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Direito Social à Saúde:: Rearticulação do Pacto Federativo a Partir de Estratégias Locais de Cooperação, Integração e Controle Social
Direito Social à Saúde:: Rearticulação do Pacto Federativo a Partir de Estratégias Locais de Cooperação, Integração e Controle Social
Direito Social à Saúde:: Rearticulação do Pacto Federativo a Partir de Estratégias Locais de Cooperação, Integração e Controle Social
E-book508 páginas4 horas

Direito Social à Saúde:: Rearticulação do Pacto Federativo a Partir de Estratégias Locais de Cooperação, Integração e Controle Social

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Sobre este e-book

Os desafios em promover uma saúde de qualidade para toda a população com foco no poder local, a partir dos pressupostos de direito social de Georges Gurvitch e do princípio da subsidiariedade constituem o tema central deste livro, que procura apresentar soluções jurídico-políticas de cooperação entre a União, estados e municípios, em conjunto com a participação da sociedade civil, no redimensionamento de políticas públicas que venham atender a população em suas demandas, com qualidade e eficácia, no plano municipal. A ideia central deste estudo é que as comunidades locais possam agir de maneira ativa na defesa da saúde, contribuindo para mudar o panorama caótico da prestação deste direito social, que faz com que a população brasileira não tenha dignidade humana.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento26 de fev. de 2020
ISBN9788575491799
Direito Social à Saúde:: Rearticulação do Pacto Federativo a Partir de Estratégias Locais de Cooperação, Integração e Controle Social

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    Direito Social à Saúde: - Adriane Medianeira Toaldo

    população.

    AGRADECIMENTOS

    Agradeço à Deus, sempre presente em minhas orações. Com fé Nele, tudo sempre foi possível.

    Agradeço aos meus pais, por todo o apoio e incentivo recebido durante toda a trajetória do curso, os quais sempre foram os meus maiores incentivadores da minha vida acadêmica.

    Agradeço também à minha irmã, por toda ajuda e compreensão na realização de mais este projeto.

    Agradeço, especialmente, as minhas alunas Carine Bertolini e Carine Volz Zaiosc, que não mediram esforços para que esta obra ficasse com o resultado esperado.

    Ao Prof. Pós-Dr. Ricardo Hermany, que soube conduzir este trabalho com o devido conhecimento, paciência e sugerindo as modificações necessárias.

    Aos professores do Programa de Programa de Pós-Graduação em Direito – Doutorado da Universidade de Santa Cruz do Sul, cuja contribuição em cada disciplina foi inestimável para se chegar ao resultado final.

    Aos pensadores que embasam esta tese, com os quais pude dialogar, pela contribuição original que ofereceram à humanidade, ocupando seu lugar na história, permitindo que de suas palavras fossem extraídas conclusões imprescindíveis ao objetivo proposto neste trabalho.

    formuladas por el Estado, son comparable a la espuma que aparece en la superficie del agua, están dirigidas esencialmente solo a los tribunales estatales y otros órganos del Estado. Los grupos y los individuos viven en total ignorancia del contenido de esas proposiciones. Ellos conocen únicamente el orden jurídico espontaneo de la sociedad, compuesto de instituciones, frente al cual toda regla es simple cáscara superficial, proyección. Así solamente una parte ínfima del orden jurídico de la sociedad puede ser afectado por la legislación estatal, y la mayor parte del derecho espontaneo se desarrolla con completa independencia de las proposiciones jurídicas abstractas. Las últimas, constituyen el plano más estático del derecho y también cuando afectan a un sector del derecho espontaneo de la sociedad, descansan sobre éste". (GURVITCH, 1945, p. 165-166).

    LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

    ADI - Ação Direta de Inconstitucionalidade

    ADPF - Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental

    AGEP - Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa

    ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária

    APS - Atenção Primária de Saúde

    Art. – artigo

    art. – artigo

    BH – Belo Horizonte

    CACIS – Central de Atendimento Cooperado e Integrado à Saúde

    CF/88 – Constituição Federal de 1988

    CIS - Consórcios Intermunicipais de Saúde

    CLSC - Centres Locaux de Services Communautaires

    CNJ - Conselho Nacional de Justiça

    CNM – Conselho Nacional dos Municípios

    CNS - Conselho Nacional de Saúde

    COAP - Contrato Organizativo da Ação Pública da Saúde

    DF – Distrito Federal

    DOU – Diário Oficial da União

    EAC - Estratégia de Agentes Comunitários

    EC - Emenda Constitucional

    ESF - Estratégia Saúde da Família

    EUA – Estados Unidos da América

    FAMURS - Federação das Associações dos Municípios do Rio Grande do Sul

    FIPEA - Fundação Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

    GFS - Gasto Social Federal

    HIV - Human Immunodeficiency Virus

    IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

    IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

    LC - Lei Complementar

    Min. - Ministro

    MS/GM – Ministério Saúde/Gabinete do Ministro

    Munic - Pesquisa de Pesquisa de Informações Básicas Municipais

    NHS - National Health Service

    NOAS - Norma Operacional de Assistência à Saúde

    NOB - Norma Operacional Básica

    nº - número

    nºs - números

    OCDE - Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico

    OMS - Organização Mundial da Saúde

    ONU – Organização das Nações Unidas

    OPAS - Organização Pan-Americana da Saúde

    p. – página

    PARTICIPASUS - Política Nacional de Gestão Estratégica e Participativa no SUS

    PCTs - Primary Care Trusts

    PEC - Proposta de Emenda à Constituição

    PIB - Produto Interno Bruto

    PNAB - Política Nacional de Atenção Básica PNHOSP - Política Nacional de Atenção Hospitalar

    PSF - Programa Saúde da Família

    RAS - Rede de Atenção à Saúde

    RCB – Receita Corrente Bruta

    RCL - Receita Corrente Líquida

    Rel. – Relator

    RS – Rio Grande do Sul

    SC – Santa Catarina

    SGP - Secretaria de Gestão Participativa

    STF - Supremo Tribunal Federal

    STN - Secretaria do Tesouro Nacional

    SUS - Sistema Único de Saúde

    TCU - Tribunal de Contas da União

    TO - Tocantins

    UBS - Unidades Básicas de Saúde

    USF - Unidades de Saúde da Família

    UPAS - Unidades de Pronto-Atendimento

    UTI – Unidade de Tratamento Intensivo

    v. – volume

    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1.1. – Relação entre direito social e Estado

    Figura 4.1. – Modelo da pirâmide: hierarquização e regionalização do SUS

    LISTA DE GRÁFICOS

    Gráfico 4.1. – Tipo de serviço referido como local regularmente procurado

    quando as pessoas necessitam de atendimento à saúde. Brasil

    – 1998, 2003, 2008

    Gráfico 4.2. – Gastos proporcionais à Receita Corrente Líquida (RCL) com saúde por ente federativo

    LISTA DE QUADROS E TABELAS

    Quadro 3.1. – Número de profissionais de saúde por 10.000 habitantes

    Tabela 3.1. – Brasil e regiões: Leitos SUS de UTI por 10 mil habitantes

    (set. 2014)

    Tabela 3.2. – Número de leitos por especialidade

    Tabela 4.1. – Distribuição dos municípios e da população segundo classe de tamanho dos municípios. Brasil – 2010

    Quadro 4.1. – Dez causas principais de ineficiência

    Quadro 4.2. – Principais desafios e recomendações

    PREFÁCIO

    Atravessamos um paradigma de crise geral no Estado Moderno: descrença generalizada nas tradicionais formas de participação política, de crença nas instituições democráticas tradicionais, de insuficiência dos direitos sociais garantidos – ao menos na letra da lei – pelo Estado e de esgotamento da democracia representativa, monopolizada por antiquadas agremiações políticas descoladas dos anseios sociais.

    Por tudo isso, podemos afirmar que é possível submeter à sociedade a uma radical crítica, transpondo as fronteiras sociais, políticas, teóricas, epistemológicas e culturais, com fulcro no cumprimento do potencial emancipatório das promessas da modernidade. Esse desafio pressupõe uma mudança radical nas concepções dominantes de direito. É preciso efetuar uma crítica aguda ao monopólio estatal e jurídico do direito, com intuito de fazer florescer alternativas ao dogmatismo jurídico e ao engessado positivismo do direito. O objetivo é um novo olhar ao Direito, uma concepção de pluralismo jurídico e uma abertura ao caráter explicitamente político do direito.

    Georges Gurvitch foi um dos últimos pensadores modernos a propor, audaciosamente, um sistema próprio e genuíno de compreensão e explicação do fenômeno humano e de organização social. Gurvitch baseou suas premissas na conjugação de uma filosofia pluralista nos campos jurídico e social. Guritch jamais pretendeu que suas posições, no campo da sociologia, fossem neutras, pois, para ele, a sociologia é uma crítica social no sentido que expressa uma concepção do pensamento sociológico como análise crítica das doutrinas, teorias e instituições sociais, rejeitando as concepções conservadoras da filosofia e da sociologia. Georges Gurvitch buscou conceber teorias mais radicais e operantes na prática das transformações sociais.

    Sua coragem e presunção o tornaram, por algum tempo, um sociólogo marginalizado, tendo ele mesmo se definido como um excluído da horda dos sociólogos e filósofos. Talvez tenha sido este o motivo pela qual sua teoria não tenha logrado uma influência mais contundente em sua época, décadas de 1930 e 1940, como se poderia imaginar de uma obra tão profunda quanto foi sua teoria do direito social.

    Adriane Toaldo é uma dessas pesquisadoras que resolveu resgatar o legado de Gurvitch e trabalhar sua teoria do direito social, ao propor um novo paradigma de relacionamento entre sociedade civil e poder público, transcendendo a ideia de uma gestão pública compartilhada, propondo uma participação pública no campo do direito social à saúde de modo inovador, profundo e detalhado.

    Tive o privilégio de exercer o mister de orientador de seu trabalho, tendo sua pesquisa sempre primado por um olhar crítico para o modelo clientelista de prestação de serviços na área da saúde. Ainda, a inquietação típica dos investigadores acompanhou Adriane na sua releitura da articulação dos diferentes entes da federação brasileira assim como a necessidade de um olhar mais qualificado e de co-originariedade com a sociedade local.

    A autora afirma o caráter imprescindível da análise do atual estágio das políticas de saúde, propondo, criticamente, a partir das bases teóricas consolidadas, quais seriam as modificações necessárias à melhoria dos serviços e, ao mesmo tempo, como realizar o diagnóstico das insuficiências, não somente na prestação da saúde, mas na própria estrutura de cooperação e de participação popular nas políticas públicas da área na esfera local. Longe de propor uma solução miraculosa, concebida individualmente, a autora ressalta justamente que o sucesso de sua proposta dependerá da transformação radical da estrutura administrativa local, implicando uma permeabilidade constante à participação dos usuários do sistema de saúde.

    A pesquisa tem o mérito de inovar na proposição de estratégias locais de cooperação e de integração, bem como na forma de rearticulação dos atores sociais e dos entes federativos, na direção de um novo modo de gestão e de cooperação entre esses mesmos sujeitos, destacando a importância dos elementos democráticos inerentes ao Estado brasileiro.

    O ineditismo da proposta também está na perspectiva de romper com o atual modelo fragmentado e desarticulado dos serviços de saúde pública no Brasil, vislumbrando não somente um novo suporte teórico-jurídico, mas também uma proposta de solução diferenciada para essa questão, mediante a indicação de uma ferramenta local de cooperação que visa à rearticulação do pacto federativo e a participação social na reordenação do sistema de saúde.

    Assim é que direito social de Gurvitch – enquanto fundamento de integração da sociedade e poder público – visa demonstrar sua interconexão da teoria do direito social com a defesa dos direitos sociais fundamentais. É uma proposição baseada nas premissas do constitucionalismo contemporâneo de modo a transformar a dogmática jurídica monista pura e simples sob uma nova proposição: submeter o Estado Contemporâneo ao crivo pluralismo jurídico, para além da mera formalidade legislativa do processo de criação normativa, tendo a democracia ampliada como pedra angular do modelo constitucional brasileiro.

    Desejo, ao final, que esta publicação seja a primeira de tantas que a autora – agora como Doutora em Direito – irá elaborar no sentido de uma revisão dos modelos de políticas públicas, forte num poder local que compatibilize a autonomia com o conjunto de preceitos constitucionais, notadamente da democracia administrativa.

    Uma excelente leitura a todos.

    Prof. Pós-Dr. Ricardo Hermany

    Pós-Doutorado na Universidade de Lisboa, Portugal. Professor Permanente do Programa de Pós-Graduação em Direito – Mestrado e Doutorado – da Universidade de Santa Cruz do Sul - UNISC, Santa Cruz do Sul, RS

    APRESENTAÇÃO

    Este livro foi originado na construção da Tese de Doutorado do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade de Santa Cruz do Sul, cuja área de concentração se restringe aos direitos sociais e políticas públicas e cujo eixo temático está fundamentado nas dimensões instrumentais das políticas públicas. Toda a minha trajetória dentro do Doutorado foi direcionada, desde o seu início, pela preocupação com a saúde pública e com a apresentação de soluções que viabilizassem melhorias em sua gestão, de forma que todo cidadão brasileiro, aquele que possui por direito o acesso à saúde, conforme está previsto na Constituição da República Federativa do Brasil, tivesse, por parte do Estado, a devida obrigação, também constante da Carta Magna, acesso a uma saúde de qualidade, para que este direito social estivesse em estreita sintonia com os demais direitos que garantissem a dignidade da pessoa humana, fundamento maior do Estado Democrático de Direito.

    Assim, durante os debates em sala de aula, em função das leituras que foram aprofundadas no Programa, nos artigos e materiais científicos produzidos antes da confecção da tese, foi cimentada a ideia de que a saúde pública brasileira, que já tinha alcançado um patamar de qualidade inigualável em todo o mundo com a criação do Sistema Único de Saúde (SUS), pudesse ser ainda mais aprimorada, no sentido de atender princípios previstos em lei, como os da universalidade, integralidade, regionalização e eficiência, garantindo que em todo o território nacional as pessoas pudessem ser atendidas em viés que privilegiasse a prevenção e o cuidado no nível mais básico de atenção à saúde, de baixa complexidade, sem descuidar do atendimento de média e alta complexidade.

    Os estudos realizados nesta fase anterior à construção da tese permitiram identificar que a saúde, a partir do advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, tornou-se um direito de todos e um dever do Estado, ampliando sobremaneira o seu campo de atuação e obrigando o poder público a criar mecanismos que garantissem esta nova ordem para toda a população. A chamada Constituição Cidadã, erigida no âmbito da redemocratização do país, entendeu ser necessária à ampliação do conceito de saúde para todos os brasileiros, fato que gerou uma demanda muito maior do que os serviços de saúde da época podiam suportar. Ainda hoje, apesar do imenso crescimento do SUS, a população sofre com a demora no atendimento e com a precária qualidade dos serviços oferecidos.

    A Constituição de 1988 gerou a necessidade de regulamentação do direito à saúde, criando-se, então as leis ordinárias que originaram o Sistema Único de Saúde, iniciando um longo caminho a ser percorrido para que toda a nação desfrutasse da nova perspectiva em relação ao direito à saúde.

    Trinta anos se passaram e pode-se verificar que muitos avanços ocorreram, fortalecendo o SUS e aumentando o número de atendimentos, de cirurgias, de fornecimento de medicamentos e de políticas públicas de prevenção e promoção à saúde. No entanto, a dimensão continental do Brasil, os problemas originários de uma gestão inadequada, a falta de recursos, a corrupção, a falta de um controle local sobre os serviços executados e muitos outros problemas têm gerado o descontentamento do cidadão, que se vê obrigado a enfrentar longas filas para ser atendido, esperar muito tempo por exames, procedimentos cirúrgicos e atendimento especializado, em meio à crise que atravessa o Sistema Único de Saúde.

    Os últimos anos agravaram esta situação, em função da crise econômica e da recessão que o país enfrenta, o que gerou um aumento expressivo no número de desempregados. Muitos deles perderam seus planos privados de saúde e sua única alternativa agora é a saúde pública, aumentando ainda o número de usuários. A par disso, há muitos anos vem crescendo o fenômeno da judicialização, pois essa foi à alternativa encontrada pelo cidadão para ser atendido mais rapidamente, contornando a longa fila de espera através de uma decisão imediata dos magistrados, fundada no próprio direito social à saúde previsto na Constituição.

    Assim, a tese de Doutorado propriamente dita tinha como objetivo encontrar soluções compatíveis com o ordenamento jurídico brasileiro e com a execução de políticas públicas dentro do Estado Democrático de Direito, ao mesmo tempo em que fossem administrativamente viáveis e contassem com a participação de todos os entes federados que administram o SUS (União, Distrito Federal, estados e municípios), além da imprescindível participação da sociedade civil como co-gestora de todo o processo.

    Ao verificar a legislação existente a respeito da competência pública sobre a saúde, encontrou-se uma legislação difusa, que simplesmente afirmava que a responsabilidade sobre esta questão era conjunta entre os entes federados citados acima, não havendo lei complementar que explicitasse as obrigações do poder público em cada nível de atuação. Havia uma lacuna a ser preenchida na determinação da capacidade e da intervenção, ou seja, do papel que tanto a União como o Distrito Federal, os estados e os município deveriam ter para responder à necessidade da população de ter acesso a uma saúde com qualidade. Esta indefinição, presente até hoje, dependente de leis complementares para estabelecer o modo de cooperação entre os entes federativos, que não sobreveio até o momento, do ponto de vista do trabalho desenvolvido, tem gerado indefinições e ineficiências na administração da saúde.

    Além disso, a par da lacuna acima apontada, o Estado brasileiro, como herança de um processo histórico de centralização, tem privilegiado a atuação dos entes federados maiores, como o Estado e a União, prejudicando o desempenho do Município, como ente federado menor, responsável por parcela significativa da saúde local sem a devida contrapartida de recursos ou autonomia para executar uma política pública municipal que atenda a demanda do cidadão, pois é no município que os problemas de saúde existem e precisam ser atendidos.

    Assim, com base na competência comum e na inexistência de lei complementar que definisse a forma de cooperação entre os três níveis de governo, além da deficiência dos serviços de saúde, a tese de Doutorado concentrou seus esforços no sentido de apontar estratégias para viabilizar uma melhoria na prestação do direito social à saúde, no plano municipal, reorganizando os serviços de forma cooperada, integrada e democrática entre os atores sociais e entes federados e maximizando os recursos (financeiros, humanos, tecnológicos e estruturais) existentes para atender as demandas da população.

    A construção da tese de Doutorado estava fundamentada no pressuposto de que o direito social à saúde era condição sine qua non da dignidade da vida humana e que havia a necessidade de se aprofundar a implementação de políticas públicas para atender a essa importante demanda da população. A tese se propunha a ser mais do que um debate jurídico, mas um conjunto de argumentações mais ampla, que envolvia diferentes formas de conhecimento social que poderiam oferecer suporte a este imenso desafio.

    O primeiro passo consistia em adotar bases teóricas diferenciadas das comumente utilizadas para compor o espectro filosófico e jurídico necessário ao entendimento da realidade e das proposições a serem levantadas. Encontrou-se nos textos de Georges Gurvitch (1894-1965) e na sua ideia de direito social os elementos que deram suporte às respostas procuradas pela tese e que forneceram um suporte do modelo de integração e participação democrática como pressuposto de concretização dos direitos fundamentais.

    Georges Gurvitch, apesar de sua nacionalidade russa, tem a sua produção intelectual na França, país que adotou no início do século passado. Sua obra consiste em um conjunto expressivo de livros, muitos dos quais ainda sem tradução no Brasil, que pressupõem como fundamento a criação de um direito social, isto é, da adoção normas de convivência entre as pessoas e os grupos a partir de suas necessidades e de seus pressupostos, respeitando-se a autonomia de cada um e a diversidade ou pluralidade de constituição das organizações sociais.

    Assim, do ponto de vista de Gurvitch, qualquer comunidade tem condições de criar as suas próprias leis, ou fatos normativos, como ele mesmo chamava, determinando o modo de vida local. Este direito originário do poder local era considerado pelo autor como um direito social puro, que poderia ou não ser integrado às leis estatais, como decorrência de sua força normativa. As normas, constituídas desta forma, seriam uma força viva que contribuem para a paz social e para a harmonia da coletividade. O direito social de Gurvitch se opõe à ideia de uma fonte normativa única, proveniente de um Estado centralizador, que determina a vida dos cidadãos sem respeitar suas características e pluralidade.

    A pluralidade, por sua vez, é outra marca importante na contribuição que este sociólogo ofereceu à humanidade, pois decorre da ideia de que há uma diversidade muito grande de pessoas e de ideias no mundo e que todas estas versões devem ser respeitadas e apreciadas para que se construa uma sociedade igualitária a partir da conjunção dos desiguais em sintonia. Por este motivo, Gurvitch é extremamente contemporâneo, apesar de viver em uma época em que o termo globalização ainda era entendido de forma muito restrita. A pluralidade aqui apresentada pressupõe o respeito à autonomia dos povos bem como internamente dentro do território nacional.

    Gurvitch também oferece uma contribuição importante em relação aos direitos sociais, sendo precursor da defesa de uma série de relevantes aspectos da vida humana, como o trabalho, a saúde, os direitos de crianças e idosos, a igualdade entre homens e mulheres, todos eles intimamente relacionados com os direitos sociais previstos no moderno constitucionalismo. Assim, no presente estudo, foi possível traçar um paralelo entre as ideias do eminente pensador e as que são defendidas pelos pensadores que estão construindo estados democráticos e de direito.

    As teorias de Gurvictch, ao defenderem a soberania local e a autodeterminação das comunidades, entraram em rota de aproximação com os pressupostos da subsidiariedade, um conjunto de ideias que afirma ser uma sociedade mais democrática e inclusiva aquela que parte dos poderes menores para um poder maior, interligando a sociedade a partir dos interesses de quem vive localmente, mas entende a necessidade de haver uma integração maior, visto que determinados objetivos não serão alcançados de forma limitada.

    O princípio da subsidiariedade, como colocado neste trabalho, engendra o fortalecimento do poder local e da sua capacidade de organização municipal a partir de relações solidárias entre o poder e a sociedade, redimensionando a ideia de esfera pública. A ideia de fortalecimento do poder local também contribui para uma reconfiguração das relações entre os entes federados, redistribuindo as competências e atribuições de cada um dos membros federados, inibindo, desta forma, a clássica centralização dos entes maiores. Salienta-se, ainda, que havendo maior concentração no poder local, aumenta o poder de fiscalização da sociedade e há maiores condições de evitar desmandos e práticas corrosivas na administração pública.

    Somando-se os dois pressupostos, que, no meu entender, estão intimamente relacionados, apesar de serem geográfica e historicamente distintos, foi possível delinear uma matriz teórica consistente capaz de elucidar os caminhos a serem percorridos na procura de soluções para o problema levantado, ou seja, de promover com eficiência e eficácia uma saúde pública acessível a toda a população. Para tanto, foi necessário diagnosticar o atual estágio das políticas de saúde, a fim de apreciar criticamente, quais seriam as modificações necessárias à melhoria dos serviços e, ao mesmo tempo, identificar as insuficiências não somente na prestação da saúde, mas na própria estrutura de cooperação e participação popular nas políticas públicas da área na esfera local.

    A tarefa de examinar a qualidade da saúde pública existente no Brasil gerou uma pesquisa exaustiva, através da qual se examinaram princípios normativos, leis, portarias, mudanças de posicionamento de gestão, destinação de recursos, dados estatísticos e demais instrumentos de avaliação que permitiram construir um quadro geral da saúde no Brasil e nos municípios, denotando os avanços do SUS e, ao mesmo tempo, as fragilidades a serem sanadas.

    Também foi preciso entender qual seria o novo papel do município nesta proposição, a partir do entendimento de que a comunidade constitui um locus de intervenção privilegiado, pois é neste ente federado que a vida acontece, que a população é atendida e que as decisões das políticas públicas geram efeito. Toda a concepção decorrente das ideias de Gurvicth e do princípio da subsidiariedade fazem convergir para o poder local as decisões, as implementações e as avaliações do que está sendo feito pela saúde pública.

    Este trabalho possui um caráter inovador ao propor estratégias locais de cooperação e de integração (que pode ser utilizada como parâmetro geral a todos os municípios) na forma de rearticulação dos atores sociais e dos entes federativos, na direção de um novo modo de gestão e de cooperação entre esses mesmos sujeitos, reforçando elementos democráticos inerentes ao Estado Democrático de Direito, bem como buscando concretizar da melhor forma possível o direito à saúde no país.

    Desta forma, foi possível apresentar as bases teórico-jurídicas e linhas de ação capazes de viabilizar uma melhoria na prestação desse direito social no âmbito local, por meio de uma cooperação integrada e democrática entre os atores sociais envolvidos e os entes federados, a partir de uma nova estratégia local de cooperação que reorganizará os serviços de saúde, sob a coordenação do município, promovendo uma rearticulação do Pacto Federativo e a maximização dos recursos financeiros, humanos, tecnológicos e estruturais disponíveis compatível com as demandas municipais.

    A construção do marco teórico e das propostas de intervenção não se limitaram às fontes citadas acimas; pelo contrário, houve um diálogo constante com uma grande leva de pensadores de reconhecida importância no cenário dos direitos sociais, realizando intersecções entre suas propostas e assimilando as diferentes denominações criadas por esses, mas que, no fundo, possuíam sentido semelhante ao proposto por Gurvitch ou pelos adeptos da subsidiariedade. Ou seja, a partir da matriz teórica fundada no binômio direito social – subsidiariedade foi possível fazer comparações e ampliar o universo de acepções para diversas correntes de pensamento que também contribuíram de maneira decisiva para elucidar a defesa da saúde e dos direitos sociais como inerentes à condição humana.

    Ao adotar como base de pesquisa o tema do direito social à saúde e as novas técnicas de gestão integrada e de cooperação na rearticulação do pacto federativo, o que indica a visão crítica debruçada sobre a tripartição de responsabilidades entre União, Estados e Municípios, afirma-se o caráter diferenciado do presente texto, ou seja, a articulação entre o direito social de Gurvitch e os direitos fundamentais indica, ao menos, uma nova perspectiva sobre a prestação do direito à saúde e uma alternativa nas propostas de políticas públicas para esse campo, albergando elementos de participação social e de integração, que contribuem para a melhoria da prestação desse direito social.

    Além da inovação contida na base teórica utilizada encontra-se a inserção de uma rearticulação do pacto federativo, com fulcro no princípio da subsidiariedade, apresentando-se como diferencial o fato de que a proposição busca uma linha cooperada entre os entes federativos e não uma simples modificação da base normativa com a determinação de competências.

    O ineditismo da proposta também está na perspectiva de romper com o atual modelo fragmentado e desarticulado dos serviços de saúde pública no Brasil, vislumbrando não somente um novo suporte teórico-jurídico, mas também uma proposta de solução diferenciada para essa questão, mediante a indicação de uma ferramenta local de cooperação que visa à rearticulação do pacto federativo e a participação social na reordenação do sistema de saúde.

    Para que se pudesse abarcar o conjunto do problema a que se propôs resolver, o livro foi dividido em cinco capítulos, pois cada um deles complementa o outro em uma sequência que conduz ao objetivo de apresentar a indicação de uma proposta para sanar a ineficiência da saúde pública municipal no Brasil.

    O primeiro capítulo enfatiza o direito social de Gurvitch como fundamento de integração da sociedade e poder público, procurando demonstrar como a interconexão da teoria do direito social com a defesa dos direitos sociais fundamentais no constitucionalismo contemporâneo pode romper a dogmática jurídica, a partir do pluralismo jurídico e da democracia como forma de complementaridade do atual modelo constitucional brasileiro, aproximando a teoria dos direitos sociais com a defesa dos direitos fundamentais sociais na ordem constitucional brasileira como forma de melhoria na prestação do direito social à saúde.

    O segundo capítulo estabelece uma relação indissociável entre a proposta do direito social de Gurvitch e o princípio da subsidiariedade, pois se entende que, embora formulados em épocas e contextos diferentes, ambos coadunam em um ponto crucial, ou seja, que a defesa dos direitos dos cidadãos necessita, primeiramente, ser elaborada e formulada em nível local, a partir da organização das comunidades e dos atores locais, fortalecendo o município como ente federado, visto que é nele que os problemas acontecem e as soluções são encontradas.

    O terceiro capítulo objetiva analisar o sistema público de saúde existente no Brasil a partir dos princípios inscritos na Constituição Federal, realizando, em síntese, um panorama da saúde pública no País no que tange a sua estrutura, ao financiamento e ao funcionamento dos serviços de saúde ofertados mediante o Sistema Único de Saúde (SUS).

    O quarto capítulo procura entender como são executadas as políticas públicas de saúde no nível mais básico de administração estatal, o município, apontando suas insuficiências e problemas, e formulando novos preceitos de organização, a partir do federalismo cooperativo, com a consequente solidificação da cooperação e participação social, bem como o fortalecimento das ações democráticas, em nível local, como condição para se ter uma gestão compartilhada que proporcione uma melhoria no sistema de saúde.

    O quinto capítulo traça as bases de um novo modelo de gestão integrada e cooperada para, em momento posterior, elencar as condições e ações necessárias para a proposta final desta tese, ou seja, a indicação de instrumentos locais desse novo formato de organização entre a sociedade civil e entes federados para melhoria na prestação do direito social à saúde, no municipalismo brasileiro, tendo como pressuposto a cooperação entre os entes federados a partir dos múltiplos recursos que possuem, sob a coordenação do poder local.

    As conclusões deste livro sintetizam a abordagem teórica e enfatizam o teor da indicação da proposta, bem como propõem caminhos para que a mesma tenha repercussão entre os municípios, configurando-se como uma alternativa para a implantação de uma estratégia de cooperação entre a sociedade civil e as instâncias federativas que garanta o acesso a esse importante direito social em nível local.

    1. O DIREITO SOCIAL DE GURVITCH E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS COMO BASE DE (RE)INTERPRETAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS NO BRASIL

    [...] le centre du développement du droit dans notre époque, comme dans autre quelque, ne doit pas être cherché dans les lois, ni dans la jurisprudence, ni dans la doctrine, ni en général dans un sistème de règles, sinon dans la societé elle-même[1]. (GURVITCH, 1945, p. 165).

    O presente capítulo possui como objeto de análise o direito social sob a ótica de Georges Gurvitch (1894-1965), o qual constitui a matriz teórica para uma ressignificação dos direitos sociais no Brasil em face do Estado Democrático de Direito. Nessa seção, propor-se-á uma interconexão entre este sociólogo e jurista russo-francês com os pensadores mais contemporâneos que defendem os direitos fundamentais sociais na esfera constitucional.

    A leitura das obras de Gurvitch mostra como suas ideias em termos de direitos sociais e de participação da sociedade nas decisões (legislativas e administrativas) que envolvem a esfera pública está em consonância com o atual Estado Democrático de Direito. Embora o autor tenha gerado os seus textos em meados do século XX, quando o mundo ainda experienciava outras estruturas de Estado, como o totalitário ou do bem-estar de direito, seus escritos se adequam perfeitamente ao espírito presente no século XXI de divisão de poderes entre a Sociedade Civil e o Estado, como se prenuncia no hodierno momento constitucional brasileiro.

    Gurvitch previu um futuro não tão distante, o de uma sociedade plural em sua composição, justificando a ideia de que deveria haver uma diversidade de fontes normativas para se buscar o equilíbrio e a justiça social. Ademais, a pluralidade se tornou ainda mais relevante quando se pensa em um mundo globalizado e complexo, no qual cidadãos do mundo inteiro estão aptos a promover uma ideia de harmonia social.

    As teses de Gurvitch e de outros autores, na seara dos direitos fundamentais sociais de viés constitucional, fundamentam uma reordenação jurídica e social que tem por finalidade responder aos anseios de uma população que clama pelo atendimento a seus direitos e garantias fundamentais e pela oportunidade de exercer seu papel de cidadão, criando fatos normativos e sendo detentora de um poder que se equivale ao padrão estatal, dotando a sociedade de legitimidade na criação de instância deliberativa.

    Dentro desse ideário, a teoria do direito social de Gurvitch, aliada a sua tese dos direitos sociais, de caráter integrador, favorece a participação ativa da sociedade na produção de normas, ao mesmo tempo em que garante a sua efetividade no Brasil, especialmente o da saúde, visto que sociedade e Estado se unem em prol da melhoria desse serviço público no Estado Democrático de Direito.

    Para que o presente estudo possa se apresentar através de uma linha de ação coerente, em primeiro lugar é preciso caracterizar como e quando o direito social de Gurvitch pode servir de fundamento para integrar sociedade e poder público em um Estado Democrático de Direito.

    Em segundo lugar, procura-se demonstrar como a interconexão da teoria do direito social com a defesa dos direitos sociais fundamentais no constitucionalismo contemporâneo pode romper a dogmática jurídica. E, em momento posterior, analisam-se as interações do pluralismo jurídico e da democracia com o direito social de Gurvitch como forma de complementaridade do atual modelo constitucional brasileiro. E, por fim, aproxima-se a defesa dos direitos fundamentais sociais na ordem constitucional brasileira e o direito social de Gurvitch como forma de melhoria na prestação do direito social à saúde.

    1.1. O Direito Social de Gurvitch: integrando sociedade e poder público em um Estado Democrático de Direito

    O estudo em tela inicia-se pelo marco teórico do direito social de Georges Gurvitch, o qual demonstra que o direito é um fato social, surgindo do próprio grupo e não exclusivamente do Estado, mas com ele podendo coexistir. A partir desse entendimento, demonstra-se a importância da integração entre sociedade e Estado na concretização dos direitos fundamentais sociais, notadamente o direito à saúde, no atual Estado Democrático de Direito.

    Justifica-se a adoção desse sustentáculo inicial sob o ponto de vista da própria dificuldade de realização das políticas públicas de saúde, em especial no âmbito local, exigindo uma integração social através do fomento de processos de democratização de todos os âmbitos da sociedade, ampliando a regulação e controle das decisões públicas, sem que isso importe na superação do Estado, pois este ainda possui uma grande importância no sentido de efetivar as normas jurídicas em favor da sociedade, demonstrando, assim, que a partir da introdução da teoria do direito social de Gurvitch é possível a reinvenção do Estado com bases democráticas participativas.

    Ainda que a denominação e o surgimento da sociologia do direito sejam relativamente recentes, a relação e os problemas decorrentes entre direito e sociedade remontam aos tempos antigos (TRÉVES, 1985, p. 21). Esta relação entre direito e sociedade[2] torna-se tão indissociável que é impossível haver a sua separação, pois significaria o desaparecimento dos indivíduos ou dos próprios grupos[3], quando ambos fornecem um ao outro suprimento social em sua constituição e existência.

    Para Gurvitch, o direito é a parte do conhecimento humano que se encontra mais ligado à vida, mais ainda que a moral e a religião, pelo simples fato de que sempre se baseia em um reconhecimento coletivo, tanto pelo seu exercício como pelo seu conteúdo, pois sua vocação consiste em aplanar os conflitos sociais. Onde existe uma sociedade, uma classe social, um grupo estruturado, ou mesmo somente um nós ativo, há possibilidade de nós encontrarmos em presença o direito. (GURVITCH, 1977, p. 240). Isto é, não existe possibilidade de separar o direito de sua existência social[4], pois a regra, invocada pelo conjunto, se afirma como condicionante e, ao mesmo tempo, como objeto da relação entre seus membros[5].

    O direito somente recebe a plenitude de sua eficácia no interior de uma estrutura social, pois a vida do direito não é conduzida pela lógica, mas pela experiência da existência social[6] na medida em que seus conceitos são relativos e as técnicas de interpretação devem considerar os conflitos de grupos (GURVITCH, 1977, p. 3). Nenhuma sociedade pode expandir-se sem que o direito a acompanhe ao mesmo tempo e no mesmo sentido (DURKHEIM, 1937, p. 97).

    A par disso, a construção de pensamento de Gurvitch se encontra diretamente relacionada com a obra de Aristóteles, A política (2008), no que tange ao fenômeno social, mais especificamente com o tema do grupo social e com o bem comum[7], uma vez que esse pensador, assim como Gurvitch, refere que o homem é um ser social e em coletivo constrói suas referências, necessitando do coletivo para garantir a sua sobrevivência e compartilhar relações. O ser humano é um animal político, destinado a viver em sociedade e participar das suas decisões políticas (ARISTÓTELES, 2008, p. 9 e 56)[8].

    O jurista e sociólogo francês Maurice Hauriou e o italiano Santi Romano também oferecem grandes contribuições à teoria de Gurvitch, especialmente no que tange ao oposto das concepções do direito e do Estado, ao atribuir à instituição[9] a expressão máxima de juridicidade, destacando Hauriou (1968, p. 39-40) que são as instituições que criam as normas de direito e não tais normas que dão origem às instituições, servindo de equilíbrio aos interesses individuais e coletivos, demonstrando que esse instituto exerce papel importante na formação do sistema jurídico.

    O italiano Santi Romano, ao desenvolver a teoria do direito como instituição, contrapôs-se ao normativismo positivista, valorizando a pluralidade de ordenamentos jurídicos. Para Santi Romano (1951, p. 27 e 41) o ordenamento jurídico é indissociável da instituição, ao prescrever: Ogni ordinamento giuridico è un’istituzione, e vice-versa ogni istituzione è un ordinamento giuridico: l’equazione fra i due concetti è necessária ed assoluta[10]. Isso significa que "a instituição é a primeira, originária e essencial

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