Produtos Florestais não Madeireiros: As Comunidades e a Sustentabilidade do Desenvolvimento
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Produtos Florestais não Madeireiros - Márcia Joana Souza Monteiro
COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO SUSTENTABILIDADE, IMPACTO, DIREITO, GESTÃO E EDUCAÇÃO AMBIENTAL
Dedico este livro à minha família, em especial aos meus pais, Sebastiana e Miracy, a quem devo minha existência e a forma como conduziram o meu caminhar; aos meus filhos, Imô, Akme-re e Améi, que iluminam minha vida e me dão motivos para continuar buscando, a cada novo dia, maneiras de oferecer sempre o melhor de mim, nas inúmeras tentativas de aprender o verdadeiro sentido do ato de cuidar; ao meu esposo, ao Felipe, pai dos meus filhos, pelo companheirismo ao longo da vida; e à minha neta, Ana Clara, minha riqueza maior de amor. A todas às mestras
e aos mestres da tradição
da Ilha de Maiandeua, que, por meio de suas sabedorias recebidas e transmitidas, propiciam a manutenção da convivência harmoniosa da população com o meio ambiente, na efetiva conservação da sociobiodiversidade local. E àqueles que respeitam e valorizam os bens maiores que constituem a identidade de um lugar – os saberes tradicionais, as práticas culturais e a relação sustentável com a natureza – e buscam alternativas para protegê-los.
AGRADECIMENTOS
Meu muito obrigada
ao grandioso Universo, por propiciar a minha existência e de toda a natureza da qual sou parte integrante.
Ao Prof. Dr. Manoel Malheiros Tourinho, pela cordialidade em prefaciar esta obra, dedicando seu tempo e sua sensível percepção sobre a temática abordada.
Ao Prof. Dr. Paulo Luiz Contente de Barros, pelas valiosas orientação e condução da pesquisa que subsidiou este livro, exercitando, da melhor forma possível, sua paciência e sua compreensão em momento tão delicado e conturbado que vivenciei no período.
Aos alunos do ensino médio da Escola Municipal de Ensino Fundamental e Médio Maria de Lourdes Ferreira, da comunidade de Algodoal, pelas imensuráveis participações e contribuições para a realização das investigações.
Aos moradores da Área de Proteção Ambiental (APA) Algodoal-Maiandeua, pela fraterna acolhida em seu território por mais de três décadas; e às famílias de cada uma das quatro comunidades, Algodoal, Fortalezinha, Mocooca e Camboinha, pela preciosa colaboração, quando da minha vivência em campo, para a construção das respostas à investigação, pois sem as informações fornecidas por eles e sem as interações compartilhadas, a qualidade dos resultados não seria a mesma.
Ao amigo Antonio Fausto, jornalista e mestre em Comunicação, pelo primoroso profissionalismo na organização e na formatação do conteúdo deste livro.
A toda a minha família, amigas, amigos e colegas, que, de maneira direta ou indireta, apoiaram este trabalho.
MUITO OBRIGADA!
PREFÁCIO
Escrever um prefácio é pedir ao prefaciador que atenda a duas condições essenciais: a primeira é conhecer o autor e a segunda é estar familiarizado com o tema que prefacia. A autora deste livro, Márcia, conheço e depois falo sobre isso; quanto à outra condição, o convite da autora é o avalista. Importante assunto traz o livro, cujo conteúdo, compreendido e internalizado na consciência dos seus leitores (certamente estudantes e outros atores sociais interessados no tema), habilita-os à conspiração contra o paradigma da ciência linear e normal
, cuja aplicação na natureza despreza a sua vida sistêmica, tanto biológica quanto social. Desde a metade do século XX que a questão ambiental e a exclusão social vêm sendo colocadas como premunições de um debate nos círculos acadêmicos sobre a necessidade de uma nova revolução científica, que traga às relações homem-natureza uma abordagem interpretativa alicerçada em um outro paradigma científico e tecnológico, que não considere apenas o mercado global, mas invista em ciência e tecnologia de forma a empoderar os sistemas produtivos locais, por serem mais próximos da distribuição da riqueza e do poder decisório legitimado.
O livro de Márcia Joana, professora, bacharel em Gestão Ambiental, mestre em Gestão de Recursos Naturais e Desenvolvimento Local na Amazônia e mestre também em Ciências Florestais, tem como objetivo mostrar que o conhecimento e o uso dos produtos da mata, não necessariamente para produção madeireira, são importantes para a vida e a sustentabilidade das comunidades florestais, sobretudo aquelas cujo território de vida e bem-estar é uma Unidade de Conservação (UC) da natureza. A autora é uma apista
, pois vive na APA Algodoal-Maiandeua, no município de Maracanã (PA), daí conseguir transitar e interagir com o cotidiano de 530 famílias, moradoras de quatro comunidades extrativistas, conhecedoras por tradição da riqueza da floresta em pé, dos manguezais, dos rios e da fauna da costa fluviomarinha. Assim, pois, o título do livro – Produtos florestais não madeireiros: as comunidades e a sustentabilidade do desenvolvimento – é um convite à desobediência intelectual ao paradigma produtivista da exploração madeireira pura e simples.
Dialogando com rica literatura – cerca de 165 obras, entre livros, artigos, documentos governamentais e legislativos, são interpretadas e apresentadas como fundamentos teóricos e empíricos aos objetivos desenhados –, Márcia demonstra que a sistematização do conhecimento tradicional sobre a floresta viva e em pé apresenta um elenco de produtos e de processos de enorme valor para os desenhos de sustentabilidade das comunidades tradicionais. E isso, que perfila a autora, vem por meio do emprego de metodologias participativas e da observação sistêmica e sistemática, quando produtos, usos, processos e serviços são apropriados pelos comunas moradores das vilas e povoados ribeirinhos do Algodoal-Maiandeua. Assim, descobrem-se as práxis usadas para a conservação da biodiversidade, como estas: só se colhe a planta quando se precisa e com pequenas retiradas
; os usos são diversificados para que a natureza viva em equilíbrio, como uma teia da vida
, na expressão de Fritjo Capra (remédios, alimentos, moradia, utensílios, veículos, instrumentos de pesca, lenha, entre outros); quando necessário, as plantas são acessadas e utilizadas em tratamento do corpo e da alma
; as comunidades têm os seus médicos populares
, que atendem em diferentes locais na Ilha e possuem conhecimentos especializados sobre o emprego das ervas.
Enfim, como prefaciador e também grato por um sentimento de dever cumprido, já que a autora foi minha aluna na Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra), termino dizendo que a obra publicada torna-se um livro de leitura obrigatória para aqueles que cuidam da terra e gostam da natureza, com as suas comunidades simples e sem complexificação, aqueles que apostam que um outro mundo é possível
. E, à guisa de uma apreciação final: se o poder público fosse um poder social responsável em amplo sentido, esses territórios seriam as prioridades para os investimentos sociais, principalmente educação boa e atendimento médico efetivo, eficiente e eficaz, exemplarmente oferecido no estado pelo programa Mais Médicos. Finalmente, como concluiu Márcia, aqui reforço: Em sistemas de gestão compartilhada, é essencial que o poder público conceda às comunidades o poder de definir as regras do sistema
. Que venham mais livros desse naipe.
Prof. Dr. Manoel M. Tourinho
Professor emérito da Ufra e assessor do Programa Biotec-Amazônia
APRESENTAÇÃO
Teólogo e filósofo, Leonardo Boff ensina que o mistério não representa o limite do conhecimento, mas o ilimitado em todo o conhecimento: seria o profundo outro lado de toda realidade. E o órgão de captação do mistério seria antes o coração do que a mente. Ao longo do século XX, assistimos ao fracasso do projeto de mundo europeu fundado na racionalidade iluminista, traduzido em duas guerras mundiais, no lançamento da bomba atômica e na desumanizante política do nazismo e do fascismo, que volta a assombrar o mundo na atualidade com a ascensão de governos de extrema-direita. É hora de voltarmos a valorizar também o coração para compreendermos as diversas tonalidades e nuances das angústias que têm assolado a humanidade. A mente, sozinha, não é capaz.
Foi, portanto, com o pensamento voltado aos sentimentos e às percepções que eu resolvi escrever este livro. Fruto da pesquisa realizada durante o mestrado que fiz na Ufra, em Belém (PA), no coração da Amazônia brasileira, ele alia o simbólico ao racional, o mitológico ao empírico e o mágico ao técnico para mostrar que uma outra política ambiental é, sim, possível. Na pesquisa que fiz na Ilha de Maiandeua, tive o privilégio de conviver e de compartilhar conhecimentos com moradores das quatro comunidades que a compõem (Algodoal, Fortalezinha, Camboinha e Mocooca), para aprender sobre o saber e o fazer relativos aos Produtos Florestais Não Madeireiros (PFNM) oferecidos pelos ecossistemas que os cercam e verificar como essas informações poderiam enriquecer o Plano de Manejo (PM) desenvolvido pelo governo do estado para a APA Algodoal-Maiandeua.
O conhecimento, afinal, é libertador. É capaz de nos libertar das amarras do mercado, por exemplo, e mesmo das amarras de um conhecimento iluminista tão instrumentalizado quanto subserviente da técnica. Assim, esquecemo-nos da dimensão humana do conhecimento e de sua própria função social, que é a de proporcionar dignidade a toda e qualquer existência humana. Em um momento no qual a universidade – particularmente a universidade pública – tem sido alvo de ataques oriundos da extrema-direita no Brasil, fiz questão de ampliar a circulação da pesquisa que realizei no mestrado e que revela os esforços diários de mulheres e homens para se alimentar, sustentar-se e garantir que seus filhos e netos também possam fazê-lo com dignidade.
A autora