Lei de Drogas interpretada na perspectiva da liberdade
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Sobre este e-book
A obra esmiúça, com rigor analítico e alicerçada em ampla pesquisa doutrinária e empírica, os setenta e cinco artigos da Lei de Drogas (Lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006).
A perspectiva da liberdade adotada pelo autor afasta os lugares-comuns sobre o universo das drogas. Refuta-se o paradigma repressivo e propõe-se a adoção de uma abordagem interdisciplinar baseada em evidências científicas e capaz de assegurar a saúde, os direitos humanos e a redução de danos para os usuários. Dessa forma, além de humanizar a discussão em torno do uso problemático de drogas, serve ainda como uma poderosa ferramenta aos operadores de Direito para fortalecer o direito de defesa.
Trata-se, portanto, de um livro que tem "lado", e este é o da liberdade, o lado da advocacia e da Defensoria Pública (em oposição ao poder punitivo do Estado), o lado da magistratura corajosa que aplica a Constituição, o lado das incontáveis vítimas da guerra às drogas.
Em suma, nas contundentes palavras do próprio autor: "este não é um livro neutro. Seu propósito é reduzir os danos que a ideologia bélica da war on drugs produz na interpretação da Lei de Drogas. É um (anti)manual de guerrilha jurídica em favor de pessoas acusadas por crimes previstos na Lei de Drogas. Um analgésico para tratar a doença causada pela fúria repressiva do Direito Penal em relação às drogas, enquanto a legalização não chega".
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Lei de Drogas interpretada na perspectiva da liberdade - Cristiano Avila Maronna
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EDITORES
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COORDENAÇÃO DE PROJETO: Juliana Daglio
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DIAGRAMAÇÃO: Pablo Madeira
CAPA: Marina Avila
CONVERSÃO PARA EBOOK: Cumbuca Studio
EQUIPE DE APOIO
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Maronna, Cristiano Avila
Lei de Drogas interpretada na perspectiva daliberdade / Cristiano Avila Maronna. -- São Paulo,SP : Editora Contracorrente, 2022.
Bibliografia.
e-ISBN 978-65-5396-044-2
ISBN 978-65-5396-043-5
1.Direito constitucional 2. Drogas - Leis e legislação - Brasil 3. Inconstitucionalidade das leis 4. Lei 11.343/2006 I. Título.
22-119869
CDU-340.131.5
Índices para catálogo sistemático:
1.Inconstitucionalidade das leis : Efeitos : Direito 340.131.5
Eliete Marques da Silva - Bibliotecária - CRB-8/9380
@editoracontracorrente
Editora Contracorrente
@ContraEditora
SUMÁRIO
AGRADECIMENTOS
APRESENTAÇÃO
INTRODUÇÃO
TÍTULO I - DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Art. 1º
Estereótipos raciais e a interpretação da Lei de Drogas
Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância (Decreto n. 10.932, de 10.01.2022)
Mandado constitucional de criminalização e outras disposições
Nova lei, velha política de drogas
Impacto da Lei de Drogas (Lei n. 11.343/2006)
Índice Global de Política de Drogas (IGPD)
Índice do Estado de Direito – Projeto Justiça Global
Guerra às drogas e letalidade policial no Brasil
Princípios básicos sobre o uso da força e armas de fogo pelos funcionários responsáveis pela aplicação da lei (1985)
Protocolo de Istambul, sobre investigação e documentação eficaz da tortura e outras penas ou tratamentos cruéis, desumanos e degradantes (1999)
Decisões do Sistema Interamericano de Direitos Humanos sobre violência policial
Encarceramento em massa
Relação entre encarceramento e danos à saúde pública
Sistema carcerário brasileiro é um estado de coisas inconstitucional
Numerus clausus
Conceito de droga
Classificação das drogas psicoativas
Máxima de Paracelso
Conceito de droga na Lei de Drogas
Drogas legais e drogas ilegais
Drogas e risco de dependência
O mito da dependência como doença do cérebro
Drogas e pandemia
Verdades médicas, drogas e dispositivos de poder
Drogas ilegais e presunção de dependência
Usuário e dependente: a questão dos padrões de uso de drogas
Uso de drogas no Brasil
Violência letal e consumo de álcool
A relação entre nível de educação e julgamento moral em relação a pessoas que abusam de drogas
Contrafissura
Prevenção do uso indevido
Proerd (Programa Educacional de Resistência às Drogas)
Atenção e reinserção social do usuário e dependente
Princípio da reserva legal e norma penal em branco heterogênea
Retroatividade benéfica
Alteração do complemento e intertemporalidade
Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas – Sisnad
Art. 2º
Proibicionismo
Quadro comparativo de modelos regulatórios (proibição, despenalização, descriminalização, legalização)
Espectros de desenhos regulatórios
Mitos e evidências na construção das políticas de drogas
O sistema ONU (Organização das Nações Unidas) e as drogas
Tratados internacionais
Princípios de interpretação dos tratados
Categorias de drogas controladas
Reclassificação da maconha nos tratados internacionais
Pena de morte
Desinvestir em prisões e modelos autoritários de polícia, investir em direitos sociais
Redução de Danos
Salas de consumo de drogas ilícitas (SCD)
Confisco
Fins medicinais ou científicos
Uso ritualístico religioso
Movimento Rastafari
Uso tradicional da folha de coca
Ayahuasca
Ibogaína
Plantio e uso de Cannabis para fins medicinais ou científicos
Direito ao cultivo de Cannabis por associação de pacientes
Farmácia Viva, Associação de Pacientes e cultivo de Cannabis
Habeas corpus como via idônea para tutela do direito à saúde por meio do cultivo de Cannabis
Dispensação e manipulação de produtos com ativos derivados vegetais ou fitofármacos da Cannabis
Autorização para cultivo de cânhamo industrial
TÍTULO II - DO SISTEMA NACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS SOBRE DROGAS
Art. 3º
Opção política pela regulação extra legem, à margem do controle social democrático (infralegalismo autoritário
)
A criação da SENAPRED e o desmembramento das políticas sobre redução da oferta e da demanda
Composição do Sisnad
Competências específicas dos órgãos e entidades que compõem o Sisnad
Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas – CONAD
Participação social na construção de políticas públicas
ADI 6.659
Gestão das informações
Sistema Único de Saúde – SUS
Sistema Único de Assistência Social – SUAS
Capítulo I – Dos princípios e dos objetivos do sistema nacional de políticas públicas sobre drogas
Art. 4º
Princípios do Sisnad
Art. 5º
Objetivos do Sisnad
Capítulo II – Do sistema nacional de políticas públicas sobre drogas
Seção I – Da Composição do Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas
Art. 6º
Art. 7º
Orientação central e execução descentralizada do Sisnad
Art. 7º-A
Art. 8º
Seção II – Das Competências
Art. 8º-A
Cuidar sim, excluir não: a reforma psiquiátrica e a luta antimanicomial em favor da humanização da saúde mental
A contrarreforma psiquiátrica e a nova
política de drogas
Resolução n. 1/2015 do CONAD
Resolução Comissão Intergestores Tripartite – CIT n. 32/2017
Resolução n. 1/2018 do CONAD
Nota Técnica n. 11/2019 do Ministério da Saúde
Política Nacional de Drogas – PNAD (Decreto n. 9.761/2019)
Recomendação n. 23/19 do Conselho Nacional de Saúde
Recomendação n. 03/2019 do Conselho Nacional de Direitos Humanos
O cuidado em saúde mental e a contrarreforma psiquiátrica: posicionamento crítico da ABRASME
Nota da ABRASCO sobre as mudanças na Política Nacional de Saúde Mental e nas Diretrizes da Política Nacional sobre drogas
Moção de Repúdio à Nova Política Nacional sobre Drogas da ABRAMD
Nota de Repúdio à Nova Política Nacional sobre Drogas do Conselho Federal de Psicologia (CFP)
Nota Técnica do Conselho Federal de Serviço Social (CFF)
Nota de Repúdio ao desmonte na Rede de Cuidado a pessoas que usam drogas da Plataforma Brasileira de Política de Drogas (PBPD)
Art. 8º-B
Art. 8º-C
Capítulo II-A – Da formulação das políticas sobre drogas
Seção I – Do Plano Nacional de Políticas sobre Drogas
Art. 8º-D
Plano Nacional de Políticas sobre Drogas – Planad
Seção II – Dos Conselhos de Políticas sobre Drogas
Art. 8º-E
Conselhos de Políticas sobre Drogas
Seção III – Dos Membros dos Conselhos de Políticas sobre Drogas
Art. 8º-F
Capítulo III
Art. 9º
Art. 10
Art. 11
Art. 12
Art. 13
Art. 14
Capítulo IV – Do acompanhamento e da avaliação das políticas sobre drogas
Das métricas utilizadas para a avaliação das políticas sobre drogas
Art. 15
Art. 16
Comunicação de casos atendidos e óbitos ocorridos
Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD)
Sigilo médico-paciente
Art. 17
Dados estatísticos de repressão ao tráfico e sistema de informações do Poder Executivo
LGPD
TÍTULO III - DAS ATIVIDADES DE PREVENÇÃO DO USO INDEVIDO, ATENÇÃO E REINSERÇÃO SOCIAL DE USUÁRIOS E DEPENDENTES DE DROGAS
Capítulo I – Da prevenção
Seção I – Das Diretrizes
Art. 18
Os limites da prevenção no contexto da guerra às drogas
Art. 19
Uma política ética e efetiva para a prevenção do uso prejudicial de drogas
Esboço de agenda para uma política de prevenção
Políticas de prevenção pontuais de alta visibilidade e baixo impacto
Poder econômico e prevenção do uso prejudicial do álcool
Seção II – Da Semana Nacional de Políticas Sobre Drogas
Art. 19-A
Semana Nacional de Políticas Sobre Drogas
Apoie, não castigue (Support. Don’t Punish)
Capítulo II – Das atividades de prevenção, tratamento, acolhimento e de reinserção social e econômica de usuários ou dependentes de drogas
Seção I – Disposições Gerais
Art. 20
Os limites da atenção no contexto da guerra às drogas
A disputa em torno do modelo de cuidado a pessoas que fazem uso problemático de drogas
Art. 21
Reinserção social e redes sociais
Reabilitação psicossocial
Art. 22
Atividades de reinserção social/reabilitação psicossocial/inclusão social
Moradia em primeiro lugar (Housing First)
Seção II – Da Educação na Reinserção Social e Econômica
Art. 22-A
Programas de educação profissional e tecnológica, educação de jovens e adultos e alfabetização
Seção III – Do Trabalho na Reinserção Social e Econômica
Art. 22-B
Seção IV – Do Tratamento do Usuário ou Dependente de Drogas
Diretivas internacionais para o tratamento do uso problemático de drogas
Art. 23
Programas de atenção ao usuário e ao dependente de drogas no SUS/SUAS
Desfinancimento dos CAPS e sobrefinanciamento das CTs
Art. 23-A
Drogas, tratamento e direitos humanos
Instituições totais e a loucura como constructo social
Natureza jurídica da internação involuntária é de tratamento em saúde
Internação compulsória é espécie do gênero medida de segurança
Seção V – Do Tratamento do Usuário ou Dependente de Drogas
Art. 23-B
Atendimento na rede de atenção à saúde
Plano Individual de Atendimento – PIA
Art. 24
Benefícios a programas de reinserção no mercado de trabalho
Art. 25
Funad
ONGs com atuação nas áreas da atenção à saúde e da assistência social
Art. 26
Garantia aos serviços de atenção à saúde na execução da pena e da medida de segurança
Governo de SP corta recursos com saúde prisional em meio a pandemia
Preferência pelo tratamento ambulatorial nas medidas de segurança
Internação como medida de segurança somente em casos excepcionais
Seção VI – Do Acolhimento em Comunidade Terapêutica Acolhedora
Art. 26-A
A transformação moral e a reconstrução dos sujeitos em comunidades terapêuticas
O modelo de cuidado em comunidades terapêuticas
Natureza jurídica das comunidades terapêuticas
Gestão do tempo, rotinas, ressignificação do passado e projeção do futuro em comunidades terapêuticas
Parecer do Conselho Nacional de Assistência Social sobre Comunidades Terapêuticas
Adolescentes em comunidades terapêuticas
Nota de Repúdio às Portarias 690 e 700/2021 do Ministério da Cidadania, que regulamentam a internação de adolescentes em CTs
Capítulo III – Dos crimes e das penas
Art. 27
Despenalização
Aplicação isolada, cumulativa ou substitutiva das penas
Art. 28
Competência do Juizado Especial Criminal (JECRIM) para processo e julgamento
Transação e suspensão condicional do processo
Transação pressupõe análise prévia sobre existência de justa causa
Bem jurídico tutelado
Sujeito ativo
Sujeito passivo
Objeto material
Núcleos do tipo
Elemento subjetivo
Elemento normativo do tipo
Consumação e tentativa
Insignificância
Insignificância e crime militar
Erro de tipo e erro de proibição
Pequena quantidade (§ 1º, do art. 28)
Atipicidade do uso de drogas contemporâneo
Atipicidade do uso de drogas pretérito
Sanções alternativas à prisão
Advertência (art. 28, caput, I)
Prestação de serviços à comunidade (art. 28, caput, II)
Comparecimento à programa ou curso educativo (art. 28, caput, III)
Prazo de duração das medidas (§§ 3º e 4º do art. 28)
Retroatividade da lex mitior
Reincidência (§ 4º do art. 28)
Anterior condenação pelo art. 28 da Lei de Drogas não gera reincidência
Medidas coercitivas em caso de recusa injustificada (§ 6º, I e II, do art. 28)
Distinção entre posse para uso pessoal e tráfico de drogas (§ 2º do art. 28)
Modelos de design para diferenciar uso pessoal e tráfico
Critérios objetivos quantitativos para diferenciar uso pessoal e tráfico
Carta de São Paulo sobre o impacto da Lei de Drogas sobre os sistemas de justiça, penitenciário e saúde
Resolução Conjunta 01/2016 do CONAD e CNPCP422
Natureza e quantidade da droga apreendida
Capacidade produtiva do cultivo de Cannabis
Local e condições da ação
Circunstâncias sociais e pessoais
Conduta e antecedentes do agente
Aquisição compartilhada sem ânimo de lucro ou intento mercantil caracteriza o crime do art. 28, caput
Mero acompanhamento na compra de drogas é fato atípico
Laudo de constatação: prova da materialidade exige exame pericial
Uso de drogas e conduta social
O papel do Judiciário no cuidado às pessoas que usam drogas (§ 7º do art. 28)
Posse de drogas para uso pessoal no período de prova de sursis processual é causa facultativa de revogação
Posse de drogas para uso pessoal em estabelecimento prisional: rejeição da denúncia por falta de justa causa (inutilidade da pretensão acusatória)
Posse de drogas em estabelecimento prisional, falta grave e overruling
Uso pretérito durante execução penal não caracteriza falta grave
Inconstitucionalidade da incriminação da posse e/ou cultivo para uso pessoal: mínima intervenção e máxima garantia
Voto do Ministro Gilmar Mendes, relator do RE 635.659 (excertos)
Voto do Ministro Edson Fachin no RE 635.659 (excertos)
Ementa e tese do voto escrito do Ministro Luís Roberto Barroso no RE 635.659
Inconstitucionalidade da incriminação da posse para uso pessoal no Direito Comparado457
Tribunal Constitucional da África do Sul
Tribunal Federal Constitucional da Alemanha
Corte Suprema da Argentina
Tribunal de Arbitragem da Bélgica
Corte Suprema do Brasil
Corte Suprema do Canadá
Corte Suprema da Colômbia
Tribunal Constitucional da Geórgia
Tribunal Constitucional da Hungria
Suprema Corte do México
Art. 29
Critérios para aplicação da multa prevista no art. 28, § 6º, II, da Lei de Drogas (medida coercitiva)
Vinculação do salário mínimo para fins diversos daqueles previstos na Constituição
Destinação das penas pecuniárias ao Funad
Art. 30
Prescrição
Causas interruptivas
Idade do agente e prescrição
TÍTULO IV - DA REPRESSÃO À PRODUÇÃO NÃO AUTORIZADA E AO TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS
Capítulo I – Disposições gerais
Art. 31
Licença prévia da autoridade competente
Art. 32
Destruição de plantações ilícitas
Devido processo legal
Expropriação das glebas onde forem localizadas culturas ilegais
Não cabimento de expropriação de bem público
A expropriação pode ser afastada se o proprietário provar que não teve culpa
Capítulo II– Dos crimes
Art. 33
Saúde pública como objeto jurídico tutelado em todas as figuras típicas do art. 33: caput; § 1º, I a IV; § 2º; § 3º; e § 4º
Hediondez e tráfico de drogas
Prova da materialidade delitiva exige exame pericial (laudo de constatação)
Art. 33, caput: tráfico de drogas
Sujeito ativo
Sujeito passivo
Objeto material
Núcleos do tipo
Crime de ação múltipla
Elemento subjetivo
Elemento normativo do tipo
Norma penal em branco
Abolitio criminis
Coautoria ou participação
Erro de tipo ou de proibição
Consumação
Tentativa
Ação penal e competência
Pena
Quantidade e pena base
Desproporcionalidade da pena de multa
Hipossuficiência econômica e pena de multa
Art. 33, § 1º: tráfico de drogas por equiparação
Art. 33, § 1º, I: tráfico de matéria-prima, insumos ou produtos químicos destinados à preparação de drogas
Sujeito ativo
Sujeito passivo
Objeto material
Núcleos do tipo
Elemento subjetivo
Elemento normativo do tipo
Consumação e tentativa
Art. 33, § 1º, II: cultivo de plantas para tráfico de drogas
Sujeito ativo
Sujeito passivo
Objeto material
Núcleos do tipo
Elemento subjetivo
Elemento normativo
Consumação e tentativa
Plantio para uso terapêutico não caracteriza tráfico
Art. 33, § 1º, III: utilização de local para fins de tráfico
Sujeito ativo
Sujeito passivo
Objeto material
Núcleos do tipo
Elemento subjetivo
Abolitio criminis
Elemento normativo
Consumação e tentativa
Art. 33, § 1º, IV: venda de drogas a policial disfarçado
Sujeito ativo
Sujeito passivo
Objeto material
Núcleos do tipo
Presença de elementos probatórios razoáveis de conduta criminal preexistente
Elemento subjetivo
Elemento normativo do tipo
Consumação e tentativa
Atribuição para atuar como agente disfarçado é da Polícia Judiciária
Art. 33, § 2º: participação no uso indevido de drogas
Suspensão condicional do processo
Não hediondez
Sujeito ativo
Sujeito passivo
Objeto material
Núcleos do tipo
Elemento subjetivo
Consumação e tentativa
Informar sobre drogas e estratégias de redução de danos não caracteriza crime
Participação no uso indevido e Marcha da Maconha
Instigação ou indução e uso de roupas com imagem ou mensagem sobre drogas
Art. 33, § 3º: oferta de droga para consumo compartilhado eventual e gratuito
Transação penal
Suspensão condicional do processo
Não hediondez
Sujeito ativo
Sujeito passivo
Núcleo do tipo
Elemento subjetivo
Consumação e tentativa
Distinção entre tráfico de drogas e oferta para consumo compartilhado eventual e gratuito
Abolitio criminis
Sob a égide da lei anterior
Retroatividade do § 3º
Art. 33, § 4º: causa de diminuição de pena (tráfico privilegiado
)
Não hediondez do art. 33, § 4º, da Lei de Drogas
Requisitos do redutor
Redutor e pertencimento a organização criminosa: exigência de prova concreta
A mera quantidade de droga, por si só, não legitima o afastamento do redutor
Redutor e quantidade de droga: menor potencial lesivo da maconha para causar dependência e danos à saúde pública
Redutor, natureza, quantidade e ne bis in idem
Redutor e diversidade de drogas
Redutor e poder de lesividade da substância
Redutor e consequências ínsitas ao crime
Redutor e inquéritos ou ações penais em andamento: cabimento
Redutor e atos infracionais pretéritos: cabimento
Redutor e condenação pretérita a pena de multa: cabimento
Redutor e condenação anterior por crime diverso do previsto no art. 33 da Lei de Drogas: cabimento
Redutor e acordo de não persecução penal
Redutor e posse/porte de arma de fogo
Redutor e a função de mula
do tráfico: possibilidade
Quantum da redução
Redutor e penas restritivas de direitos
Redutor e regime prisional diverso do fechado
Redutor e indulto
Redutor e analogia: aplicação do redutor para outros crimes da Lei de Drogas
O papel do Ministério Público na aplicação da Lei de Drogas
Presunção de inocência e ônus da prova
Interpretação conforme a Constituição: tráfico de drogas pressupõe, de forma implícita, finalidade diversa do consumo pessoal
Proposta de Súmula Vinculante ao STF (CF, art. 103-A, caput e §§)
Entregar a consumo ou fornecer drogas ainda que gratuitamente: atipicidade
Fundada suspeita, racismo estrutural e busca pessoal
Exigência de justa causa, baseada em dado concreto, para busca pessoal e veicular
Guardas Municipais não possuem competência para realizar abordagens e revistas em suspeitos de portar ou traficar drogas
Relaxamento da prisão em flagrante por ausência de fundada suspeita para busca pessoal
Direito ao silêncio e indispensabilidade do aviso de Miranda na abordagem policial
Ordem judicial prévia é requisito de validade da busca domiciliar
A insuficiência da denúncia anônima
Prova obtida pelo espelhamento de conversas via WhatsApp Web, mesmo que tenha havido autorização judicial prévia, é ilícita
Insignificância e tráfico
Atos preparatórios não são puníveis por atipicidade
Desnecessidade de aferição do grau de pureza
Laudo de Constatação
Importação de pequena quantidade de semente de Cannabis: atipicidade
Droga remetida do exterior pela via postal: competência da Justiça Federal do local do destino
Mulheres grávidas e com filhos menores de 12 anos acusadas de tráfico têm direito à prisão domiciliar em substituição à preventiva
Ato infracional análogo ao tráfico e medidas alternativas à internação: cabimento
Ato infracional diverso do tráfico de drogas não serve para afastar minorante
Liberdade provisória e tráfico
Quantidade, por si só, não justifica a prisão preventiva
Sursis e tráfico
Ser o réu andarilho não justifica a prisão preventiva
Não hediondez do tráfico de drogas para fins de progressão de regime prisional
Art. 34
Tráfico de maquinários para fabricação de drogas
Sujeito ativo
Sujeito passivo
Objeto material
Bem jurídico
Núcleos do tipo
Elemento subjetivo
Elemento normativo do tipo
Consumação e tentativa
Pena
Ação penal
Necessidade de comprovação da destinação: ônus da acusação
Necessidade de prova pericial
Objetos materiais destinados exclusivamente a consumo pessoal: fato atípico
Posse de esmurrugador é fato atípico
Excepcionalidade da punição de atos meramente preparatórios
Inconstitucionalidade
Consunção
Autonomia e subsidiariedade do delito
Confronto com o art. 28 da Lei de Drogas
Prova de destinação ao tráfico é indispensável
Art. 35
Associação para fins de tráfico
Sujeito ativo
Sujeito passivo
Bem jurídico
Objeto material
Núcleo do tipo
Elemento subjetivo
Consumação e tentativa
Pena
Ação penal
Cúmulo material entre os crimes de tráfico e associação
A busca por lucro fácil não justifica o aumento da pena base
Associação para o tráfico e a impunidade dos atos meramente preparatórios
Estabilidade e permanência
Associação para a prática reiterada do crime definido no art. 36 da Lei de Drogas (art. 35, parágrafo único) exige habitualidade, além da estabilidade e permanência
Coautoria não se confunde com associação
Não hediondez, progressão de regime e comutação/indulto
Local dominado por facção não evidencia vínculo estável e permanente
Retroatividade benéfica
Art. 36
Financiamento ou custeio ao tráfico de drogas
Sujeito ativo
Sujeito passivo
Bem jurídico
Objeto material
Núcleos do tipo
Elemento subjetivo
Consumação e tentativa
Pena
Ação penal
Autonomia do financiamento em relação ao crime de tráfico de drogas e conflito aparente de normas
Necessária prova da habitualidade
Indispensabilidade da prova de materialidade dos crimes dos arts. 33, caput e § 1º, e 34, da Lei de Drogas
Art. 37
Colaboração como informante
Sujeito ativo
Sujeito passivo
Bem jurídico
Objeto material
Núcleos do tipo
Grupo, organização e associação
Elemento subjetivo
Consumação e tentativa
Pena
Ação penal
Delito subsidiário
Informação repassada pelo sujeito ativo deve ser relevante, sob pena de atipicidade
Colaboração como informante de um único traficante: atipicidade
Retroatividade
Art. 38
Art. 38: prescrição ou ministração culposa
Sujeito ativo
Sujeito passivo
Bem jurídico
Objeto material
Núcleos do tipo
Elemento subjetivo
Consumação e tentativa
Pena
Transação penal
Suspensão condicional do processo
Ação penal
Comunicação judicial ao Conselho Federal da categoria profissional
Art. 39
Condução de embarcação ou aeronave sob a influência de drogas
Suspensão condicional do processo
Sujeito ativo
Sujeito passivo
Bem jurídico
Objeto material
Núcleos do tipo
Elemento subjetivo
Consumação e tentativa
Pena
Suspensão condicional do processo
Penas restritivas de direitos não substitutivas
Apreensão da embarcação
Cassação da habilitação respectiva ou proibição de obtê-la
Ação penal
Forma qualificada
Prova do uso pretérito de drogas e ônus da prova
Competência
Art. 40
Causas de aumento de pena
Rol taxativo
Exigência de motivação concreta
Abolitio criminis
Retroatividade da lei mais benéfica
Prova da internacionalidade ou interestadualidade
Aplicação cumulativa da transnacionalidade e interestadualidade
Interestadualidade e quantum de aumento
Transnacionalidade e consequências do crime
Transnacionalidade e bis in idem
Causa de aumento do art. 40, VI, da Lei de Drogas e art. 244-B do ECA: bis in idem e conflito aparente de normas
Mera presença de criança ou adolescente no contexto delitivo não justifica a majorante
Crime praticado com violência, grave ameaça, emprego de arma de fogo ou qualquer processo de intimidação difusa ou coletiva
Locus delicti e aumento da pena: interpretação teleológica
O mero uso de transporte público não faz incidir a majorante
Encomenda postal contendo drogas com indicação de destinatário por terceiros de má-fé
Remessa de droga do exterior por via postal e competência
Inaplicabilidade da majorante quando a droga foi apreendida no interior de residência
Crime cometido nas dependências de estabelecimento prisional
Financiamento ou custeio
Art. 41
Colaboração premiada na Lei de Drogas
Regra da corroboração
Prisão em flagrante por tráfico após entrada de policiais em residência sem mandado judicial com autorização do morador
Aplicação simultânea da colaboração premiada e confissão espontânea
Direito do réu delatado ao contraditório e ampla defesa plenos
Incomunicabilidade da minorante em razão da delação premiada
Art. 42
Fixação da pena privativa de liberdade
Dosimetria da pena, natureza e quantidade
Natureza, quantidade e bis in idem
Inquéritos e ações penais em curso não podem agravar a pena base
Exacerbação indevida da pena por falta de motivação idônea
Confissão
Regime prisional
Desnecessidade de aferição do grau de pureza ou potencial lesivo da droga
Art. 43
Fixação da pena de multa
Valor do salário mínimo na data do fato
A disparidade econômica e a individualização da pena de multa
Possibilidade de pagamento parcelado do valor da multa
Art. 44
Interpretação restritiva das vedações
Desmedido rigor penal
Inconstitucionalidade da vedação da conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos
Tráfico, prisão e liberdade
Possibilidade de concessão de liberdade provisória ou decretação de medidas cautelares diversas da prisão (CPP, art. 319) em situações de inafiançabilidade
Indicação das elementares do delito não configura fundamentação idônea
Recomendação 62 do CNJ e a pandemia do novo coronavírus
Vedação à graça, anistia e indulto
Art. 45
Inimputabilidade em razão da dependência, caso fortuito ou força maior
Tratamento no âmbito da medida de segurança
Art. 46
Semi-imputabilidade
Art. 47
Encaminhamento do agente para tratamento
Competência privativa para aferir a necessidade de tratamento
Capítulo III – Do procedimento penal
Art. 48
Procedimento comum sumaríssimo
Sistema acusatório e interpretação conforme a Constituição
Art. 49
Aplicação dos instrumentos protetivos de colaboradores e testemunhas
Seção I – Da Investigação
Art. 50
Prisão em flagrante deve ser imediatamente comunicada ao juiz competente
Audiência de custódia
Impossibilidade de decretação de prisão preventiva de ofício pelo juiz
Obrigatoriedade da nomeação de defensor logo após a prisão em flagrante
Prova da materialidade delitiva exige exame toxicológico definitivo
Quebra da cadeia de custódia da prova: ausência de materialidade
Laudo de constatação e exame toxicológico
Indispensabilidade de verificação pericial do sexo da planta Cannabis
Destruição de drogas apreendidas por ocasião da prisão em flagrante
Art. 50-A
Destruição de drogas apreendidas sem a ocorrência de prisão em flagrante
Art. 51
Prazo para a conclusão do inquérito policial
Direito de defesa no inquérito policial
Direito de ser ouvido na fase pré-processual
Art. 52
Remessa do inquérito policial a Juízo
Art. 53
Juiz como garante da legalidade de todas as fases da persecução criminal
Juiz que atua na fase pré-processual não pode ser o mesmo a presidir a ação penal
Denúncia anônima
Infiltração de agentes
Flagrante diferido (ação controlada)
Itinerário provável
Seção II – Da Instrução Criminal
Art. 54
Opinio delicti do dominus litis
Oferecimento de denúncia
Art. 55
O procedimento da lei especial prevalece sobre o da lei geral
Defesa preliminar
Exceções
Diligências complementares de ofício
Art. 56
Rejeição da denúncia (CPP, art. 395)
Absolvição sumária (CPP, art. 397)
Recebimento da denúncia
Desclassificação na fase do recebimento da denúncia
Suspensão condicional do processo
Afastamento cautelar do denunciado funcionário público
Art. 57
Momento processual do interrogatório
Paridade de armas entre acusação e defesa
Art. 58
Valor probatório do depoimento policial
Sentença
Art. 59
Direito de recorrer em liberdade
Capítulo IV – Da apreensão, arrecadação e destinação de bens do acusado
Art. 60
Medidas assecuratórias
Prova da origem lícita
Veículo apreendido em transporte de droga
Art. 60-A
Conversão em moeda nacional de moeda estrangeira, títulos, valores mobiliários ou cheques
Art. 61
Apreensão de veículos, embarcações e aeronaves e o terceiro de boa-fé
Alienação antecipada de bens apreendidos
Art. 62
Utilização de bens apreendidos por interesse público
Art. 62-A
Depósitos do produto da alienação de bens apreendidos ou numerário apreendido ou convertido
Art. 63
Destinação dos bens apreendidos
Art. 63-A
Exigência de comparecimento pessoal do acusado em sede de pedido de restituição
Art. 63-B
Liberação dos bens apreendidos quando comprovada a origem lícita
Art. 63-C
Destinação dos bens apreendidos e não leiloados em caráter cautelar
Art. 63-D
Portaria n. 1, de 10/01/2020, da Senad/MJSP
Art. 63-E
Produto da alienação dos bens apreendidos e confiscados será revertido integralmente ao Funad
Art. 63-F
Perda alargada (confisco alargado)
Inconstitucionalidade
Art. 64
Convênios da Senad com estados, DF e organizações sociais para liberação de equipamentos e recursos
TÍTULO V - DA COOPERAÇÃO INTERNACIONAL
Art. 65
Cooperação internacional
Intercâmbio de informações sobre prevenção do uso indevido e de inteligência policial e judicial
TÍTULO V-A - DO FINANCIAMENTO DAS POLÍTICAS SOBRE DROGAS
Art. 65-A
TÍTULO VI - DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS
Art. 66
Conceito de drogas
Art. 67
Liberação de recursos em convênios com a União
Art. 67-A
Fiscalização de entidades que recebem recursos públicos para execução das políticas sobre drogas
Art. 68
Estímulos fiscais e outros para pessoas físicas e jurídicas
Art. 69
Falência ou liquidação extrajudicial
Art. 70
Competência
Art. 71
Art. 72
Destruição das amostras guardadas para contraprova
Art. 73
Convênios entre a União e demais entes federativos
Art. 74
Vacatio legis
Art. 75
Revogação expressa da Lei n. 6.368/1976 e da Lei n. 10.409/2002
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Lista de abreviaturas e siglas
Lista de figuras
AGRADECIMENTOS
Este livro é fruto de um longo aprendizado, possível graças à empatia e à generosidade de pessoas que dedicam as suas vidas a construir uma nova política de drogas centrada no respeito aos direitos humanos e em evidências. A todas elas – e são muitas –, a minha gratidão.
Homenageio a memória de Antonio Lancetti, André Kiepper, Elisaldo Carlini, Maria Antonia Goulart, Marcus Matraga e Padre Ticão, camaradas com quem tive a alegria de conviver e aprender.
Agradeço, muito especialmente, a: Andre Kehdi, Alexandre Morais da Rosa, Allyne Andrade, André Feiges, Andrea Gallassi, Bia Labate, Bruno Shimizu, Camila Magalhães, Carla Silene, Carol Diniz, Carol Godefreud, Cecília Galício, Celi Cavallari, Cidinha Carvalho, Cristina Vicentin, Daniel Nicory, Dartiu Xavier, Dayana Rosa, Debora Medeiros, Denis Burgiermann, Denis Petuco, Dina Alves, Diogo Busse, Douglas Calixto, Dudu Ribeiro, Edson Baldan, Eleonora Nacif, Emílio Figueiredo, Estela Aranha, Fernanda Balera, Francisco Netto, Frederico Almeida, Gabriel Elias, Gabriel Queiroz, Gabriela Barros de Luca, Gabriella Arima, Haroldo Caetano da Silva, Helios Moyano, Heloisa Dantas, Henrique Apolinário, Henrique Carneiro, Jacqueline Sinhoretto, Jamil Murad, Jacson Zilio, João Telésforo, José Henrique Torres, José Marcos Lunardelli, Julita Lemgruber, Konstantin Gerber, Leon Garcia, Luciana Boiteux, Luis Fernando Tofoli, Luis Carlos Valois, Luis Guilherme Paiva, Manoela Abreu, Maria Alice Polo Araújo, Maria Angelica Comis, Mariana Berger, Mariangela Magalhães, Marilene Felinto, Mateus Moro, Maurício Fiore, Maurides Ribeiro, Mauro Aranha, Miriam Abou Yd, Nathalia Oliveira, Octávio Ferraz, Orlando Zacconne, Paulo Faria, Paulo Mattos, Paulo Pereira, Paulo Teixeira, Poliana Ferreira, Priscila Beltrame, Raquel Schramm, Raull Santiago, Renato Filev, Renato Stanziola Vieira, Ricardo Nemer, Roberto Corcioli, Roberto Tykanori, Roberto Seracinskis, Sacha Dark, Sheila de Carvalho, Sidarta Ribeiro, Silvia Cazenave, Sílvio Almeida, Thiago Bottino e Vera da Ros.
Um salve para meus companheiros de JUSTA,¹ Caroline Oliveira, Erika Lula de Medeiros, Felipe Freitas, Jean Peres, Luciana Zaffalon, Poliana Ferreira, Ricardo Cappi e Vanessa de Jesus.
Um agradecimento muito especial a Felipe Freitas, que contribuiu com críticas e sugestões que enriqueceram o livro.
Não posso deixar de mencionar a Rede Jurídica pela Reforma da Política de Drogas, que congrega advogadas, advogados e advogades com talento, coragem e visão política na vanguarda antiproibicionista. É uma grande alegria fazer parte do time que faz avançar, ainda que a passos de cágado, a política de drogas no Brasil.
Sou grato pelo auxílio de Alison Milan (tradução) e Flávia Hashimoto (gráficos, tabelas e imagens).
Aos meus sócios, Carlos Mendes e Marco Stein, com quem compartilho a trincheira da advocacia criminal, suas aventuras e desventuras, há quase 20 anos: estar ao lado de vocês me transformou em um advogado melhor.
Os erros são de responsabilidade exclusiva do autor.
Muito obrigado aos amigos Rafael Valim e Gustavo Marinho, da Editora Contracorrente, que acolheram a ideia de publicação do livro com a magnanimidade que os caracteriza.
À Luciana Zaffalon, minha companheira de vida e parceira de lutas, em cujos olhos enxergo o reflexo da melhor versão de mim mesmo: obrigado por todo o apoio, incentivo, carinho e afeto. Obrigado por me mostrar que o amor pode ser revolucionário. Que a nossa partilha siga frutificando.
Aos meus amados filhos, Cecília, Antonio e João, e aos meus pais, Maria Lúcia e Nicolangelo (in memorian), todo o meu amor.
1 Think tank que pesquisa a economia política da Justiça (justa.org.br).
APRESENTAÇÃO
Saúde, justiça, economia, segurança, vínculos afetivos e encarceramento são apenas algumas das áreas transversalmente atravessadas pela aplicação da Lei de Drogas, forjada, especialmente no Brasil e na América Latina, por vieses raciais, de gênero e socioeconômicos indissociáveis de seus tão evidentes quanto devastadores efeitos.
Repensar o Brasil de forma séria, honesta e comprometida com um futuro mais digno e justo passa, necessariamente, por repensar a aplicação da Lei de Drogas. E é precisamente este o compromisso que Cristiano Maronna assume ao lançar este livro, que tenho a honra de apresentar e que se dedica de maneira inovadora a organizar e tornar acessível ao público novas perspectivas que não só podem como precisam ser conhecidas e consideradas nas tomadas de decisão relacionadas ao uso de substâncias.
São diversas e de inestimável valor as contribuições que Cristiano Maronna concretiza com a publicação desta necessária obra. Trabalho de fôlego, que de forma brilhante e muito bem-vinda se afasta do padrão dos dogmáticos manuais jurídicos, sempre tão herméticos e ancorados em reproduções acríticas de um saber monolítico.
Maronna se dedica ao avesso dessa perspectiva. Abre-se ao que de mais atual há nos campos científicos, sociais e econômicos, em âmbito nacional e internacional, para repensar os modelos jurídicos estabelecidos e propor caminhos mais humanos e responsáveis nas tomadas de decisão relacionadas a drogas.
A publicação deste novo instrumental jurídico, que organiza o que de mais avançado se observa em termos doutrinários e jurisprudenciais, que busca facilitar a aplicação da Lei de Drogas com foco na liberdade, já é revolucionária por si, à medida que se contrapõe ao encarceramento e à internação em massa de nossas populações mais vulneráveis – em um contexto de tranquila naturalização do confinamento como resposta estatal prioritária para lidar com os sintomas de nossas principais mazelas sociais, econômicas, raciais e de saúde.
Este livro propõe diálogos, convida à construção de novos consensos, comprometidos com a efetiva proteção às diferentes dimensões dos direitos humanos. Mas essas estão longe de ser as únicas contribuições da obra.
Outro grande aporte da publicação é a aproximação entre a saúde e a justiça, unindo saberes e propondo novos paradigmas para a aplicação da Lei de Drogas, ancorados nas mais atuais evidências científicas.
As decisões tomadas pela justiça envolvem enorme responsabilidade. Transformam radicalmente as vidas das pessoas, afetam nossa organização social e impactam nossa experiência democrática de maneira determinante.
O mesmo acontece com profissionais da área médica. O campo da saúde, contudo, goza de maior acesso a evidências científicas sobre sofrimento, sobre dependência e sobre drogas – saberes extremamente úteis às tomadas de decisão também da Justiça.
Trata-se de conhecimento que chega antes, muito antes, à área médica e de que devem se valer também os operadores do Direito comprometidos com a efetivação substantiva da Justiça. Maronna contribui sobremaneira com o campo ao sistematizar esses conhecimentos e disponibilizá-los em um manual jurídico que revisita a Lei de Drogas, artigo a artigo, propondo uma interpretação conforme a Constituição Federal.
Lei de Drogas interpretada na perspectiva da liberdade é um livro genial também pela singeleza, generosidade e clareza do olhar de seu autor: no Direito, assim como na Medicina, há que se buscar ajudar e não causar mais dor para as pessoas que enfrentam sofrimentos. Se quem serve à saúde, deve, antes de tudo, tomar muito cuidado para não causar dano, o mesmo precisa ocorrer com quem serve à Justiça.
Há que se afastar a ortopedia moral, expressão precisa cunhada pelo autor do livro, da aplicação da Lei de Drogas para que as decisões passem a ser baseadas em evidências científicas, em pesquisas e nos avanços civilizatórios experimentados ao redor do mundo – e ainda desconhecidos do meio jurídico brasileiro.
Não há como falar do livro Lei de Drogas interpretada na perspectiva da liberdade sem tratar de outro elemento caro à sua natureza inovadora – a trajetória de seu autor e sua dedicação à sistematização e ao compartilhamento de saberes coletivamente construídos ao longo da última década. O denso trabalho de elaboração deste livro se configura também como registro histórico do resultado do trabalho de diversas organizações, ativistas e pesquisadores que têm, assim como Maronna, dedicado suas existências à construção de novos paradigmas no campo das drogas, no Brasil e no mundo.
Cristiano Maronna é advogado, mestre e doutor em Direito Penal pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, integrou a diretoria do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, o IBCCRIM, por 10 anos, tendo, depois disso, exercido a presidência e integrado o Conselho Consultivo do mesmo Instituto. Foi Conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo, integra Comissões da mesma OAB/SP há anos, dentre outros conselhos jurídicos e de direitos em diferentes esferas de governo, assim como protagonizou inúmeras representações internacionais e produziu diversas publicações jurídicas.
O bem-sucedido trafegar nos meios jurídicos e acadêmicos, contudo, não fez serenar a vontade de aprender, não levou a desviar o olhar das injustiças que mobilizam a urgência na busca por novos caminhos, não tornou menos voraz a ousadia e a disposição para o bom combate.
A vivacidade política, intelectual e jurídica de Cristiano, aliadas a um profundo compromisso com a busca por justiça e a uma extraordinária capacidade de aprendizado e realização, levaram o autor desta obra a seguir buscando, a seguir ousando e construindo. E foi nessa caminhada que Maronna, ao lado de tão valiosos quanto diversos parceiros e parceiras, criou a Plataforma Brasileira de Políticas de Drogas, a PBPD.
Cristiano participou ativamente da criação da PBPD em 2013. Foi Secretário Executivo e esteve, até 2021, à frente da gestão dessa rede de mais de 60 organizações não governamentais, coletivos e especialistas de diversos campos de atuação, que busca debater e promover políticas de drogas fundamentadas na garantia dos direitos humanos, em evidências científicas e na redução dos danos produzidos pelo uso problemático de drogas e pela violência associada à ilegalidade de sua circulação.
A riqueza deste livro também é fruto dessa caminhada. E seu caráter inovador decorre da rara oportunidade que ele proporciona: a de refletir sobre uma realidade complexa a partir não apenas dos saberes ortodoxos, mas também das ricas e profundas reflexões produzidas por movimentos e organizações sociais que atuam no campo.
A partir de 2021, Cristiano Maronna passou a se dedicar à escrita deste livro e também a compor a Diretoria da Plataforma JUSTA, que atua no campo da economia política da justiça, unindo diferentes áreas do conhecimento, como Direito, economia, gestão pública, comunicação e tecnologia, para tratar de temas caros à gestão e ao financiamento do sistema de justiça, apoiando a transparência e o controle social do exercício do poder.
Lei de Drogas interpretada na perspectiva da liberdade é lançada pela Editora Contracorrente, que se compromete com um projeto editorial avesso às simplificações que contaminam a produção literária, em parceria com a Plataforma JUSTA, renovando o caráter agregador e inovador que marca o livro desde sua concepção.
O autor se propõe a oferecer aos operadores do Direito, em especial advogados e defensores públicos, uma ferramenta capaz de fortalecer o direito de defesa, a partir de instrumental doutrinário e jurisprudencial que facilita a aplicação da Lei de Drogas com foco na liberdade. Já eu espero que este livro rompa as fronteiras da defesa e seja incorporado também pelas escolas de formação das polícias, do Ministério Público e da Magistratura.
Já é possível saber hoje que a guerra às drogas será substituída por outro design regulatório. Não se trata mais de cogitar se essa mudança vai acontecer, mas quando e como. A obra de Cristiano Maronna confere ao debate jurídico brasileiro a oportunidade de se reposicionar, conhecendo os movimentos globais que estão em pleno voo.
LUCIANA ZAFFALON
INTRODUÇÃO
Este é um livro que eu gostaria de não ter escrito. Substâncias psicoativas não deviam ser proibidas, mas reguladas e controladas, e ninguém devia ser preso por usar ou mesmo por vender drogas. A abordagem correta dessa questão, a meu ver, passa pelo abandono do paradigma repressivo e pela adoção de uma perspectiva interdisciplinar baseada em evidências científicas, que seja capaz de assegurar a saúde, os direitos humanos e a redução de danos.
A atual realidade brasileira faz crer que os ventos da mudança que sopram alhures tão cedo não chegam a estas plagas, o que reforça a necessidade de circunscrever o âmbito de incidência da atual Lei de Drogas a partir de uma interpretação conforme a Constituição – mínima intervenção/máxima garantia.
Este não é um livro neutro, escrito por um observador desinteressado, um mero espectador imparcial. E nem poderia ser. Neutralidade ideológica é uma impossibilidade matemática. O Direito não é neutro, e Roberto Lyra Filho deixou isso muito claro:
Direito é desenganadamente política, e a questão não é ser político ou não sê-lo, pois não sê-lo é um disfarce que adota a opção política de natureza conservadora – isto é, não quer que o estudante ou professor façam política
, porque esperam que eles se acomodem docilmente à política oficial, que já traçou a função e a maneira de exercê-la: o Estado é o autor da peça; o dirigente da Faculdade é o produtor e diretor do espetáculo; e a nós cumpriria apenas desempenhar o papel que nos foi distribuído, sem contestar
.²
Este livro tem lado: o lado da liberdade. De uma liberdade que inclui o direito de usar substâncias psicoativas, o direito às drogas³ e ao prazer proporcionado por elas.
Pessoas adultas e capazes têm direito à autogestão farmacológica. Usar drogas se insere no direito de buscar a felicidade,⁴ o direito de criar o seu próprio roteiro de vida, ainda que a ideia, para a maioria, possa ser eventualmente considerada estranha, extravagante, inaceitável ou perigosa
.⁵
O lado da advocacia e da Defensoria Pública – a trincheira da defesa da liberdade –, em contraposição ao abusivo exercício do poder punitivo estatal, cuja feição mais voraz se revela no Direito Penal das drogas.
O lado da magistratura garantidora de direitos, a qual, com imensa coragem, aplica a Constituição, mesmo quando favorece alguém acusado ou condenado por tráfico de drogas. O papel dos juízes não é o de combater o crime, mas o de garantir a intangibilidade dos direitos fundamentais.
A independência judicial, contudo, é reiteradamente violada no Brasil em nome da guerra às drogas. Há muitos casos de perseguição em razão do livre exercício da jurisdição,⁶ como o do magistrado punido com censura por realizar o controle da legalidade na atividade policial em flagrante de tráfico de drogas, sob o fundamento de que julgava movido por razões de ordem ideológica, curiosamente vinculadas à ideia de garantismo
.⁷ Ou o episódio em que o Supremo Tribunal Federal fixou entendimento de que a ausência da reavaliação da prisão preventiva no prazo de 90 dias não implica a revogação automática da custódia, contrariando a literalidade do texto legal porque o beneficiário seria traficante.⁸
Da primeira instância à mais alta Corte, o Direito Penal das drogas situa-se em um Estado de não Direito
, no qual as garantias penais e processuais penais clássicas são postas em uma espécie de coma induzido. Os melhores fins justificariam quaisquer meios.
A resistência das Cortes de segundo grau em respeitar os precedentes dos Tribunais Superiores em matéria de tráfico privilegiado⁹ é exemplo de interpretação retrospectiva que traduz o novo contexto legislativo com o olhar do velho, enclausurando qualquer possibilidade de mudança
.¹⁰ Millôr profetizou: o Brasil tem um enorme passado pela frente.
O lado das vítimas da guerra às drogas, dos mortos pela letalidade policial,¹¹ dos encarcerados em decorrência da presunção de tráfico mesmo diante da ausência de prova de intenção mercantil, dos usuários que são perseguidos, criminalizados, estigmatizados e submetidos a cuidados inadequados, entre outras violações de direitos humanos. A esse propósito, chama a atenção a ressurreição de práticas no campo da saúde mental, banidas pela reforma psiquiátrica, em direção ao populismo manicomial
.¹²
Busca-se, enfim, oferecer aos operadores do Direito, em especial aos advogados e defensores públicos, uma ferramenta capaz de fortalecer o direito de defesa, a partir de instrumental doutrinário e jurisprudencial com foco na liberdade. Uma proposta que visa uniformizar a interpretação da Lei de Drogas de modo a impedir, ou ao menos restringir, os arreganhos autoritários rotineiramente praticados em nome da war on drugs. Uma interpretação que garanta o maior espaço possível de liberdade dentro do marco constitucional e que sirva de parâmetro para julgamentos posteriores de casos semelhantes.
Este não é um livro neutro. Seu propósito é reduzir os danos que a política criminal bélica produz na interpretação da Lei de Drogas. É um (anti)manual de guerrilha jurídica em favor de pessoas acusadas por crimes previstos na Lei de Drogas. Um analgésico para tratar a doença causada pelo proibicionismo e instrumentalizada pela fúria repressiva do Direito Penal, enquanto a legalização não chega.
São Paulo, primavera de 2022.
2 LYRA FILHO, Roberto. Por que estudar Direito hoje? Brasília: Nair, 1984, p. 27.
3 SZASZ, Thomas. Nuestro derecho a las drogas. Trad. de Antonio Escohotado. Barcelona: Compactos Anagrama, 2001; ESCOHOTADO, Antonio. Historia General de las drogas. Madri: Alianza, 1998.
4 HART, Carl. Drogas para adultos. Trad. Pedro Maia Soares. Rio de Janeiro: Zahar, 2021.
5 STF, ADPF n. 187, rel. Celso de Mello, j. 15.06.2011.
6 Relatório sobre a situação da independência judicial e da liberdade de expressão dos juízes no Brasil, apresentado pela Associação Juízes para a Democracia (AJD).
7 KEHDI, Andre P. de Andrade. A cruzada do Tribunal de Justiça de São Paulo contra o garantismo penal
. Conjur, 13 maio 2021. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2021-mai-13/andre-kehdi-cruzada-tj-sp-garantismo-penal. Acessado em: 22.06.2022.
8 CPP, art. 316, parágrafo único. Decretada a prisão preventiva, deverá o órgão emissor da decisão revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90 (noventa) dias, mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal
.
9 CONECTAS. Prisão a qualquer custo: como o sistema de Justiça descumpre decisão do STF sobre penas para pequenos traficantes. São Paulo: Conectas Direitos Humanos, 2019. Disponível em: https://www.conectas.org/wp-content/uploads/2019/11/conectas_trafico_privilegiado_sumario_executivo_A4_FINAL_baixa-1.pdf. Acessado em: 15.09.2021.
10 CARVALHO, Salo de. A política criminal de drogas no Brasil: estudo criminológico e dogmático da Lei n. 11.343/06. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 273.
11 FERREIRA, Poliana da Silva. Justiça e letalidade policial: responsabilização jurídica e imunização da polícia que mata. São Paulo: Jandaíra, 2021.
12 CAETANO, Haroldo. O populismo manicomial na política de drogas
. Boletim IBCCRIM, nº 286, set. 2016, pp. 19/20.
TÍTULO I
DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Art. 1º. Esta Lei institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas – Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas e define crimes.
Parágrafo único. Para fins desta Lei, consideram-se como drogas as substâncias ou os produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União.
Estereótipos raciais e a interpretação da Lei de Drogas
Estereótipos raciais e as práticas de seletividade racial impactam diretamente na aplicação da Lei de Drogas, em especial no estabelecimento da distinção entre consumo pessoal e tráfico, na caracterização da fundada suspeita e na construção das narrativas policiais.
O estereótipo funciona como uma marca que acompanha membros de um determinado grupo, os quais deixam de ser vistos por suas qualidades e passam a ser julgados pela etiqueta adscrita, recebendo, então, tratamento em função desse processo de rotulação.¹³
A seletividade racial, por sua vez, atua como recurso dos agentes da lei, da segurança e do controle de fronteira baseado na raça, na cor da pele, na ascendência e na origem nacional ou étnica como justificativa para submeter pessoas a registros detalhados, controles de identidade e investigações, ou para determinar responsáveis por atividades delitivas
.¹⁴
"Ao tratar de seletividade penal racial, falamos sobre como os processos de criminalização concentram-se sobre determinados grupos (negras e negros especialmente, no caso brasileiro), consubstanciada não apenas em uma maior vigilância sobre essas parcelas da população, como também a partir da produção de decisões mais desfavoráveis aos membros desses grupos. Trata-se de um processo amplo de práticas discriminatórias contra pessoas com determinadas características associadas a estereótipos dos descendentes de africanos e que relacionam o perfil físico das pessoas à maior ou menor propensão ao cometimento de crimes.
O conceito de seletividade racial foi formulado a partir das denúncias dos movimentos sociais negros em diferentes regiões do mundo, que apontavam o comportamento desigual do Estado na aplicação da lei perante grupos raciais discriminados. O aspecto central ressaltado historicamente pelos movimentos negros, e por outros movimentos de luta contra o racismo e a discriminação racial, é o de que as características físicas de pessoas ou grupos são utilizadas sistematicamente pelos órgãos de aplicação da lei como critérios arbitrários de seleção daqueles que passarão por revistas, investigações e controles de identidade, ou para determinar critérios de quem é considerado suspeito pelas autoridades policiais.
Segundo as Nações Unidas, a seletividade racial é o recurso dos agentes da lei, da segurança e do controle de fronteira baseado na raça, na cor da pele, na ascendência e na origem nacional ou étnica como justificativa para submeter pessoas a registros detalhados, controles de identidade e investigações, ou para determinar responsáveis por atividades delitivas. No caso do Brasil, a seletividade racial contra pessoas negras é a causa de uma sobrerrepresentação desse grupo entre aqueles que são mais abordados pela polícia, que passam por mais intensos e recorrentes processos de revista ao passarem por espaços públicos, posicionando este grupo, ainda, entre as principais vítimas em casos de letalidade policial e de encarceramento. Do ponto de vista da privação de liberdade, por exemplo, dados divulgados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública revelam que, em 15 anos, a proporção de negros no sistema carcerário cresceu 14%, enquanto a de brancos diminuiu 19%, e que, em 2021, de cada três presos no país, dois eram negros".¹⁵
"No caso da seletividade penal espacial, é possível observar que os processos de criminalização não ocorrem de maneira uniforme pelo espaço urbano, pelo contrário, o sistema penal incide de forma extremamente desigual, atingindo desproporcionalmente determinados bairros.
Em geral, o encarceramento atinge justamente aquelas localidades pobres, que acumulam desvantagens sociais e baixos índices socioeconômicos (apesar de não necessariamente serem os locais com as maiores taxas de violência ou criminalidade), gerando uma relação simbiótica entre tais espaços segregados socialmente e o cárcere. Produz-se, assim, um aprisionamento altamente concentrado nesses bairros, com muitos de seus moradores levados ao cárcere, estabelecendo-se novas dinâmicas sociais nas quais a passagem pela prisão passa a ser uma experiência relativamente comum.
Disso decorrem diversas consequências negativas não apenas às pessoas presas, mas aos próprios bairros e seus residentes, já que tais locais passam a ser estigmatizados e se tornam alvos frequentes de ações policiais invasivas, violentas e, muitas vezes, ilegais. Ainda, a incidência do sistema penal nesses bairros inevitavelmente altera as relações de trabalho e as familiares, na medida em que ter mães, pais, companheiros/as ou filhos presos/as gera impactos na renda e custos à dinâmica familiar, impondo novas formas de sociabilidade para tais locais pelo rompimento de laços afetivos e criação de rotinas que se estruturam em torno do cárcere. Essas são frequentemente extenuantes, como visitas a estabelecimentos em outras cidades, pernoites em frente a presídios e em muitos casos situações humilhantes, como a submissão a revistas íntimas. Há uma série de ‘punições invisíveis’ que afetam famílias e bairros inteiros, ampliando o alcance dos efeitos deletérios do encarceramento em massa em curso para a população negra".¹⁶
No contexto da aplicação da lei, perfilamento tem sido definido como a associação sistemática de um conjunto de características físicas, comportamentais ou psicológicas com delitos específicos e seu uso como base para tomar decisões de aplicação da lei
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A criação de perfis raciais, ou seja, o perfilamento racial é incompatível com a proteção dos direitos humanos e é identificada na prática de instituições policiais, agentes das fronteiras, imigração e forças de segurança nacional. Muitas vezes se manifesta no contexto de paradas e buscas pessoais desnecessárias, verificações repetidas da identidade do indivíduo, revistas pessoais, prisões, invasões e batidas, fiscalizações alfandegárias e nas fronteiras e buscas domiciliares, que visam alvos específicos para vigilância e são refletidos nas decisões sobre imigração realizadas por tais agências
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"O resultado obtido com o desenvolvimento da pesquisa aponta para o reconhecimento de que a racialização das relações sociais no Brasil se expressa de maneira contundente no campo da segurança pública. Evidencia-se o racismo institucional que opera nas corporações policiais militares dos quatro estados estudados [São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerias e Distrito Federal].
A quantidade e a intensidade dos casos de discriminação racial enumerados pelos interlocutores do associativismo antirracista ouvidos, somada aos números oficiais de letalidade policial e prisões em flagrante levantados nos quatros estados estudados, fornecem evidências empíricas abundantes da produção cotidiana da desigualdade racial na operação da segurança pública no Brasil. Essa produção foi verificada mediante a análise dos dados quantitativos, da perspectiva dos policiais sobre a atividade de abordagem, da perspectiva do associativismo antirracista e da fragilidade das respostas.
Na avaliação dos ativistas, o racismo institucional na segurança encontra a expressão máxima no genocídio dos jovens negros de territórios como periferias e favelas pelas mãos de policiais militares. Os dados da pesquisa demonstraram o caráter sistemático da letalidade policial contra jovens negros, revelando a institucionalização do racismo nas polícias militares. Não se trata de concepções racistas individualmente manifestas por agentes policiais; o racismo institucional está enraizado nas próprias organizações, no funcionamento de todo o sistema de justiça criminal, que identifica a população negra como alvo de necessário controle produzido mediante violência, perpetuando e atualizando práticas forjadas na colonização e na escravização de negros.
A filtragem racial torna-se evidente nos dados da letalidade policial. Em São Paulo, estado com a menor população negra residente entre os estudados (34% do total da população é composta por negros), as vítimas negras de mortes cometidas por policiais somam 58% do total. Em Minas Gerais, é notória a representatividade da população negra entre as vítimas de homicídio no estado. A desigualdade racial no acesso à vida segura é gritante, pois a taxa de mortos entre negros (14,2 por 100 mil habitantes) é quase quatro vezes maior do que aquela para vítimas brancas (3,7 por 100 mil habitantes). Números que deixam evidente a ausência de políticas de segurança pública para a população negra, que culmina nas altas taxas de mortalidade por homicídio nesse grupo.
Comparando-se as taxas de letalidade policial dentro de cada grupo de cor/raça das vítimas, nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais (onde foi possível a obtenção de dados), a desproporção entre vítimas brancas e negras foi constatada em todos os locais. Nos estados em que há maiores taxas de letalidade policial (Rio de Janeiro e São Paulo), a discrepância entre negros e brancos mortos é ainda maior. Quanto maior o número de mortes produzidas pela atividade policial, mais evidente a filtragem racial de negros se torna, especialmente entre os jovens.
Além da produção da desigualdade racial nos resultados da letalidade policial, a pesquisa constatou ainda que a vigilância policial é operada de modo racializado. Os dados sobre as prisões em flagrante indicam que a maioria dos presos é composta de negros. Em Minas Gerais e São Paulo, a taxa de flagrantes de negros é mais que o dobro da verificada para brancos. Esses dados expressam que a vigilância policial ‘privilegia’ as pessoas negras e as reconhece como suspeitos criminais, flagrando em maior intensidade as suas condutas ilegais, ao passo que os brancos gozam de menor vigilância da polícia para suas atividades criminais. A filtragem racial está entranhada nas próprias estratégias do policiamento.
O trabalho com as diferentes fontes oficiais mostrou que as bases de dados sobre segurança pública e justiça criminal não são formuladas para o monitoramento das práticas de filtragem racial. A precariedade de monitoramento na coleta e sistematização dos dados, sobretudo quando se trata da questão étnico-racial, prejudica não apenas a qualidade da informação, mas também a implementação de políticas públicas de monitoramento das práticas de filtragem racial ou de políticas afirmativas para a segurança da população negra.
Com o trabalho de campo realizado junto a policiais, identificou-se que os tipos suspeitos
são compostos por critérios estigmatizantes que informam a ação policial. Embora os policiais neguem realizar a seleção de suspeitos pela cor da pele, esse diacrítico, articulado a outras marcas corporais, como cabelo, formas de corporeidade, tipo de vestimenta, local, horário, orienta a lógica da suspeição policial, permitindo identificar no corpo as marcas da suspeição criminal. Isso é o que configura o processo de racialização, pois associa características negativas a tipos sociais e a grupos humanos, criminalizando os comportamentos e as atividades econômicas, políticas e culturais dos grupos negros, em especial dos jovens negros.
Ao processo de criminalização da vestimenta, da música, da cultura, associa-se a criminalização das formas de manifestação política e cultural dos jovens negros, como o hip hop e os eventos de ativismo.
Quanto mais altas as taxas de letalidade policial, mais elas se concentram sobre a população negra, jovem e dos territórios estigmatizados. Violência policial e racialização, dessa forma, são fenômenos sociais correlacionados. Isso ajuda a compreender porque, historicamente, a luta contra a violência policial foi uma bandeira do movimento negro. Contemporaneamente, nas regiões estudadas, as lutas antirracistas se aproximam das formas associativas da luta contra a violência policial. De um lado, há a emergência das pautas trazidas pela juventude negra como ator político novo na esfera pública, pautando a violência letal contra os jovens negros, construindo o direito à vida segura como uma de suas principais bandeiras de luta. De outro lado, a emergência de movimentos de luta contra a violência policial que denunciam o caráter racista do extermínio promovido por policiais, como é o caso do Movimento Mães de Maio, em São Paulo, e dos protestos construídos em torno do assassinato de Amarildo de Souza, no Rio de Janeiro.
Da associação entre esses dois movimentos, surge a pauta do genocídio da juventude negra e periférica, apontando o fracasso coletivo em proteger a vida de uma parcela significativa de pessoas marcadas por discriminações que articulam raça, recorte etário, posição de classe e pertença territorial – o que corresponde ao fenômeno que a literatura internacional definiu como racismo institucional.
Uma coleção incontável de casos de discriminação racial no direito à segurança e na relação com os policiais é constituída pelos ativistas ouvidos pela pesquisa. A maior parte desses casos não obtém visibilidade social suficiente para produzir impactos para além da indignação e da solidariedade daqueles que se identificam com as vítimas. Muitos desses casos entram para a memória coletiva do país como efeitos necessários da luta contra o crime, produzindo a desumanização das vítimas e a aceitação social da letalidade como estratégia de segurança.
Alguns grandes casos rompem a naturalização das desigualdades raciais e se tornam emblemáticos, produzindo processos mais complexos de resistência ao racismo institucional e à discriminação racial na abordagem policial. A existência dos grandes casos é uma decorrência das estratégias de luta e mobilização do associativismo antirracista e do ativismo por direitos humanos. A denúncia e o acompanhamento de grandes casos é fruto do trabalho de mobilização dos ativistas.
A construção institucional das acusações de racismo nas ações das polícias militares depende, para além da capacidade de mobilização da sociedade civil, da existência de canais institucionais para receber denúncias, acompanhar os casos, assistir as vítimas, proteger as testemunhas. Depende também de respostas efetivas, seja em termos de punição, seja na construção de ações internas às polícias e ao sistema de segurança, para a desconstrução do racismo e a promoção da igualdade racial.
Assim, a atuação do associativismo antirracista foi fundamental para que a morte de Flávio Sant’Anna, em São Paulo, tenha sido debatida nacionalmente como um episódio de abordagem policial discriminatória. Mas o fato de existirem instituições atuantes, como o Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra e a Ouvidoria da Polícia, foram fundamentais para que a denúncia gerasse procedimentos investigatórios, processos criminal e administrativo. Da mesma forma, a força do associativismo trouxe para as fileiras da Polícia Militar paulista uma crítica interna, que se materializou na criação de uma disciplina para debater as relações raciais nos quadros da formação policial.
No Distrito Federal, mesmo sem haver um grande caso emblemático, a crítica interna à corporação também se comunica com o associativismo antirracista, propondo mudanças no modelo de educação policial e incorporando a educação das relações étnico-raciais como conteúdo obrigatório da formação policial.
As iniciativas de educação policial para as relações raciais são positivas, mas ainda não dão conta de romper os pilares poderosos sobre os quais o racismo institucional se reproduz e produz desigualdades no direito à vida segura.
Dois fatores são predominantes para o quadro de dificuldades em encaminhar a denúncia formal do racismo e em promover mudanças efetivas no modo de operação da segurança pública. Um deles é a fragilidade das instituições estatais em receber a denúncia dos casos e as demandas sociais por reformulação das políticas públicas. O outro é a fragilidade do associativismo antirracista diante das dificuldades em fazer as denúncias, exigir respostas efetivas e propor reformulações e políticas públicas voltadas à promoção da igualdade racial em segurança pública.
No que tange à fragilidade institucional, ela passa pela limitação dos órgãos de participação social na gestão do Estado, que atualmente atingiram um grau significativo de institucionalização na esfera federal, mas ainda encontram grandes obstáculos de consolidação, em especial nas esferas mais locais. Isso é ainda mais verdadeiro no campo da segurança pública, onde a participação social na formulação e condução de políticas públicas encontra imensas resistências em face da concepção de que segurança é um assunto de Estado, que deve ser conduzido pelos princípios da segurança nacional, do sigilo e do privilégio das corporações estatais.
Outra fragilidade institucional é a falta de autonomia política, financeira e legal das ouvidorias de polícia e órgãos similares que, embora recebam denúncias, não têm instrumentos para apurá-las, orientar e apoiar as vítimas,