Geni e Maria da Conceição Assis que, como tantas outras mulheres, foi obrigada a deixar o trabalho na fábrica quando se casou para se tornar maquinista de fogão, conforme lamentou. Com um olhar atento aos vestígios deixados por essas mulheres e aos registros rotineiros da fábrica a autora revela as hierarquias nas relações de trabalho que excluem as mulheres dos cargos de chefia e lhes atribui os salários mais baixos; desigualdades de gênero que ainda caracterizam a apropriação e o controle das mulheres, seus corpos e seu tempo, no mundo do trabalho.

    Sob a roupagem da filantropia e benevolência a Fábrica do bispo se ergueu sobre a exploração do trabalho de meninas (a grande maioria no período analisado), mulheres pobres, órfãs, viúvas e ex-escravas provenientes de Diamantina e de várias localidades do norte/nordeste de Minas, e como parte de um projeto de moralização e disciplinamento dos/das pobres pelo trabalho. Nesse sentido, merece destaque o Convento – como era conhecido o dormitório das operárias residentes –, um espaço de confinamento e exercício do poder disciplinar, tão bem analisado por Michel Foucault, que tinha como objetivo o controle dos comportamentos e a constituição de corpos e sujeitas dóceis. Mas, como também mostra Foucault, onde há relações de poder há sempre a possibilidade de resistência, de escapatória e de insubmissão. Atenta a

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