A caminhada: (100 anos de histórias e estórias)
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Sobre este e-book
O livro ganha mais força e velocidade quando entra em cena o Doutor Eleno, uma espécie de alter ego do autor. Suas histórias são inacreditáveis mas dialeticamente críveis. Jacinto mostra a mais clara tradução do homem no interior do Brasil, acostumado às dificuldades, vivendo uma vida simples mas não menos fantástica. Iúri Godinho da Academia Goiana de Letras.
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A caminhada - Jacinto José de Almeida
JACINTO JOSÉ DE ALMEIDA
A caminhada
(100 anos de histórias e estórias)
Goiânia-GO
Editora Kelps, 2019
Copyright © 2019 by Jacinto José de Almeida.
Editora Kelps
Rua 19 nº 100 — St. Marechal RondonCEP 74.560-460 — Goiânia — GO
Fone: (62) 3211-1616 Fax: (62) 3211-1075
E-mail: kelps@kelps.com.br / homepage: www.kelps.com.br
Diagramação: Alcides Pessoni
designer.pessoni@gmail.com
CIP Brasil Catalogação na Fonte
Dartony Diocen T. Santos CRB-1 (1º Região)3294
DIREITOS RESERVADOS
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Sumário
CEM ANOS NESSAS PÁGINAS
RUMO AO SERTÃO
UM CAPETA DE QUATRO
UM MORTO VIVO
INÍCIO, MEIO E FIM
VIDA DE CRIANÇAS
MUTIRÃO DE SÃO JOÃO
CAÇADA SEM FIM
ENTUSIASMOS DA JUVENTUDE
PESCADOR DE TRAÍRA
A MORTE DA GENUÍNA
O FERIADÃO
O SUCURI
PEDRAS DE OURO
O DILEMA DE VIVI
A ESTRELA QUE APAGOU
COMO DOUTOR SOFRE
DESCASO E IGNORÂNCIA
UM BURRO DE CARGA SONHADOR
SESSENTINHA
FAZENDA BOI GRANDE
A RAÇA NELORE
VOLTANDO AO TEMPO DA LAMPARINA
OS PERNETAS?
PEÇAS DA NATUREZA
DONA ERCINA
FLECHA DE OURO E A MÃO DE OURO
OSSOS DO OFÍCIO
A ÚLTIMA VISITA
GALERIA DO FIM DE TARDE E DA NOITE
SEXTA-FEIRA 13
PARTITURAS
CEM ANOS NESSAS PÁGINAS
JACINTO JOSÉ DE ALMEIDA
Este livro conta quase cem anos de histórias e estórias, narradas em sua maioria em forma de contos escritos de modo a oferecer uma leitura fácil e ao mesmo tempo oferecer reflexões profundas sobre o comportamento do ser humano, os acontecimentos do dia a dia e dando certa ênfase à sexualidade. Narradas com alta dose de humor e ao mesmo tempo trazendo muitas informações que a primeira vista parecem ser ficção, Mas ao fazer uma análise mais profunda nota que se trata da pura realidade. Onde o número de histórias suplanta em muito o número de estórias. Onde os fatos ocorrem em tempos diferentes de desenvolvimento e ocupação da terra. De início com uso de pouca tecnologia e chegando aos tempos atuais, com uso de altas tecnologias, presente na vida de todos, tanto nas grandes cidades e no meio rural. Falando ainda nas dificuldades dos trabalhadores do meio rural e do meio urbano. Além de abordar com certa profundidade a dificuldade enfrentada pelos médicos para exercer suas atividades no dia a dia, impostas pelo sistema único de saúde, o SUS e também pela complexidade do atendimento do ser humano. Dando ênfase em especial à especialidade de obstetrícia e ginecologia. Uma área que parece ser simples, mas que, muitas vezes, ocorrem complicações bem graves e inesperadas. Trazendo críticas tanto a esse sistema de saúde vigente bem como aos outros seguimentos integrados com ele. Para finalizar foi colocado três partituras para teclado de três letras de músicas que aparecem no livro.
Que me desculpem os músicos por algumas falhas.
GOIÂNIA, 23 DE ABRIL DE 2017.
O meu muito obrigado a
Jônathas F. Q. de Almeida pela criação da capa
Janaína C. Q. de Almeida pela revisão de alguns textos
Guiomar A. J. Almeida pelo auxílio de sempre
Iúri Rincon Godinho, meu maior incentivador
RUMO AO SERTÃO
A NOITE ESTRELADA JÁ SE IA. Com a sensação de que os primeiros raios solares iriam aparecer a qualquer momento. Os carros de bois já seguiam enfileirados pela estrada, com algum ensaiando um canto. Zezinho ia dentro de um deles. Era pequeno para ir andando atrás do carro. Havia dois dias que tinham deixado Corumbaíba. O destino era o sertão de Goiás. O interior de Goiás. Promessa de muitas terras, com muitas matas para derrubar e plantar: milho, arroz, feijão, mandioca e depois semear semente de capim para criar vacas. Além das matas, tinha campos e várzeas. Todos cobertos por vegetações nativas e virgens. Certamente com uma grande variedade de animais, aves e peixes que serviriam para serem caçados ou pescados e seriam utilizados como alimentos. Os carros de bois vinham carregados de camas, cobertas, travesseiros, roupas e alimentos básicos para o sustento da caravana. Incluindo o sal. Além de ferramentas para trabalhar: foices, machados, cutelos, serrotes, enxadas, etc. Traziam também outros objetos tais como: bancos de madeira, pilão, tachas, gamelas, rodas de fiar, tear, camas e mesas para serem utilizados dentro de casa. O sal era sempre buscado muito longe. Não era igual à rapadura que substituía o açúcar e era fácil de ser fabricada. O morador bastava ter um canavial, um engenho para moer a cana-de-açúcar, as tachas para apurar a garapa e lenha para colocar no fogo. A caravana não tinha dia para chegar ao destino. Nos locais de pouso, os bois eram soltos para seu descanso e sua alimentação. Também serviam para descanso das pessoas. Entre elas homens já anciãos, adultos mais jovens, mulheres e crianças. Sempre pelos caminhos ocorriam imprevistos: era gente com diarreia, febre e outros com sintomas de gripe. Todos estavam sujos de poeira deixada pelo andar dos bois e dos carros. Favorecida pela época do ano. Época de estiagem. Ainda pairava uma tristeza sobre a caravana devido à morte da irmã de Candinho. Ocorrido na semana anterior ao início da viagem. Apesar de que já beirava os 95 anos e já estava bem doente. Vítima das sequelas da doença de Chagas. Doença transmitida pelo barbeiro. Parecia que tinha afetado o seu coração. Era uma doença muito comum, naquele tempo, no interior de Minas Gerais. Seu Candinho já estava com quase cem anos. Fazedor de chapéu de palha. Aí chegaram ao Rio dos Bois. Um rio largo. A ponte até balançava quando passava sobre ela. As pessoas desciam do carro para não correrem o risco de cair no rio. Assim que a caravana chegou nele, fizeram como era recomendado. Depois que os carros já tinham passado o rio, o genro de Seu Candinho perguntou para o sogro:
– Cadê a minha sogra? Não a vi depois que atravessamos o rio.
– É verdade. Respondeu seu irmão que estava ao seu lado. Será que caiu no rio?
– Não sei. Mas se caiu não faz mal. Ela já viveu demais. Respondeu o genro de Candinho.
Tem pessoas que são surdas, mas parece que quando querem escutam bem.
– Ah é? Você me paga. Um dia te jogo azeite quente na cara.
Ela tinha sido esquecida dentro de um carro e atravessou a ponte dormindo dentro dele. Nesta hora ela ouviu muito bem. E ficou sem conversar com o genro vários meses.
Depois de mais um dia de viagem a caravana chegou ao destino. Somente alguns tinham dinheiro para comprar terras. Os outros iriam morar como agregados. Trabalhadores que moravam na terra de outros e que geralmente ganhavam um pedaço de terra para plantar. No começo a primeira coisa era escolher aonde fazer as casas. Sempre perto de algum rio. Ficando mais fácil de conseguir água para beber, alimentos para comer e lavar as roupas. Apesar de que também ficava no meio da malária e outras doenças favorecidas pela umidade das margens dos rios. As casas eram feitas de pau-a-pique, com o piso de chão batido e com cobertura de folhas de buriti. E depois providenciariam a escolha do local para roçar as matas com foice, derrubar as árvores com machado e botar fogo, para depois plantar. O que não faltava era pessoas sofrendo da tal maleita. Sem falar na febre amarela que tinha em alguns lugares. O pai de Zezinho não passou muito tempo e foi vítima da febre amarela. Depois desse fato quem o orientava era seu avô. Até no jeito de lidar com peões ele fazia questão de orientar Zezinho. Naquele tempo um litro de manteiga de porco valia um dia de serviço na enxada. E se o peão não chegasse bem cedo era mandado de volta sem receber nada e era orientado para voltar mais cedo no outro dia. Mas Zezinho já era rapaz jovem quando o seu avô veio a falecer. Vitimado de um esforço intenso e desnecessário. Faleceu vomitando sangue, após carregar sozinho, um cocho de madeira que dois peões não tinham conseguido carregar. Deve ter arrebentado alguma veia por dentro. Daí em diante o jeito foi Zezinho ter que tomar conta da sua casa. Dos meninos ele era o mais velho. Infância praticamente não teve. Tinha que: trabalhar, cuidar dos mais novos e dar exemplo de vida. Sua mãe sempre o trazia sob vigilância e sempre exigia dele além dos seus limites. Naquela época não tinha moleza e tudo era mais difícil. Mas Zezinho seguiu em frente com sua família.
UM CAPETA DE QUATRO
ZEZINHO TINHA PASSADO DOS 15 ANOS. No dia a dia dava duro no trabalho. Já na condição de chefe de família. Estava arrastando toras de pau da futura roça para o terreiro. Já tinha arrastado vários varões compridos de: aroeira, angico, peroba, ipê e jatobá. Madeiras de lei. Madeiras para construir paiol, casas, curral, chiqueiro, etc. Ele puxava as toras com três juntas de bois. À medida que ia puxando as toras ia colocando uma ao lado da outra. Nisto chegou Seu Manezinho. Tinha ido à currutela comprar mantimentos para o gasto e sal para o gado. Tudo comprado na loja do Seu Roldão. Trazia essas coisas num carro puxado por três juntas de carneiro. Seu Manezinho ainda vinha trazendo um cabrito amarrado na traseira do carrinho. Era um cabrito macho, branco com umas pintas pretas, chifrudo e com aquela barbicha no queixo. Até ficava engraçado. Pois Seu Manezinho também usava uma barbicha só no queixo. Zezinho tinha uma bezerra enjeitada numa vaca. A sua mãe tinha morrido logo após o parto. Provavelmente ofendida de cobra. Deveria ser uma cascavel. Pois no local da picada nem inchou e ela ficou meio desgovernada, caindo aqui e acolá. Parecia que o veneno tinha afetado o cérebro da vaca. A bezerra era mansinha. Acostumada a beber leite em outra vaca e no balde. Aí ela foi caminhando atrás de Seu Manezinho. Ele achou a bezerra interessante e propôs trocar o cabrito por ela. Zezinho nem pensou muito para aceitar o negócio. Com a troca aumentaria uma vaca para tirar leite e depois poderia capar aquele cabrito e comer a sua carne. Além de que ele poderia servir de companhia para o carneiro de nome Tufão. No momento sem ovelha para companhia. Assim foi feito a troca. Zezinho deixou o cabrito amarrado debaixo de uma gameleira e continuou a puxar as toras. A roça, de onde elas vinham, não era muito longe. Até tinha esquecido se da ordem da sua mãe, de que era para trazer duas carradas de lenha, para pôr na fornalha para queimar no dia a dia. Foi quando ele ouviu o chamado de sua mãe:
– Zezinho?
– Inhora?
– Se você não puxar as carretas de lenha para pôr no fogo, hoje, vai é levar uma surra.
E quando a sua mãe falava ela cumpria. Então ele tratou foi de cumprir a ordem dela. Trouxe duas carradas de lenha. A sorte que já estavam picadas. Feita das pontas das arvores cortadas para toras. Trouxe e amontoou a lenha dentro do quintal, perto da casa. Formando um monte quase da altura da casa. Aos poucos Zezinho foi vendo que o cabrito não era flor que se cheirava.
Antes ele não tinha conhecimento do que era um cabrito. Andava em cima das toras de pau na maior velocidade. E se não saísse do rumo que ele estava indo ele queria era dar chifradas e passar por cima. Tinha um cachaço que ele vivia atentando o coitado. De vez em quando ele pulava sobre as costas do porco e pulava longe. Se tiver negócios que só trazem arrependimento, aquele foi um desses. Ele só respeitava o carneiro. Desde o dia em que o carneiro estava furioso e o cabrito engraçou para cima dele. Ele afastou uns metros e veio a toda velocidade, dando uma cabeçada nele, jogando-o desacordado a uns dois metros. Desse dia em diante o cabrito nunca mais quis beirar o carneiro. O carneiro era amigo do boi Zulêgo. Um boi cabeçudo, do chifre virado para baixo e para trás e de cor amarelada; com pescoço, cupim, quartos dianteiros e quartos traseiros escuros. Os dois fizeram uma parceria. Sempre que o boi ia brigar com o boi do vizinho, aparecia o carneiro que corria para dar cabeçada na cara do outro boi, que saía em disparada e assustado. Sempre que Zezinho escutava os berros dos bois querendo brigar, ele dava um jeito de ir ver a briga. Só para ver a astúcia do carneiro. Com isso evitava dos bois desmancharem a cerca de arame durante a briga. Naquela época, arame farpado.
Mas mesmo assim Zezinho continuava com o cabrito, apesar das peripécias dele. O curral de lidar com as vacas era feito por toras colocadas em cima de par de forquilhas, em número de três. Sendo cada par de forquilhas enterradas parcialmente, de modo que cada tora ficava de altura diferente e com um espaço entre elas. Certo dia Zezinho estava tirando leite das vacas e veio o danado do cabrito andando em cima da cerca do curral. Quando ele chegou ao lado da vaca que Zezinho estava tirando leite, ele pulou em cima das costas dela, com a vaca mesmo piada dando um pulo e dando um coice no balde, derramando o leite. Aí o cabrito saiu correndo sem rumo e o Zezinho correndo atrás dele tentando pelo menos dar um chute nos seus tentos. Mas o cabrito fez foi pular em cima do jirau que estava a lata com o leite já tirado, virando a lata e derramando o leite dela e depois pulou em cima da cerca e pulou para o outro lado. Ainda virou a cara para trás e deu dois berros. Só podia ser um troço possuído pelo satanás. Quando Zezinho chegou à sua casa sem o leite a sua mãe pegou-o pela orelha, com ele saindo até andando nas pontas dos pés. Indo por ele de castigo, ajoelhado sobre o chão. Quem mandou ocê arrumá esse demônio? Isso é pra ocê aprendê. Disse sua mãe.
Já era hora do almoço quando Zezinho foi chamado para almoçar e sendo liberado do castigo. Zezinho olhou dentro das panelas e logo protestou:
– A gente vai comer só arroz, feijão e abobrinha?
– Quantas vezes é preciso falar que nas quartas e sextas da quaresma não come carne?
Tinha mais essa. Aquela comida não sustentava. Mas a lembrança que no outro dia começava os dias santos e não trabalhava, alegrou Zezinho.
Pelo costume, do meio dia de quinta-feira a meia-noite de Sexta-feira Santa, as pessoas não podiam fazer nada. Principalmente na noite de Sextafeira Santa. Diziam que era quando mulas sem-cabeça, lobisomem, almas penadas enviadas pelo satanás e outras almas perdidas neste mundo saiam andando por ele. Não podia nem varrer a casa, tomar banho, cortar cabelo ou fazer a barba. Até tirar leite não podia. Falavam que saía era sangue em vez de leite das maminhas das vacas. Na quinta-feira antes do meio dia Zezinho cismou de ir pescar. Até ao meio dia não tinha problema. Já tinha pegado uns dez peixes, todos pequenos, quando de repente Zezinho ouviu um barulho estranho, no córrego, logo abaixo de onde ele estava. Ficando meio apreensivo. De repente ele ouviu o mesmo barulho, porém mais próximo. Alguma coisa debatendo dentro d’água. O cabelo começou a arrepiar. Quando ele olhou para dentro do poço onde ele estava pescando viu duas cobras nadando por cima d’água, já pondo a língua para fora e vindo em sua direção. Ouviu o barulho de novo. Agora mais próximo, parecia que vinha no meio da mata e aproximava. Então Zezinho saiu foi embalado para o rumo de casa e tão amedrontado que esqueceu os peixes que tinha pegado. Parecia que quanto mais corria, tinha um barulho no mato que o acompanhava. De repente tropeçou num toco e saiu catando cavaco. Para livrar de meter a cara no chão Zezinho deu foi uma cambalhota sem triscar as costas no chão. Caindo de pé e continuou correndo no que dava. Na queda a vara de pescar ficou. Quando chegou à sua casa, a sua mãe perguntou:
– Cadê os peixes?
– Não estava nem beliscando. Foi o que respondeu Zezinho.
Ele não quis foi contar o medo que passou. Aí o jeito foi ficar quieto dentro de casa, depois de tomar um banho para tirar a sujeira do corpo. Naquele tempo ou tomava banho na bica ou tomava banho na bacia. Como já estava próximo do meio dia, o jeito foi tomar banho na bacia. Foi aí que ele viu que tinha arrebentado a cabeça do dedo do pé no tropicão. Sua mãe estava contando com os peixes para o almoço. O jeito foi comer arroz, feijão e abobrinha cozida. Nem ovo tinha. Diziam que as galinhas não botavam na quaresma. E ainda só de pensar que no outro dia tinha que jejuar até ao meio dia já dava uma tristeza. Quando começou a sumir o sol, Zezinho começou a sentir que tinha alguma coisa no ar que trazia mau pressentimento. Mas a subida da lua cheia e sua claridade amenizou aquela apreensão. Assim que deitou para dormir o dedo começou a doer e latejar. Zezinho dormia em cima de uns bancos que ficavam na sala, com um colchão cheio de palha de milho estendido sobre eles. Pois já estava ficando rapaz e não era conveniente dormir no quarto em que dormia as meninas. Sentou na cama. Tinha perdido o sono. Passou um pouco deitou de novo. Demorou um pouco, mas deu para dar uma cochilada. No entanto logo ele acordou de novo com a dor do dedo do pé. Parece que tinha encostado o dedo machucado no colchão. Pelo tempo passado já deveria ser quase meia noite. De repente ouviu um barulho que parecia ter vindo de cima da casa. O barulho parecia que movimentava em cima do telhado. A casa era coberta por telha comum. Será que seria uma alma penada ou alguma coisa enviada pelo capeta? Parecia que o barulho andava em cima da casa e acompanhava os movimentos de Zezinho dentro da sala. Zezinho apesar de novo tinha uma carabina. Deixado pelo seu pai. Ele tratou foi de pegar ela, por uma bala na agulha e pegar firme nela com as duas mãos. E o barulho continuava em cima do telhado. Veio na mente de Zezinho que era Sexta-feira Santa. Será que não era alguma coisa enviada pelo satanás? Zezinho até pediu perdão pelas desavenças que tinha tido com os irmãos. Até ajoelhou para ver se a prece surtia mais efeito. Mas da carabina ele não largava. Sua mãe apareceu com uma lamparina na mão. Depois de confirmar com Zezinho sobre os barulhos em cima da casa. Pegou um terço, ajoelhou e começou a rezar e pedir perdão dos atos feitos nos momentos de nervosismo. Fez questão de falar em voz mais alta para ver se amedrontava a coisa que estava em cima do telhado e para ver se Deus providenciava uma solução mais rápida. Até dos puxões de orelha e dos castigos aplicados contra Zezinho ela pediu perdão. Naquele momento, para Zezinho, o barulho parecia com o que ele tinha ouvido lá no córrego. Será que o bicho tinha vindo atrás dele. Zezinho tinha quase dezesseis anos. Era o mais velho dos irmãos. Já estava era pensando o que seria da sua mãe e dos irmãos se aquela coisa o pegasse. E o barulho continuava lá em cima da casa, indo de um lado para o outro. A mãe de Zezinho já chorava sem parar. Mas recomendou para Zezinho não atirar. Pois aquele tipo de bala não mataria alma do outro mundo. Zezinho até tinha esquecido se do dedo machucado. E continuava com a arma nas mãos.
– Eu vou é atirar no rumo dessa coisa.
– Pelo amor de Deus não faça isso. Foi a recomendação da sua mãe. Mas não tomava a arma dele. No fundo a esperança era aquela arma.
Nisso o barulho em cima da casa ficou mais forte. Parecia que queria tirar as telhas. Certamente, para entrar na casa. Zezinho armou a carabina e pensou: se começar a tirar as telhas eu atiro. Nisso ouviram um berro parecido com o de um cabrito. E parecia que vinha de cima da casa. De repente novo berrado e com certeza vinha de cima da casa. Então a mãe