Consciência Política e Socialização pela Internet: O Eleitor Universitário
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Consciência Política e Socialização pela Internet - Rubens Vidigal Coriolano
COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO CIÊNCIAS SOCIAIS
Para minha mãe, Sônia Vidigal.
AGRADECIMENTOS
Este projeto não teria sido possível sem a colaboração dos muitos profissionais e amigos a seguir mencionados.
Aos professores Cecília Pescatore Alves, Maria da Graça Marchina Gonçalves, Maria do Carmo Guedes e Mary Jane Paris Spink pelos novos horizontes que abriram e pelos deliciosos momentos em sala de aula.
À Simone Bega Harnik, cujo sólido savoir-faire em desenvolvimento de modelos estatísticos facilitou sobremaneira a análise dos dados; ao Flávio Lima Ramos, pela colaboração caprichosa em montar o banco de dados; ao Ricardo Dall Antonia, pela minuciosa e cuidadosa revisão do texto e ao Antonio Fernando Gomes Alves, pela colaboração na revisão do texto.
Às professoras Cecília Pescatore Alves e Maria Adelina França, pelas relevantes contribuições apresentadas na banca de qualificação, particularmente úteis no desenvolvimento do questionário final do survey, o que possibilitou uma análise estatística mais ampla e profunda dos dados.
Aos colegas do núcleo de Psicologia Política da PUC-SP, cuja experiência, questionamentos críticos e ponderação comprovam a importância da construção coletiva do conhecimento. Uma menção especial ao amigo Ernesto Pacheco Richter, que me incentivou a enfrentar este desafio.
Aos professores: Alfredo Ricardo Abdalla, Bruna Suruagy do Amaral Dantas, Camila Castanhato, Cecília Pescatore Alves, Denise Aparecida Botter, Dennis de Oliveira, Elisabeti Kira, Ernesto Pacheco Richter, Flavia Tiemi Suguimoto, Gisela Tunes da Silva, Luis Antonio Gomes Lima, Monica Carneiro Sandoval, Regiane Balestra Vieira, René Batista de Almeida, Roberto de Oliveira Loureiro, Suzana Soares Lopes e Wendell Cristiano Lepore, que me permitiram aplicar o survey em suas turmas. Sou igualmente grato aos professores Antonio Fernando Gomes Alves, Aline Iris Gil Parra Magnani, Eliete Edwiges Barbosa, Juliana Lopes Frias e Willis Santiago Guerra Filho, pela indicação de colegas para a aplicação do survey.
Ao Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq) pela bolsa de estudos e, por fim, aos que direta ou indiretamente participaram ou de alguma forma contribuíram para que este objetivo fosse alcançado.
Nosso agradecimento a todos!
O conhecimento é o ato de entender a vida.
(Aristóteles)
INTRODUÇÃO
A Arpanet (Advanced Research Projects Agency Network) foi criada nos EUA no final da década de 60, auge da Guerra Fria entre as duas superpotências globais. O Departamento de Defesa estadunidense pretendia assegurar a conexão entre seus militares e os cientistas de laboratórios de pesquisa, ainda que num contexto de ataque militar. No início da década de 80, a rede não só se expandiu no meio acadêmico, mas se internacionalizou, passando a ser chamada internet. Com o surgimento dos provedores de acesso e o desenvolvimento da worldwide web pelo Cern¹, na década seguinte, seu crescimento passou a ser exponencial em todo o mundo.
Graças aos recentes avanços da tecnologia da informação e das telecomunicações, a internet não apenas se transformou na grande plataforma de comunicação do século XXI, como tem contribuído significativamente para a mudança do comportamento social dos indivíduos. A complexa rede de relações sociais, estabelecida por meio da internet, vem alterando o processo de socialização dos indivíduos. O relatório Digital in 2018
, divulgado no site We are Social
, aponta alguns dados expressivos em relação à situação da rede em ٢٠١٨: (i) atinge ٥٢,٩٪ da população mundial (٤,٠ bilhões de pessoas); (ii) conecta 3,2 bilhões de usuários a redes sociais; (iii) contabiliza 5,1 bilhões de usuários de telefones celulares e (iv) mantém seus usuários conectados por longos períodos. O Brasil registra o terceiro maior tempo de conexão à internet², com 9 horas e 14 minutos em média por dia.
As atitudes e o comportamento político dos cidadãos também têm sido influenciados em função da socialização promovida pela internet. Nesse sentido, Baquero e seus colegas (2016, p. 992) apontam que jovens do mundo todo, usando as redes virtuais, patrocinaram manifestações que chegaram até a provocar a queda de governos, caso da Primavera Árabe³, e que essas manifestações indicaram que não podemos mais ignorar a influência das novas mídias tecnológicas na formação de identidades coletivas entre os jovens
.
Em junho de 2013, uma onda reivindicatória, a maior desde as manifestações pelo impeachment do presidente Collor de Mello, propagou-se pelas grandes capitais do país, contando também com forte participação da juventude. O movimento, nascido em São Paulo, que a princípio protestava contra o aumento da tarifa do transporte público, ampliou sua abrangência para incorporar temas como a má qualidade dos serviços públicos, a corrupção na política e os gastos excessivos em grandes eventos esportivos internacionais. Nos últimos meses de 2015, jovens estudantes do ensino médio de São Paulo mostraram determinação e união ao ocuparem escolas da rede estadual, protestando contra mudanças na política educacional do governo Alckmin. Em ambas as ocasiões, a internet desempenhou papel relevante como fator de mobilização social.
Em um momento de ruptura tecnológica, em que a internet ultrapassa a televisão como veículo midiático de maior penetração, especialmente entre os jovens, esta pesquisa traz reflexões oportunas sobre o impacto dos agentes de informação presentes na internet, sejam recém-chegadas ou tradicionais empresas de mídia, na formação da consciência política do eleitor universitário. O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) aponta⁴ que 22.230.111 eleitores do Brasil (15,1% do total) tinham entre 16 e 24 anos de idade, fatia considerável do eleitorado.
Expandir os conhecimentos em relação à influência da internet sobre o eleitor é interesse não só de ciências como a psicologia política, o marketing político e a sociologia, mas da administração pública e da sociedade em geral. As ciências políticas ainda têm um longo caminho a percorrer para compreender mais eficazmente os fatores que atuam sobre o eleitor de um país com características tão peculiares e complexas quanto o nosso.
Interessante compreender, também, como ficará a disputa de narrativas nesse novo contexto de comunicação. O jornalista Leonardo Sakamoto faz uma analogia da comunicação global com a geografia, afirmando que, se antes a comunicação era verticalizada pelos grandes veículos de comunicação, tal qual continentes, hoje o sistema horizontalizou-se na forma de arquipélagos de comunicação, representando os diversos veículos de mídia, sejam eles tradicionais, recentes, independentes ou não. Assim, se anteriormente os conteúdos de informação eram disponibilizados basicamente por televisão, rádio, jornais e revistas, agora estão também acessíveis em plataformas como o YouTube, Facebook, Instagram e WhatsApp, dentre outras. O reinado da mídia tradicional vem sendo vigorosamente afrontado no início do presente século e a informação hegemônica ocidental, anteriormente monopolizada por grandes agências de comunicação como a Reuters, CNN, BBC e Agence France Press, hoje é contraposta por redes como a Al Jazira, Russia Today, Hispantv⁵, etc. O cordão umbilical
com a mídia tradicional foi rompido e nesse grande arquipélago de conteúdos, dependendo dos portos nos quais o indivíduo escolha atracar, emergirá sua interpretação da realidade e formação de sua consciência política, em um sistema de informação muito mais amplo e complexo.
A rede, todavia, também tem sido usada de forma nada democrática pelos atores dominantes da geopolítica mundial com fins de manipulação ideológica, segundo advertem diversos veículos independentes de mídia, dentre os quais o jornal eletrônico GGN do jornalista Luis Nassif. O espírito democrático
de redes sociais como o Facebook também é questionado por Edward Snowden e Julian Assange, para quem os algoritmos da rede oferecem visibilidade apenas aos alinhados ao mainstream⁶, enquanto os opositores do discurso dominante são isolados em suas pequenas bolhas. Na época da massificação das comunicações pela televisão, ainda antes da explosão da internet como importante veículo de comunicação de massa, Foucault (1995, p. 241) já precavera contra o poder exercido pelos meios de comunicação: as relações de comunicação implicam atividades finalizadas (mesmo que seja apenas a
correta operação dos elementos significantes) e induzem efeitos de poder pelo fato de modificarem o campo de informação dos parceiros
.
Avaliar em que medida a internet contribui para a formação da consciência política de eleitores universitários e sua relação com o voto, por si só, já é uma questão metodológica complexa. Num momento de apartheid ideológico e fragilidade institucional, compartilhamos a preocupação metodológica da pesquisadora Silvia Lane (1999, p. 46):
[...] a pesquisa em psicologia social, lidando com seres humanos, deverá ter sempre presente que o papel institucionalizado de pesquisador em nossa sociedade traz consigo o caráter de dominação e como tal reproduz a ideologia dominante; se não quisermos elaborar conhecimentos contaminados ideologicamente, este fato deve merecer uma atenção fundamental no planejamento de procedimentos, registros e análise do fato pesquisado.
A fim de estruturar um embasamento teórico adequado e consistente para esta pesquisa, empregamos o modelo de consciência política do professor Sandoval e fizemos uma revisão bibliográfica sobre as principais escolas que estudam o comportamento de voto, dentre elas: a escola sociológica, a psicossocial, a econômica e a da ideologia dominante. Aproveitamos o período pré-eleitoral de 2018, para realizar uma pesquisa quantitativa do tipo survey seccional, de abordagem psicossocial, com universitários de diferentes instituições de ensino superior da grande São Paulo.
A partir dessa base epistemológica e com os dados empíricos, procuramos ainda: (i) avaliar em que medida a internet contribui para o eleitor universitário conhecer os candidatos e seus programas; (ii) identificar os determinantes psicossociais da consciência política; (iii) compreender as relações da tríade: consciência política, ideologia e voto; (iv) observar diferenças comportamentais entre subgrupos amostrais (segmentados por sexo, idade, etnia, religião, renda, etc.); (v) verificar o quanto esse eleitor discute política em seu meio social e (vi) investigar o grau de satisfação do universitário com a internet e demais instituições do país.
Este trabalho foi estruturado em cinco capítulos. O Capítulo 1 apresenta as bases teóricas utilizadas: o modelo de consciência política do professor Sandoval e os quatro modelos de comportamento eleitoral; o Capítulo 2 esclarece os percursos da pesquisa de campo e expõe os seus resultados; o Capítulo 3 explora as diversas correlações entre as variáveis pesquisadas; o Capítulo 4 associa os determinantes psicossociais da consciência política com as variáveis de socialização midiática; e o Capítulo ٥ desenvolve as considerações finais, divididas em considerações epistemológicas e empíricas.
Sumário
INTRODUÇÃO 15
1
CONSCIÊNCIA POLÍTICA E VOTO 19
1.1 AS ESCOLAS SOBRE O COMPORTAMENTO DE VOTO 25
1.1.1 A escola sociológica 25
1.1.2 A escola psicossocial 28
1.1.3 A escola econômica 31
1.1.4 A escola da ideologia dominante 33
1.2 A CONSCIÊNCIA POLÍTICA 35
1.2.1 A dimensão identidade coletiva 39
1.2.2 A dimensão crenças e valores 40
1.2.3 A dimensão interesses coletivos 41
1.2.4 A dimensão sentimentos com respeito aos adversários 42
1.2.5 A dimensão eficácia política 42
1.2.6 A dimensão metas e repertórios de ações 43
1.2.7 A dimensão vontade de agir coletivamente 43
2
A PESQUISA DE CAMPO 45
2.1 A APLICAÇÃO DA PESQUISA DE CAMPO 45
2.1.1 O pré-teste 45
2.1.2 O teste final 46
2.2 O QUESTIONÁRIO 47
2.2.1 O formulário do questionário 49
PARTE 1: DADOS PESSOAIS 49
PARTE 2: SOCIALIZAÇÃO MIDIÁTICA E VOTO 50
2.3 O PERFIL DO UNIVERSITÁRIO 58
2.4 A SOCIALIZAÇÃO MIDIÁTICA E O VOTO DO UNIVERSITÁRIO 66
3
AS RELAÇÕES ENTRE AS VARIÁVEIS 83
3.1 AS DIFERENÇAS INTERGRUPAIS DAS VARIÁVEIS DESCRITIVAS 83
3.2 AS CORRELAÇÕES ENTRE AS VARIÁVEIS DE
SOCIALIZAÇÃO MIDIÁTICA 103
3.2.1 As contribuições da internet 103
3.2.2 Autoposicionamento versus escore ideológico 105
3.3 AS ANÁLISES RELACIONAIS DA TRÍADE: CONSCIÊNCIA POLÍTICA, VOTO E IDEOLOGIA 107
3.3.1 Ideologia e consciência política 107
3.3.2 Voto e ideologia 109
3.3.3 A identificação de variáveis explicativas para o escore da
consciência política (ecp3) 111
3.3.4 Consciência política e voto 119
4
DETERMINANTES PSICOSSOCIAIS DA CONSCIÊNCIA POLÍTICA DO
ELEITOR UNIVERSITÁRIO 125
4.1 A RENDA FAMILIAR DO UNIVERSITÁRIO 125
4.2 O VÍNCULO DE PAGAMENTO COM A INSTITUIÇÃO DE ENSINO
DO UNIVERSITÁRIO 134
4.3 A COR DO