Medicina Genômica
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Sobre este e-book
1.Determinantes genéticos que influenciam na susceptibilidade à hipertensão arterial sistêmica
2.Associação da via mapk e dos genes ace e nrf2 na nefropatia diabética
3.Polimorfismos genéticos e o metabolismo do folato na susceptibilidade às leucemias
4.Genes e micrornas associados com a infecção pelo vírus da hepatite c
5.Esclerose lateral amiotrófica: uma abordagem neurogenética e a relação com as células tronco
6.Biologia e integridade telomérica: correlações com os exercícios físicos e o câncer.
7.Diretrizes metodológicas para a elaboração de revisão sistemática e metanálise para estudos de associação entre polimorfismos genéticos.
8.Painel genético: caracterização molecular de biomarcadores utilizados como fator prognóstico de neoplasias mamárias caninas, utilizando ferramentas de bioinformática
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Medicina Genômica - Angela Adamski da Silva Reis
BIOINFORMÁTICA
DETERMINANTES GENÉTICOS QUE INFLUENCIAM NA SUSCEPTIBILIDADE À HIPERTENSÃO ARTERIAL SISTÊMICA
Rayana Pereira Dantas de Oliveira[a](ver nota); Kamilla de Faria Santos[b](ver nota); Jéssica Barletto de Sousa Barros[c](ver nota); Rodrigo da Silva Santos[d](ver nota); Angela Adamski da Silva Reis[e](ver nota)
RESUMO
A hipertensão arterial sistêmica (HAS) é uma doença crônica não transmissível, caracterizada pela elevação sustentada dos níveis pressóricos. Afeta 25% da população mundial e 36 milhões de indivíduos no Brasil, com maior prevalência em idosos. Sua causa pode ser primária ou secundária, tendo vários fatores de risco associados, como idade, sexo, tabagismo, alcoolismo, sedentarismo, obesidade e diabetes mellitus. O estresse oxidativo é considerado patognomônico da HAS, situação em que há redução da biodisponibilidade de óxido nítrico (NO), um vasodilatador importante na manutenção do tônus vascular. O polimorfismo dos genes GSTT1 e GSTM1 prejudica a atividade das enzimas Glutationa S-transferase (GST), atuantes na fase II de desintoxicação celular, contribuindo para o aumento do estresse oxidativo. O gene ECA, responsável pela codificação da Enzima conversora de Angiotensina (ECA), apresenta um polimorfismo de inserção e deleção (I/D), o qual pode interferir diretamente nos níveis de ECA circulante e, consequentemente, na atuação do sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA). Por ser uma doença de caráter multifatorial complexa, incluindo fatores genéticos, o estudo de polimorfismos que predispõem ao desenvolvimento da doença faz-se necessário.
Palavras-chave: Hipertensão arterial sistêmica (HAS); polimorfismos genéticos; estresse oxidativo; sistema renina-angiotensina-aldosterona.
INTRODUÇÃO
Pressão arterial é definida pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como a força exercida pelo sangue por unidade de superfície da parede vascular, isto reflete a interação do débito cardíaco com a resistência vascular periférica exercendo uma função fundamental no sistema cardiovascular.(1) É uma importante indicadora de saúde sofrendo alterações contínuas, sendo que seus níveis aumentados e sustentados são conhecidos como Hipertensão arterial sistêmica (HAS).(2,3)
A HAS é conceituada pela VII Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial como uma doença crônica não transmissível e multifatorial, caracterizada por elevação sustentada dos níveis pressóricos ≥ 140 e/ou 90 mmHg. Essa doença está frequentemente associada a alterações funcionais e/ou estruturais dos órgãos que são acometidos (vasos sanguíneos, rins, coração e encéfalo), e a distúrbios metabólicos, sendo agravada pela presença de outros fatores de risco, como obesidade, diabetes mellitus (DM) e dislipidemia.(4,5) A HAS, inclusive, pode acarretar o aparecimento de outras doenças, como: infarto agudo do miocárdio (IAM), insuficiência cardíaca (IC), doença cardíaca coronariana (que afeta os vasos do músculo do coração), acidente vascular encefálico (AVE) e insuficiência renal (IR).(6)
A hipertensão primária ou essencial (90 a 95% dos hipertensos diagnosticados)(1,3,7) se caracteriza por não apresentar uma etiologia definida, possuindo predisposição genética e interação entre os fatores ambientais, tais como: mudanças do estilo de vida, incluindo hábitos alimentares inadequados em associação com inatividade física, tabagismo e etilismo.(8,9) Correspondendo de 3 a 5% dos pacientes hipertensos, a hipertensão secundária é caracterizada pela identificação de um distúrbio subjacente específico, apresentando fatores endógenos/não modificáveis e fatores exógenos/modificáveis que poderão contribuir para o seu desenvolvimento, sendo as principais causas o hiperaldosteronismo primário; feocromocitoma; hipotireoidismo; hipertireoidismo; hiperparatireoidismo; síndrome de Cushing; doença renal crônica, entre outros.(5,10)
A OMS estima que há no mundo cerca de 600 milhões de pessoas com HAS afetando cerca de 25% da população adulta mundial, tendo seu aumento estimado para 29% em 2025.(4,7) No Brasil, a HAS atinge 32,5% (36 milhões) de indivíduos adultos, sendo mais de 60% dos idosos, contribuindo direta ou indiretamente para 50% das mortes por doença cardiovascular (DCV).(5)
A HAS é um grande problema de saúde mundial, principalmente por apresentar complicações silenciosas e multissistêmicas, sendo uma das principais causas de morte por doenças do aparelho circulatório, acarretando um ônus elevado.(11,12) No Brasil, estima-se que 1,2 milhão de internações estejam vinculadas à DCV associadas à HAS. Isso representa um gasto anual de 780 milhões de dólares para os sistemas de saúde, US$462 milhões para o Sistema Único de Saúde (SUS), sendo o encargo total em saúde, no ano de 2015, equivalente a 7% do PIB brasileiro.(13)
Hipótese oxidativa para HAS e os polimorfismos nos genes GSTT1 e GSTM1
O desequilíbrio entre agentes oxidantes (radicais livres) e antioxidantes, frente à produção insatisfatória de sistemas antioxidantes de defesa, gera estresse oxidativo.(14) Espécies reativas de oxigênio (ROS) são naturalmente produzidas em células eucarióticas e mitocôndrias, desempenhando funções biológicas importantes, como parte do mecanismo de defesa contra microrganismos invasores ou células malignas, reparo tecidual, cicatrização e remodelação.(15) Porém, vários poluentes ambientais, exposição à luz ultravioleta, agentes quimioterápicos, radiações ionizantes e certas toxinas também promovem aumento de ROS no organismo.(14)
As ROS são um grupo de moléculas que inclui os radicais livres e as espécies não-radicais e a sua produção está ligada ao metabolismo de oxigênio, bem como à ação de enzimas vasculares ou não, como do fosfato de dinucleotídeo de nicotinamida e adenina (NADPH) oxidase, da xantina oxidase e da eNOS (óxido nítrico sintase endotelial).(15,16)
O óxido nítrico (NO) é produzido continuamente, em condições basais, nas células endoteliais pelas enzimas eNOS, sendo vasodilatador, inibidor de atividade plaquetária, de agregação de leucócitos e de proliferação das células musculares lisas da vasculatura endotelial, tornando-se essencial para a regulação do tônus vascular e da PA.(17) O estresse oxidativo ocasionado pelos inúmeros processos de óxido-redução que ocorrem no endotélio vascular através das enzimas NADPH oxidase [NAD(P)Hox] e eNOS, ocasiona um aumento na produção de O2- que reage com o NO reduzindo a bioatividade do mesmo e formando ONOO-, um intermediário reativo particularmente lesivo. A menor disponibilidade de NO favorece o aumento da atividade da Endotelina-1 (ET-1) ou fator de contração derivado do endotélio (EDCF), promovendo crescimento das células endoteliais, inflamação e vasoconstrição, atuando assim, na patogênese do estresse oxidativo da HAS.(18)
Mecanismos de desintoxicação celular são de suma importância para a manutenção da saúde, fornecendo proteção contra agentes nocivos do ambiente (ex.: xenobióticos tóxicos), bem como contra metabólitos e o excesso de produção de ROS provenientes dos processos intracelulares.(19,20) Esse processo envolve duas etapas principais: Fase I ou de ativação, mediada pelas enzimas oxidativas, como as da família CYP450; e a fase mediada pelas enzimas conjugadas, como as da superfamília glutationa S-transferase (GST), que constitui a Fase II ou de detoxificação.(21)
As GSTs constituem uma família multigênica, contendo produtos de diferentes locus gênicos, composta por proteínas diméricas solúveis e multifuncionais, subdivididas com base em seu ponto isoelétrico, na sequência de aminoácidos e na especificidade por substrato: Alpha (α), Kappa (k), Mu (μ), Omega (ω), Pi (π), Sigma (σ), Theta (θ) e Zeta (ζ).(14) A sua função protetiva da célula com relação às toxicidades oriundas de produtos químicos, metabólitos e estresse oxidativo, se dá pela conjugação dos compostos eletrofílicos e reativos formados na Fase I à glutationa reduzida (GSH), formando moléculas hidrofílicas e atóxicas, facilitando sua excreção do organismo e reestabelecendo a homeostase(22)
A família de enzimas da GST é expressa como várias isoformas codificadas por genes amplamente distribuídos em diferentes cromossomos. Sua maior concentração é no fígado, porém pode ser encontrada em outros órgãos, como pulmões e intestino delgado.(23) Estudos têm mostrado que polimorfismos nos genes das GSTs podem conduzir a alterações na expressão da enzima, quer quantitativamente ou qualitativamente, o que tornaria o indivíduo susceptível ao desenvolvimento de várias doenças(24,25), incluindo a HAS.(19,26)
A classe μ das GST (GSTM) possui 5 genes distintos: GSTM1, GSTM2, GSTM3, GSTM4 e GSTM5, sendo que todos foram mapeados no cromossomo 1p13. Dentre os genes dessa família, destaca-se o GSTM1, situado no lócus 1p13.1, que é polimórfico possuindo dois alelos funcionais (GSTM1*A e GSTM1*B) igualmente eficientes no metabolismo de detoxificação, e apresenta 8 éxons. A classe θ consiste em dois genes, GSTT1 e GSTT2, que estão localizados no lócus 22q11.2; possuem 5 éxons com divisões idênticas de íntron/éxon, mas seus produtos proteicos possuem apenas 55% da identidade nos aminoácidos que compõe suas estruturas primárias.(14,22)
Ambos os genes, GSTT1 e GSTM1, apresentam um polimorfismo genético de deleção total do gene bem definido, resultando no genótipo homozigoto nulo (GSTT1-nulo e GSTM1-nulo), caracterizado pela ausência da atividade enzimática dessas duas isoformas (Figuras 1 e 2). A deleção em homozigose do gene GSTM1 é observada em frequências que variam de 20 a 70% em diferentes populações, enquanto que para o gene GSTT1 essa variação é de 11 a 38%, sendo justificada pela possível relação à suscetibilidade de doenças específicas em cada população.(14,20) A ausência de uma ou mais formas de GST, acarreta em prejuízo ao mecanismo de detoxicação, tornando a célula mais susceptível ao estresse oxidativo, levando à disfunção celular.(23)
Figura 1. Desenho esquemático ilustrando a deleção de GSTM1. É representado o alelo selvagem e o alelo nulo do gene GSTM1. As posições relativas dos demais genes da classe μ, no cromossomo 1p, são mostradas na figura. Adaptado de: REIS, 2010 e DE LIMA, 2016. (²¹,²³)
Figura 2. Desenho esquemático ilustrando a deleção de GSTT1. É representado o alelo selvagem e o alelo nulo do gene GSTT1. As posições relativas dos demais genes da classe θ, no cromossomo 22q, são mostradas na figura. HA3 e HA5 são regiões flanqueadoras de deleção / junção do genótipo nulo Adaptado de: REIS, 2010 e DE LIMA, 2016.(21,23)
Em um estudo caso-controle na população do Norte da Índia, foi encontrada uma associação significativa entre os genótipos GSTT1-null / GSTM1-positivo com hipertensão essencial.(27) Frequência maior dos genótipos GSTT1-null / GSTM1-positivo também foi encontrada no estudo realizado por Rizvi et al.(19), quando o grupo caso de hipertensos com sobrepeso / obeso foi comparado com o grupo de hipertensos com peso normal e com o controle, estabelecendo uma relação desse polimorfismo com o desenvolvimento da HAS em indivíduos com sobrepeso ou obesidade.
Almoshabek et al.(28) encontrou uma associação significativa entre os genótipos GSTT1-null / GSTM1-positivo e GSTT1-null / GSTM1-null com obesidade e sua relação com as proteínas plasmáticas, índice de massa corporal (IMC) e hipertensão em jovens sauditas. Já na meta-análise de Eslami e Sahebkar(26), o genótipo GSTM1-null foi associado significativamente à presença de HAS, porém GSTT1-null foi considerado apenas como um fator predisponente à doença.
Sistema Renina-angiotensina-aldosterona e o polimorfismo do gene ECA na HAS
O sistema