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Perigo em Bardino
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E-book352 páginas5 horas

Perigo em Bardino

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Sobre este e-book

Depois que o detetive particular Art Blakey é contratado para encontrar a irmã desaparecida de Inge Schwartz, a femme fatale, os corpos começam a se acumular em um ritmo alarmante.


Quando Art descobre uma ligação com uma cidade catalã fictícia e o suposto sequestrador, ele se enreda em uma teia de mentiras, enganos e paixão. Art terá que navegar por um labirinto complexo de ex-amantes, gangsters da máfia, repórteres e negociantes de arte para encontrar Gisela.


Ao final do dia, Art conseguirá se superar e encontrar a donzela em perigo... ou já é tarde demais?

IdiomaPortuguês
Data de lançamento26 de set. de 2023
ISBN9798890081247
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    Perigo em Bardino - Nick Sweet

    1

    Fui acordado pelo som do meu celular tocando. Minha cabeça doía e tinha a sensação que ela estava com o tamanho de uma melancia. Eu suspeitei que eu tinha exagerado na noite anterior, enquanto me levantei e agarrei o telefone. 'Olá?'

    'É o Arthur Blakey, investigador particular?' uma voz feminina perguntou.

    'Isso mesmo'

    'Oh senhor Blakey, eu ouvi falar que você é um expert em encontrar pessoas, é isso mesmo?' Quem quer que ela fosse, falava inglês com um sotaque estrangeiro. Alemão, eu diria.

    'Apenas quando eu consigo fazer isso.'

    'Fazer o que?'

    'Encontrá-las.'

    'Isso não é engraçado, senhor Blakey.' Ela não parecia seguir meu humor. Muitas pessoas não seguem, não que isso já tenha me aborrecido muito.

    'Nunca disse que era.'

    Ela ficou quieta por um momento e enquanto eu esperava para ouvir o que ela diria a seguir, eu podia imaginá-la em meu olho da mente, ou pensei que podia. Eu estimei que ela era uma morena bonita. Elas normalmente são, quando as imagino. Não necessariamente morenas, quero dizer, mas bonitas. Eu não sei porque, mas elas apenas aparecem dessa forma. Eu imagino que você poderia dizer que sou um otimista por natureza. Talvez você tenha que ser se você vai ficar muito tempo no meu ramo de trabalho. Você tem que ver muitas coisas desagradáveis quando trabalha de investigador particular, e você não pode evitar. Deveriam adicionar as habilidades de esquecer e deixar as coisas para trás na descrição do trabalho.

    Em todo caso, como eu estava dizendo, eu a imagine como uma linda morena, mas do tipo formal e apropriada de um jeito antigo; e agora, eu imagino como sua testa deve parecer ao estar marcada com uma expressão de dúvida. Então ela disse, ‘Você poderia encontrar alguém para mim?’

    ‘Eu certamente poderia tentar.’

    ‘Eu ficaria muito grata se você fizesse.’

    Eu achei seu tom de voz antigo levemente divertido, ou eu teria se minha cabeça na estivesse me dando tanta dor. Deve ter sido aquela última bebida que fez isso, a última ou as duas últimas, de qualquer forma. Ela ou elas foram responsáveis pelo pequeno arranjo que o interior da minha cabeça parecia não estar gostando, uma seção rítmica apresentada por alguns nas baterias. ‘Eu não seria tão grato,’ eu disse. ‘Eu não cobro barato.’

    ‘Quanto?’

    ‘Trezentos euros por dia mais despesas,’ eu disse. ‘E outros mil se eu encontrar quem quer que eu esteja procurando, metade disso eu recebo antecipado.’

    ‘E se você não encontrá-la?’

    ‘Você recebe os quizentos de volta.’

    ‘Entendo... bom, isso soa razoável,’ ela disse. ‘Então você irá encontrá-la para mim?’

    ‘Encontrar quem?’

    ‘Minha irmã Gisela, Sr. Blakey... ela está desaparecida, você sabe.’

    ‘Vou precisar do último nome.’

    ‘É Schwartz.’

    ‘E você é?’

    ‘Inge’, ela respondeu. ‘Inge Schwartz.’

    ‘Onde você está agora?’

    ‘Eu estou na rua do lado de fora de seu escritório... a porta está trancada.’

    ‘Sim, eu recebi um chamado,’ eu disse. ‘Se você puder voltar dentro de uma hora, eu me encontrarei com você.’

    ‘Por que tanto tempo?’

    ‘Tem um homem que eu venho perseguindo e eu acabei de alcançá-lo, mas ele está armado com um revólver e –‘

    ‘Oh querido... você quer que eu chame a polícia?’

    ‘Não, eu consigo lidar com isso.’

    ‘Mas parece que esse homem é perigoso.’

    ‘Eu consigo lidar com ele.’ Eu disse. Além disso, eu deveria ter acrescentado, alguns policiais em Bardino não gostam muito de mim, e eu não gosto deles também. Mas eu decidi guardar esse último pensamento para mim mesmo. De qualquer forma, eu estava apenas brincando com ela a respeito de perseguir um homem com um revólver. Não que eu não persiga muitos homens armados por aí, porque eu persigo; apenas não o estava fazendo naquele momento. O que eu estava fazendo era levantando da cama, depois de acabar de acordar. ‘Certo, se você chamar no meu escritório dentro de uma hora, te encontrarei lá.’ Eu disse a ela e desliguei.

    Eu olhei meu relógio. Acabara de marcar dez e meia, o que é tarde para as pessoas estarem deitadas na cama, talvez, mas não para mim quando não estou trabalhando. Eu acabei de resolvei recentemente uma dificil investigação de homicídio e ganhei dinheiro suficiente para os próximos meses, então não estava com pressa de encontrar novos clientes. Claro que se um caso conveniente aparecer, então melhor ainda; mas se não, não teria nada que me impedisse de dormir tarde e aproveitar um tempo com calma.

    Eu coloquei meu celular de volta no meu gabinete e cocei minha cabeça enquanto imaginava o que a irmã de uma boa garota alemã estava fazendo em lugares como Bardino e esquecendo de ligar ou escrever para casa. Eu ainda estava pensando nisso enquanto eu me retirava da cama, ao longo do corredor curto, e entrava na pequenina salon de estar ou sala de estar, e entrava na cozinha à esquerda. Pela janela, o céu ao longe, além das montanhas, era um azul claro, como era comum nessa época do ano, Bardino sendo abençoado com um clima que trouxe pessoas de todos lugares da Europa para cá nas férias ou para se instalar. No meu caso, eu segui alguém para essa parte do mundo em uma investigação alguns anos atrás, e de alguma forma ou eu fiquei preso ao lugar ou ele ficou preso a mim; e embora eu soubesse com certeza que eu não estava em nenhuma férias permanente, eu também não poderia dizer que eu estava exatamente instalado. Eu gostei daqui, porém, isso não era o suficiente para mim. No meu ponto de vista, Bardino tinha algumas vantagens: primeiro e mais importante, tinha sempre crime suficiente acontecendo para me manter ocupado ao longo do ano, além disso eu tinha praias para relaxar entre os casos, da primavera ao outono.

    Olhando pela cozinha, eu não poderia deixar de notar a garrafa vazia de Chivas em pé à lixeira como uma testemunha de júbilo dos meus excessos da noite anterior. Eu imaginei que eu realmente deveria me sentir envergonhado de mim mesmo ou culpado ou alguma coisa assim, um homem como eu que tinha acabado de chegar à tenra idade dos trinta e deveria ter mais juízo. Mas eu nuca fui de sentir culpa pelas coisas ou de punir demais, então eu esqueci aquela cena e me concentrei em uma caneca de um forte café preto.

    O café estava bom. Ele estara ainda melhor se eu tivesse adicionado um pouco de liquor, para fazer o que os espanhóis chamam de carajillo; mas isso não teria ajudado minha dor de cabeça, então eu exercitei um pouco de auto-controle e rejeitei a ideia. Eu levei a caneca através da sala de estar para a sacada, que era ainda menor. Se você estiver com a impressão que meu apartamento é pequeno, então você está certo. Mas é grande o suficiente para mim. É uma boa parte do pueblo também, ao sul sul do Barrio López, que é um complexo de casas construídas nos anos sessenta ou setenta em um tradicional estilo todo branco. O lugar é uma jaula de ruas estreitas de pedra que se interceptam, e tem algumas plazas na conurbação, uma delas tem um pequeno restaurante com cadeiras dispostas em um terraço. No lado distante do portão da jaula de casas brancas que é o Barrio López, há uma fileira de lojas e bares, assim como restaurantes que oferecem pesixes frescos e frutos do mar com preços razoáveis. Um deles, El Piripi, é particularmente bom, desde que não se importe em comer sobre uma toalha de papel descartável. Se você estivesse sentado fora do El Piripi, você teria uma vista perfeita da fileira de apartamentos do outro lado da rua que marca o início do barrio conhecido como Bocanazo. Esse pequeno barrio é feito de várias ruas paralelas, todas com idênticos blocos de apartamento correndo ao longo delas. Os apartamentos foram originalmente construídas para os pescadores, antigamente quando Bardino era pequena como uma vila de pesca. Atualmente o Bocanazo é cheio de europeus orientais, africanos e pessoas de todo lugar que tem uma coisa em comum: falta de dinheiro. Os unicos espanhóis que ainda vivem no barrio são aqueles que tem pouca sorte e não podem bancar uma mudança para uma área melhor. Se você caminhar na direção oposta à que eu vivo, que é o sul, você pode pegar alguma das três ou quatro ruas que levam à rotunda, como é chamado, em direção a Calle Zaragoza, e de lá tem uma caminhada curta até o beira-mar.

    Eu sentei e olhei para fora do jardim compartilhado, e escutei os pássaros cantarem ao longe enquanto eu tomava meu café. Então eu comecei a ponderar minhas finanças, como eu faço nas manhãs quando não estou trabalhando. Eu comecei desejando que eu tivesse um pouco mais de dinheiro na minha conta no banco, e depois evoluí para o desejo que eu tivesse muito mais dinheiro nela. Eu imagino que eu poderia dizer que sou um cara comum nesse sentido.

    Nesse momento eu comecei a pensar na tal mulher Inge Schwartz, e percebi que estava ficando curioso. Então eu terminei meu café, voltei para o quarto, abri o guarda-roupa e peguei um paletó de verão bege e uma camisa de seda azul escura.

    Já vestido, eu deixei o apartamento e me encaminhei ao meu escritório, que ficava apenas a alguns minutos de caminhada de distância, na rua Veracruz. A porta é estreita, espremida entre uma loja que vende relógio e uma loja de sapatos femininos. Eu abri a porta e subi as escadas. Enquanto eu subia, me ocorreu que eu realmente deveria procurar por um novo escritório. Alguma coisa relacionada a ter que subir as escadas para o escritório não parecia correto, e isso provavelmente explicava o motivo de os apostadores freqüentemente baterem na minha porta sob a impressão equivocada que estavam prestes a entrar em uma casa de má reputação. Você poderia dizer pela aparência de choque e decepção em suas feições, quando eu abria a porta para eles e, no lugar de uma jovem moça vestida ou em trajes frágeis e possuída por uma moral que era ainda mais flácida, eles se encontraram cara a cara com o seu eu verdadeiro. Não que eu tenha uma aparência monstruosa, pelo menos é que eu digo para mim mesmo. Porque, modéstia à parte, eu gosto de pensar que sou um cara bonito o suficiente. Eu tenho 1,83m e o porte atlético, cabelo castanho curto, mandíbula quadrada e o nariz quase tão quadrado quanto a mandíbula, mas as garotas que eu conheço sempre me dizem, certo nem sempre mas algumas vezes, que eu tenho os bebês azuis mais honestos do mundo. Elas apenas precisam olhar para meus olhos, elas dizem, para se sentirem seguras. Eu não digo para elas se sentirem assim. Pelo contrário, eu darei a elas o benefício da fazer essa leitura, e o cara em questão se fará raro.

    Os supostos apostadores, de quem eu falei, deveriam saber onde estavam batendo antes de vir bater na minha porta, contudo, porque meu nome e a natureza de meu negócio estão escritos em letra dourada e em negrito na janela de vidro fosca:

    ARTHUR BLAKEY

    INVESTIGADOR PARTICULAR

    Mas infelizmente as escadas são escuras e algumas pessoas parecer achar o letreiro difícil de decifrar. Ou então eles apenas se esquecem de ler para entrar logo, onde eles acreditam que suas amadas senhoritas frágeis estão esperando por eles.

    Na verdade eu não deveria ser tão superficial a respeito disso porque existe um grande problema com prostitutas em Bardino nesse momento. Veja bem, nem todas as garotas nessa profissão desejam estar nela; o fato triste é que muitas delas são coagidas por traficantes da máfia. Mas isso é outra história.

    Fiquei feliz ao ver que eu possuía mira suficiente para fechar a porta na noite anterior apesar de meu excesso com a garrafa de bebida e eu tirei minha chave, abri a porta e entrei. A mesa sólida de carvalho estava organizada perfeitamente de uma forma que apenas um desempregado organizaria, e as venezianas estavam parcialmente fechadas, então a sala estava com sombras listradas. Haviam duas cadeiras verticais nesse lado da mesa, e a minha cadeira giratória mais confortável estava do outro lado. Fui até lá e me sentei na cadeira e girei nela um pouco enquanto eu esperava a Inge Schwartz aparecer.

    Então ela apareceu.

    2

    No momento que abri a porta para ela, eu percebi que eu estava errado a respeito da Inge Schwartz: ela não era uma bonita morena, nem um pouco. Ela era loira, para começar.

    ‘Talvez você gostaria de entrar?’ Eu disse.

    ‘Talvez eu gostaria.’

    Eu fechei a porta atrás dela e me esforcei em não olhá-la de cima a baixo várias vezes. Eu falhei miseravelmente nisso, entretanto, porque ela era deslumbrante. Além disso, ela sabia disso. Certo, eu sou louco por loiras bonitas, mas deixe-me dizer que ela não era uma loira bonita qualquer. Quer dizer, bonita não é a palavra certa, não chega nem perto. Eu imagino que é melhor eu ser cuidado, no entanto. Afinal, eu não quero babar no meu diálogo e te dar uma má impressão sinceramente. Supostamente é ruim o bastante que um detetive particular queira te contar um de seus casos para começar; mas eu tenho minhas próprias razões pessoais para fazer isso. Talvez eu conte a respeito delas mais tarde, ou talvez não. Veremos como as coisas se desenvolverão.

    Onde eu estava? Ah é, a garota. Certo, vou direto ao ponto: ela tinha o cabelo loiro cor de mel bem arrumado por uma mão habilidosa, uma pele morena, olhos azuis da China, uma boca pintada de vermelho e uma estrutura óssea que teria feito Rodin jogar fora o cincel, juntamente com uma figura delgada em todos os lugares certos e menos esbeltos - na verdade, não esbeltos - em todos os lugares certos, também, e ela veio envolta em um vestido de linho de cor fúcsia que ela usava com um casaco creme do mesmo material e sapatos de corte preto. Por um momento a realidade invadiu minha imaginação e deu uma forma nas minhas calças, se é que você entende. Por isso eu digo que ela parecia ainda melhor do que a voz escultural, que ouvi no telefone mais cedo, me fez imaginar.

    Ela tirou sua jaqueta e me entregou, como se eu fosse o porteiro de um elegante conjunto. A roupa cheirava à seu perfume. Chanel número 5, se não me engano. O que Marilyn costumava usar. A Monroe, não Manson. Não que eu tenha alguma coisa contra ele, entenda, apenas nunca cheguei perto o suficiente dele para conferir seu perfume. Ou quis chegar, nesse quesito. Se você é do tipo que gosta de dar evasivas, então você deve fizer que eu sou muito novo para alguma vez ter tdo a oportunidade de chegar perto suficiente da outra Marilyn para sentir seu cheiro também, nesse caso eu terei que concordar. Mas eu imaginei issp muitas vezes. E minha imaginação pode ser um instrumento bem afiado nesse assunto, posso te garantir.

    Ela disse, ‘Eu trouxe algumas coisas para você.’ Ela abriu a bolsa, uma pequena Kelly, tirou um envelope A3 e me entregou.

    Eu dei uma olhada dentre dele. Tinha um maço de dinheiro nele, assim como uma fotografia e um pedaço de papel. Eu tirei o maço de dinheiro e deslizei o polegar pelas notas.

    ‘Está tudo aí, a quantia que você pediu,’ ela disse. ‘Conte se você quiser.’

    Eu contei rapidamente e enfei no bolso no peito da minha jaqueta. Depois eu peguei a fotografia e dei uma olhada nela. Era uma fotografia de uma garota por volta dos dezoito por aí. ‘Ela parece uma versão mais jovem nova de você,’ eu disse.

    ‘Não é atoa que somos irmãs, Sr Blakey.’

    Por um breve momento eu quase fui tentado a dizer que ela poderia dispensar o negócio de senhor e me chamar apenas de Art, abreviatura de Arthur, como todas as pessoas que conheço; mas eu retorne ao juízo e disse ao invés disso, ‘Quando essa fotografia foi tirada?’

    ‘Dois ou três anos atrás... foi a única que eu consegui encontrar.’

    ‘Quantos anos sua irmã tem agora?’

    ‘Vinte e um.’

    Eu olhei a fotografia e estava a um milimetro de dizer que sua irmã era com certeza uma garota de aparência bonita, mas eu consegui morder minha língua. Eu tirei a folha de papel e dei uma boa olhada nela. Tinha sido arrancada de um bloco de papel de carta, e não deveria me surprender, creio eu, encontrar uma carta escrita nela. O que me surpreendeu, contudo, foi a natureza da carta em si. Eu não sou grafólogo, mas o grande rabisco de aranha parecia extremamente infantil para mim, mais como o que alguém de treze anos poderia produzir do que o tipo de coisa que você esperaria de um adulto, mesmo um jovem; e notei que nenhum dos i’s estava pontuado, o que poderia sugerir a ausência de sentimentos de auto-estima do escritor. E havia o assunto da carta. Parecia uma garotinha escrevendo de um acampamento de verão, onde ela estava agitada pelo primeiro romance, e nem um pouco como a carta de uma jovem mulher que teria vindo a Bardino para viver e talvez tomado um rumo errado na vida e desistido de manter contato. Em suma, havia uma inocência beirando a infantilidade absoluta na escrita que me pareceu um pouco estranha, já que a data no topo da página era junho deste ano.

    ‘Por favor, sente-se.’ Eu disse, a a senhorita Schwartz se sentou devidamente em uma das cadeiras verticais. Ela cruzou as pernas perfeitamente no joelho, alisou o vestido, e seu pé manteve o ritmo de uma música imaginária que podia ou não estar sendo tocada em sua mente. Por sua expressão facial, no entanto, música parecia ser a última coisa em que estaria preocupada.

    ‘Essa é a última carta que você recebeu dela?’ Eu disse enquanto eu sentava na minha cadeira giratória acolchoada.

    Ela assentiu e mordeu o lábio inferior, e por um terrível momento parecia que ela estava prestes a cair em lágrimas. Mesmo enquanto isso acontecia, entretanto, eu continuei a suspeitar se eu deveria acreditar no que eu estava testemunhando. Se eu poderia assumir seguramente, em outras palavras, que o que eu estava vendo, ou sendo permitido assistir, era de fato ‘sério’.

    Eu respirei fundo, inflei minhas bochechas como um baiacu, e voltei minha atenção para a carta. Tendo notado o endereço local no topo da página, eu perguntei à senhorita Schwartz se ela havia entrado em contato com o lugar para ver se a irmã ainda estava morando lá. Ela respondeu que sim, fechando os olhos, como se ela estivesse sendo soterrada por emoções forte. A pessoa que estava morando atualmente lá, ela explicou, disse que Gisela saiu para algum lugar algumas semanas atrás. Para onde ela tinha ido e por que, o homem não sabia. Ele também não sabia quando ela provavelmente retornaria. Tudo que ele conseguiu dizer foi que ela tinha empacotado as coisas no trabalho e deixado a cidade.

    Eu pensei em conferir o endereço, que por sinal era perto daqui, no Bocanazo, minha primeira parada. Então eu perguntei à Miss Schwartz se ela e a Gisela tinham sido criadas juntas e pelos mesmos pais; e se sim, então de onde elas eram? ‘Sim’, foi a resposta para a minha primeira pergunta, a ‘Hamburgo na Alemanha’ sua resposta para a seguinte. Eu nunca estive nessa cidade e, além da localização geográfica, não sabia nada a respeito do lugar.

    ‘Então você vai pegar o caso?’

    ‘Eu peguei seu dinheiro, não peguei?’

    ‘Você acha que consegue achar minha irmã para mim, Sr. Blakey?’

    ‘Muito provavelmente... mas e se ela não quiser ser encontrada?’

    ‘O que você quer dizer com isso?’

    ‘Imagine que ela se apaixonou por algum jovem bruto sortudo e foi morar com ele, mas ela não quer que o papai descubra.’

    ‘O papai faleceu ano passado, infelizmente.’

    ‘Bom, a mamãe então.’

    ‘Ela morreu três anos atrás.’

    ‘Eu sinto muito.’

    ‘Não sinta.’

    ‘Vocês têm outros parentes?’

    Ela balançou a cabeça e suspirou, então deu uma mordida delicada no lábio inferior. ‘Não é típico dela, deixar de escrever ou ligar desse jeito.’

    ‘Você teve alguma discussão com Gisela?’

    ‘Não

    ‘Como você descreveria o relacionamento de vocês?’

    ‘Nós éramos bastante diferente.’

    ‘Mas vocês parecem ser iguais.’

    ‘Parecidas, mas não iguais.’ Ela me corrigiu.

    Isso era verdade: embora a garota na fotografia se assemelhava com a mulher com quem eu estava conversando, e de fato tivesse algo claramente deslumbrante em seu jeito, seu olhar não tinha a pureza clássica de sua irmã mais velha. ‘Vocês não se davam bem então?

    ‘Eu nunca disse isso.’

    ‘Não, mas você não disse muito.’

    ‘Eu sempre fui a sensível, Sr. Blakey, e Gisela parecia sempre fazer o que lhe agradasse.’

    ‘Então você se ressentiu com ela?’

    ‘Pare de colocar palavras na minha boca’, ela disse. ‘além do mais, realmente importa como nós relacionávamos, se tudo que eu quero é que você a encontre?’

    ‘Isso pode importar muito.’ Eu retruquei, ‘se vocês tiveram uma discussão e ela está decidida a não falar com você mais.’

    ‘Eu posso te garantir que não é o caso.’

    ‘É possível que você não pense que é, mas Gisela sim?’

    ‘Não, mas mesmo que fosse assim eu ainda iria querer encontrá-la, apenas para saber que ela está bem.’

    Eu peguei minha caneta Parker e comecei a rolá-la entre meus dedos. Eu sempre gosto de ter uma Parker em mãos para isso, em parte porque rolá-la entre meus dedos me dá algo para fazer com minhas mãos, e em parte porque eu sempre achei que uma Parker confere certo ar de classe britânica ao seu usuário e dá uma impressão boa aos clientes. ‘O que Gisela estava fazendo em Bardino?’

    ‘Ela nunca mais foi a mesma depois da morte da mãe e do pai.’ Sua sobrancelha se curvou como uma lagarta enrolada. ‘Ela era muito próxima e eles, entende.’

    ‘O que era esperado, não era?’ eu disse.

    ‘Sim, mas eu quis dizer...’ Ela parou, segurando sua bolsa Kelly como se pensasse que alguém estava prestes a sair correndo com ela e, observando-a, eu me perguntei se ela estava realmente chateada como parecia, ou se ela estava atuando. Era muito difícil dizer. Mas com certeza eu não podia me lembrar de ter visto uma garota como essa Inge Schwartz antes. Para começar, você teria que dar um jeito de encontrar alguém que fosse tão lindo quanto ela, e quando você encontrasse alguém, as chances são de que ela não seria nem de longe uma velha-solteirona. Embora eu tenha começado a me perguntar se a maneira de senhorita formal e apropriada era apenas um disfarce. Era impossível dizer. De uma coisa eu tinha certeza, contudo, ela não era o estereótipo de loira burra. Quer dizer, sabe o tipo descuidado de modos ultra-femininos que Marilyn encenou em Quanto mais quente melhor? Bem, Inge Schwartz não tinha isso. De fato, ela tinha qualquer que seja o opósito da maneira casualmente despreocupada de Marilyn. Eu estava intrigado para trabalhar com ela, apenas para chegar ao fundo do que estava acontecendo aqui. Ou talvez, fosse da própria mulher que eu estava querendo chegar ao fundo, mesmo que eu nunca tivesse confessado isso, mesmo para mim mesmo, nem em um milhão de anos. E ainda assim, aqui estou eu, você poderia dizer, e você poderia estar imaginando sobre o que estou falando e por que eu estou me contradizendo. Nesse caso você provavelmente teria razão. Eu sei, eu sei... mas eu tenho minhas próprias razões particulares para contar essa historia, e talvez Inge Schwartz seja uma delas.

    Eu fiquei esperando ela continuar sua sentença. Isso pareceu estar sendo difícil para ela, então eu dei à minha Parker mais alguns rodopios e girei na minha cadeira algumas vezes. Eu gosto de girar na minha cadeira quando eu estou falando com clientes. Um dos motivos que eu gosto tanto disso é porque eu posso fazer isso e eles não. As cadeiras verticais não têm o fator giratório embutido, do jeito que gosto. Me mostre um detetive particular que gosta de fazer seus clientes se sentirem confortáveis e eu te mostrarei um homem que está no caminho de perder sua licença. ‘Posso ver que você está chateada, Senhora Schwartz.’

    ‘É senhorita.’

    ‘Me perdoe, Senhorita Schwartz,’ eu disse. ‘Posso pegar um copo de água para você?’

    Ela descartou minha oferta com uma rápida sacudida com a cabeça.

    ‘Alguma coisa mais forte então?’

    ‘Ainda é de manhã’ ela disse, e me lançou uma expressão que uma diretora de cara escola de etiqueta reservaria para um jovem rapaz que tivera a temeridade de espiar dentro do dormitório feminino durante a noite.

    ‘Você estava dizendo como Gisela era muito próxima aos pais...’

    ‘Sim, ela ficou deprimida por um tempo depois que eles morreram. Então uma vez ela saiu, veio para Bardino com a intenção de arrumar um emprego.’

    ‘Que tipo de emprego?’

    Ela encolheu os ombros. ‘Ser garçonete ou trabalhar em um hotel, alguma coisa do gênero, eu penso.’

    ‘Ela chegou a encontrar algum trabalho?’

    ‘Eu não acredito que tenha... não que ela tenha me contato, de qualquer forma.’

    ‘Ela tinha muito dinheiro?’

    ‘Ela deveria ter algum.’

    ‘Quanto é algum?’

    ‘Bem, eu não sei exatamente’, ela disse. ‘Mas o que isso tudo tem a ver com alguma coisa, de qualquer forma? Eu quero que você encontre minha irmã, não escrever um livro a respeito dela.’

    ‘Eu percebi isso.’ Eu sorri, mas você não deveria ler nada nisso. Meu sorriso é mais barato que um chiclete. Inge Schwartz corou e desviou o olhar. Eu imaginei se seu rubor era real, ou se isso era parte da encenação. Eu me perguntei o que era mais

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