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Coletânea Opala
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E-book414 páginas5 horas

Coletânea Opala

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Sobre este e-book

Acontecimentos estranhos na Casa azul, Uma curiosidade mórbida em O Retrato de Amanda, Segredos de arrepiar em Sombras no Outeiro, Crimes sequenciais em o Retorno da Andorinha, Um resgate surpreendente em Gisele.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento23 de out. de 2013
Coletânea Opala

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    Coletânea Opala - José Antonio Vieira

    COLETÂNEA OPALA J.A. VIEIRA 1

    I

    Sombras no Outeiro

    A Casa Azul

    O Retrato de Amanda

    O Retorno da Andorinha

    Gisele

    EDIÇÃO 2016

    COLETÂNEA OPALA J.A. VIEIRA 2

    José Antonio Vieira, mineiro de Bom Jesus da Penha reside em São Carlos - SP

    COLETÂNEA OPALA J.A. VIEIRA 3

    (José Antonio Vieira)

    Primeira Edição - 2011-06-12

    Registro 461313 – livro 868 folha 16

    FBN

    Ficção

    Literatura Nacional

    COLETÂNEA OPALA J.A. VIEIRA 4

    SOMBRAS NO OUTEIRO

    SOMBRAS NO OUTEIRO

    Fernando dirigia seu carro possante por uma estrada de terra, no interior de Minas, acompanhado de sua esposa Selma.

    Uma lua de mel já de alguns dias, e estavam contentes pelas experiências passadas, até então. Tinham visitado algumas

    COLETÂNEA OPALA J.A. VIEIRA 5

    cidades históricas e haviam sofrido um banho de história que impressionou muito a ambos.

    Os dois se casaram alguns dias antes, numa cidade do interior de São Paulo. Agora, queriam chegar até uma pousada depois de passarem o dia todo visitando os mais diversos lugares daquela região muito bonita, mas, ainda por virem certos confortos como estradas asfaltadas, p.ex.

    ─ Fernando? Veja lá ao longe uma construção sobre uma montanha, do meu lado.

    ─ Selma, daqui parece uma construção antiga. Deixe-me parar e ver com mais cuidado.

    ─ Realmente, parece ser um antigo convento de freiras construído sobre aquela colina muitos anos atrás, talvez, funcione hoje como uma pousada ou um pequeno hotel.

    ─ Como chegaremos lá? Não vejo nenhuma entrada por aqui que vá dar naquela direção. Entremos no carro e vamos tocar para frente, quem sabe logo após aquela curva tenha alguma placa indicativa.

    ─ Então vamos.

    ─ Olhe Selma, tem uma placa a direita, na entrada de uma estreita estrada que certamente vai dar lá.

    Pousada do antigo convento, pouso e refeições. Assim estava escrito.

    ─ Vamos em frente, falou Fernando, enquanto o carro derrapava um pouco no cascalho quando virou à direita de uma forma um pouco brusca.

    ─ Veja, se vier um outro carro em direção contrária um dos dois tem de sair para o lado correndo o risco de cair na

    COLETÂNEA OPALA J.A. VIEIRA 6

    ribanceira. São poucos os lugares que permite isso, disse Fernando.

    ─ São montanhas enormes as nossas costas e ali um monte não muito elevado com uma única construção visível daqui.

    Espero que tenham um jantar á mineira, porque estou com muita fome, Selma.

    ─ Ah, os homens! Exclamou Selma, sempre com fome.

    ─ Almoçamos já certo tempo, Selma, ainda mais que estou dirigindo a horas e isto vai energia, sorrindo.

    ─ Bom, espero que tenha mais energias para a noite, amor.

    Afinal ontem passamos em branco por que você alegou muito cansaço, aliás, mal caiu na cama e dormiu como um anjo.

    Fernando, um rapaz de compleição física forte na altura de seus 28 anos de idade, uma pele clara combinando com os cabelos loiros e olhos muito azuis, a paixão de Selma. Ela um espécime mais misturada, portanto, de tez amorenada e olhos e cabelos negros como a noite. Não era muito alta, com seios bem esculpidos em um tronco mais para o franzino, com idade ao redor dos vinte e cinco anos.

    Ambos se conheceram numa Universidade Federal do interior do Estado de São Paulo, ela se formou em Pedagogia e ele em Engenharia de Materiais, com louvor.

    Ambos trabalhavam em áreas totalmente distintas, mas, não impedia que tivessem uma boa comunicação entre si, e consideravam isto como terapêutico devido não haver competição num mesmo campo.

    ─ Já estou sentindo um friozinho gostoso Fernando, vamos torcer para que a pousada seja aconchegante e quem sabe até uma lareira.

    COLETÂNEA OPALA J.A. VIEIRA 7

    -

    ─ Vamos torcer Selma, mas, primeiro um bom banho e uma lauta refeição a base de tutu de feijão, mandioca, carne suína, alem de doce de leite com queijo no final.

    ─ Bom, chegamos e vou estacionar nas proximidades da entrada.

    Repararam que era uma construção bem antiga, de mais de cinqüenta anos, com uma base de pedras que em alguns pontos atingia cerca de um metro. A construção de um formato quadrado com pé direito alto e paredes destacando grandes portas e janelas de madeira. A cor parecia um azul bem claro enquanto beirais de madeira, portas e janelas de um azul profundo como o mar. Parecia esmaecida devido a pouca luz do entardecer. Certamente, haveria um pátio interno como é comum neste tipo de construção.

    ─ Agora, somos os únicos até então aqui, porque não estou vendo nenhum outro veiculo, falou Fernando.

    ─ Humm, será que não está funcionando? Só faltava essa, Fernando.

    ─ Acho que tem gente sim, porque algumas janelas do lado esquerdo estão abertas e a porta de entrada está semi aberta somente. Vamos até lá, querida.

    Enquanto andavam, repararam que para chegar até a porta de entrada o chão era de pedras que muitos chamam de pé de moleque, desconfortável em alguns pontos que exigia cuidados ao pisar.

    Ao chegarem à porta de entrada, viram aquele arco meia lua preso a porta que servia para se anunciar com suas batidas na madeira. Logo, uma senhora com idade ao redor de 60 anos veio

    COLETÂNEA OPALA J.A. VIEIRA 8

    atender, depois de ouvir o barulho das batidas. Cumprimentou-os de uma maneira simpática e pediu que se acomodassem no sofá da sala. Quando já estavam acomodados, perguntaram sobre as condições de pouso e foram prontamente esclarecidas pela velhinha sorridente.

    Vou colocá-los em um dos nossos melhores quartos, com visão para o lado sul onde ao longe se vê uma cascata de águas brancas que enche de neblina a encosta ao amanhecer. Neste instante, moveu um pequeno sino sobre uma mesa de canto e logo apareceu uma moça aparentando cerca de trinta anos de idade que foi apresentada como sua filha Ursula, que os levaria até os aposentos. Lembrou que dali uma hora o jantar estaria sendo servido, em uma sala não muito longe do quarto deles.

    Neste momento, ouviu-se o barulho de um outro veiculo chegando, terão companhia e isto é muito bom, falou Ursula, querendo parecer simpática.

    Enquanto Ursula seguia a frente, Fernando pensava sobre esta figura feminina que intrigava um pouco. Não era muito magra, tinha seios fartos, pernas grossas e uma cintura fina, parecia fugir das pessoas, um mistério. Selma, apenas observava o corredor de onde divisava o pátio interno. Balaustres em toda sua extensão com parapeitos de proteção também. Apesar de uma luz um pouco difusa percebia-se que o pátio tinha alguns bancos de madeira, vasos grandes com plantas floridas que enchiam o ambiente de um perfume característico, a dama da noite certamente. Logo, chegaram ao quarto, com a moça avisando que o banheiro era coletivo e ficava do lado direito de onde estavam.

    ─ Não esqueçam que logo serviremos o jantar, disse Ursula.

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    ─ Logo depois do banho estaremos lá, falou Fernando.

    O chuveiro estava muito bom depois de um dia de muita poeira, pareciam ter recobrado todas as energias.

    ─ Agora, um momento muito importante, Selma, vamos ver o que temos para o jantar.

    ─ Então vamos, querido.

    Ao saírem do quarto, a duvida para que lado deviam ir foi resolvida de imediato, do lado direito o barulho de talheres sendo colocados em algum lugar.

    ─ Para lá sem dúvida, disse Selma.

    Uma sala com trabalhados em madeira em diversos pontos, piso também de madeira. Uma lareira pequena num canto com o fogo brando enchendo o ambiente de um calor confortável. Uma grande mesa retangular com cerca de quatorze cadeiras em um verniz escuro, e entalhado magnificamente.

    Invariavelmente a dona da casa sentava-se na cabeceira onde as suas costas havia um grande quadro pendurado na parede com os dizeres, se sentir à vontade conte sua história, por favor.

    Dona Cândida, era seu nome, recebia os hospedes com uma voz suave e doce que desarmava os mais agressivos espíritos.

    Dava gosto em ouvi-la. Fernando e Selma tiveram esta sensação e também os dois casais que haviam chegado um pouco depois deles.

    Ursula começou a trazer uma sopa a base de caldo de feijão e macarrão, divina foi a opinião de Selma quando deu a primeira colherada, esquentava o estomago.

    Dona Cândida, falava mansamente sobre suas duas filhas, Ursula e Lucia, está a caçula e estava no momento na cozinha,

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    enquanto que Ursula atendia a cozinha e os hospedes. A razão de minha existência se deve a elas, continuou.

    ─ Ursula com um temperamento mais forte, enquanto que Lucia era mais comedida, uma qualidade importante quando se trata de lidar com a cozinha. Ambas se completavam, concluiu.

    ─ Meu marido abandonou a gente quando Lucia nasceu, há vinte e oito anos. Nunca mais deu noticias para o desespero de suas filhas que sonham em conhecê-lo. Mas, vamos tocando a nossa vida muito bem.

    ─ Suas filhas são casadas? Dona Cândida. Perguntou um dos presentes.

    ─ Não, foi a resposta. Tiveram alguns namoros no passado que não deram em nada. Tem seus estudos secundários e agora me ajudam aqui na pousada.

    Todos sentiram que ela deu uma abertura para o caso de alguém querer falar alguma coisa.

    Os dois casais ainda não haviam se manifestado, talvez, uma precaução devida já serem mais maduros com idades entre quarenta e cinqüenta anos.

    Quando terminaram a sopa, Dona Cândida tocou um sininho.

    Para que Ursula servisse a refeição principal, certamente.

    Uma senhora, morena, um pouco rechonchuda disse que estavam vindo da cidade do Rio de Janeiro, onde passaram por momentos preocupantes nos últimos tempos.

    Enchentes, assaltos, correrias, típicos de uma grande cidade e agora estavam à procura de mais sossego. Dois casais amigos que resolveram sair de férias pelo interior de Minas.

    COLETÂNEA OPALA J.A. VIEIRA 11

    Uma outra mulher completou dizendo que alem desses problemas enfrentou a prisão do filho devido estar envolvido com drogas.

    ─ Ah, os filhos, suspirou.

    ─ Um dos homens continuou dizendo que os pais também são gentes, e merecem aproveitar a vida quando querem.

    Fizemos uma reflexão e não sabemos onde erramos na educação de nosso filho, suspirou. Na correria da vida moderna está ficando cada vez mais difícil acompanhar a vida dos filhos, completou.

    ─ E os dois pombinhos? Perguntou Dona Cândida.

    ─ Casamos alguns dias atrás no Estado de São Paulo e estamos maravilhados com o interior de Minas onde escolhemos fazer nossa lua de mel. A simplicidade, a boa comida, a hospitalidade fazem a diferença, falou Fernando. Meus pais são paulistas mesmos enquanto que os de Selma, o pai veio de Minas.

    ─ Ela sabe de que cidade? Perguntou Cândida.

    ─ Ele nunca se abre neste particular, sempre mudando de assunto quando tocamos nisto, completou Selma.

    Logo Ursula chegava com os pratos quentes. Um aroma de coisa gostosa encheu a sala, aliás, o olfato abre o caminho.

    Arroz, feijão, quiabo, chuchu, frango caipira, salada de alface, goiabada com queijo, nada muito pesado para a noite.

    ─ Esta pousada foi um convento no passado? Perguntou um dos presentes para Dona Cândida.

    ─ Sim, meu senhor. Algumas freiras viviam em clausura aqui. Eram muito reservadas a ponto de terem muito pouco contato nesta região. Fui uma das raras pessoas a ter certo relacionamento com elas. Lembro-me bem de algumas,

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    especialmente a Rosa, uma noviça muito bonita, que me intrigava pelo fato de ter tudo para viver bem fora daqui e acabou se escondendo do mundo. Era muito inteligente e ler era um de seus passatempos preferidos. Levei até suas mãos obras muito boas, de autores nacionais e internacionais, com muito cuidado porque somente livros religiosos eram permitidos. Morreu jovem ainda e deixou saudades.

    ─ Havia a Clara, também uma reclusa muito interessante, já um pouco mais madura, talvez ao redor dos quarenta anos de idade.

    ─ Muito loquaz e divertida quando se reuniam para a refeição, aliás muito frugal com pouca coisa protéica. Eu diria que ela era a mais popular e que dava um pouco mais de vida neste lugar. Gostava de promover quermesses, quando havia quitutes dos mais diversos, sorteios para ajudar a santa igreja.

    ─ Eventualmente recebiam padres e até bispos em datas comemorativas da cristandade. Pouco sabíamos dessas reuniões alem de rezarem muito, conforme ficava sabendo depois.

    ─ Dona Cândida, porque o convento deixou de funcionar, perguntou Fernando.

    ─ Bem, coincidiu com uma reunião entre o novo bispo, do bispado de Divisas, com o arcebispo da capital, aqui nesta morada. Havia alguns boatos na região, não muito dignificantes para o convento, nada que pudesse ter sido provado.

    ─ Mas, que tipo de boatos, Dona Cândida?

    ─ Sabia-se de noviças e padres bem aparentados que suscitavam duvidas quanto ao comportamento deles aqui dentro, mas, acredito que eram apenas boatos. A imaginação do povo não tem limites, sorriu.

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    ─ Como a senhora conseguiu a posse desta propriedade?

    Perguntou uma senhora, até então calada o tempo todo.

    ─ Ela foi colocada a venda, mas, não aparecia ninguém interessado na compra até que eu e meu marido resolvemos investir as nossas economias aqui.

    ─ Foi um bom negócio? Em sua opinião, perguntou Selma.

    ─ Sim porque lidar com a terra nem sempre é gratificante, as vezes chuva de granizo, outras vezes geada ou praga. Aqui não ganhamos muito, mas sem endividamento bancário.

    ─ Seu marido tinha a mesma opinião?

    ─ No começo ele tinha um comportamento, e depois estava manifestando desejo de se mudar daqui um dia, achava que estas paredes tinham muitos segredos. Eu retrucava dizendo que um lugar de muitas orações somente haveria muita paz.

    ─ Ele acabou nos deixando sem ao menos se despedir, e nunca mais soubemos mais nada dele para o nosso desgosto.

    ─ Ao longo do tempo hospedamos muita gente aqui na pousada, cada uma com uma história de vida, algumas de uma saga impressionante com um corolário de boas realizações.

    Outras seguiam sua rotina de vida como se ansiasse para chegar logo ao seu termino, sem um ideal definido, arrastando muitas vezes um peso de amarguras e ressentimentos.

    ─ Conhecer pessoas sempre acrescenta alguma coisa na vida da gente, observou Selma.

    ─ Sem dúvida minha jovem, sem dúvida.

    ─ Mas, falei muito e pouco ouvi de vocês, gosto de conhecer as pessoas com quem convivo, mesmo que por pouco tempo.

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    ─ Como se trata de uma construção antiga vocês já viram alguma assombração por aqui? Dona Cândida.

    ─ Imagina, nunca vimos. Como já disse era um local de muitas orações. Alguns hospedes diziam que ouviam sons estranhos durante a noite e não levamos isto a sério.

    ─ As pessoas estressadas das grandes cidades encontram aqui um refugio que se recuperam dentro de pouco tempo.

    Voltam-se para si e se fortalecem para quando voltam ao trabalho.

    Dali a pouco, Lucia a caçula, passou pela sala e foi certamente para seu quarto. Fernando percebeu que era uma moça bonita e mais clara que Ursula, inclusive quanto ao cabelo de um tom aloirado. Não quis comentar isto ali no momento.

    ─ Bom, senhores e senhoras, vamos para o nosso quarto porque o sono está chegando, falou Fernando.

    ─ Boa noite e um bom sono para vocês, disseram alguns.

    Fernando e Selma, deitados sob os cobertores conversavam sobre o que foi dito no jantar. Dentro da candura de Dona Cândida viam uma mulher de personalidade forte e decidida.

    Tinha muito que contar desses anos todos tocando a pousada.

    ─ Interessante Selma, que mãe e filhas não possuem muitos traços em comum. A mãe, tipo Mignone, cabelos e olhos escuros alem de uma pele levemente clara. Ursula, olhos e cabelos castanhos além de ser mais corpulenta. Lucia, com uma pele bem clara e cabelos aloirados. Deu-me a impressão dos olhos serem claros também, disse Fernando.

    ─ Ouça o rugir do vento lá fora, dá uma sensação fantasmagórica.

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    ─ Bom, é uma experiência diferente dormir numa construção antiga como esta, aliás, preciso ir ao banheiro novamente, disse Fernando.

    Quando saiu no corredor viu que estava as escuras, e foi a direita apalpando a parede até chegar ao banheiro, cerca de cinco metros aproximadamente. Acendeu a luz depois de tatear a procura do interruptor. Puxa vida, deviam deixar uma luz no corredor, pensou. Enquanto isso o vento sibilava nas janelas tipo venezianas de abrir até haver um barulho de abas de uma delas batendo no portal. Quando saiu no corredor viu que era a veneziana dali que havia aberto, alternando uma leve claridade com escuridão total devido ao luar. Quando uma das abas abriu iluminou uma figura humana de branco nas proximidades dela.

    O coração de Fernando acelerou e um frio na barriga veio a seguir, até ouvir a voz de Dona Cândida que ela estava ali para fechar a janela e dizer também que a luz do corredor havia se queimado.

    Fernando ficou aliviado e falou que ela havia dado um grande susto nele.

    ─ Desculpe-me, Sr. Fernando, não foi esta a minha intenção.

    ─ Selma, passei um susto agora que colocou meu coração a prova, mas, sobrevivi. Vamos tentar dormir.

    ─ O que aconteceu?

    ─ O corredor estava escuro devido a lâmpada ter se queimado quando vi Dona Cândida de branco num momento de claridade.

    ─ Ora, relaxe e vamos dormir. Beijos.

    O dia seguinte amanhecera com uma leve brisa, vinda das montanhas, que obrigava o uso de uma blusa de meia estação.

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    Fernando e Selma foram para a sala de café, onde todos os hospedes já estavam. Pessoas com mais idade geralmente se levantam mais cedo.

    Dona Cândida perguntou a todos se haviam dormido bem, o que foi confirmado pelos presentes. Lembrou, com certo humor, que sem querer dera um susto no Fernando quando fechou a janela do corredor. Fique tranqüilo Fernando, que já vamos trocar a lâmpada queimada.

    ─ Bom, se vocês quiserem podem conhecer os arredores, tomando o cuidado de não cair em ribanceiras, continuou.

    Fernando e Selma resolveram dormir ali mais uma noite para se recuperarem dos dias corridos de antes.

    Andavam descontraídos pelas trilhas ao redor da pousada, as vezes pegavam uma flor amarela típica dos campos, depois continuavam sem pressa.

    ─ Fernando, aquilo deve ser um cemitério, não? Vamos chegar mais perto, Selma.

    ─ Sim é um cemitério. Certamente de freiras que moraram aqui.

    ─ Deixe-me ler o que está naquela placa. Bem, aqui diz ser da irmã Jesuína e morreu jovem ainda conforme estas datas. Este já pertence a de uma irmã de mais idade quando faleceu, disse Fernando.

    ─ Interessante que no canto direito tem uma pedra grande com uma base achatada. Estou percebendo isto porque o mato está seco ao redor e a pedra um pouco inclinada, devido a erosão provavelmente. Parece que foi cortada na base, e se tem uma base lisa fica fácil de deslocá-la.

    ─ Selma ajude-me aqui, por favor.

    COLETÂNEA OPALA J.A. VIEIRA 17

    ─ Fernando será que devemos mexer nela, afinal estamos num cemitério.

    ─ Você sabe como sou curioso, talvez não tenha nada embaixo, vamos lá, força. Está se movendo, continue a fazer força Selma.

    ─ Olhe, existe um buraco sob ela, continue me ajudando.

    ─ Humm, o buraco é maior do que eu pensava, vamos continuar, upa. ─ Veja, tem uma pequena escada.

    ─ Então deve ser um tumulo, mas, porque não tem nenhuma identificação na pedra? e não estou vendo nenhuma placa caída no chão. Mais um pouco e já tenho condições de entrar, Selma.

    ─ Acho que agora dá para entrar. Fernando, acho melhor não ir porque pode estar profanando um tumulo e haver algum animal peçonhento aí também.

    ─ Não se preocupe, querida estou com um isqueiro para clarear lá dentro.

    Alguns minutos depois, Fernando gritou lá de dentro.

    ─ Selma, pegue a lanterna que está no carro.

    ─Selma foi até o carro e pegou a lanterna, tomando o cuidado de não ser vista por uma outra pessoa.

    ─ Já estou com a lanterna, querido.

    ─ Então desça com muito cuidado na escada para não cair.

    ─ Você não deve estar falando sério porque não estou com nenhuma vontade de ir até aí.

    ─ Selma, deixe de ser teimosa e venha, por favor.

    ─ Bom, já estou descendo e espero que a gente não vá se arrepender depois.

    ─ Pode vir, se apóie no barranco para não cair.

    COLETÂNEA OPALA J.A. VIEIRA 18

    ─ Está bem, aqui é maior do que eu pensava, falou Selma.

    ─ Parece uma tumba de uma família inteira. Veja que posso andar em pé aqui Fernando.

    ─ Bom, você sim. Eu ando um pouco encurvado devido minha altura. Tem um escoramento com madeiras de lei que ainda vai durar muito.

    ─ Vejo que existem gavetas de cimento pequenas, sobrepostas uma na outra, afinal o que tem nestas gavetas porque não cabe um cadáver adulto aí. Disse Fernando.

    ─ Veja se tem um espaço entre a ultima e o teto, Fernando.

    Clareou com a lanterna e viu que havia um espaço, entregou a lanterna para Selma e tentou desencaixar a ultima gaveta, somente assim, pois se a puxar ela não vai deslizar, pensou.

    ─ Bem, vamos lá, vou tentar tira-la de cima. Houve um barulho de soltura devido estar ali coladas por tanto tempo, falou Fernando.

    ─ Cuidado, coloque-a no chão, querido.

    ─ Vamos lá, de uma maneira ofegante, até colocar a gaveta sobre o chão. O cimento é pesado, observou.

    ─ A gente percebe que tem uma tampa, também de cimento, deixe-me tirar. ─ Ah, já se soltou, já está saindo.

    Quando abriu, Selma quase deu um grito de pavor ao ver que era um esqueleto de uma criança de tenra idade, certamente.

    Muito pequeno. Fernando ficou mudo, estava pasmo.

    ─ Fernando, o que vamos fazer agora? Este é um cemitério exclusivo do antigo convento ou alguém foi aqui enterrado depois disto?

    COLETÂNEA OPALA J.A. VIEIRA 19

    ─ Não sei Selma, pelo visto são varias crianças que aqui estão enterradas.

    ─ Bem, vamos sair e depois pensar o que vamos fazer, certo?

    Depois que colocaram a grande pedra no seu lugar de antes, procuraram checar se alguém tinha visto eles dentro do cemitério.

    ─ Parece que ninguém viu a gente, Selma.

    ─ Então, vamos porque o almoço já deve acontecer daqui a pouco.

    Perceberam que mais um carro estava estacionado em frente a pousada, agora três ao todo.

    ─ Veja, a placa é daqui da região mesmo.

    Passaram rapidamente no quarto deles para que Fernando trocasse a camisa porque havia sujado um pouco de pó dentro do buraco. Lavaram bem as mãos e depois foram para a sala de refeições.

    Um dos hospedes do ultimo veiculo já estava se apresentando a todos os presentes, estimulado por Dona Cândida que estava sentada no seu lugar habitual.

    ─ Bem, conheço a Dona Cândida já algum tempo, porque venho de vez em quando para cá. É um dos lugares que faço um retiro e coloco minhas idéias em ordem. Meus afazeres profissionais são muitas vezes desgastantes, alem de um sitio e aqui volto a ter equilíbrio, meu nome é Jair.

    ─ Dona Cândida, passamos nas proximidades do cemitério e percebemos que os túmulos não são recentes. Sei que no passado era habito enterrarem seus mortos na propriedade, e a

    COLETÂNEA OPALA J.A. VIEIRA 20

    senhora sabe me responder se pessoas da região eram enterradas aqui também, disse Fernando.

    ─ Não senhor Fernando que eu saiba, havia o cemitério da localidade aqui perto onde outras pessoas eram enterradas.

    Somente as irmãs eram enterradas aqui, talvez, algum padre, o que não tenho certeza. Pode ser que mortos da região tenham sido enterrados aqui bem no inicio da construção do convento, não tenho condições de afirmar.

    ─ Recém nascidos mortos da região podem estar enterrados aqui? Perguntou mais uma vez Fernando.

    ─ Não tenho conhecimento disto e me parece que somente adultos foram enterrados neste cemitério.

    ─ Obrigado, Dona Cândida.

    ─ A senhora se lembra bem de algumas freiras?

    ─ Lembro-me muito bem de algumas como já disse anteriormente, agora veio a mente a irmã Jesuína que faleceu ainda jovem.

    ─ Posso saber do que morreu, minha senhora?

    ─ Foi uma morte um pouco misteriosa porque era uma moça muito saudável e muito bonita. Nunca entendi como uma pessoa bem dotada pela natureza, pudesse dar as costas para o mundo e viver em clausura.

    ─ A senhora havia falado também de Rosa, se não me engano, que era também muito bonita e saudável. E ela faleceu já de idade ou mais jovem também. Ao redor dos trinta anos aproximadamente.

    ─ Bem jovem também, observou Fernando.

    ─ È curioso como a tranqüilidade daqui não foi suficiente para uma vida longeva de algumas pessoas, observou Selma.

    COLETÂNEA OPALA J.A. VIEIRA 21

    ─ Sim, minha senhora, talvez a distancia de centros maiores e com mais recursos médicos foi um fator decisivo para o socorro não sido de imediato.

    Algum tempo depois do almoço, descansando no pátio central o Sr. Jair foi abordado por Fernando sobre os tempos idos do convento. O homem foi comedido nas respostas.

    Disse que não sabia de detalhes da vida das irmãs, mas, aparentemente levavam uma existência normal, sem nenhum acontecimento que poderia arranhar a conduta delas.

    Vinha com certa freqüência comprar produtos horti fruti granjeiros produzidos por elas na propriedade, e depois de ser transformada em pousada também não deixou de vir.

    ─ Então, era uma comunidade vivendo de acordo com seus preceitos, concluiu Fernando.

    ─Sem dúvida, finalizou o Sr. Jair.

    Fernando e Selma agradeceram a conversa e logo saíram em direção ao carro para pegar algumas coisas.

    Ao retornarem para dentro de casa viram o Sr. Jair conversando com Dona Cândida de uma maneira bem discreta o que suscitou a suspeita de que o assunto fora o de alguns minutos antes com Fernando e Selma.

    O casal decidiu não inquirir mais ninguém sobre o passado da Pousada e pensavam já na possibilidade de seguir viagem, naquele mesmo dia.

    ─ Então, vamos arrumar nossas coisas daqui a pouco Selma.

    ─ Sim, logo depois de uma ultima caminhada ao redor da Pousada, concorda?

    ─ Vamos caminhar e não podemos demorar muito.

    COLETÂNEA OPALA J.A. VIEIRA 22

    Tiraram fotos de diversos lugares ao redor, inclusive do cemitério. Comentários surgiam quando divisavam trabalhados de madeira de qualidade artística, aliás, obras magníficas que tinham certamente um valor histórico muito grande.

    ─ Bem, acho que já tiramos fotos em demasia e já está na hora de pegar nossas coisas e partir.

    Quando chegaram a seus aposentos viram uma jarra de suco de laranja em uma bandeja com dois copos sobre a cômoda.

    Veio a calhar porque estamos com muita sede e uma boa cortesia da casa. Fernando tomou dois copos enquanto que Selma tomou um apenas. Pedras de gelo boiavam no liquido que dava uma sensação muito refrescante quando tomado.

    Depois de arrumar a mala em pouco tempo, sentiram a necessidade de descansar um pouco deitados na cama. As pálpebras pesavam e não resistiram ao sono.

    ─ Selma, está muito escuro aqui dentro e parece que dormimos por muito tempo. Selma, acorde querida.

    ─ Humm, querido, ainda estou com muito sono e quero dormir mais um pouco.

    ─Selma, estamos dormindo num colchão sobre o piso, alguma coisa está errada enquanto apalpava o piso ao redor. O

    piso é de pedra rústica enquanto que o do quarto é de pedra polida.

    ─ Selma, acorde, nos não estamos no quarto.

    ─ Querido você deve estar sonhando, claro que estamos no quarto.

    ─ Não estamos querida, tenho certeza.

    COLETÂNEA OPALA J.A. VIEIRA 23

    ─ Não estou vendo quase nada, querida, vou tentar achar o interruptor de luz próximo da porta de entrada. Vou tentar levantar-me apoiando na parede. Selma, a parede é de pedra rústica também, sinto quando apalpo. Decididamente não estamos no nosso quarto. Onde estamos? Disse Fernando com uma tonalidade de voz com muita preocupação.

    Alguns minutos depois, ele já havia feito um reconhecimento tátil do recinto. Havia uma porta somente, feita de uma madeira maciça trancada pelo lado de fora. Um quarto pequeno, talvez, uns dez metros quadrados aproximadamente, conforme avaliação de Fernando.

    ─ Estou sentindo muito frio e acho melhor deitar-me sob o cobertor e aguardar a claridade do dia para avaliarmos nossa situação.

    ─ Fernando estamos presos aqui, e agora?

    ─ Acalme-se querida, talvez, estejam de brincadeira com a gente, não se desespere tudo vai acabar bem.

    ─ Não consigo mais dormir, Fernando. O que será de nós?

    Soluçava abraçada em Fernando.

    ─ Feche os olhos e procure se manter calma, daqui a pouco teremos a luz do dia certamente. Por esta eu não esperava, suspirou.

    Não conseguiram conciliar o sono até o dia começar a raiar, visto através de uma pequena abertura

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