Encontre milhões de e-books, audiobooks e muito mais com um período de teste gratuito

Apenas $11.99/mês após o término do seu período de teste gratuito. Cancele a qualquer momento.

Benedita e o Orgulho: Histórias e Vozes
Benedita e o Orgulho: Histórias e Vozes
Benedita e o Orgulho: Histórias e Vozes
E-book199 páginas2 horas

Benedita e o Orgulho: Histórias e Vozes

Nota: 0 de 5 estrelas

()

Ler a amostra

Sobre este e-book

Histórias que chegam e vozes que soam.
IdiomaPortuguês
EditoraM-Y Books
Data de lançamento10 de jul. de 2021
ISBN9781526046727
Benedita e o Orgulho: Histórias e Vozes

Leia mais títulos de Nelson Santrim

Autores relacionados

Relacionado a Benedita e o Orgulho

Ebooks relacionados

Ficção Geral para você

Visualizar mais

Artigos relacionados

Categorias relacionadas

Avaliações de Benedita e o Orgulho

Nota: 0 de 5 estrelas
0 notas

0 avaliação0 avaliação

O que você achou?

Toque para dar uma nota

A avaliação deve ter pelo menos 10 palavras

    Pré-visualização do livro

    Benedita e o Orgulho - Nelson Santrim

    NELSON

    SANTRIM

    BENEDITA E O ORGULHO

    (Histórias e Vozes)

    Apologia da Ignorância

    Todos os professores que tive tinham algo para ensinar. Eu ficava entediado e quase ofendido quando eles só queriam dar a impressão de que sabiam coisas e que me queriam transmitir ou passar essas coisas que sabiam. Ficava pior que estragado com a sua presunção de quem tinha algo para ensinar. Só porque eram professores!

    Chamavam-me ao quadro e então:

    - Mas o Miguel não sabe?

    O Miguel não sabe? Sempre este estribilho a ressoar-me no ouvido como um eco condenatório. Mas qual era o problema de não saber e ser ignorante? Qual é o mal de ser ignorante?

    Adoro pessoas que só sabem dizer:

    - Não sei.

    Para qualquer resposta que lhes peçam, só têm a dizer ao mundo e à sociedade um rotundo:

    - Não sei.

    Para mim, estas são as melhores pessoas. É muito mau e muito negativo quando alguém sabe alguma coisa. Um professor deve arrogar-se de saber a matéria que ensina? Quanta presunção acreditar-se detentor de um saber. Para mim, tem muito mais valor não saber. É por isso que sou fascinado pela sabedoria socrática:

    - Só sei que nada sei.

    Isso sim é ser um sábio: não saber nada. Para mim, as pessoas que não são ignorantes só podem ser umas convencidas. Por que há de alguém querer ter respostas? É muito mais digno e salutar responder, quando interpelado, que não se tem a mínima ideia sobre o que nos perguntam.

    Por exemplo, eu deliro quando vou a um restaurante e pergunto o que há para comer e me respondem:

    - Não sei.

    Ou quando estou numa terra estranha e desconheço o caminho para chegar onde quero chegar e perguntando por indicações me respondem um sublime:

    - Não sei.

    Existem pessoas cheias de si mesmas que se acham detentoras de algum saber e que só de vez em quando arriscam um «não sei». Para mim, estas pessoas que se acham sabedoras são do pior que há. Eu gosto é dos ignorantes, aquelas pessoas que não sabem nada de nada, nada sobre nada. É com estas que gosto de conversar, porque não se arrogam de saber seja o que for.

    Uma criança nasce ignorante e devia morrer ignorante. As crianças deviam ser ensinadas a dizer «não sei» a tudo. Infelizmente há todo um sistema de ensino que as quer desvirtuar com conhecimento. São os professores e muita gente em redor quem estraga as crianças.

    Tenho para mim que um ser humano deveria passar pela existência sem procurar o conhecimento ou tentar saber seja o que for. Quem quer respostas? Essas são as pessoas que se questionam. Quem não quer respostas não se questiona e responde a tudo com um simples e honesto:

    - Não sei.

    Pela minha parte, adoro que me considerem ignorante. Tenho sempre um «não sei» na ponta da língua. Resposta rápida. Resposta para tudo. Graças a Deus, não penso que sou um sábio, não penso que saiba alguma coisa. Só sei presentear os meus interlocutores com a minha bendita ignorância. Porque um homem morre sempre ignorante e mais vale assumir em vida que, pura e simplesmente, não sabe nada de nada.

    A Dor É Boa

    Adoro sofrer, sempre adorei o sofrimento. Se existem coisas boas nesta vida é a possibilidade infinita e aberta de sofrermos.

    O que seria a vida sem sofrimento? A que daríamos valor? É como dizia insistentemente o grande cultivador de músculos, Arnaldo Schwarzenegger: «NO PAIN, NO GAIN».

    Sem o sofrimento nunca ganharíamos nada. É por isso que tudo o que faço tem de envolver muita ou pelo menos alguma dor, ou então sinto que não tem o valor que faz valer a pena.

    Uma alma sofredora é sempre uma grande alma. O sofrimento valoriza-nos, dá-nos o reconhecimento que merecemos e possibilita-nos alcançar a grandeza. A dor merecida é sempre uma bênção. Felizes os que sofrem!

    A dor não é perversa como o prazer. O prazer é uma coisa má que nos deve fazer sentir culpados. O prazer é uma prisão e uma inutilidade. Nada se aprende com o prazer, antes nos torna moles acabando por nos tornar desprovidos de energia. Faz-nos relaxar depois do clímax. É muito mau – o prazer.

    Entre a dor e o prazer não há que hesitar, a escolha é facílima. Uma vida de sofrimentos é infinitamente preferível a uma vida de prazeres. Quem gostaria de ter uma vida só de prazer? Quem quer ter uma vida sem sentido – vazia e desprovida de incentivos? A vida que vale a pena viver está repleta de infortúnios e agravos pesarosos. A boa vida é feita de dor, porque a dor é o expoente que garante a nossa fortaleza.

    O prazer torna-se insuportável, é sempre a mesma coisa e depois esgota-se. Só aí, quando se esgota, é que podemos apreciar um pouco da vida se sentirmos desprazer. Mas a ausência de prazer pode não ser dor. É necessário que haja dor.

    Eu gosto de sofrer. Quando era miúdo ia andar de bicicleta e a minha Avó pedia-me que chegasse todos os dias com os joelhos esfolados das quedas. Era assim que a minha sábia Avó ficava descansada de que eu era um menino muito atinado.

    - Magoa-te, filho – aconselhava a minha querida Avó. – Não regresses a casa sem umas boas nódoas negras, Manelinho.

    Acontecia também andar à porrada e com cada bofetada me sentia condecorado, era uma medalha; cada pontapé nas virilhas um bálsamo pela dor de que iria gozar nas horas seguintes.

    Uma vez caí do telhado da casa dos meus Avós e eles mais me acarinharam quando o Doutor Soeiro, o médico da vila, lhes garantiu que eu tinha um braço partido.

    A humilhação psicológica também não é nada de desprezar, é uma dor saborosa. É claro que esta é uma dor mais exigente, é preciso ter uma alma que saiba sofrer e não simplesmente aquela sorte da carne que faz feridas.

    A minha família ensinou-me o gozo das dores de alma: as humilhações e os enxovalhos, as desconsiderações. Essas são todas as dores que mais valem a pena.

    O prazer?... Mas quem quer saber do prazer? A vida tem de ser muito mais do que isso! A vida tem de ser um vale de lágrimas para valer mesmo a pena. E eu quero gritar, quero lançar no vento esta mensagem, para que chegue a todos os recantos deste inferno terrestre: A DOR É A MELHOR COISA DO MUNDO!

    Aprende-se a lição sofrendo. Antes o Inferno que o Paraíso. 

    Ouvir Mais

    Eugénio era muito ingénuo e por isso era preciso aconselhá-lo. Estava sempre a necessitar que o chamassem à razão para não cometer erros crassos. Era impressionante, e proverbial entre os seus amigos e conhecidos, a sua falta de senso comum na gestão dos seus assuntos pessoais. Era frequente perder oportunidades, porque simplesmente não sabia como proceder para tirar o melhor partido de cada boa ocasião. Os amigos desesperavam quando o aconselhavam e ele, pura e simplesmente, acabava por estragar tudo.

    Acontecia ser muito irrefletido e distraído, pelo que era muitas vezes necessário chamá-lo à atenção. Muitas vezes perdia a chance de seguir por um caminho proveitoso, apenas porque não valorizava o que lhe acontecia e que podia resultar num bem maior. A sua falta de entrega e determinação exasperava quem lhe queria bem e que tudo fazia para o ajudar a combater a sua irritante ingenuidade. É claro que ninguém pode tomar como garantidas as boas intenções dos seus amigos, se não os ouvir quando eles devem ser ouvidos, e por isso também as amizades se afastavam.

    O essencial era que Eugénio continuasse a respeitar toda a gente, a respeitar os outros, porque o respeitinho era muito bonito. Se ao menos respeitasse as opiniões dos amigos, e as ouvisse e as tomasse em consideração, talvez Eugénio pudesse beneficiar de um bom conselho que porventura lhe dessem. Já era mais do que tempo para que ele acordasse e deixasse de ser tão irrefletido e descuidado com a maneira como tratava quem lhe queria bem.

    Assim se não se metesse em encrencas, nem em sarilhos, tudo correria pelo melhor. Se respeitasse os outros, e continuasse respeitando, por certo que até lhe tolerariam algumas excentricidades. Porém, não era fácil lidar com o temperamento casmurro de Eugénio. Não era nada fácil e com a idade ele ia-se fechando cada vez mais nas suas ideias sem permitir que os outros lhe inoculassem algo de seu que, nas suas boas intenções, pretendiam ajudasse o amigo. A excentricidade de Eugénio era a sua falta de capacidade de aproveitamento do que lhe poderia resultar bem e a aprendizagem com as lições da vida. Eugénio precisava de ser menos teimoso ao não dar espaço aos outros quando estes tentavam inculcar-lhe juízo. Não era mal-educado, mas a verdade é que não dar ouvidos a ninguém o tornava um pouco menos que sociável e um pouco menos que um amigo disponível para ouvir outros amigos.

    Podia Eugénio ter um certo pendor para ser um pobre de espírito, no modo menos simpático da expressão, mas se se comportasse no sentido de respeitar os outros, alguma coisa menos certa da sua cabeça ser-lhe-ia tolerada, porque até era frequente Eugénio expressar um humor de gosto duvidoso. Quantas gafes e saídas infelizes os amigos não tiveram de suportar-lhe! Tentava ser engraçado, mas era de uma pobreza de hilaridade confrangedora. Eugénio devia ouvir mais do que tentar expor o seu pensamento confuso sem considerar a clarificação que os outros lhe tentavam incutir. Ser amigo de Eugénio não era nada fácil. Não era fácil a amizade com Eugénio...

    Amadurecer

    Eugénio era um homem muito ingénuo. Às vezes até parecia mais um rapaz do que um homem, um rapazinho. É sabido que os homens amadurecem mais tarde do que as mulheres, e então, comparativamente a uma mulher, Eugénio era afinal muito um homem. Era imaturo.

    Tinha à volta de quarenta anos e sendo já quarentão era mesmo ainda muito ingénuo. Parecia que não sabia nada da vida. Não parecia estar a par das obrigações de uma pessoa adulta e tudo era como se lhe passasse ao lado. Havia um certo desfasamento de Eugénio com aquelas que são as preocupações da vida adulta. Às vezes parecia não estar nem aí para o que era realmente importante.

    Era difícil para ele levar uma vida escorreita e se não o amparassem ele não saberia como proceder nos assuntos da sua vida. Era muito inábil e parecia que vivia dentro de um sonho, mas será que a bolha em que vivia não iria rebentar um dia? Não parecia viver na realidade, como se vivesse alheado daquelas que devia ser as suas prioridades, para ser senhor da sua própria vida.

    Por isso o aconselhavam assaz frequentemente. Era uma sorte Eugénio ter verdadeiros amigos que procuravam orientá-lo, mas ele talvez até nem sequer se desse conta disso ou o valorizasse. Poderia vir a ter amigos que não o desamparassem, mas muitos deles com certeza que iriam saturar-se das atitudes displicentes e acabariam por abandoná-lo à sua sorte, a sorte por ele escolhida sem pensar sequer muito no assunto.

    Eugénio tinha planos e tinha sonhos, apesar da forma desmazelada com que parecia encarar a vida. Diziam-lhe que tivesse calma e que, se encarasse bem e tranquilamente o que lhe acontecia, por certo que o sucesso lhe iria sorrir. Mas tinha de haver mais do que uma leve vontade, tinha de haver empenho. Eugénio tinha de demonstrar que merecia aquilo que se propunha obter e conquistar. Nunca nada nos cai no colo, é preciso lutar.

    Eugénio amuava quando um sonho se desfazia. Tinha de se compenetrar de que tinha de ter calma. Mas também tinha de dar o seu contributo efetivo e não esperar que as coisas lhe caíssem no colo. Faltava maturidade a Eugénio. Era um sonhador inconsequente. As boas coisas não vêm simplesmente ter connosco; é preciso criar as condições para que essas boas coisas tenham a oportunidade de acontecer. Eugénio esmorecia, mas não podia permitir-se ser infantil na sua reação perante o fracasso de não obter o que pretendia. Para ser um homem, mas uma pessoa madura, perante a adversidade, tinha de encarar a situação com poder de encaixe e a capacidade de continuar a lutar pelos seus objetivos. Não podia desistir.

    O êxito poderia surgir, e só tinha que aguardar confiante e pela calada, sem levantar o ânimo em demasia para não espantar a boa sorte. Tinha de ser prudente e industrioso. Não cantar vitória antes da concretização dos seus anseios, mas também não baixar os braços antes do cair do pano. Tinha de levar a luta até ao fim, dar tudo por tudo, tudo de si, para alcançar o que almejava. Os amigos puxavam por ele, mas Eugénio precisava de crescer.

    Amor Sombrio

    Eugénio era um pouco ou muito ingénuo e precisava de se aconselhar. Era característico dele não saber que atitudes tomar, fosse prevenir-se ou tomar a iniciativa, e por essa razão tudo era muito difícil com ele de desemperrar e seguir adiante.

    Nada conseguia resolver sem ajuda, com a sua iniciativa própria, e era frequente vê-lo num estado de melancólica impotência, sentida e auto-imposta. Mas esse não resultar das situações que poderiam melhorar a sua vida, bem como dar-lhe uma maior qualidade de vida, sucedia normalmente devido à sua, talvez congénita, incapacidade para se fazer valer.

    Mas será que uma incapacidade para agir é algo que nasce com a pessoa, poderá ser inato? O certo era que Eugénio demonstrara sempre, junto dos amigos e no contacto com as outras pessoas, uma invariável inaptidão para se decidir ou resolver os seus problemas ou aproveitamento de situações vantajosas. Era uma lástima a lutar por si próprio.

    Andava ele com um mal de amor, que dificilmente lhe parecia ser um bem, porque sofria penosamente. Caíra enamorado, mas não tinha queda para desenvolver relações amorosas. Que situações conseguia Eugénio desenvolver? Provavelmente era uma nódoa em todos as áreas da vida. Neste concreto apaixonava-se, mas entregava-se à depressão sem resolver ou se decidir sobre nada de nada.

    Disseram-lhe, a título de conselho amigo, que acreditasse mais nas propriedades do amor e na sua própria capacidade para amar. Talvez aqui tocassem num ponto-chave da personalidade de Eugénio: ele não acreditava em si mesmo e era por essa incapacidade de acreditar em si que nada fazia, mesmo aquilo que poderia melhorar a sua vida.

    Ele não se mostrou, por conseguinte, muito crente nessa sua própria capacidade para amar, ou o que fosse, mas continuaram a insistir junto dele para que não tivesse receio e que assim ele iria ver que o futuro não era tão negro como ele o pintava. Mas como podia ele dar a volta? Como descolar de anos sobre anos de indecisão e conformismo com uma vida sem chama, sem procura e implementação de alternativas, uma vida de situações inquinadas logo à partida?

    A vida e o amor podem dar certo, mas é necessário fazermos a nossa parte. Era necessário que Eugénio tomasse as

    Está gostando da amostra?
    Página 1 de 1