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A História das Cervejas Britânicas: Amber, Gold & Black
A História das Cervejas Britânicas: Amber, Gold & Black
A História das Cervejas Britânicas: Amber, Gold & Black
E-book431 páginas7 horas

A História das Cervejas Britânicas: Amber, Gold & Black

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Sobre este e-book

A História das Cervejas Britânicas é o livro mais completo já escrito sobre o tema.

Embarque em uma viagem pelas origens e evolução das cervejas que são apreciadas há séculos nas Ilhas Britânicas: das Bitters às Barley Wines, das Milds às Stouts, passando por variedades menos conhecidas como Stingo, Heather Ale e Mum.

Baseado em centenas de documentos históricos, este livro celebra as raízes e o desenvolvimento das cervejas britânicas – tanto as que se perderam no tempo como as que preenchem os pints até hoje com tons dourados, âmbares e pretos.

Seja qual for o seu nível de conhecimento sobre cerveja, você certamente encontrará informações surpreendentes e histórias fascinantes sobre a bebida favorita dos britânicos. Cheers!
IdiomaPortuguês
Data de lançamento31 de mai. de 2022
ISBN9786584915008
A História das Cervejas Britânicas: Amber, Gold & Black

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    Pré-visualização do livro

    A História das Cervejas Britânicas - Martyn Cornell

    A História das Cervejas BritânicasA História das Cervejas BritânicasA História das Cervejas Britânicas

    Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

    Tuxped Serviços Editoriais (São Paulo, SP)

    Ficha catalográfica elaborada pelo bibliotecário Pedro Anizio Gomes - CRB-8 8846

    CORNELL, Martyn. A História das Cervejas Britânicas: Amber,

    Gold and Black. 1. ed. Porto Alegre, RS: Editora Krater, 2022.

    Para Arthur Harry Cornell (1922 – 1990)

    e Herbert Charles BertCornell (1926 – 2000)

    Meus mentores na cerveja

    Meus agradecimentos a Fuller, Smith & Turner de Chiswick, Londres

    e Harvey & Sons de Lewes, Sussex,

    os quais, sem a ajuda, este livro não teria nascido.

    SUMÁRIO

    Introdução

    CAP. 01 Bitter

    CAP. 02 MiIld

    CAP. 03 Burton Ale

    CAP. 04 Porter

    CAP. 05 Stout

    CAP. 06 India Pale Ale

    CAP. 07 Golden Ale

    CAP. 08 Dinner Ales e Cervejas de Baixa Densidade

    CAP. 09 Brown Ale

    CAP. 10 Wheat Beer – Cervejas de Trigo

    CAP. 11 Barley Wine e Old Ale

    CAP. 12 Herb Ales – Ales saborizadas e com ervas

    CAP. 13 Honey Beer – Cervejas e outras bebidas com mel

    CAP. 14 Heather Ale

    CAP. 15 Wood-Aged Beers – Cervejas envelhecidas em madeira

    CAP. 16 Lager

    Glossário

    Bibliografia

    Anexos

    NOTA DA EDITORA

    A Grã-Bretanha é uma das maiores nações produtoras de cerveja do mundo – fato que os próprios britânicos muitas vezes parecem desconhecer. Precisamos ter muito mais orgulho das coisas que demos a nós mesmos e ao mundo: lindas, refrescantes e lupuladas Bitters e IPAs; Summer Ales douradas para os dias quentes no jardim; Barley Wines inebriantes e ricas; Winter Warmers untuosas; Milds alegres, sociáveis e animadoras de conversas; Porters escuras, cremosas, revigorantes e fortes; encorpadas e calorosas Stouts; Old Ales e Barley Wines para saborear e relaxar; cervejas que vão bem com comidas de todos os tipos e cervejas que podem ser apreciadas sozinhas – estilos nascidos nessas ilhas e, agora, apreciados e produzidos de São Francisco a Cingapura, de São Petersburgo a Sydney.

    Este livro é uma celebração das raízes da Cerveja Britânica, um olhar sobre a origem dos estilos que apreciamos hoje, bem como sobre aquelas ales e cervejas que perdemos; um estudo sobre como os líquidos que enchem nossos copos de cor âmbar, dourada e preta se desenvolveram ao longo dos anos. Também é um olhar para a frente, para alguns dos novos estilos de cerveja sendo desenvolvidos na Grã-Bretanha no século XXI, como cervejas envelhecidas em barris de madeira que antes continham uísque ou rum.

    Surpreendentemente, apesar do grande aumento no interesse pela cerveja como assunto na Grã-Bretanha nos últimos trinta anos ou mais, este é o primeiro livro dedicado exclusivamente a examinar a história única dos diferentes estilos de cerveja produzidos por aqui – mais estilos que conquistaram o mundo, pode-se sugerir, do que qualquer outra nação conseguiu.

    Pode ser algo bom que os britânicos prefiram estar em um pub apreciando sua cerveja com os amigos, do que ficar sentados em casa lendo sobre ela. Mas, espero que aprender mais sobre a História daquilo que estão bebendo possa adicionar prazer à experiência, independente de onde quer que se esteja fazendo isso, encorajando-os a apreciar mais dessa bebida maravilhosa e explorar suas muitas ofertas. E são muitas as histórias que veremos neste livro. Por exemplo:

    • como a Bitter nasceu e se desenvolveu a partir do desejo da classe média vitoriana pelas então na moda Pale Ales, antes apreciadas exclusivamente pela pequena nobreza;

    • como a demanda dos trabalhadores das ruas e rios de Londres por uma cerveja substanciosa e fortalecedora para ajudá-los a passar o dia de trabalho acabou nos dando um estilo que, nos braços irlandeses, circulou o globo;

    • como um estilo desenvolvido para os aristocratas do Báltico se tornou a Burton Ale, uma das cervejas mais populares na Grã-Bretanha até algumas gerações atrás e agora quase esquecida;

    • como cervejas como Broom Ale, Mum e West Country White Ale prosperaram e depois desapareceram;

    • como o enorme aumento no número de cervejarias na Grã-Bretanha nos últimos trinta anos, com mais de 700 microcervejarias em operação, ajudou a trazer novos estilos, como a Golden Ale e cervejas envelhecidas em madeira;

    • e até mesmo sobre como os cervejeiros britânicos do século XIX ajudaram a inspirar o desenvolvimento da cerveja moderna.

    Além disso, detalhar as longas histórias por detrás das cervejas britânicas pode ajudar a restaurar o respeito pela bebida nacional do país. Embora Thomas Hardy tivesse escrito no The Trumpet Major of Dorchester que as massas a adoravam, a pequena nobreza a amava mais do que o vinho, e pelas famílias mais ilustres do condado ela não era desprezada, hoje, a cerveja raramente recebe a posição que merece no coração da vida gastronômica britânica.

    A comida britânica cresceu e se desenvolveu ao lado da cerveja e as duas se complementam – assim como a comida francesa ou italiana é complementada pelo vinho. Rosbife é fantástico acompanhado de uma Pale Ale, Porter é ótima com um filé ou cordeiro, Stout é ótima harmonizada com carne de porco, frango ou alimentos picantes, e qualquer queijo britânico tem sua cerveja de companhia – de Cheddar e Bitter a Stilton e Barley Wine. Além disso, sobremesas também vão muito bem com cerveja, como pode afirmar quem já experimentou clafoutis de damasco com uma IPA, uma Strong Ale com pudim de ameixas ou uma Chocolate Stout acompanhada de um bom sorvete de baunilha.

    Em resumo, este livro é uma celebração da cerveja britânica em todos os seus belos tons e sabores inspiradores. Saúde e boas cervejas!

    O pint é um dos ícones da Grã-Bretanha e, para a maioria das pessoas hoje, a cerveja naquele copo icônico deve ser uma Bitter – a cerveja de cor âmbar-castanha, maltada e fortemente aromatizada com lúpulos, que todos imaginam nas mãos de britânicos bebendo em uma velha mesa de carvalho em um pub com telhado de palha no interior do país, ou enquanto eles desfrutam de uma música em torno de um piano maltratado em um alegre bar de esquina –, exceto que ela, embora seja uma das maiores contribuições da Grã-Bretanha para o mundo da cerveja, tornou-se a bebida favorita do país apenas no início dos anos 1960.

    As origens da Bitter, especialmente considerando sua popularidade, são surpreendentemente obscuras. Não parece ter havido uma cerveja chamada Bitter muito antes da época em que a Rainha Victoria subiu ao trono, em 1837. O que parece ter acontecido é que o nome surgiu porque os consumidores queriam diferenciar as cervejas claras, maturadas e bem lupuladas – que estavam ganhando lugar nos portfólios das cervejarias em todo o país no início da década de 1840 – das mais adocicadas, mais jovens e geralmente menos amargas Mild Ales, que, até então, eram praticamente a única alternativa às Porters e Stouts para a maioria dos consumidores por mais de um século.

    A Porter – que, após 100 anos como a mais vendida do país, estava aos poucos perdendo sua enorme popularidade quando da morte de William IV – sempre foi chamada apenas de cerveja (do inglês, beer). Mesmo na década de 1930, se você pedisse simplesmente cerveja em certos pubs de bairros mais afastados, provavelmente seria servido de uma Porter, sem mais perguntas. Se você não quisesse Porter, você deveria pedir uma ale. O que você receberia como ale era uma cerveja fresca, leve, adocicada e, naquela época, por volta de 1840, também clara, sendo geralmente feita apenas de maltes claros, como o malte Pale. Como chamar, então, quando um novo tipo de cerveja clara, mas envelhecida e lupulada, começou a aparecer nos pubs?

    Os cervejeiros nomearam – e continuaram a nomear – a nova bebida mais lupulada como Pale Ale. A cervejaria londrina Whitbread listou Pale Ale, Mild Ale, Stout e Burton como os quatro principais tipos de cerveja atualmente, e muitas das cervejas que nós pensamos hoje como sendo Bitters ainda são chamadas de Pale Ales por seus fabricantes. Truman, Hanbury & Buxton fabricavam, em sua cervejaria localizada em Burton upon Trent, cervejas chamadas PA1 e PA2 (Pale Ale um e dois). A primeira era uma Strong Bitter (bitter forte) e a segunda uma Standard Bitter (bitter padrão). Quando a cervejaria Ram (que pertencia à Young & Co, em Wandsworth, sul de Londres) fechou em 2006, ainda enviava sua Ordinary Bitter (bitter comum) em barris rotulados como PA, exatamente da mesma forma de quando foi produzida pela primeira vez, em 1864, enquanto os barris de sua Special Bitter (bitter especial) eram marcados como SPA. Em 1952, a cervejaria Marston’s, de Burton, deu a sua Best Pale Ale o nome de Pedigree Pale Ale. Na mesma época, a London Pride foi anunciada pela Fuller, Smith & Turner como sendo uma Pale Ale. Hoje em dia, nenhum consumidor se referiria à Pedigree ou à Pride como sendo qualquer outra coisa que não rótulos de Bitter.

    Não haviam placas de identificação nas manoplas de torneiras e de equipamentos de extração de chope nos pubs vitorianos (e elas não apareceriam até 1930, sendo amplamente usadas apenas a partir da década de 1950) e, embora os cervejeiros pudessem ditar a nomenclatura da nova bebida nos rótulos de suas versões engarrafadas (razão pela qual havia Pale Ale em garrafas na Grã-Bretanha, mas não Bitter), os próprios consumidores poderiam decidir como chamariam a versão em chope quando eles a pedissem. Foi mantido o termo ale para o estilo antigo e leve da bebida (Mild Ale) e chamaram o novo por um que o definia e contrastava com o anterior – Bitter Beer, ou apenas Bitter, para abreviar. A dicotomia ale/bitter, em vez de mild/bitter, durou pelo menos por 120 anos no vocabulário dos consumidores, especialmente em algumas regiões. Tom Berkley, que no início dos anos 1950 era gerente em treinamento em um pub perto das docas de Poplar, à leste de Londres, teve que aprender rapidamente que quando os estivadores entravam e diziam simplesmente "ghissile", eles queriam algo suave, enquanto a Bitter era mais especificamente solicitada como "pinta bi’er".

    Desde o início, Pale Ale e Bitter foram sinônimos. A primeiro menção do termo Bitter Beer no jornal The Times veio em 5 de setembro de 1842, em um pequeno anúncio da Australian Pale Ale produzida pela Ashby’s, cervejaria fundada pelos quacrianos (quakers) de Staines, em Middlesex, algumas milhas acima do Tâmisa a partir de Londres. É a mais agradável de todos os diferentes tipos de cervejas Bitter que já provamos, dizia o anúncio.

    A melhor evidência sobre o motivo de cervejeiros e público considerarem Pale Ale e Bitter Beer como sinônimos intercambiáveis vem com o episódio denominado A Grande Calúnia da Estricnina (The Great Strychnine Libel), de 1852. Em março daquele ano, o professor francês Monsieur Payen afirmou que grandes quantidades de estricnina¹ estavam sendo exportadas da França para a Inglaterra para uso em cerveja – ao invés de lúpulo para dar o sabor amargo na bebida, a substância estaria sendo adicionada. A difamação foi repetida em um jornal médico inglês, o Medical Times and Gazette, que escreveu:

    Agora é moda acreditar que a cerveja Bitter é a melhor bebida para o estômago que já foi inventada... Que o amargor do melhor tipo de Pale Ale é dado simplesmente por um excesso de lúpulo ou camomila... [mas] acreditamos firmemente que grandes quantidades de estricnina foram produzidas em Paris... para ser destinada à exportação para a Inglaterra, com o intuito de fabricar cerveja Bitter.

    Uma carta foi publicada no The Times em 29 de março sob o título Cerveja Bitter, chamando a atenção do público em geral para a suposta afirmação do francês. Isto foi respondido com revolta pelos cervejeiros, incluindo uma carta que foi publicada já no dia seguinte de Michael Thomas Bass, chefe de uma das maiores cervejarias de Burton upon Trent e uma das maiores exportadoras de Pale Ale para a Índia. Bass disse:

    Quando uma carta é admitida no The Times, alertando o público que eles podem estar absorvendo o veneno mais sutil e mortal enquanto estão apenas sonhando com os prazeres de uma cerveja Bitter, posso, talvez, ser perdoado, como um dos cervejeiros daquela bebida favorita, se pedir sua permissão para apontar o que já disse o The Spectator em sua última edição, chamada de Uma Fábula Parisiense sobre a Pale Ale [A Paris Fable of Pale Ale] ...

    Ora, Senhor, a Índia teria sido há muito tempo despovoada de seus habitantes europeus se houvesse algo de pernicioso na Pale Ale.

    A carta de Bass não faz distinção entre Bitter e Pale Ale, bem como em uma história publicada posteriormente no The Times, em 12 de maio de 1852, sob o título Suposta adulteração de Pale Ales por estricnina. Esta foi sobre um relatório encomendado a dois professores de Química na Inglaterra por Henry Allsopp, chefe de outra grande cervejaria de Burton upon Trent, que dizia: …a acusação de adulteração é totalmente infundada, e o consumidor de cerveja Bitter pode descartar todos os temores de ser envenenado algum dia enquanto saboreia sua bebida favorita.

    Em meados do século XIX, a nova bebida clara e amarga estava particularmente em voga entre jovens consumidores de classe média e classe média alta, por ser algo visivelmente diferente das Milds adocicadas e das Porters escuras das classes trabalhadoras. No romance The Adventures of Mr. Verdant Green, an Oxford Freshman, de Cuthbert Bede (pseudônimo de um professor de Oxford, o Reverendo Edward Bradley), escrito em torno de 1853, todos os alunos de graduação de Oxford que povoam suas páginas como personagens bebem Bitter.

    Apesar disso, nem todo mundo se animou com a nova bebida: em 1850, um editorial do The Times dizia que, embora entre as classes mais ricas, a cerveja tenha sido muito substituída por vinhos leves, entre as classes intermediárias, o atroz composto chamado de ‘cerveja Bitter’ parece ser a escolha para expulsar de vez a velha bebida britânica por completo, como o rato de Hanover exterminou aquela raça nativa que agora só é visível na Ilha de Portland². Dois anos depois, o jornal, falando sobre a ‘cerveja clara’ dos consumidores da classe alta e sobre as alegações de doses (pints) menores que as usuais, dizia: "Se fôssemos forçados a beber um pint de ‘cerveja Bitter’ durante o jantar, admitamos francamente que não deveríamos nos importar com o quão pequena fosse a medida".

    Em 1855, a revista Punch estava fazendo piadas sobre os avançados jovens cavalheiros, que bebiam cerveja amarga vivendo uma existência amarga. Alguns anos depois, em 1864, o artista de Music Hall³ Tom Maclagan, vestido como um elegante magnata em sua cartola, monóculo e com costeletas de 23 centímetros (inspiradas em Lord Dundreary), apresentou uma música em louvor à Bitter Beer da Bass, com a propaganda de da India Pale Ale na última página de seu livreto de partituras. A crescente popularidade das Pale Bitter Ales entre os modernos e avançados jovens cavalheiros estava intimamente relacionada com o crescimento de Burton upon Trent como um centro cervejeiro (provavelmente porque as Pale Ales eram caras e visivelmente diferentes nos novos e não tributados copos de cerveja, que estavam substituindo as canecas de peltre e de porcelana nos salões dos pubs).

    As Pale Ales provavelmente já existiam desde a década de 1640, após a invenção do coque (carvão com seus compostos voláteis e tóxicos removidos). Maltarias não podiam usar carvão comum para secar o malte verde, pois ele envenenava seu produto, mas podiam usar coque em vez de madeira ou palha. Isso significava que, com um combustível mais confiável, podia-se controlar melhor a temperatura dos fornos nas maltarias e, portanto, também controlar melhor a cor resultante do malte. Com a invenção e o crescente uso do sacarômetro no século XVIII, os cervejeiros foram capazes de descobrir que o malte Pale contém maior quantidade de matéria fermentável do que os maltes mais escuros, sendo frequentemente usado durante aquele século para fabricar cervejas fortes, claras, fortemente lupuladas ou de guarda, que maturavam por doze meses ou mais. No entanto, pelo coque ser mais caro que a madeira para secar os maltes, tais cervejas tornavam-se caras, sendo geralmente bebidas apenas pelos ricos.

    Capa do livreto de partituras de 1864 do músico de Music Hall Tom Maclagan, ostentando seus trajes e costeletas segundo a moda da metade da Era Vitoriana.

    No final do século XVIII, o mercado para essas Pale Ales de guarda cresceu na Índia, onde eram muito populares entre os civis (escriturários e burocratas) e militares (oficiais em exércitos privados) da Companhia das Índias Orientais, a gigantesca empresa comercial que acabou gerenciando grande parte do subcontinente. Antes do reinado de George IV, o maior fornecedor do mercado indiano era um cervejeiro chamado Hodgson, de Bow, no extremo leste de Londres, perto das docas da Companhia das Índias Orientais. Na década de 1820, cervejeiros de Burton upon Trent, em Staffordshire, começaram a fabricar uma versão clara de Bitter Beer para competir com Hodgson no mercado da Índia. Tal cerveja era originalmente conhecida por uma variedade de nomes, incluindo Pale Ale como preparada para a Índia, mas, no final da década de 1830, tornou-se conhecida como India Pale Ale ou East India Pale Ale.

    Embora os cervejeiros da época mal soubessem os motivos, as águas dos poços de Burton, naturalmente com alto teor de sulfato de cálcio (graças aos leitos de gipsita/gesso nas profundezas da cidade), eram perfeitas para a produção de cervejas Pale Ale altamente lupuladas e carbonatadas. A água cervejeira rica em gipsita usada pelos cervejeiros da cidade ajudava na coagulação da matéria proteica durante a fervura do mosto (hot break), que de outra forma causaria turbidez na cerveja. Isto permitiu a utilização de lúpulo em proporção mais elevada sem que aumentasse a adstringência da cerveja, ao contrário das cervejarias londrinas com águas de teor elevado de carbonatos. Além disso, as águas de Burton retiravam menos cor do malte, produzindo cervejas mais claras a partir do malte Pale, e ainda promoviam o crescimento da levedura durante a fermentação.

    A chegada da ferrovia em Burton upon Trent, em 1839, permitiu que os cervejeiros da cidade de Staffordshire começassem a enviar suas cervejas claras e lupuladas, do mesmo tipo que enviavam para a Índia, também para clientes na Grã-Bretanha, sem ter que pagar altas taxas e sofrer o inevitável furto que enfrentavam ao enviar suas cervejas pelo canal. Seu comércio saltou 50% em um ano e continuou a subir rapidamente. Em poucos anos, outras cervejarias se viram obrigadas a oferecer cervejas claras e amargas semelhantes para competir.

    Antes da década de 1840, os poucos anúncios de cervejarias nos jornais locais normalmente listavam apenas Ale (em três diferentes graduações: X, XX e XXX) e Porter. Um dos primeiros cervejeiros de fora do eixo Londres-Burton a oferecer uma cerveja amarga no estilo IPA foi Thomas Henry Wyatt, da Bridge Street Brewery (Banbury, Oxfordshire), que a anunciava como "Very Fine Pale Bitter Ale (India)". Tal cerveja era vendida, em julho de 1843, ao preço de 17 pennies por galão, a cerveja mais cara da lista da cervejaria. Um anúncio de 1851 da Laws & Co, produzido na cervejaria Chevalier, de King’s Lynn, em Norfolk, declarou: "Pale Bitter Beer! Laws & Company, uma cervejaria familiar, conseguiu produzir um excelente produto que está sendo vendido para famílias por 1 shillings por galão", apresentando a versão mais barata de Pale Ale amarga disponível até então.

    No mesmo ano de 1851, a Hall & Woodhouse, então ainda Ansty, cervejaria localizada perto de Blandford, em Dorset, anunciou que a Pale Ale tinha sido recentemente adicionada aos seus produtos. Um ano depois, Nanson & Co., que detinha a cervejaria Lady’s Bridge, em Sheffield, também anunciava Bitter Beer. Mas esses eram casos raros. Durante a década de 1850, a maioria dos cervejeiros parece ter continuado a anunciar suas cervejas apenas como Ale e Porter. A partir da década de 1860, no entanto, muitos cervejeiros começaram a fabricar Pale Ales e estavam vendendo IPA e Bitter Ales, estas a preços mais baixos. Em 1875, Henry Earle, da cervejaria Barnet, de Middlesex, listou três tipos diferentes de cervejas amargas: IPA, BA e LBA, em ordem decrescente de força e preço.

    Outros cervejeiros seguiram um padrão semelhante, embora nem sempre com uma cerveja chamada IPA na lista. Michael Bowyer, da cervejaria Stoke, em Surrey, por exemplo, produziu três cervejas amargas diferentes em 1887: a PA, levemente amarga, sendo vendida por 15 shillings por kilderkin, que implicava em uma densidade inicial (OG) de cerca de 1.040 e preço de varejo de 3 pennies por um quart (equivalente a 2 pints) – a cerveja mais barata de qualquer pub vitoriano; a Bitter Ale, por 18 shillings por kilderkin, 4 pennies por um quart, com uma OG de cerca de 1.045 a 1.050; e a BBA, uma cerveja de guarda forte e amarga, custando 27 shillings por kilderkin, com uma OG de cerca de 1.070 e preço de varejo de 7 pennies o quart.

    O termo Bitter nunca cruzou o Atlântico como nome de um estilo de cerveja local – talvez porque tenha surgido depois do período de máxima imigração inglesa para a América do Norte (embora muitos cervejeiros no Canadá e nos estados da Nova Inglaterra produzissem Pale Ales para seus clientes). Ocorreu, porém, na África do Sul, Austrália e Nova Zelândia, onde a emigração da Grã-Bretanha foi forte durante a década de 1840 e 1850, uma época em que a palavra estava começando a ser usada nos pubs britânicos.

    Em 1868, na recém-fundada cidade de Newcastle, na atual KwaZulu-Natal, William Peel, da cervejaria Umlaas, ancestral direta das posteriores cervejarias sul-africanas, estava vendendo Pale Bitter Ale a 2 shillings por galão. Na Austrália, o estilo manteve seu nome completo, em vez de ser abreviado para apenas Bitter, de modo que a cervejaria South Australian, em Adelaide, produzia a West End XXX Bitter Beer e a Southwark Bitter Beer, enquanto a cervejaria Standard, da Tooheys, em Sydney, vendia Standard Bitter Ale, e sua rival Tooth’s fabricava a Sydney Bitter Ale. Cervejeiros australianos também chamam suas versões engarrafadas da cerveja de Bitter Ale ou Bitter Beer, em vez de Pale Ale, como na Grã-Bretanha. Na Austrália da década de 1920, no entanto, Bitter, como estilo, significava simplesmente um tipo ligeiramente mais escuro de cerveja, em comparação com a Lager local, servida fria e produzida com levedura de baixa fermentação. Castlemaine XXXX, por exemplo, chamada de Lager no Reino Unido, também é conhecida como Bitter Ale em Queensland, seu local de origem.

    Pelo menos um autor, escrevendo de forma anônima em 1884, considerou o desenvolvimento da Burton IPA como sendo a invenção das cervejas amargas em geral. No entanto, havia um estilo de Pale Ale lupulada que existia de forma independente da tradição da IPA, que era conhecido como KK ou AK. Embora o estilo K de Pale Ale amarga fosse provavelmente um estilo antigo, este fato carece de evidências. Uma das primeiras menções impressas é de 1855, em um anúncio para a cervejaria Stafford, que vendia Pale India Ale a 18 pennies o galão, e AK Ale, uma cerveja delicadamente amarga, por 14 pennies por galão. O cervejeiro James Herbert, de Burton, comentou sobre a AK Ale: "Esta classe de ale tornou-se muito consumida, principalmente por famílias, sendo uma ale leve e enviada pela maioria dos cervejeiros a 1 shilling por galão. Esta ale é normalmente produzida a uma densidade de 20 lb" – que é equivalente a uma OG de 1.056.

    Outras evidências sugerem que Herbert estava errado em sua estimativa da força da AK, embora certamente fosse um estilo popular. Em uma única edição do Richmond and Twickenham Times, datada de 8 de julho de 1893, havia anúncios de cinco cervejarias diferentes do sul e oeste de Londres, quatro das quais ofereciam uma cerveja chamada AK ou KK, e todas com preço de 1 shilling o galão, sugerindo que tivessem uma OG de 1.045 a 1.050. O professor Charles Graham, em sua palestra para a Sociedade da Indústria Química em 1881, confirmou a densidade original da AK em 1.045, com um teor de álcool por massa de 4,3% (equivalente a 5,4% ABV, o que parece bastante alto), enquanto a Burton Bitter, disse ele, tinha uma OG de 1.064 e um ABV de 5,4%. As cervejas AK eram maturadas por um tempo um pouco menor do que outras ales claras: em 1898, Dr. Edmund Moritz, descrevendo tipos de cerveja em uma comissão parlamentar sobre o assunto, falou das Light Pale Ales, ou AK, mantidas na cervejaria por duas a três semanas antes da entrega, enquanto outras Pale Ales eram mantidas por até um mês.

    Os cervejeiros parecem ter mantido deliberadamente a diferença entre os dois tipos de cerveja amarga: a AK, uma cerveja de baixo amargor, baixa densidade, cor mais clara e menos lupulada, consumida relativamente logo após a sua produção; e uma Pale Ale um pouco mais escura, lupulada, mais forte, muitas vezes designadas como PA, que era armazenada por algum tempo antes de ser enviada aos pontos de venda. Os registros de produção do ano de 1912 da Garne & Sons de Burford, em Oxfordshire, mostram AK sendo fabricada em uma OG de 1.040 e com uma cor de 14, uma tonalidade castanho-avermelhada, enquanto a PA foi fabricada com uma OG de 1.056 e com a cor 18, um castanho-médio mais escuro. A diferença é confirmada por comentários contemporâneos sobre as duas cervejas. Alfred Barnard, escritor especialista em bebidas do final do período vitoriano, provou uma AK produzida por Rogers de Bristol em 1889, descrevendo-a como uma bebida frisante e brilhante, de uma rica cor dourada e... um sabor delicado e agradável de lúpulo. Sobre a Pale Ale da Whitbread, por outro lado, que era mais como uma Standard Bitter, ele escreveu que tinha um sabor mais perceptível de lúpulo, embora também parecesse brilhante e frisante. A Crowley, cervejaria localizada em Croydon High Street, Surrey, descreveu sua AK em um de seus anúncios do ano de 1900 como uma Bitter Ale de qualidade marcante e com um delicado sabor de lúpulo – e a descrição frequente das AK em anúncios vitorianos de para consumo familiar sugere uma cerveja não muito amarga e nem muito forte.

    Por que um K foi usado no nome dessas cervejas claras e de baixa lupulagem é um mistério ainda a ser devidamente desvendado. Pode ser simplesmente para contrastar com o X, normalmente usado para Milds e ales escuras, como pode até ter sido retirado de uma popular cerveja medieval holandesa e flamenga chamada koyt, ou coyt, fornecida em duas potências, simples e dupla. Em flamengo antigo, a palavra para simples era ankel (enkel em holandês moderno), designando a cerveja simples como ankel koyt, o que poderia facilmente ter sido encurtado para AK. Muitos cervejeiros holandeses e flamengos emigraram para a Inglaterra nos séculos XV e XVI, trazendo consigo a preferência pela produção de cerveja com lúpulo e um amplo número de termos cervejeiros, como gyle e kilderkin. Talvez eles tenham trazido a Ankel Koyt com eles também. O termo AK, apesar da mitologia que diz o contrário, não tem nada a ver com um cervejeiro chamado Arthur King. Também não é abreviação de Asquith’s Knockout, uma vez que a cerveja facilmente precede Herbert Asquith, o político eduardiano notoriamente apaixonado por bebida e que foi o Primeiro-Ministro em 1914, quando a Primeira Guerra Mundial começou e os impostos sobre a cerveja saltaram de 7 shillings e 9 pennies para 23 shillings por barril.

    Certamente havia espaço para uma cerveja amarga com menos adição de lúpulo, já que a primeira onda das populares Pale Ales usava a planta em quantidades substanciais. Michael Bass, o cervejeiro de Burton, revelou em 1857 que, enquanto a cerveja comum consumia até 2 ou 2,5 lb (aprox. 0,9 - 1,1 kg) de lúpulo por barril, as "Pale Ales e

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